sábado, 28 de maio de 2022

Fp 4.10-20 Sobre cuidar e ser cuidado






Introdução

 

 

Estamos encerrando a série de sermões na Carta que Paulo escreveu aos irmãos que moravam em Filipos. Um texto rico e valioso. No último capítulo, Paulo fala da relação afetiva que tinha com a igreja de Filipenses, que parece ser a igreja com a qual ele possuía sua melhor relação de amor. Ele agradece a igreja pela preocupação com seu bem-estar e com sua vida. O amor e o cuidado de uma igreja é um critério fundamental para sabermos que realmente tem compromisso com a obra de cristo. Jesus afirmou: “Nisto conhecereis que sois meus discípulos, de tiverdes amor uns pelos outros.”

 

Ao pensarmos no cuidado mútuo, precisamos lembrar que mutualidade é um caminho de mão dupla: Precisamos ser cuidados, e precisamos cuidar! Muitos não aceitam cuidado. Muitos não querem cuidar. 

 

Os que não aceitam cuidado o fazem por várias razões, entre elas, vaidade e orgulho. Não querem dar trabalho, não querem depender dos outros, se distanciam da comunidade, tornam-se solitários, frios e distantes.

 

Os que não querem cuidar não querem ter trabalho. Se acomodam no seu universo individual, querem se manter à distância, acham muito complicado se envolver com as pessoas e não se interessam muito pelo que as pessoas sentem ou pensam. "Cada um cuide de si... Cada um se vire como puder..." 

 

Mas este texto de Paulo, fala de cuidado. Como o cuidado da igreja de Filipos foi importante para sua vida. Como ser cuidado é bom... como cuidar dos outros é importante, e, acima de tudo, como Deus deseja que este relacionamento de amor seja algo espontâneo na vida de seu povo. Paulo afirma que esta atitude de cuidado possuía um caráter sagrado e espiritual: "sacrifício de aroma suave diante de Deus". No desenvolver deste assunto precisamos entender o que realmente significa isto.

 

Quais são as lições que podemos aprender deste texto:

 

1.     Fique ligado: Nós precisamos de cuidado! Todavia, fizestes bem, associando-se na minha tribulação” (Fp 4.14)

 

Todos precisamos de comunidade, de apoio, de aceitação, de acolhimento. No seu livro “The diferente Drum”, Scott Peck afirma que “em comunidade e através de comunidade, encontramos nossa esperança.” Muitas pessoas equivocadamente pensam que são super-homens, autossuficientes, indestrutíveis, imbatíveis, mas isto não é verdade. Todos precisamos de cuidado.

 

Paulo demonstra isto neste texto ao afirmar: “Todavia, fizestes bem, associando-se na minha tribulação” (Fp 4.14) Esta atitude da igreja foi uma benção para sua vida. Paulo estava preso, ele precisava de cuidado e atenção. Ele estava debaixo de grande tribulação, preso, sendo julgado. Paulo reconhece sua necessidade de ajuda.

 

O Apóstolo Paulo, que era um homem de Deus, espiritual e crente, nunca deixou de demonstrar suas vulnerabilidades, fraquezas e dificuldades. Na Carta a Timóteo ele demonstra isto várias vezes. Enfrentando a solidão da cadeia ele não tem dificuldade de dizer a Timóteo: “Procura vir ter comigo depressa.” (2 Tm 4.9). Na mesma carta diz: “Toma contigo Marcos e traze-o, pois me é útil para o ministério.” (2 Tm 4.11). Mais adiante diz: “Apressa-te a vir antes do inverno.” (2 Tm 4.21). Dando ideia de que ficar sem amigos em mais uma época de frio seria algo muito dolorido para ele. Ele se refere a Tito como seu companheiro e cooperador. (2 Co 8.23)

 

 

Em todas estas situações demonstra como ele precisava de apoio, amizade, presença. Ele não tinha dificuldade de dizer que precisava de gente. Neste texto ele expressa o quanto o cuidado da igreja de Filipos havia sido bom para sua alma e como o gesto daquela igreja falava ao seu coração.

 

A geração atual está se tornando cada vez mais solitária. Lutamos muito pelos direitos individuais, mas pouco pelos interesses coletivos. As culturas antigas tinham forte senso de clã, de tribo, de aldeia. Nós queremos cada vez nossa privacidade e nos isolamos e estamos morrendo na nossa solidão, sem cuidar, e sem sermos cuidados.

 

Em 2018 a Inglaterra criou o “Ministério da Solidão”, e em 2021, o Japão também fez o mesmo. O que está acontecendo? As pessoas antigamente, tinham ideia de comunidade: aldeia, igreja, família maior. Hoje estamos cada vez mais distanciados, vivendo numa bolha e nos afastamos das pessoas. Não gostamos de relacionamentos comunitários. Estamos ficando desamparados e órfãos porque não temos cuidado. O aumento da depressão e das fobias modernas tem a ver com este quadro. O modelo atual adoece. A Solidão mata.

 

Então, considere que eventualmente você precisará de cuidados. Deixe-se ser cuidado. Procure ajuda, não morra no isolamento, não se afaste de sua comunidade. Não seja orgulhoso, deixe que outros estendam a mão e te ajudem nos processos de restauração e cura, se eventualmente você precisar.

 

2.     Envolva-se! Muitos precisam de ajuda - Alegrei-me, sobremaneira, no Senhor porque, agora, uma vez mais, renovastes a meu favor o vosso cuidado!” (Fp 1.10).

 

O povo de Deus precisa cuidar!

 

Se no primeiro tópico consideramos a necessidade de sermos cuidados, no segundo a ênfase é a necessidade de cuidar. Não só esperar que o outro faça algo por nós, mas perguntar como podemos nos preocupar e encorajar outros.

 

Paulo deixa claro como atitude da igreja de Filipos havia sido importante. “Alegrei-me, sobremaneira, no Senhor porque, agora, uma vez mais, renovastes a meu favor o vosso cuidado!” (Fp 1.10).

 

Podemos falar de três tipos de cuidado: 

Físico

Espiritual

Emocional

 

Cuidado físico.

 

Precisamos cuidar do bem-estar físico das pessoas. Cuidar para que as pessoas não passem necessidades, mas sejam protegidas financeiramente. Isto deve acontecer no nível pessoal, institucional e familiar. Sabemos que muitas vezes o desequilíbrio financeiro pode acontecer por falta de planejamento, mas eventualmente a enfermidade e o desemprego, podem gerar situações difíceis.

 

Quando a pandemia do Covid-19 começou, não sabíamos muito bem quais seriam os efeitos com o isolamento social. No início do ano 2020, todos estávamos fragilizados com a situação. Conversei com o conselho da igreja e liguei para as três igrejas mais pobres de nosso presbitério para pedir que não deixassem que faltassem nada para eles e nem para seus membros. Um dos pastores chorou ao telefone. Nós tínhamos reservas, e se necessário fosse, poderíamos socorrer aos irmãos mais pobres da periferia da cidade. Ninguém nos procurou pedindo ajuda, mas estávamos dispostos a cuidar uns dos outros. Houve muito movimento de solidariedade. Membros da igreja ligavam para os líderes da Junta Diaconal, perguntando se havia alguém com necessidade, pois queriam ajudar. Pessoas de fora da igreja, mas que conheciam o trabalho dos diáconos da igreja, chegaram a depositar boa quantidade de dinheiro na conta da Junta para ajudar os necessitados.

 

Precisamos cuidar fisicamente uns dos outros. Como diz a Lei: “para que não haja pobres no meio de ti”, (Dt 15.3) como Deus ordenou ao povo de Israel. “Quando entre ti houver algum pobre de teus irmãos, em alguma das tuas cidades, na terra que o Senhor, seu deus, te dá, não endurecerás o teu coração, nem fecharás a mão ao teu irmão pobre.” (Dt 15.7)

 

Cuidado espiritual

Quem pastoreia a igreja?

Em geral pensamos em pastoreio na perspectiva institucional, mas deveríamos pensar não na perspectiva do ofício, mas dos dons. Uma coisa é o ofício pastoral, que se refere aos que passam pelos seminários, recebem treinamento e são ordenados. Outra coisa são os dons. Quem tem alma pastoral? Quem gosta do rebanho, se preocupa e cuida do rebanho?

 

Neste sentido fica a pergunta: Quem são os pastores da igreja?

Tenho percebido que algumas pessoas leigas são melhores “pastores” que os que tem o ofício pastoral. São preocupadas com a vida dos outros, oram e visitam. São pessoas que aprenderam cuidar. Possuem o dom de misericórdia.

 

No sentido dos dons espirituais, posso dizer que elas são mais efetivas pastoralmente, que boa parte dos pastores oficiais, mesmo não tendo reconhecimento institucional, nem sejam chamadas desta forma. Muitos líderes de pequenos grupos se tornam pastores (as), criando vínculos de amor e cuidado.

 

Todo este pastoreio é cuidado espiritual.

 

Dentre as atribuições dos presbíteros da igreja, encontra-se o cuidado espiritual do rebanho. Muitos presbíteros possuem uma enorme disposição para visitar, aconselhar, evangelizar, cuidar e proteger o rebanho. Quando pastoreava a igreja de Vila Morais em Goiânia, o Presbítero Samuel Rodrigues, sempre chegava às pessoas que precisavam de cuidados pastorais primeiro que eu. Na igreja de Anápolis, tenho visto este pastoreio, pessoas cuidando do rebanho, orando por pessoas, visitando e aconselhando.

 

Vidas estão sendo restauradas, temos salvação de almas, orações são feitas uns pelos outros. A Igreja precisa de cuidado. Precisamos orar para que lares sejam libertos da opressão espiritual, orar pela saúde física e emocional das pessoas, apoio financeiro, aconselhamento. Tudo isto é cuidado espiritual. Quando oramos pelas pessoas nós as cobrimos de proteção contra as investidas do diabo. A Bíblia encoraja os homens da igreja a orarem pelas pessoas. “Quero, portanto, que os varões orem em todo lugar, levantando mãos santas, sem ira e sem animosidade.” (1 Tm 2.8)

 

Cuidado Emocional

Outro aspecto a ser considerado é o do cuidado emocional.

 

Há muita dor e sofrimento. Pessoas com depressão, perdas e lutos. O cuidado emocional é uma dimensão saudável do corpo. Precisamos acolher, proteger, abraçar. Todos precisamos de colo, de compreensão, de aprisco.

 

Temos muita facilidade de reclamar quando não recebemos nenhuma mensagem no dia do aniversario, mas será que nos preocupamos em enviar uma mensagem ou ligar para aqueles que aniversariam? Temos reclamado que ninguém nos presenteou, mas você já deu presente a alguém?

 

Uma igreja acolhedora, amável, simpática, aprende a cuidar.

 

A Bíblia fala dos mandamentos recíprocos.

Um dos textos mais relevantes sobre a experiência da comunhão da igreja foi escrito por Lowell Bailey: “25 segredos para derrotar a crise da comunhão”.[1] O livro é dividido em 3 seções:

-       Considerações básicas sobra a mutualidade.

-       Os mandamentos recíprocos: Uns aos outros

-       Como desenvolver, no pequeno grupo e na igreja, a vida de mutualidade.

 

Bailey cuidadosamente analisou cada vez que aparece a expressão “uns aos outros” na Bíblia, e deu uma sequência interessante ao conteúdo exposto. Quais são estes mandamentos recíprocos? Ele dividiu em três blocos:

 

  1. Os discípulos valorizam relacionamentos. “uns aos outros”:

·       Amem-se uns aos outros – Jo 13.34

·       Aceitem-se uns aos outros – Rm 15.07

·       Saúdem-se uns aos outros – 1 Co 16-20b

·       Tenham cuidado uns dos outros – 1 Co 12.24b-25

·       Sujeitai-vos uns aos outros – Ef 5.21

·       Suportai-vos uns ao outros – Ef 4.3; Cl 3.12-14

 

  1. Os discípulos protegem o corpo

·       Não tenham inveja – Gl 5.22-26

·       Não julguem – Rm 14-13

·       Não se queixem – Tg 5.9

·       Não tratem mal – Tg 4.11

·       Não provoquem -  Gl 5.22-26

·       Não devorem – Gl 5.14-15

·       Não mintam – Gl 3.9-10

·       Confessem pecados uns aos outros – Tg 5.16

·       Perdoem – Ef 4.31

 

  1. Os discípulos contribuem para o crescimento uns dos outros

·       Edifiquem-se uns aos outros – I Tss 5.11; Rm 4.19

·       Ensinem – Cl. 3.16

·       Encoragem – Hb 3.12-13

·       Aconselhem – Rm 15.14

·       Falem com cânticos Cl 3.16; Ef 5.18

 

  1. Os discípulos servem uns aos outros

·       Ministrem – I Pe 4.10

·       Levem os fardos – Gl 6.2

·       Praticai a hospitalidade – 1 Pe 4.7-9

·       Sejam bondosos – Ef 4.31-32

·       Orem Tg 5.16

Todos são mandamentos recíprocos. De mutualidade. Uns aos outros. Nós precisamos de cuidado, mas da mesma forma, precisamos cuidar.

 

3.     Cuidado e atenção nem sempre é algo presente. “E sabeis também, vós, ó filipenses, que, no início do evangelho, quando parti da Macedônia, nenhuma igreja se associou comigo no tocante a dar e receber, senão unicamente vós outros.” (Fp 4.15)

 

Podemos perceber um pouco de tristeza no que ele fala, e um pouco de observação. Ele saiu para a obra missionária, mas nenhuma igreja percebeu a necessidade que ele tinha de recursos para continuar a obra, exceto a Igreja de Filipenses.

Cuidar deveria ser uma atitude espontânea de quem entendeu o evangelho. Ouvi uma expressão muito interessante esta semana que dizia: “Quando a pessoa ama a Jesus, aprende a amar a sua igreja.”

 

Muitas vezes precisamos estar mais atentos e diligentes porque as coisas não são fáceis. Precisamos de graça.

 

Quais são as consequências de cuidar e ser cuidado?

 

A.    Alegria no coração daquele que recebe – Alegrei-me, sobremaneira, no Senhor porque, agora, uma vez mais, renovastes a meu favor o vosso cuidado!” (Fp 1.10).

 

Quem recebe cuidado se sente bem. Isto traz alegria, contentamento. Ser cuidado é bom para crianças, avós, pais. É bom entender que cuidado não é uma questão de dinheiro, mas de coração: Uma ligação telefônica, uma mensagem, uma visita.

 

B.    Cuidado tem implicações espirituais – Recebi tudo e tenho em abundância; estou suprido, desde que Epafrodito me passou às mãos o que me veio da vossa parte como aroma suave, como sacrifício aceitável e aprazível.” (Fp 4.18)

 

Observe a linguagem do texto. Paulo afirma que as ofertas que os irmãos lhe enviaram chegaram até ele como “sacrifício aceitável e aprazível.” Prestem atenção nesta linguagem. Ele usa a mesma expressão do Antigo Testamento. As ofertas deveriam ser de “aroma suave ao Senhor.” Isto incluía holocaustos e ofertas pacíficas. (Lv 1.9,13,17; Nm 15.10; 18.17) Todo o culto judaico estava centrado na forma como deus receberia o que era feito. Se a oferta não fosse agradável, ela não era aceita. Isto aconteceu com Caim.

 

A Bíblia sempre ensina que Deus é glorificado quando seu povo demonstra cuidado e amor pelos outros. Conhecemos muito bem o texto de Jesus que nos ensina a ser luz do mundo, mas você já percebeu o que ele diz no texto todo? “Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus.” (Mt 5.16).

 

Para Paulo, as ofertas que ele recebeu da Igreja de Filipos eram espirituais e sagradas, como as oferendas judaicas realizadas no templo. Assim é que Deus é glorificado.

 

Conta-se que Paulo Freire, quando esteve na África do Sul para dar palestras à universidade, após o almoço ele saiu para dar uma volta no campus e o seu anfitrião, segundo o costume local, lhe deu a mão e saíram andando de mãos dadas. Esta situação o afligiu muito e ele se sentia incomodado, quando um pensamento lhe veio à mente: Se na minha cultura não há lugar para afetividade, alguma coisa está errada com a cultura. Parafraseando esta frase eu diria: “Se na minha espiritualidade, não há lugar para afeto, cuidado, alguma coisa está errada com minha espiritualidade.

 

No meu livro “Teologia do Afeto”, trato desta questão. Espiritualidade e afetividade não são dissociadas na teologia bíblica. Não há maturidade espiritual se não houver maturidade emocional.

 

C.    Cuidado protege o outro. Recebi tudo e tenho em abundância; estou suprido, desde que Epafrodito me passou às mãos o que me veio da vossa parte.” (Fp 4.18)

 

Paulo era um velho pastor. A assistência material da igreja supriu suas necessidades. No vs 16 ele diz: “Mandastes não apenas uma vez, mas duas, o bastante para minhas necessidades. (Fp 4.16). O que ele recebeu não era para gastar em luxos pessoais, mas para gastar naquilo que era essencial: suas necessidades. As limitações financeiras de Paulo necessitavam de apoio financeiro. Ao fazer isto a igreja protegia seu pastor de privações pessoais e recursos básicos para sua vida. Quando cuidamos protegemos o outro.

 

Muitas vezes as pessoas estão passando por grandes lutas pessoais, e

quando somos sensíveis espiritualmente torna-se mais fácil lidar com estas questões.

 

 

Existem pessoas que precisam de nossos recursos

Existem obras missionárias e sociais que precisam de nossos recursos.

 

D.   Cuidado aumenta meu crédito. Não que eu procure o donativo, mas o que realmente me interessa é o fruto que aumente o vosso crédito.” (Fp 4.17).

 

Este texto fala de algo curioso: Nosso cuidado e generosidade trazem crédito para nossa vida. O que significa isto?

 

Stephen Covey escreveu o best-seller: “Sete hábitos de uma pessoa efetiva.” Ele afirma que para termos saques emocionais, precisamos fazer depósitos emocionais. Muitos querem fazer saques, mas não possuem lastros. Querem receber sem depositar. Como minha filha fez quando tinha 4 anos. Ele queria comprar alguma coisa, e então eu lhe disse que não dava, porque não tinha dinheiro. Ela virou para mim e disse: “Dá um cheque!”

 

Fico pensando neste crédito mencionado aqui. Teria ele uma dimensão mais “espiritual”? O texto gramaticalmente parece sugerir isto ao afirmar: “E o meu Deus, segundo sua riqueza em glória, há de suprir, em Cristo Jesus, cada uma de vossas necessidades.” (Fp 4.19). Este texto tem uma conjunção aditiva, “E”, dando a ideia de que os textos estão interligados, como se dissesse: quando oferecemos sacrifícios aceitáveis e aprazíveis a Deus, Ele suprirá as necessidades que temos.

 

Sem querer pensar equivocadamente em “barganha” com Deus, porque a ideia de “crédito” pode nos induzir a isto, mas não é muito difícil pensar que generosidade e cuidado, redundam em crédito, e que então, Deus suprirá cada uma de nossas necessidades. Há muitos querendo as bençãos de Deus, sem o Deus da benção. Há muitos querendo saques emocionais sem fazer depósitos emocionais. Há muitos querendo a abundância de Deus sem serem abundantemente generosos.

 

Sabemos que tudo o que recebemos é fruto da graça de Deus, mas a Bíblia fala também da lei da semeadura. “Não vos enganeis, de Deus não se zomba; porque aquilo que o homem semear, isto também colherá.” (Gl 4.7). Não adianta plantar laranja esperando colher morango. Colhemos o que semeamos. Lemos ainda: “Por isto não desfalecemos, porque a seu tempo ceifaremos, se não desfalecermos.” (Gl 4.9) É preciso continuar semeando se queremos esperar colheita. Gente que cuida recebe cuidado.

 

Conclusão

 

É importante observar que o texto não está falando de salvação. Equivocadamente muitos pensam que serão salvos pelos depósitos de bondade que estão acumulando. A Bíblia diz que nenhum de nós conseguirá construir uma “carteira de bondade”, para receber salvação eterna. A Salvação não é meritória, nem fruto da conquista humana, não ganhamos o céu por nossas boas obras, pela nossa reputação. A salvação é obra exclusiva de Deus a favor do pecador.

 

A Bíblia diz que a salvação é uma dádiva divina. Por isto é fruto da graça. “Pela graça sois salvos mediante a fé e isto não vem de vós; é dom de Deus. Não de obras para que ninguém se glorie.” (Ef 2.8-9). A Reforma Protestante defendeu arduamente esta verdade bíblica. “Sola Gratia”. Céu não é ganho por merecimento.

 

Então, antes de encerrarmos, gostaria de falar de outro cuidado: O cuidado e a provisão de Deus pelas nossas vidas. Jesus afirmou: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas ovelhas.” (Jo 10.11) Deus providenciou tudo o que era necessário para nossa salvação por meio de Cristo. O autor da carta aos hebreus chega a afirmar: “Como escaparemos, se negligenciarmos tão grande salvação?” (Hb 2.3)

 

Cuidar é apenas uma reação natural de quem foi cuidado. Se fazemos alguma coisa isto deve ser algo natural, uma vez que Cristo já fez tanto por nós. O apóstolo João afirma: “Nós amamos porque ele nos amou primeiro.” (1 Jo 4.19). A cruz deve ser o fator motivador de nosso cuidado pelos outros. A cruz nos ensina a abençoar, ser generosos, perdoador, a cuidar. O que damos é muito pequeno em relação ao tanto que recebemos.

 

 

 

 

 



 

 



[1] Bailey, Lowell -  “25 segredos para derrotar a crise da comunhão”. Sta Barbara. Editora  Z3 1ª edição, 2013)

 





terça-feira, 17 de maio de 2022

1 Pe 1.10-12 O Evangelho na perspectiva dos profetas e dos anjos

 


 

Introdução

 

No estudo anterior, consideramos duas etapas:

A.   O Plano da Salvação

B.    Os efeitos da Salvação

 

O Plano da Salvação

Sobre o plano da salvação analisamos os seguintes aspectos:

 

a.     Deus nos elegeu. (1 Pe 1.1-2) Esta mensagem era extremamente importante para aqueles irmãos primitivos que estavam lidando com toda sorte de oposição. Saber que Deus os amava, os havia considerado especiais, certamente era transformador. Pedro usa a palavra eleição duas vezes nestes primeiros versículos.

 

b.     Ele nos regenerou (1 Pe 1.3) A obra de Deus em nos dar uma nova identidade, um novo nascimento, em nos tornar novas criaturas.

 

c.     Ele nos deu viva esperança (1 Pe 1.3). Não caminhamos para a eternidade indo para o nada. Sabemos em quem temos crido. Não é uma esperança vaga, nem um “talvez”, mas uma esperança viva.

 

d.     Ele nos deu herança eterna. (1 Pe 1.4). Com Cristo recebemos todas as bençãos espirituais. Há uma maravilhosa nos céus àqueles que pertencem a Cristo.

 

e.     Ele nos guarda (1 Pe 1.5). Pedro usa aqui um termo militar. Somos protegidos militarmente por Deus. Esta é a única maneira que nos possibilita de não tropeçarmos e falharmos. Nossa vitória espiritual está garantida, porque é Deus quem nos guarda.

 

Este é o plano da salvação, sintetizado.

 

Os efeitos da Salvação

 

Logo a seguir, o texto vai falar dos resultados da obra da salvação no coração dos eleitos de Deus.

 

a.     Alegria no meio da tribulação - (1 Pe 1.6) Aqueles pessoas não teriam condições de experimentar qualquer forma de regozijo, se olhassem para a condição humana a que estavam sujeitos, entretanto, Pedro afirma: “Nisso exultais.” Ele está se referindo a toda a compreensão espiritual que eles tinham acerca de Deus e acerca de si mesmo. Era uma alegria transcendental.

 

b.     Fé valorosa – “O valor da vossa fé” (1 Pe 1.6). Pedro se refere à fé como algo valoroso, não algo barato e descartável. Esta afirmação nos leva a indagar se realmente consideramos a fé que assumimos como algo de valor. Bonhoeffer falava da graça barata, e do discipulado sem custo. A verdade é que “fé que não custa nada, não vale nada!”

 

c.     Esperança gloriosa – Aqueles irmãos estavam historicamente dispersos, mas viviam na dimensão da eternidade, eles compreendiam a beleza da salvação espiritual que eles haviam gratuitamente recebidos em Cristo.

 

A importância da salvação

 

Nos vs 10-12, Pedro vai introduzir um aspecto diferente. Ele tenta mostrar como esta fé é valiosa. Ele falará de como os profetas e os anjos, ansiavam por estas verdades.

 

Na medida em que lemos o texto, vamos percebendo que, no mundo espiritual, e nas esferas celestiais, havia desde antigamente, um certo sussurro e indagação sobre um evento, do qual eles não tinham compreensão muito clara, mas possuíam algum vislumbre. Pedro menciona os profetas e anjos.

 

Os profetas indagavam... (1 Pe 1.10)

O que isto quer dizer?

Na verdade, havia certa inquietação destes homens que recebiam as mensagens de Deus, porque a revelação que eles recebiam eram ainda parciais. Os profetas tinham “vislumbres”, mas não entendiam todas as coisas relacionadas a Cristo e ao evangelho.

 

Por exemplo:

 

O Salmo 22 fala do Messias sendo crucificado.

Todos os que me veem zombam de mim; afrouxam os lábios e meneiam a cabeça: Confiou no Senhor ! Livre-o ele; salve-o, pois nele tem prazer.” (Sl 22.7-8). Isto aconteceu na cruzenquanto Jesus era crucificado. O Salmistaprofeticamente está falando de quem?

 

Cães me cercam; uma súcia de malfeitores me rodeia; traspassaram-me as mãos e os pés.” (Sl 22.16). Sobre quem o salmista estava falando? Por acaso Davi teve suas mãos e pés traspassados?

 

Repartem entre si as minhas vestes e sobre a minha túnica deitam sortes.” (Sl 22.18) Os leitores do Novo Testamento sabem perfeitamente que o salmista está falando de Cristo. mas quando ele escreveu estas coisas, ele tinha compreensão do que seria?

 

O profeta Isaias fala do servo sofredor, do Messias sendo sacrificado. Algum leitor do Antigo Testamento, ou mesmo o profeta seria capaz de entender esta mensagem?

 

Mas ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados.” (Is 53.5). Por acaso o profeta era capaz de vislumbrar todo o cenário e todas as implicações do resgate efetuado por Cristo lá na cruz? Certamente que não. Entretanto, ele fala destas coisas.

 

Quando Miqueias fala do local de nascimento do Messias, ele o faz com detalhes:

E tu, Belém-Efrata, pequena demais para figurar como grupo de milhares de Judá, de ti me sairá o que há de reinar em Israel, e cujas origens são desde os tempos antigos, desde os dias da eternidade.” (Mq 5.2). De onde veio isto em sua mente? Ele compreendia o que estaria acontecendo em Belém? O nascimento do Filho de Deus, da encarnação do verbo. Naturalmente que não. Entretanto, ele fala disto, porque Deus lhe havia revelado. Não era uma inquiracao pessoal. “Nenhuma profecia provem de particular elucidação.”

 

Ora, todos os profetas e discípulos de profetas, entrando em contato com as verdades reveladas a eles ou aos outros profetas, ficavam tentando decodificar todas estas verdades anunciadas. Mas todos falavam sem compreensão clara do que viria. Veja os verbos que Pedro usa neste texto:

 

·       Indagaram

·       Inquiriram

·       Profetizaram

·       Investigaram

 

Eles investigavam a ocasião e as circunstâncias, relacionadas a duas coisas:

 

A.   Ao sofrimento do Messias

 

Isaias descreverá com detalhes o sofrimento do Messias no capitulo 53. Davi também o fez com clareza no Salmo 22. Apesar destas claras descrições, os judeus sempre tiveram a ideia de um Messias triunfante, guerreiro e vitorioso, não de um Messias morto numa cruz.

 

B.    A glória do Messias.

Assim como os profetas descreveram o sofrimento eles também falaram da glória. Veja como Daniel fala da glória do Filho do Homem:

 

Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha com as nuvens do céu um como o Filho do Homem, e dirigiu-se ao Ancião de Dias, e o fizeram chegar até ele. Foi-lhe dado domínio, e glória, e o reino, para que os povos, nações e homens de todas as línguas o servissem; o seu domínio é domínio eterno, que não passará, e o seu reino jamais será destruído. Quanto a mim, Daniel, o meu espírito foi alarmado dentro de mim, e as visões da minha cabeça me perturbaram.” (Dn 7.13-15).

 

Daniel fala do Filho do Homem, uma clara referência a Jesus que atribuiu este titulo a ele mesmo, como de alguém que teria domínio e glória, e cujo reino jamais teria fim. Depois destas revelações, não é de se impressionar que Daniel ficasse abalado, com seu espírito alarmado, e as visões da sua cabeça me perturbador. Ele não tinha compreensão daquilo que ele escrevia. Ele foi movido pelo Espírito Santo para registrar suas visões, porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto, homens [santos] falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo.” (2 Pe 1.21).

 

Os profetas falavam para nós. As revelações não eram para eles mesmos.

Pedro tenta mostrar como isto é importante. Até os profetas quiseram entender tudo isto, mas Deus guardou esta mensagem para nosso tempo.

 

Isto dá peso e consistência à mensagem na qual eles criam e estavam sendo sustentados.

 

Os anjos desejavam contemplar...

 

Em seguida, Pedro vai demonstrar de outra forma como a mensagem que eles estavam recebendo era maravilhosa: Não apenas os profetas indagaram sobre ela, mas até mesmo no mundo espiritual, os anjos percebiam que algo muito especial estava para acontecer, mas não sabiam o que era.

 

A eles foi revelado que, não para si mesmos, mas para vocês, ministravam as coisas que, agora, foram anunciadas a vocês por aqueles que, pelo Espírito Santo enviado do céu, lhes pregaram o evangelho, coisas essas que anjos desejam contemplar.” (1 Pe 1.12).

 

Paulo se refere à obra de Cristo como o “mistério de Deus”

“...pois, segundo uma revelação, me foi dado a conhecer o mistério” (Ef 3.3) e afirma que o Evangelho das insondáveis riquezas de Deus encontrava-se no mistério da encarnação de Cristo. “A mim, o menor de todos os santos, foi dada esta graça de pregar aos gentios o evangelho das insondáveis riquezas de Cristo e manifestar a todos qual é a dispensação do mistério que, durante tempos passados, esteve oculto em Deus, que criou todas as coisas.” (Ef 3.8,9).

 

Este mistério não era esotérico como pressupõem os espiritualistas e os gnósticos. Tratava-se de um plano de Deus em não revelar o que ele estava por fazer. Tratava-se da encarnação do própria Deus. Ele assumindo a natureza humana, e este mistério foi revelado quando “o verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1.14).

 

Os anjos tinham uma visão limitada sobre este assunto. Anjos não são seres oniscientes. Este é um atributo apenas das pessoas da Trindade, trata-se de um atributo divino. Entretanto, assim como os profetas eles tinham vislumbres de que algo grandioso estava para acontecer. O que de fato viria, contudo, foi um choque. Deus se encarnou. Esta foi a maior surpresa. Os anjos anelavam “perscrutar” estas verdades (RA). O sinônimo desta palavra é “examinar, investigar rigorosamente; indagar, perquirir”. E ainda: “tentar conhecer, procurar penetrar no segredo das coisas.”

 

O inferno jamais poderia imaginar que o próprio Deus habitaria entre os homens. Eles sabiam que sua condenação já estava determinada, mas ficaram surpresos com o que aconteceu no “meio da história”, e não no fim da história. Um dia Jesus estava expulsando demônios do endemoninhado gadareno, e a afirmação que os demônios fizeram é surpreendente.

 

Que temos nós contigo, Filho do Homem? Viestes perder-nos antes do tempo?” (Mt 8.29). Preste atenção na expressão: “Antes do tempo”. A que tempo eles se referem? Naturalmente eles falavam do juízo final quando Satanás será definitivamente condenado e jogado no lago de fogo e enxofre (Ap 20.1,2). Mas a surpresa deles foi se deparar com um julgamento “antecipado”.

 

Por esta razão os anjos desejavam saber antecipadamente do que se tratava todos aqueles sussurros diante do mistério de Deus oculto em Cristo. nem os profetas, nem os anjos, puderam.

 

Pedro então se volta para seus leitores, dispersos e forasteiros, sofrendo grandes tribulações e lhes diz:

A eles foi revelado que, não para si mesmos, mas para vocês, ministravam as coisas que, agora, foram anunciadas a vocês por aqueles que, pelo Espírito Santo enviado do céu, lhes pregaram o evangelho.”(1 Pe 1.12). Era uma forma de demonstrar qual importante esta mensagem era para eles.

 

Diante disto, Pedro exorta então os irmãos a responderem ao evangelho de forma santa e positiva. A partir de 1 Pe 1.13, ele vai encorajá-los, a darem uma resposta de amor a tudo isto que receberam de Deus.

 

Mas sobre este assunto falaremos em outra oportunidade.