domingo, 14 de fevereiro de 2016

Mt 24.45-51 O Deus desaparecido



Uma das questões filosóficas centrais da humanidade é sobre um Deus que parece distante, assim como é comum o sentimento de ser esquecido de Deus. Desde Camus, Sartre a Beckett, vemos sempre este pensamento de que o Senhor da terra abandonou este universo.

Esta preocupação também pode ser encontrada pelos personagens bíblicos. Existem vários textos no livro dos Salmos, repleto de exclamações e lamentos neste sentido:

Salmo 42.3,10: “As minhas lágrimas tem sido o meu alimento dia e noite, enquanto me dizem continuamente: O teu Deus, onde está? (...) digo a Deus, minha rocha: Porque te olvidaste de mim?”. As pessoas viam o sofrimento do salmista e diziam: “Você não crê em Deus? Onde ele está?”

Sl 44.23,24: “Desperta! Por que dormes Senhor? Desperta! Não nos rejeites para sempre! Por que escondes a face e te esqueces de nossa miséria e da nossa opressão?”

Sl 60.10: “Não nos rejeitastes, ó Deus? Tu não sais, ó Deus, com os nossos exércitos”.

Sl 77.7: “Rejeita o Senhor para sempre? Acaso, não torna a ser propício? Cessou perpetuamente a sua graça? Caducou a sua promessa para todas as gerações? Esqueceu-se Deus de ser benigno? Ou, na sua ira, terá ele reprimido as suas misericórdias? Então disse eu: isto é a minha aflição; mudou-se a destra do Altíssimo”.

Até mesmo Jesus, diante de sua agonizante experiência de morte, clama ao Senhor: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparastes?”. Há, portanto, uma grande quantidade de pessoas em diferentes situações fazendo este desabafo diante de Deus, sem ter certeza de que Deus as ouve.

Ao lermos as últimas parábolas de Jesus no Evangelho de Mateus, no conhecido “sermão escatológico” observamos assustados e estarrecidos que o próprio Jesus fala deste tema, e que, em todas as parábolas, este tema está presente como pano de fundo: Deus desapareceu.

Na parábola do bom e do mau servo (Mt 24.45-51) vemos um empresário deixando o trabalho na mão dos funcionários, e as coisas pareciam tão abandonadas que eles acharam que eram donos e começaram a usar os recursos de forma equivocada. Os servos desobedientes descuidadamente começaram a gastar o que não lhes pertencia e a viver de forma dissoluta e despreocupada, comendo e bebendo com ébrios, mas Jesus adverte: “O Senhor virá em dia que não o espera e em hora que não sabe” (Mt 24.50).

Na segunda parábola, das dez virgens, os noivos chegam tão tarde, demoram tanto, que o azeite acaba e as noivas dormem: “E, tardando o noivo, foram todas tomadas de sono e adormeceram” (Mt 25.5). É uma mensagem clara de Jesus de que é possível perdermos a referência de Deus porque o julgamos desaparecido.

Na parábola dos talentos, a terceira, um fazendeiro faz uma longa viagem, e depois de distribuir os talentos, segundo a capacidade de cada um, partiu, deixando os empregados cuidando de sua lavoura, e retorna, “depois de muito tempo, para ajustar as contas com eles” (Mt 25.19).

Em todas estas narrativas contadas por Jesus, o Senhor desaparece, deixando os servos livres para agirem. Ilustram situações em que as pessoas tem que lidar com este Deus que “partiu e desapareceu”, e parece não ter deixado orientação e direção. Assim tem sido a experiência moderna daqueles que deixaram de crer num Deus soberano da terra e passaram a estabelecer suas próprias regras, esquecendo-se de que “o Deus desaparecido” voltará. A ética sem referência, pois, “se não existe Deus, tudo é permitido” (Dostoievski).

“Na verdade, as histórias de Jesus anteciparam a questão central da era atual: ´onde está Deus agora? ´ A resposta de hoje, de pessoas como Nietzsche, Freud, Marx, Camus e Beckett é que o Senhor das terras nos abandonou” (Yancey).

Destes textos, podemos extrair algumas lições:
1.   Tome cuidado com este falso sentimento de um Deus ausente: ele voltará!

Em todas as parábolas, Jesus deixa claro de que, depois de muito tempo, o “Deus desaparecido”, voltará. Esta também foi a mensagem dos anjos, na ascensão de Jesus, enquanto os discípulos assustados via Jesus sendo elevado aos céus: “Varões galileus, porque estás olhando para as alturas? Este Jesus que dentre vos foi assunto ao céu, virá do modo como o viste subir” (At 1.11).
Deus não perdeu o “timing”, embora o julguemos demorado. Portanto, não deixe o seu azeite acabar “Mt 25.8); não crie éticas achando que o Senhor não volta (Mt 24.48-49), não esconda seus talentos (Mt 25.19), porque este Jesus voltará! (At 1.11).

2.   Na parábola das ovelhas e bodes, que descreve o grande julgamento (Mt 25.31-46), somos surpreendidos mais uma vez.

Jesus fala do Deus que desaparece, só retornando para o dia do acerto de contas. Ele novamente se refere a este período intermediário, quando Deus parece ausente. No entanto, na visão de Jesus, Deus não estava oculto, mas assumiu o disfarce mais imprevisível e chocante na pele daqueles que sofrem e são desprezados.

“Quanto te vimos com fome, ou com sede, ou estrangeiro, ou nu, ou enfermo, ou preso, e não te servimos? E Jesus nos surpreende ao dizer: “Na verdade, todas as vezes que o deixastes de fazer a um destes pequeninos, foi a mim que o deixastes de fazer”. Com isto aprendemos que “se não podemos detectar a presença de Deus no mundo, pode ser que o tenhamos procurado nos lugares errados” (Yancey).

Deus não desapareceu, mas apenas assumiu uma nova forma de se manifestar.
Boa parte das indagações filosóficas e teológicas seriam dissipadas, se, ao invés de fazermos um retorno ao nosso interior, na introspecção mórbida ou depressão egóica, fizéssemos um movimento para fora, em direção ao outro, ao irmão, e ao que sofre. Excesso de auto análise, de reflexão auto centrada e vitimismo, adoece ainda mais, porque entra-se em contato com o cinismo, incredulidade e ceticismo, e o ciclo do desespero silencioso da alma.

Certamente não encontraremos Deus dentro do coração vazio e sem esperança, mas facilmente enxergaremos o “Deus desaparecido”, na face oculta do que sofre, no amor e serviço ao ser humano, que foi atropelado pelas circunstâncias adversas da vida. Ali contemplaremos, assustados, o rosto deste Deus, que se oculta no meio desta caótica situação de dor e angústia humana.

Um milionário rico resolveu visitar Madre Tereza de Calcutá e lhe indagou como funcionava a espiritualidade dela, e ela respondeu: “Somos uma ordem contemplativa. Primeiro meditamos, depois saímos e procuramos Deus disfarçado no pobre”.

3.   Todos os homens de Deus, como lemos no Sl 42, 44, 60 e 77 sabiam que o desaparecimento de Deus, era muito mais uma questão de sentimento, que realidade.

O sentimento da ausência de Deus era real, mas o fato é que ele sabia que sua alma poderia colocar a âncora segura em Deus.

Em outro salmo ele ainda é mais enfático. Depois de vários questionamentos afirma: “Isto é a minha aflição” (Sl 77.10). Por sua alma estar perturbada, os sentimentos se tornaram confusos. Não é assim que fazemos no meio da angustia e da dor? Fazemos leituras erradas, colocamos lentes distorcidas, interpretamos erroneamente os fatos.

A verdade é que Deus sempre se revelou na história: “Contudo, não se deixou ficar sem testemunho de si mesmo, dando-vos do céu chuvas e estacoes frutíferas, enchendo o vosso coração de fartura de alegria” (At 14.17).

Que verdade maravilhosa. O Deus desaparecido se revela no rosto do que sofre, se revela na natureza criada (Rm 1.19-21), e por meio do seu cuidado como lemos em Atos.

Por isto podemos declarar a grande verdade do Sl 27.13-14:

Eu sei que virei a bondade do Senhor na terra dos viventes. Espera no Senhor e tem bom ânimo. Espera, pois no Senhor!”

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Ex 33.12-16 Sem Deus não dá




Nos idos de 1970, o Sr. José Alves se converteu na cidade de Governador Valadares. Ele era maquinista responsável por grandes locomotivas que carregavam ferro nas ferrovias de Minas Gerais em direção ao porto de Vitória. Logo após sua conversão, muito entusiasmado com o Evangelho, pediu ao pastor da igreja se poderia pregar. Meio constrangido, o pastor permitiu que ele falasse numa das reuniões que aconteceria na casa de uma irmã. Ao começar a pregação, usou como exemplo a horta de sua casa, comparando-a à vida cristã que precisa ser regada e cultivada. Em seguida, começou a comparar a vida cristã a um vagão que precisa andar no trilho... assim meio assustado, não sabendo mais o que dizer, parou perplexo e disse para o pastor: “vazio eu não prego não!”.

Ele achava que bastava chegar na frente e começar a falar, e que tudo aconteceria, e agora percebia que era necessário se preparar para comunicar o Evangelho. Sua declaração, contudo, revela uma profunda verdade teológica. Deus precisa estar de fato presente.

Neste texto lemos o incrível drama da relação de Moisés com Deus.

Em Ex 32, Moisés sobe ao monte para se encontrar com Deus, e depois de 40 dias retorna com as tábuas da lei, mas para sua perplexidade, este tempo fora suficiente para que o povo se desviasse completamente do Senhor que os livrara do Egito e seguissem um bezerro de ouro, recém fabricado na Indústria Arão & Cia, S.A.

O texto revela a lógica da idolatria: fazer um deus à imagem e semelhança do homem. Assim a humanidade faz até hoje. Quer controlar o sagrado. Este é o fundamento da feitiçaria, ter acesso a fórmulas ocultas que permitam ao homem controlar divindades, o sobrenatural, poderes e entidades. Na idolatria, é a mesma coisa: Deus fez o homem à sua imagem e semelhança, e agora o homem deseja fazer deuses à sua imagem.

Assim ele supõe ter o controle. Ele manipula. Ele domina.
Falsa pressuposição!

O resultado disto é descrito no livro de Êxodo: O povo se perdeu. A ética do povo ficou desorientada. Afinal, os homens se parecem com seus deuses. Cosmovisão antecede ética. O que cremos determina e orienta o que fazemos. O homem é o que ele crê. Nossos deuses nos levam a comportamentos parecidos com eles. O povo de distanciou de Deus.

De repente, o impensável acontece: Deus desiste do povo e afirma a Moisés que não seguirá mais entre eles (Ex 32.34; 33.2-3). Deus se recusa a andar com seu povo.

Deus faz a seguinte proposta para Moisés: Eu vou te abençoar, mas não vou contigo. Vou enviar meu anjo e minhas hostes irão contigo, mas eu não irei (Ex 33.2), No entanto, Moises se recusa veementemente.

O que Moises poderia querer?
Deus estaria com o povo através de seus anjos, seus poderes, eles continuariam ainda vitoriosos. Deus promete isto. Mas Moises afirma: “Se sua presença não vai conosco, não nos faca sair deste lugar”.

Por que ele insiste na presença de Deus?

1.     Não bastam as bênçãos do Senhor, precisamos do Senhor das bênçãos. Este é um erro muito comum na teologia retributiva, tão amplamente apregoada em nossos dias. Queremos as bênçãos. Moises diz: Bênçãos não são bastante.

Podemos nos entreter com as coisas boas que Deus dá, esquecendo-nos de que precisamos dele, acima de tudo.

Quando Jesus convidou os 12 apóstolos, depois de passar uma noite em oração para fazer esta escolha, há uma expressão curiosa no texto: “E designou doze para estarem com ele e para os enviar a pregar” (Mc 3.14). A ideia, antes de tudo, não era um chamado para serem missionários, para fazerem a obra, mas para estarem com ele. Jesus queria os discípulos para andarem com ele, para relacionamentos significativos.

É muito fácil fazer a obra de Deus, e até mesmo sermos abençoados na obra de Deus, mas sem sua presença, nada faz sentido. Moises sabe disto e não negocia este grande princípio. Moises sabia quem onde está o Senhor, as bênçãos naturalmente estarão, mas mesmo que as bênçãos aparentemente não venham, estar com Deus é a maior de todas as bênçãos.

A grande experiência da vida não é fazermos para Deus, nem recebermos de Deus, mas sermos de Deus. “Alegrai-vos, não porque os demônios se vos submetem, mas porque os vossos nomes estão escritos no livro da vida”(Lc 10.12). O que conta não é o extenso currículo de coisas realizadas e performances magistrais, mas a vida com Deus.

Deus é fonte inesgotável de graça e benção, ele é a fonte dos recursos, é o Jeová-Jiré, mas ele busca pessoas que o “adorem em espirito em verdade”, isto é, que vivam relacionamentos com ele, sem cosméticos. Na Nova aliança, os cosméticos e véus não são mais efetivos.

Por que Deus criou o homem à sua imagem e semelhança? Para relacionamento. Por que Deus exige culto? Ritual? Programa? agenda de domingo, ou do sábado? não! Nada do que lhe podemos ofertar, nossos louvores, recursos, ofertas, cânticos, podem acrescentar santidade e glória àquilo que Ele é. Existe algo que eu possa lhe oferecer? Nada, a não ser, relacionamento significativo de amor.

Minha oferta é resposta de gratidão e louvor. Por isto, quando as pessoas no Antigo Testamento tentavam subornar Deus trazendo suas ofertas sem seus corações, ou trazendo ofertas pífias e sem alegria, deixando de adorá-lo com seus bens ele lhes pergunta: “Com tais ofertas, aceitaria eu a vossa pessoa?” (Mal 1.6). Será que Deus estava preocupado com o valor? Não! O que ele queria é que o coração das pessoas viesse junto na adoração, e o culto que prestavam, no entanto, era superficial.

2.     A única forma de saber que recebi graça de Deus é sua companhia, não as suas bênçãos. “Agora, pois, se achei graça aos teus olhos, rogo-te que me faças saber neste momento o teu caminho, para que eu te conheça e ache graça aos teus olhos; e considera que esta nação é teu povo” (Ex 33.13)

O que Moisés percebe é que bênçãos de Deus podem ser resultado da sua bondade e da graça comum, afinal, a Bíblia afirma que “Deus faz chover sobre justos e injustos”. Graça especial, entretanto, é fruto daqueles que receberam a salvação e são chamados a caminhar num relacionamento de amor com Deus.

Moisés dá uma explicação maravilhosa para que Deus ande com eles: “rogo-te que me faças saber neste momento o teu caminho, para que eu te conheça”. Ele queria conhecer a Deus, buscava intimidade. Não se aproximava de Deus pensando no que ele poderia lhe dar, mas imaginando quão maravilhoso seria caminhar com ele e conhecer sua santidade, poder e graça.

Jó viu isto de perto.
Ele era um homem abençoado por Deus. Família bonita, cercado de bens e honra, mas quando tudo ruiu, ele conheceu uma dimensão sobrenatural de Deus, por isto declara: “ Eu conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te veem”. Ele estava conhecendo o lado oculto da divindade, o mistério que interpenetra na noite escura do seu coração entristecido.

Gente obcecada por benção perde a benção da presença de Deus e se contenta com os benefícios recebidos dele. Nos dias de Jesus, multidões passaram a segui-lo, não por causa da palavra de salvação, nem pelos mistérios que ora lhes eram anunciados, mas por causa do pão. Queriam fazê-lo rei por causa da comida.

Moises entende que a coisa mais importante era o próprio Deus. O argumento de Moises: “Pois como se há de saber que achamos graça aos teus olhos, eu e teu povo? Não é porventura, em andares conosco, de maneira que somos, eu e teu povo, separados de todos os povos da terra?” (Ex 33.16). A benção de ser povo de Deus não é receber benção de Deus, é ser especial para Deus. Muitos servos de Deus na história não tinham nada, foram espoliados de seus bens, perderam sua vida por crerem em Cristo, foram serrados ao meio, perderam status e posição, mas tinham algo maravilhoso: o próprio Deu que andava com eles!

3.     A presença de Deus traz descanso – “Respondeu-lhe: A minha presença irá contigo, e eu te darei descanso” (Ex 32.14).

Alguns anos atrás o livro “O Segredo”, de Bob Procton, se tornou um fenômeno editorial, tanto no Brasil como em outros países. Para Procton, o segredo era “A Lei da Atração”, uma espécie de confissão positiva secular, que dizia o óbvio: “Pensamentos ruins atraem coisas ruins, pensamentos positivos atraem alegria e vida”. Para Moisés, o segredo não era outro senão a presença de Deus. Por isto insistiu com Deus: “Então lhe disse Moisés: Se a tua presença não vai comigo, não nos faca subir deste lugar” (Ex 33.15). Em outras palavras, Sem Deus não dá!

O que precisamos mais se Deus está conosco? “Mesmo que eu ande pelo vale do sombra da morte, a tua vara e teu cajado me consolam” (Sl 23.4). “Deus é meu refúgio e fortaleza, portanto não temeremos ainda que as águas tumultuem e espumejem, e na sua fúria, os montes se estremeçam” (Sl 46.1,2). Não é isto que afirma o salmista?

Conclusão: Sem Deus é que não dá!

A.     Auto ajuda não ajuda muito quando não temos ajuda do Alto

B.     Bênçãos materiais são acessíveis àqueles que não possuem bênçãos espirituais. Então, não é nada incomum ser abençoado e prospero, mesmo não sendo de Deus. O maravilhoso, porém, é ter o Deus das bênçãos.

C.     Nada pode ser substituto da presença de Deus: Nem anjos, nem bênçãos, nem vitórias sobre os inimigos. O que não dá mesmo é viver sem Deus, afinal, sem Deus não dá!



sábado, 6 de fevereiro de 2016

1 Ts 1.1-10 Igrejas que fazem diferença


Introdução:

À medida que envelheço, tenho estado mais convencido de que precisamos de pastores modelos e igrejas modelos. As novas gerações e comunidades precisam de referências aprovadas. Não raramente ouço jovens dizendo que estão observando meu ministério e confesso que me sinto assustado, porque isto é uma enorme responsabilidade e desafio.

Paulo se refere à igreja de Tessalônica como uma igreja “modelo para todos os crentes da Macedônia e da Acaia” (1 Ts 1.7). O que havia nesta igreja que fazia diferença e inspirava a tantas outras comunidades?

Primeiro, a fé operosa – (1 Ts 1.3) Não uma fé abstrata, mas fé concreta. As pessoas de fato não se impressionam com nosso discurso, mas são atraídas por atitudes. isto fez de Tessalônica uma igreja modelo. Sua fé transformava-se em ato; o que criam, praticavam. Fé operosa produz frutos, manifesta Deus na cidade, gera desejo em outros de conhecer a mensagem que pregam.

Segundo, um amor abnegado - (1 Ts 1.3). Abnegação é um termo meio negativo e pejorativo na minha mente. Não sei se isto se dá porque há uma pessoa em minha família, que nunca parece querer nada, não ter vontade ou desejo algum, e todos dizem que ela é “abnegada”. Mas na verdade, amor abnegado tem realmente um pouco de tudo isto. Ele abre mão de direitos e privilégios para servir outros, não faz isto constrangida, mas voluntariamente. Assim era a igreja de Tessalônica.

Terceiro, firmeza da esperança - (1 Ts 1.3). Não uma esperança débil, frágil, pusilânime, permeada de dúvidas e incertezas. pelo contrário, suas convicções eram sólidas Não eram dúbias nem inconstante quanto ao que criam. Numa época de tanto relativismo moral e espiritual, de tantos paradoxos e desconstrução, é fácil desenvolvermos uma fé volátil e liquida, pós moderna. isto leva as pessoas a perderem a confiança rapidamente em Deus, quando as coisas não estão dando certas.

Quarto, identidade clara - (1 Ts 1.4). “Reconhecendo, irmãos, amados de Deus, a vossa eleição”. Uma das coisas mais fantásticas da vida é identidade e relacionamento. Esta igreja sabia que ele era escolhida por Deus, por isto sabia que era tratada de forma especial e amada – era um relacionamento firmado no amor. Eleição para muitos é um tema pesado, destinado àqueles que se aprofundam nos estudos teológicos, mas se lermos cuidadosamente nas Escrituras veremos que se trata de uma das grandes razões de gratidão. Saber que somos escolhidos de Deus, nos dá senso de pertencimento, identidade e amor. Um cântico evangélico brasileiro diz assim: “Nada como ser um redimido, nada como ser filho de Deus, e bem cedinho de manhã, saber que as misericórdias do Senhor, se renovaram”.

Quinta, uma igreja firmada na Palavra autenticada pelo Espirito – “Porque o nosso evangelho não chegou até vós, tão somente em palavra, mas, sobretudo, em poder, no Espirito Santo, e em plena convicção”. (1 Ts 1.5).Este é sempre um binômio positivo: Palavra e Poder. “Errais, não conhecendo as Escrituras, nem o poder de Deus” (Lc 22.26). Esta igreja vivenciava a palavra de forma intensa, em plena convicção, não tinha dúvidas sobre a Palavra de Deus, porque via a palavra de forma prática na própria vida. A mensagem chegou com poder, e por isto não se distanciava da vida destes irmãos.

Sexto, Alegria ultracircunstancial – Tendo recebido a palavra, posto que em meio de muita tribulação, com alegria do Espirito Santo” - (1 Ts 1.6). As circunstâncias não era favoráveis, os dias eram tensos, marcados por tribulação e escassez, mas esta igreja estava experimentando no meio de tudo isto, a alegria do Espirito Santo. Havia muita oposição política e satânica, os crentes estavam acossados e instigados por causa de suas convicções, em meio a “muita tribulação”, mas algo surpreendente acontecia em seus corações. A alegria deles estava relacionada à palavra, à identidade de amor que tinham com Deus, à manifestação do Espirito Santo no seu meio. Você tem experimentado gozo e regojizo em sua vida?

Sétimo, ruptura com deuses falsos – “...e como, deixando os ídolos, vos convertestes a Deus” - (1 Ts 1.9). A primeira e mais dramática conversão espiritual é dos deuses falsos para o Deus verdadeiro. Aquele povo havia rompido com tradições culturais, familiares, religiosas, que eram contra o Deus verdadeiro. Eles rejeitaram os seus ídolos, em quem haviam anteriormente colocado toda sua confiança em tempos pregressos. Eventualmente esta ruptura produz grandes estardalhaços: “...que repercussão teve o nosso ingresso no vosso meio”. A atitude destes irmãos em seguir o Deus verdadeiro, causou impacto e se tornou assunto nas rodas de conversa. Não foi algo fácil. Quando Gideão decidiu romper com os ídolos de sua casa, a Bíblia diz que seu pai ficou contra ele (embora o tivesse defendido da morte), e toda sua aldeia quis matá-lo.

Conclusão

Estas são algumas características desta igreja que se tornou referência e modelo naqueles dias.

Se você me perguntasse hoje sobre alguns dos anseios de minha alma eu diria que gostaria de pastorear uma igreja que fosse refúgio e descanso para as pessoas cansadas, trouxesse graça e esperança ao coração das pessoas, e que inspirasse esta geração. Eu gostaria de ser pastor de uma igreja na qual pudessem olhar para ela e desejassem imitar as coisas boas e saudáveis que ela produz, e que, inspirasse também as próximas gerações, a cidade e atraísse outras pessoas com uma direção profunda, sábia e abençoadora em direção a Deus.

Algum tempo atrás,  veio à nossa igreja um casal com dois filhos. Eles chegaram desconfiados e arredios. Ele havia sido pastor de uma das igrejas mais fundamentalistas deste país, e sofreram muito e apesar de serem crentes, não tinham vontade de se envolver com nenhuma outra igreja, mas com o passar do tempo, viram que sua atitude não era correta. É assim o coração dos crentes... Deus os fez para viver em comunidade, já que não existe corpo sem junção de membros.  Eles procuraram o dono de uma livraria cristã da cidade, querendo saber de uma igreja na qual ele recomendaria para adorar a Deus e trazer seus filhos. Aquele rapaz, que não é de nossa igreja, lhe disse que nos recomendaria. Ele veio, se envolveu, participou de nossa comunidade até se transferir, em plena comunhão, de nossa cidade para São Paulo.

Nossa igreja chegou a 1.011 membros em 2015, contando as congregações e membros menores. Mais do que um numero simbólico e marcante, meu desejo é que esta igreja se torne referência de graça, do evangelho, de saúde e santidade para muitas outras igrejas e pastores jovens, que eles pudessem olhar para nosso jeito de ser e fazer ministério e dissessem: “Esta igreja é uma boa referência para nós”.

Assim foi a igreja de Tessalônica.


Será que receberemos graça de Deus para vivermos assim?

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Rm 6.15-23 A colheita do pecado



Introdução:

Estamos nos dias de carnaval, uma festa que, como o próprio nome sugere, é dedicada à carne. Afinal, não é assim que sugerem as músicas? “Não existe pecado do lado de baixo do Equador. Vamos fazer um pecado rasgado, suado a todo vapor”, e Noite dos mascarados: “Mas é carnaval, não me diga mais quem é você. Amanhã, tudo volta ao normal, deixe a festa acabar, deixe o barco correr, deixe o dia raiar que hoje eu sou, da manheira que você me quer. O que você pedir, eu lhe dou, seja você quem for, seja o que Deus quiser. Seja você quem for, seja o que Deus quiser”, ambas de Chico Buarque. As letras, explicitamente revelam o que há nos motivos do carnaval. Nada de restrição, nada de ética, nada de compromisso. Vamos para gandaia, seja o que Deus quiser.

Qual é o resultado, qual a colheita que a humanidade recebe com a satisfação da carne, e por agir de acordo com os impulsos?

Neste texto, Paulo afirma que, sem Jesus, o homem continuamente entrega seu corpo para os impulsos da carne. O termo “oferecer” aparece 3 x (Rm 6.16,19), dando a ideia de uma atitude espontânea e deliberada. Podemos oferecer os membros do corpo ao pecado, como instrumento da iniquidade; ou à Deus, como instrumento da justiça (Rm 6.13).

Paulo faz uma pergunta provocativa: “Naquele tempo, que resultado colhestes?” (Rm 6.21). Quais são os resultados de viver a vida para atender paixões carnais? Quais os resultados do pecado?

1.     Pecado produz vergonha – (Rm 6.21). Ele afirma que o resultado era “as coisas de que agora vos envergonhais”. A plantação do pecado, traz desonra e vergonha.

Já vi muita gente envergonhada com o pecado. Eventualmente tenho que lembrar tais pessoas do poder restaurador da graça, porque correm o risco de viverem para sempre debaixo da condenação do diabo. Comportamentos escusos, ao serem revelados, trazem desonra e consternação, tem o poder de gerar um mecanismo retroativo de culpa e acusação. Pecados ocultos e mantidos em segredo, mesmo quando não trazidos à tona, energizam Satanás, nosso acusador, transformando a vida num ciclo de dor e tristeza.

Quanta humilhação e vergonha o pecado gera.

2.     Pecado gera dor – É muito comum pessoas adoecerem com a vida de pecado. Davi afirma que “enquanto calou seus pecados, envelheceram seus ossos” (Sl 32.3). A descrição que Davi faz do peso que sentiu pelo seu pecado é parecida com a descrição de um inferno.

Veja o Sl 38:3-8: “Não há parte as na minha carne, por causa da tua indignação; não há saúde nos meus ossos, por causa do meu pecado. Pois já se elevam acima de minha cabeças as minhas iniquidades; como fardos pesados, excedem as minhas forças. Tornam-se infectas e purulentas as minhas chagas, por causa da minha loucura. Sinto-me encurvado e sobremodo abatido, ando de luto o dia todo. Ardem-me os lombos e não há parte sã na minha carne”.

Não é esta uma declaração de grande dor? Existe algum pecado na sua vida que está causando tristeza? Este texto nos convida a aproximarmos de Cristo para experimentar o perdão e a liberdade que só ele pode oferecer.

3.     Pecado gera escravidão – Em Rm 6.13-14 Paulo exorta os irmãos a não oferecerem os membros de seu corpo ao pecado, como instrumentos da iniquidade, para que o pecado não dominasse suas vidas. “Porque o pecado não terá domínio sobre vós”.
Quando vivemos a vida para satisfação da carne, o resultado é que, aquilo que fazemos por curiosidade, diversão e prazer, passa a dominar e escravizar. Uma pessoa começa fumando uma “maconhinha” que julga inofensiva, quando menos espera, lá está precisando de doses mais fortes, sustentando a indústria do crime comprando droga na mão de traficantes, abrindo-se para experimentar outro tipo de droga, e incapaz de romper com aquilo que julgava inofensivo.

O pecado domina, enlaça e aprisiona o ser humano de tal forma que ele não consegue se desvencilhar de suas tramas. Pedro fala a Simão, o mágico, que ele estava preso por “laços de iniquidade”. Ele era um homem espiritualizado, gostava de ocultismo, magia, manifestações sobrenaturais, e com o passar do tempo, aquilo se tornou uma obsessão, e mesmo quando veio para a igreja e se batizou, estes laços estavam aprisionando sua vida, e ele não tinha liberdade para experimentar a benção de viver em Cristo.

Há alguma coisa enlaçando sua vida? Impedindo-o de continuar? De ser livre?

4.     Pecado gera condenação e morte – A verdade é que, apesar da inflação, o salário do pecado continua o mesmo: “O salário do pecado é a morte!”

Tenho defendido uma tese polêmica e controvertida, de que o pecado mata mais cedo. Perdi três amigos de minha idade, cujas mortes estavam relacionados a escolhas morais que fizeram, dentre elas, droga, promiscuidade e abandono de Deus. A morte e a tragédia, certamente atingem a todos, indistintamente, mas existem pessoas que se aproximam perigosamente desta “geografia da morte”.

Em 1980 me formei no seminário de Campinas, éramos então, a maior turma de todos os tempos e seminários presbiterianos no Brasil. 41 formandos. De minha turma de pastores, apenas 1 faleceu no ano passado, todos os demais estão vivos. E eu sou o caçulinha do grupo. Não é surpreendente? Pessoas morrem muito cedo quando desobedecem as leis de Deus, da vida e da natureza. Por cruzarem esta linha de fogo. No ano passado, no Brasil, 56 mil pessoas foram assassinadas, 80% deles, jovens entre 15-25 anos, e destes, 80% relacionados ao tráfico de drogas.

Paulo diz que “O salário do pecado é a morte!” (Rm 6.23), mas ele não estava se referindo à morte física, mas eterna. O pecado não apenas destrói a saúde e nos expõe à morte física, mas traz danos eternos, nos afasta espiritualmente de Deus e eternamente da sua gloria.

Conclusão:

Felizmente, porém, este texto não termina com esta nota de pesar, mas dando esperança. Não apenas descreve os efeitos deletérios do pecado, mas fala da surpreendente obra da graça de Deus. O texto diz: ““O salário do pecado é a morte! Mas, o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo jesus”. Afirma ainda,Mas graças a Deus, porque, outrora escravos do pecado, contudo, viestes a obedecer de coração, à forma de doutrina a que fostes entregues, e, uma vez libertados do pecado, fostes feitos servos da justiça” (Rm 6.17-18). Veja como as conjunções adversativas, “mas e contudo”, mostram a eficácia da nova realidade gerada pela obra de Cristo.

o que isto nos ensina:

A.     A graça de Deus muda nossa situação – Ela nos liberta do poder do pecado e nos transforma em servos da justiça. que maravilhosa mudança! Não servos da iniquidade, não mais escravos do pecado, não mais condenados à morte eterna, mas livres, para, de coração, obedecer as verdades do evangelho e fazer a vontade de Deus;

B.     A graça muda nossa disposição – Paulo fala que quando éramos escravos do pecado, oferecíamos os membros para a escravidão, mas agora, em Cristo, voluntariamente, servimos à justiça e santificação (Rm 6.19). Não mais para as trevas, mas para Deus, para que ele seja glorificado.

C.     A graça muda nossa condição – Não mais condenados, mas justificados. Não mais destinados à morte, mas à vida eterna.

Quando somos atraídos a Deus, recebemos gratuitamente a vida eterna. você não paga por ela. É gratuita. Você não a merece, é 0800. Nada do que você faça será capaz de torná-lo merecedor, senão seria trabalho, e não graça. Você não pode pagar pela culpa do pecado. Jesus fez isto por você. Ele levou sobre si sua dor, vergonha, escravidão, humilhação.

Esta semana tive uma conversa profunda e franca com uma pessoa que esteve afastada da comunhão da igreja por 20 anos. Ele teve uma queda moral, e isto trouxe muita confusão, vergonha e dor para sua família e seu coração. Ele disse que não voltou antes, e estava relutante em retornar agora, porque seu pecado tinha decepcionado e machucado muitas pessoas, e sentia que não tinha direito de retornar. Virando-se prá mim, perguntou: “Você me entende, né?” e eu lhe respondi: “Não!” Ele então ficou meio indeciso, e eu lhe disse: “Isto que você está afirmando contraria o Evangelho. Não é isto que aprendemos nas Escrituras Sagradas. O tempo do exílio acabou”.

O Evangelho muda nossa condição. Nossa sentença era morte, mas agora é vida. Era condenação, mas agora, aceitação; era vergonha, mas agora gratidão e exultação. o salário de nossas atitudes e decisões morais, de uma vida acorrentada pelos laços de iniquidade, trazem juízo e condenação, mas a obra de Cristo muda nosso status e condição. “O salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de deus é a vida eterna”.

É isto que o evangelho ensina! “Uma vez libertados do pecado, fostes feitos servos da justiça!”(Rm 6.18).

Portanto, ofereçam agora, livremente a Deus, os seus membros, talentos e corpo, para servirem à justiça e ao seu Reino. A obra de Deus é gratuita. nada pode ser feito para que sejamos resgatado da nossa condição, mas ele nos redimiu. Então, como forma de gratidão e louvor, ofereçamos nossos membros não mais ao pecado, mas a Deus, como instrumentos de justiça.