Introdução:
O Livro de Isaías é considerado o
mais evangélico de todos os livros do Antigo Testamento. Alguns temas são
centrais na sua mensagem:
a. A vinda do Messias. Há sempre
mensagens descrevendo a vinda do Messias, incluindo seu ministério. Se você é
judeu e ler Isaías 53 com a mente aberta, certamente você se converterá a
Jesus.
b. A universalidade do Evangelho. O
Evangelho não seria apenas para os judeus, mas transcendia os limites
geográficos de Israel e deveria ser levado a todos os povos.
c. A doutrina do Pacto. É
maravilhoso estudar o livro de Isaias nesta perspectiva: As promessas que Deus
tem para os filhos. Deus está sempre reiterando sua promessa de salvação para
as gerações de seus filhos.
O capitulo 1 nos leva a
considerar quais serão os temas do livro. Deus começa a denunciar os pecados de
Israel e mostrar como seus pecados traziam consequências espirituais tão danosas.
Primeiro, o pecado nos distancia
do conhecimento de Deus. Deus está exortando seu povo à conversão.
Uma das primeiras coisas que ele
afirma: “O boi reconhece o seu dono, e o jumento o
dono da sua manjedoura do seu proprietário; mas Israel não tem conhecimento, o
meu povo não entende" (Is 1.3). O cãozinho conhece seu dono (ou o seu
escravo, se for em nossos dias), mas o homem não conhece seu criador.
O pecado
nos afasta da santidade de Deus. O povo é chamado de Sodoma e Gomorra (Is
1.10). “Governantes de Sodoma, ouçam a
palavra do Senhor! Vocês, povo de Gomorra, escutem a instrução de nosso Deus!”
(Is 1.10-NVI). Ao lermos o texto, podemos imediatamente ter a ideia de que Deus
estava falando aos antigos habitantes destas cidades que foram destruídas por
Deus por causa de seus pecados, mas na verdade, Deus está se dirigindo ao seu
povo, a quem ele chama de povo de Sodoma e Gomorra. É uma palavra dura!
O pecado estava
distanciando o povo de Deus, a tal ponto, de ser comparado com uma nação que
agrediu tanto a Deus que foi extinguida da face da terra.
Segundo, o pecado possui uma
dimensão comunitária. Não apenas indivíduos pecavam contra Deus, mas Israel enquanto
nação. “Ai desta nação pecaminosa, povo de iniquidade, raça de malignos, filhos
corruptores; abandonaram o Senhor, blasfemaram do Santo de Israel, voltaram
para trás” (Is 1.4)
Quase nunca pensamos em pecado na
sua dimensão sistêmica, coletiva, comunitária.
Maioria das vezes tratamos de pecado como algo individual.
Considere pecados de forma
coletiva.
ü A família age assim. São pecados,
atitudes, ou “fútil procedimento que
vossos pais vos legaram” (1 Pe 1.18).
ü Igreja. São atitudes pecaminosas
que se tornam marca de uma igreja: discórdia, dissensão, falta de santidade,
farisaísmo. Ninguém toca em algumas das vacas sagradas da comunidade.
ü Sociedade: Ana Arendt, filósofa
alemã faz duras críticas ao comportamento coletivo da Alemanha, que sustentou o
nazismo, fazendo vistas grossas ao genocídio que seus líderes cometiam. Podemos nos referir à nossa nação desta
forma: A idolatria dominante; a sensualidade cultuada e celebrada; a corrupção
como estilo de vida.
“Desde a planta do pé até à cabeça, não há nele coisa sã, senão feridas,
contusões e chagas inflamadas, umas e outras não espremidas, nem atadas, nem
amolecidas com óleo” (Is 1.6). Pecados
estruturais, atingindo classes sociais diferentes.
Terceiro, Deus mostra a dimensão
ecológica do pecado – É estranho pensar sobre isto, mas Deus leva o povo a refletir sobre as consequência do pecado
sobre a natureza.
“A terra de vocês está devastada, suas cidades
foram destruídas a fogo; os seus campos estão sendo tomados por estrangeiros,
diante de vocês, e devastados como a ruína que os estrangeiros costumam causar” (Is
1.7). A terra, os campos, estavam sofrendo o impacto espiritual do povo. A
natureza sofrendo.
O Profeta
Jeremias também demonstra como o pecado afeta diretamente a natureza:
“A palavra do SENHOR, que veio a Jeremias, a
respeito da grande seca.
Anda chorando Judá, e as suas portas estão enfraquecidas; andam de luto até ao chão, e o clamor de Jerusalém vai subindo. E os seus mais ilustres enviam os seus pequenos a buscar água; vão às cisternas, e não acham água; voltam com os seus cântaros vazios; envergonham-se e confundem-se, e cobrem as suas cabeças. Por causa da terra que se fendeu, porque não há chuva sobre a terra, os lavradores se envergonham e cobrem as suas cabeças. Porque até as cervas no campo têm as suas crias, e abandonam seus filhos, porquanto não há erva. E os jumentos monteses se põem nos lugares altos, sorvem o vento como os chacais; desfalecem os seus olhos, porquanto não há erva. Posto que as nossas maldades testificam contra nós, ó Senhor, age por amor do teu nome; porque as nossas rebeldias se multiplicaram; contra ti pecamos” (Jr 14.1-7).
Anda chorando Judá, e as suas portas estão enfraquecidas; andam de luto até ao chão, e o clamor de Jerusalém vai subindo. E os seus mais ilustres enviam os seus pequenos a buscar água; vão às cisternas, e não acham água; voltam com os seus cântaros vazios; envergonham-se e confundem-se, e cobrem as suas cabeças. Por causa da terra que se fendeu, porque não há chuva sobre a terra, os lavradores se envergonham e cobrem as suas cabeças. Porque até as cervas no campo têm as suas crias, e abandonam seus filhos, porquanto não há erva. E os jumentos monteses se põem nos lugares altos, sorvem o vento como os chacais; desfalecem os seus olhos, porquanto não há erva. Posto que as nossas maldades testificam contra nós, ó Senhor, age por amor do teu nome; porque as nossas rebeldias se multiplicaram; contra ti pecamos” (Jr 14.1-7).
O vs 7 mostra como a relação pecado & natureza estão interligados: “Posto que”.
A causa da situação de caos na natureza
está intimamente ligado ao pecado daquela nação. A queda trouxe vários
desequilíbrios na natureza: “E ao homem declarou: "Visto que você
deu ouvidos à sua mulher e comeu do fruto da árvore da qual eu lhe ordenara que
não comesse, maldita é a terra por sua causa; com sofrimento você se alimentará
dela todos os dias da sua vida. Ela lhe dará espinhos e ervas daninhas, e você terá
que alimentar-se das plantas do campo. Com
o suor do seu rosto você comerá o seu pão, até que volte à terra, visto que
dela foi tirado; porque você é pó e ao pó voltará" (Gn 3.17-19). A espiritualidade do
povo afetava a natureza.
John Stott
afirma que precisamos ter uma conceito mais abrangente de pecado”, não apenas
olhar para o pecado como algo individual, mas como algo coletivo e que impacta
a natureza. Ao mesmo tempo, Stott nos desafia a ter também, um conceito mais
abrangente da redenção. A obra de Cristo impacta não apenas nossa vida
individualmente, mas atinge a família, a sociedade e a ecologia.
Quarto, o
pecado produz uma espiritualidade vazia –Deus
questiona a forma de vida de seu povo na sua presença.
"Para que me oferecem tantos sacrifícios?
", pergunta o Senhor. Para mim, chega de holocaustos de carneiros e da
gordura de novilhos gordos; não tenho nenhum prazer no sangue de novilhos, de
cordeiros e de bodes! Quando lhes pediu que viessem à minha presença, quem lhes pediu que
pusessem os pés em meus átrios? Parem de
trazer ofertas inúteis! O incenso de vocês é repugnante para mim. Luas novas,
sábados e reuniões! Não consigo suportar suas assembleias cheias de iniquidade.
Suas festas da lua nova e suas festas fixas, eu
as odeio. Tornaram-se um fardo para mim; não as suporto mais! Quando vocês estenderem as mãos em oração, esconderei
de vocês os meus olhos; mesmo que multipliquem as suas orações, não as
escutarei! As suas mãos estão cheias de sangue! Lavem-se! Limpem-se! Removam suas más obras para longe da minha vista!
Parem de fazer o mal, aprendam a fazer o
bem! Busquem a justiça, acabem com a opressão. Lutem pelos direitos do órfão,
defendam a causa da viúva” (Is 1.11-17).
Ele
demonstra como a espiritualidade daquele povo estava esvaziada em seus
corações, como sua adoração se tornara vazia. Os atos religiosos, instituídos
por Deus, passam a ser questionados pelo próprio Deus.
Quando a espiritualidade se torna vazia?
O texto
mostra dois aspectos centrais:
A. Quando a
religiosidade se torna ritualista, sem que o coração esteja presente. O povo
continuava a fazer os atos religiosos exigidos por Deus. Qual era o problema?
Leia novamente
o texto:
O problema estava na religiosidade
meramente externa.
Deus afirma que não podia mais suportar
iniquidade com ajuntamento solene. Deus questiona os sacrifícios, as ofertas, e
até mesmo as orações, porque estas não eram acompanhadas do coração. Muitas
orações estavam cheias de sangue.
O que Deus queria: Um culto integral,
que associasse teologia & ética; louvor e justiça; oferta e atos de
misericórdia.
Muitas vezes na Bíblia Deus adverte seu
povo por causa do culto esvaziado do coração: “
"Eu odeio e desprezo as suas festas
religiosas; não suporto as suas assembleias solenes. Mesmo que vocês me tragam
holocaustos e ofertas de cereal, isso não me agradará. Mesmo que me tragam as
melhores ofertas de comunhão, não darei a menor atenção a elas. Afastem de mim o som das suas canções e a música das
suas liras. Em vez disso, corra a retidão
como um rio, a justiça como um ribeiro perene! (Am
5.21-24-NVI).
O livro de Provérbios adverte: “O que desvia os ouvidos de ouvir a lei; até
a sua oração será abominável” (Pv 28.9).
Religiosidade sem o coração não
adianta. Portanto, ao adorar a Deus, venha por inteiro. No próprio livro de
Isaias leremos outro texto sobre este assunto: “O Senhor diz: Esse povo se
aproxima de mim com a boca e me honra com os lábios, mas o seu coração está
longe de mim. A adoração que me prestam só é feita de regras ensinadas por
homens” (Is 29.13), e que
posteriormente seria citado por Jesus: “Hipócritas!
Bem profetizou Isaías sobre vós, denunciando: ‘Este povo me honra com os
lábios, mas seu coração está longe de mim. Em vão me adoram; pois ensinam
doutrinas que não passam de regras criadas por homens’” (Mt 15.8).
B. Quando a ética se distancia do culto – Este é o tema central destes
versículos. O culto era ritualista porque a vida não era acompanhada por
inteiro. A teologia não estava ligada à ética; o louvor não estava ligado à
justiça; as ofertas e sacrifícios não eram integrados aos atos de misericórdia.
Culto com gestos espirituais
desacompanhado de uma vida de justiça e justiça torna-se afronta para Deus: “exercitar justiça e juízo é mais aceitável
ao Senhor do que sacrifícios” (Pv 21.3).
Existe todo um livro na Bíblia tratando
deste assunto, é o livro de Amós. O profeta traz a dura mensagem de Deus ao
povo. “E ainda que me ofereçais holocaustos, ofertas de alimentos,
não me agradarei delas; nem atentarei para as ofertas pacíficas de vossos
animais gordos. Afasta
de mim o estrépito dos teus cânticos; porque não ouvirei as melodias das tuas liras”(Am 5.22,23).
O que Deus
está constantemente pedindo ao povo é coerência no seu culto.
Precisamos
aprender a cultuar a Deus com uma ética santa. Num tempo de moral tão relativa,
tentar “enrolar” a Deus com culto, música e ofertas, sem trazermos um coração
quebrantado e uma vida santa, pode se tornar condenação contra nós mesmos.
Ética e
culto não podem estar dissociadas.
Conclusão:
O
impacto do pecado
Em síntese, quatro pontos foram aqui
levantados:
A. O pecado nos distancia do conhecimento
de Deus – vs. 3
B. O pecado tem impacto estrutural e
sistêmico – vs. 4-6
C. O pecado atinge a natureza de forma
direta – vs. 7
D. O pecado gera uma espiritualidade vazia
– vs 1.10-17
Mas precisamos chegar aos vs 1.18-19.
Estes versículos nos apontam para a
essência do evangelho: “Vinde, pois, e arrazoemos, diz o Senhor.
"Embora os seus pecados sejam vermelhos como escarlate, eles se tornarão
brancos como a neve; embora sejam rubros como púrpura, como a lã se tornarão. Se vocês estiverem
dispostos a obedecer, comerão os melhores frutos desta terra” (Is 1.18-19).
Até estes
versículos, Deus está falando duramente ao seu povo, até que então, ele convida
o seu povo para refletir com ele, e esta mensagem aqui é surpreendente: “Vinde, pois, e arrazoemos”.
“Arrazoar”
literalmente é trazer à razão. Deus convida o povo para refletir com ele. O que
esperamos aqui é que Deus fale das consequências da atitude de infidelidade
deste povo, mas o que acontece aqui nos surpreende. Deus chama o povo para que
o povo experimente o seu perdão e sua graça.
Deus
afirma que se se voltarem para ele, “Ainda
que seus pecados sejam como a escarlata, eles se tornaram brancos como a neve”.
Deus está afirmando que ele pode mudar a situação do seu povo de forma radical,
quando o seu povo se voltar para ele.
Deus não
está chamando o seu povo para o julgamento, mas para o arrependimento, para que
experimentem “o melhor desta terra”. Deus
deseja ver mudança de atitude na vida de seu povo. Transformação de caráter.
Deus está oferecendo seu perdão.
Certa vez
fui visitar uma mulher que estava com vários distúrbios psiquiátricos. Ela,
literalmente, tinha saído da internação de uma clínica depois de um surto
psiquiátrico. Sua alma estava carregada de confusão e culpa. Ela precisava
falar de sua vida, e queria conversar com um pastor.
Depois de
ouvir a explanação de sua confusa vida, ela me confidenciou que havia traído
seu marido e disto havia resultado uma gravidez indesejada. Para restaurar seu
relacionamento, ela decidiu fazer um aborto. “A Bíblia afirma que “um abismo chama outro abismo ao fragor de suas das
suas cachoeiras” (Sl 42.7). Esta é a dinâmica do pecado: para resolver um
problema, se não optarmos pelo caminho do arrependimento e contrição, vamos
tentando acobertar e criamos outros problemas. Uma mentira para encobrir outra,
e assim passamos a viver numa vida de engano sobre engano.
Depois de
ouvir a sua dura narrativa, olhei para fora. Era época de inverno e naquele dia
estava caindo uma linda neve do lado de fora de casa, tudo estava lindo e a
neve já tinha coberto todo o campo e a rua. A brancura da neve é um espetáculo.
Então eu me lembrei deste texto e disse àquela amargurada mulher: “Deus está te
chamando para algo maravilhoso. Ele quer te chamar à razão. Veja o que este
texto diz: ainda que vossos pecados estejam como a escarlata, eles se tornarão brancos
com a neve. Olhe para aquela neve caindo lá fora. É assim que Deus quer que
você entenda como o sangue de Cristo pode purificar sua vida”.
O pecado machuca, fere, destrói,
desestrutura, mas Deus está chamando seu povo a uma vida de transformação e
mudança. Deus está nos convidando para experimentarmos os efeitos do sacrifício
de Cristo sobre a nossa história.
O sangue de Cristo, nos purifica de
todo pecado, purifica de má consciência, nos transforma. Assim é a obra de Cristo.
Quando lemos a Bíblia, vemos que não há chance para nossa vida, só nos resta a condenação.
Erramos, ferimos a Deus, mas quando olhamos para a cruz de Cristo, encontramos
sua misericórdia, seu braço estendido, a dívida paga pelo seu sangue.
Precisamos olhar para nosso coração fragmentado,
nossa adoração dividida, nossa vida de injustiça, e nos arrependermos, mas isto
é apenas um lado da moeda. Precisamos continuar colocando nossa vida à luz do
evangelho. Olhe para sua vida: frustração, cansaço, miséria. Mas olhe para Cristo.
Ali encontramos perdão, restauração, graça e misericórdia.
Vinde, pois, e arrazoemos, diz o
Senhor, ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se
tornaram brancos como a neve”. Aleluia!