quinta-feira, 27 de outubro de 2016

2 Rs 8.1-6 O Encontro dos desencontrados


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Introdução

Este texto nos relata o encontro de dois personagens complicados: Geazi e Jorão. Já ouviu falar deles? Quem são estes personagens? 

Geazi é apresentado na bíblia como “o moço do homem de Deus” (2 Rs 8.4). Ele acompanhou Eliseu durante anos, servindo-o, como seu escudeiro. Mas um incidente causado pela sua cobiça o afastou de sua posição. Sua aspiração por reconhecimento humano, riqueza, bens e honra o tiraram do ministério (2 Rs 5.20-27).

O que ele está fazendo agora?
Está diante do rei. 

Não era isto que queria? Ele não queria o glamour do palácio, de gente importante? Pois bem, ele saiu de sua situação de seminarista pobre e se tornou agora uma espécie de amigo do rei. Parece que a cobiça dele foi bem sucedida, afinal, está diante do rei. Só apenas um problema: Ele tem status, mas uma doença terrível o consome. Ele está com lepra, uma bomba relógio no seu corpo. As pessoas o veem como um homem bem sucedido, mas ele é o sucesso do fracasso. Um cenário mais comum do que geralmente achamos que existe. Sucesso não garante plenitude, dinheiro não resolve o problema da dor humana, glória não satisfaz a alma triste e angustiada.

Ironias iguais a esta acontecem com regularidade na história. Pessoas dominadas pela cobiça podem perder sua alma, sua alegria, e as coisas mais significativas da vida, apesar de alcançarem seus sonhos. Infelizmente em muitos casos, o desejo do coração se torna uma perigosa ameaça contra o ser humano. O povo reclamou contra Deus, queria satisfazer determinados desejos e por isto desprezou o sustento miraculoso através do Maná, e passou a murmurar, queria mais, queria carne. Não bastava a graça diária e consistente de Deus, queria a comida do Egito. Eles “entregaram-se à cobiça, no deserto, e tentaram a Deus na solidão” (Sl 106.14), e o que fez o Senhor? “Deu-lhes o que pediram, mas fez definhar-lhes a alma” (Sl 106.15). Concedeu o que queriam, mas o resultado foi trágico Não queriam carne? Deus providenciou, mas suas almas secaram, a benção do Senhor desapareceu e muitos foram sucumbidos pela sua própria cobiça e gula, enquanto comiam a carne que tanto queriam. O desejo deste povo se tornou em armadilha e trouxe morte.

Muitas das insistências com sonhos obsessivos e pecaminosos que temos, podem ser dados por Deus, mas a ambição e ganância, desejos de grandeza e dinheiro e popularidade podem nos destruir. Aspirações alcançadas, desejos satisfeitos, mas a que preço? Podemos ter o que sonhamos, Deus pode permitir que objetos dos desejos sejam realizados, mas qual o preço destes sonhos? Geazi estava diante de Jorão, o rei do seu país, bebendo vinho, contando anedotas, relatando experiências, e até mesmo sendo usado por Deus para abençoar outras vidas, como a da viúva que brota neste contexto, mas Geazi perdeu a vitalidade. Tinha a “benção” de Deus, mas não o Deus das bênçãos. Tinha riqueza, prosperidade, mas estava longe da comunhão com Deus que ele experimentava nos dias de outrora, vendo o cuidado e a provisão miraculosa de Deus no ambiente simples e pobre, aprendendo das verdades de Deus através do profeta Elizeu. 

Quando Naamã surgiu no cenário, Geazi entendeu que esta era a oportunidade da vida. Ele não podia perder esta ocasião. Ele não entendia como seu mestre, o profeta Elizeu, deixava escapar uma oportunidade tão fantástica de sair da pobreza para a independência financeira. pediu duas vestes festivais, que não fazia qualquer sentido, já que seu ambiente e estilo de vida era de simplicidade, andando com pessoas pobres. Ele jamais precisaria daquelas roupas se continuasse vivendo no ambiente em que estava, mas agora ele as usa, diante do rei e dos nobres. Ele pede a Naamã um talento de prata (15 kg), foi até modesto. Naamã lhe dá mais do que ele pediu. Não seria este um sinal da aprovação de Deus? Geazi tem o desejo do seu coração satisfeito, queria fama, glamour, sucesso, reconhecimento, e os teve, mas perdeu sua saúde e deixou esta terrível marca na vida de seus filhos. 

A Bíblia nos adverte severamente contra a cobiça, porque ela pode tirar a vida do homem. “Tal é a sorte de todo ganancioso, e este espírito de ganância tira a vida de quem o possui”(Pv 1.19). “Há o suficiente no mundo para todas as necessidades humanas, não há o suficiente para a cobiça humana” (Mahatma Gandhi).

O outro personagem é Jorão. O rei Jorão, líder máximo de Samaria, capital de Israel. Este homem é complicado.

Ele não confia em Deus. Ele tem raiva de Deus e mantém uma terrível suspeita sobre Deus (2 Rs 6.33). Ele considera Deus como seu inimigo (2 Rs 3.10). Ele é seguidor do deus pagão dos sidônios, Baal-Zebube (o deus-das-moscas), como foi seu irmão Acazias (2 Rs 1.2) e sua mãe Jezabel, que era uma espécie de sacerdotisa e catequista deste falso deus (1 Rs 16.31-32). Jorão morre pouco tempo depois, por causa do juízo de Deus contra sua apostasia, sua oposição a Deus atingirá diretamente sua família, que é completamente dizimada, todos seus filhos morrerão assassinados, e seu reinado seria interrompido por Jeú, enviado de Deus para estabelecer juízo (2 Rs 9.21-24).

O que estes dois desencontrados estão fazendo?

Um ditado inglês afirma que “misery loves company”, uma tradução mais popular em português é “miséria detesta solidão”. Outro ditado popular afirma algo similar: “gambá atrai gambá”, que tem seu correlato no clássico provérbio: “Diga-me com quem andas e te direi quem tu és”. Pessoas se atraem, porque possuem o mesmo estilo de vida, e se identificam na sua visão de mundo. Você pode levar um alcoólatra para outro país para acabar com seu vício, mas se deixá-lo sozinho, logo o verá fazendo amizade com outros bêbados da região. Certo pai tirou seu filho da cidade porque estava envolvido com drogas e foram morar noutro Estado, longe das “más influências”, mas assim que chegaram ao novo endereço, o seu filho se envolveu com pessoas que vendiam drogas e enfrentavam o mesmo problema de dependência e que lhe repassavam a droga. Não adiante mudar de ar, se não há mudança na mente.

O amigo de Geazi não é mais o piedoso profeta Elizeu, mas o cínico e incrédulo Jorão. As amizades mudaram porque o coração mudou. Os ambientes de hoje não eram os mesmos de ontem, as conversas de hoje são sobre outros assuntos, as práticas espirituais são outras. Geazi conheceu muito de Deus ao lado de Elizeu, a quem o rei Jorão odiava, mas o que vemos agora? Ele está aliada, na roda de conversa, contando casos. Ele não sobreviveria naquele ambiente se não tivesse uma identificação com o discurso pagão e apóstata do rei, e com o ambiente zombador que este grupo adotava. Agora o vemos enturmado, falando a mesma linguagem, sendo aceito, fazendo parte do grupo. Mudou o coração, e assim mudam os relacionamentos, as conversas, a vida espiritual.

A Bíblia afirma que “Não vos enganeis: as más conversações corrompem os bons costumes” (1 Co 15.33). Pessoas cínicas e incrédulas gostam de andar juntos. Por isto aprendemos: “Bem aventurado o homem que não anda no conselho dos ímpios, não se detém no caminho dos pecadores nem se assenta na roda dos escarnecedores” (Sl 1.1).

Algumas lições que extraímos do texto:

1. Coração determina ambiente – As pessoas são atraídas por aquilo com que se identificam. Muitas vezes respondi questão de jovens da igreja que queriam ir a determinados ambientes para lá de suspeito e queriam saber minha opinião. Com o tempo aprendi a não dar muitas regras, mas fazer algumas perguntas. Uma delas era: “Por que um jovem que ama a Deus frequentaria um ambiente assim?”

Um antigo provérbio espanhol afirma: “Ande com os lobos e aprenderás a uivar”. Geazi está neste ambiente porque conversas espirituais não mais o atraem, ele abandona a companhia de um grupo chamado de “discípulos dos profetas” (2 Rs 2.15), uma espécie de seminário itinerante de jovens desejosos de buscar a Deus e decide se tornar amigo de um rei que claramente se opõe a Deus. 

Muitos agem assim hoje em dia. Decidiram abandonar o ambiente e a atmosfera que envolve a caminhada com o povo de Deus. Por que o fizeram? Porque outros ambientes se tornaram mais atrativos. Existem ambientes pesados que convidam à lascívia, à luxúria, à ostentação, e cujas conversas, atitudes, olhares, gestos e comportamentos desagradam a Deus. São rodadas de bebida, ambientes pesados, piadas sujas, e conversas que ferem o coração de Deus. Muitos saem da igreja e passam a frequentar tais ambientes onde o escárnio está presente. 

O Salmo 1 fala do homem que anda com Deus e do homem que está distante de Deus. O homem justo não anda no conselho dos ímpios, isto é, não submete sua agenda ao ímpio nem com ele se aconselha. Este tipo de conversa não lhe atrai. O princípio presente no salmo 1 é que a pessoa que anda com Deus, não entra na conversa daquele que não ama a Deus. Não se impressiona com os assuntos que atraem tanto a mídia depravada e artistas debochados. Já vi pessoas entrando em crise com Deus por causa de Nietsche, Spinoza, Freud. Poderiam até ler para ver o que estes homens sem Deus dizem, mas o conteúdo deste material não pode se tornar a atração do nosso coração. Se isto acontece, alguma coisa está errada com o nosso coração. 

O Salmo 1, também afirma que ele não se detém no caminho dos pecadores. Se a ideia anterior era “andar”, agora é “deter”. Se a primeira expressa movimento, a segunda expressa estado. O homem justo não gasta tempo ouvindo o estilo de vida daquele que desagrada a Deus. Ele não para ali e fica jogando conversa fora num contexto de impiedade. “Deter” não é algo circunstancial, mas revela tempo gasto.

Por último, não se assenta na roda dos escarnecedores. Dá para perceber como Salmo 1 mostra uma progressão? Agora ele se assenta, se identifica, partilha do diálogo, torna-se interlocutor. Não se sente desambientado com pessoas que “escarnecem” e “zombam” de Deus e da fé, ridicularizam valores e bons costumes, ou colocam em cheque a glória de Deus.

Fique atento aos movimentos de seu coração. O que passa nele, o que você se sente e o que você pensa, determina o ambiente que você deseja frequentar.

2. Curiosidades sobre coisas de Deus não nos transformam em pessoas de Deus – Jorão tem interesse em ouvir as histórias de milagres, mas por mera curiosidade, isto não o transforma. Qual história Geazi tinha acabado de contar? Da mulher cujo filho havia ressuscitado, e que grande experiência foi aquela. Geazi era testemunha ocular, ele esteve envolvido em todo o desenrolar da história e intervenção miraculosa de Deus. Não seria este um testemunho capaz de impactar o coração de qualquer pecador e movê-lo a Deus? Contudo, o que vemos? O conhecimento deste fato não deveria gerar temor naquele rei idólatra mas não o fez. Isto sabemos porque seu estilo de vida não mudou. Ele não se aproximou de Deus. Tais histórias eram interessantes, mas faziam parte apenas do diletantismo filosófico, nada daquilo tocava seu coração.

Como isto é comum. Existem pessoas curiosas sobre a fé, que querem ter informações sobre Deus, leem a Bíblia para terem conhecimento e informação, e podem até mesmo ver Deus agindo na sua vida ou em pessoas amigas, mas mesmo os milagres, não impactam sua vida. Depois de ouvirem tudo, seguirão suas vidas da mesma forma.

Jesus afirmou: “Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim. Contudo, não quereis vir a mim para terdes vida” (Jo 5.39-40). Não é disto que Jesus está tratando? Os religiosos liam a Bíblia, ouviam os relatos da intervenção de Deus na história humana, mas não se moviam em direção a Deus. Conheciam seu conteúdo mas não eram impactados por ele.

Poucas pessoas viram a intervenção de Deus de forma tão presente quanto este rei. Ele viu a ação poderosa de Deus no deserto, quando estavam ameaçados de morte (2 Rs 3.4-20); acompanhou de perto a cura da lepra do comandante sírio (2 Rs 5.1-19); estava presente quando Eliseu profetizou sobre a fome do povo de Samaria, o que se cumpriu exatamente como o previsto, incluindo o dia anunciado (2 Rs 6.31-7.2); ouviu o relato de uma testemunha ocular sobre a ressurreição de um adolescente, contada pelo próprio Geazi que era um dos interlocutores (2 Rs 8.1-6), mas isto não o transformou.

Um dos grandes desafios do pastor é aprender a discernir quem faz perguntas honestas de quem só vive em torno de curiosidade ou pior ainda, com sarcasmo. Francis Schaeffer afirma que o cristianismo precisa aprender a “dar respostas honestas a perguntas honestas”. Gastar tempo com pessoas que só ironizam é perda de tempo, responder ao tolo, ao estulto, não é bom princípio, é inútil e infrutífero. Não vale a pena dar pérolas aos porcos. 

3. A vida de Geazi demonstra que nem sempre a dor nos aproxima de Deus – Ele recebeu dura sentença por causa de sua cobiça. Não só ficaria leproso, mas a lepra seria uma marca sobre seus descendentes (2 Rs 5.27). Esta dura condição com a qual ele teria que conviver, não o impulsionou em direção a Deus, nem o levou a buscar a Deus com o coração quebrantado, antes pegou suas vestes de festas, fruto de sua cobiça e mentira, e aproveitou o dinheiro que recebeu usando o nome de Deus, para ter acesso ao rei e ter assento no palácio.

Já ouviram a expressão: “Se não vier pelo amor, vem pela dor?” A verdade é que, nem sempre a dor nos aproxima de Deus. “Quando passamos por circunstâncias difíceis, aquilo que cremos é posto em dúvida. A depressão e a dúvida vem juntas. Aprendi a não me julgar, a não julgar os outros e a Deus, quando estou emocionalmente deprimido” (David Yong, Vida e Carreira, 121)

A dor pode também gerar cinismo, incredulidade e desprezo pelas verdades de Deus. Geazi está distante de sua vocação, seu chamado, seu ambiente de fé. Ele se distanciou do povo de Deus.

Millor Fernandes, conhecido e celebrado cartunista brasileiro, foi filho de um espanhol e sua mãe era descendente de italianos. Perdeu os pais quando tinha 10 anos, ele os 4 irmãos ficaram órfãos, vivendo com parentes. Na sua autobiografia ele afirma: “Sozinho no mundo, tive a sensação da injustiça da vida e conclui que Deus, em absoluto, não existia”.

Nem sempre a dor nos aproxima de Deus. Ela pode nos tornar duros, questionadores, amargos e distantes. Não sabemos se Geazi experimentou todos estes reveses espirituais, mas uma coisa o texto deixa claro. Geazi está noutra. Seu ambiente é outro, seus amigos são outros. Se ele fosse membro de uma igreja, diríamos que ele se afastou da comunhão, seus amigos e conversas são diferentes. Deus parece uma remota lembrança no coração daquele que conheceu tão de perto o poder de Deus, e que pela sua disciplina, zelo, cuidado anteriormente demonstrado com as verdades de Deus, foi escolhido por Elizeu para ser o seu ajudante principal, seu discípulo imediato, seu sucessor.

Geazi se perdeu na história. Seu futuro era de profeta, agora é de assessor do rei pagão. Negou sua vocação, chamado, profetismo.

4. Convivência com pessoas que se opõem a Deus, desemboca na perda da simplicidade da fé – Geazi é alguém que conheceu o poder de Deus de forma muito direta, viu muitos milagres acontecerem diante dele, mas sua fé agora encontra-se em crise. Ele perdeu a pureza e a simplicidade da fé.

Tenho visto muitos perdendo a fé simples, de vida de piedade, oração, leitura devocional das Escrituras. Tornaram-se rebuscados e sofisticados na sua forma de crer, perderam a singeleza da vida cristã, agora são “cultos”, ou “enriqueceram”, ou “estudaram”, conversaram com pessoas que colocaram em xeque seus pressupostos quanto à autoridade e inerrância das Escrituras, questionaram a igreja e a necessidade de um compromisso comunitário, e por isto perderam a beleza e simplicidade da fé.

Geazi agora frequenta o palácio, ele não pode se esquecer do que presenciou e testemunhou, mas seria muito bom se alguém chegasse a Geazi e lhe perguntasse: “O que você está fazendo ai?” Onde estão seus amigos de fé, que oravam e buscavam a Deus? Onde estão as experiências genuínas com o Deus de poder que ele conheceu? Seu amigo agora é um rei pagão e idólatra. Ele até fala das coisas que viu, mas será que ainda está vivendo debaixo do impacto destas grandes manifestações de Deus? Seu coração continua firme na graça de Deus? Estaria ele encantado com as coisas de Deus ou só fala delas?

“O que você está fazendo ai Geazi!!!?”

Geazi agora vive do passado de sua fé, que parece algo tão distante da simplicidade e confiança genuína em Deus. Perdeu-se, desencontrou-se.

E você? Como está seu coração? Mantem ainda a pureza e o fogo de Deus queimando no seu coração? Que Deus nos aqueça novamente e nos dê um coração encharcado da sua graça e amor. 

“O que você está fazendo ai, neste lugar, nestes ambientes, tendo este tipo de conversa!!!?”

Conclusão

O encontro do rei Jorão com Geazi demonstra como os iguais se atraem. Vemos aqui o encontro dos desencontrados. Dois personagens bíblicos que estão vivendo longe de Deus.

Não sabemos que fim teve Geazi, como morreu, se voltou ao Senhor, se se arrependeu. Não temos acesso nem informações sobre sua biografia, mas o rei Jorão continuou sua história rebelde a Deus, e assim foi até sua morte. Não se convenceu das histórias que Geazi contava? Não acreditava nelas? Geazi não foi suficientemente convincente ao relatar os feitos de Deus? Teria ele interesse em gerar fé no rei ou apenas contava para ter o que conversar, no meio das rodadas de vinho e comidas?

Estas são respostas que nunca saberemos. Mas o que sabemos é que a morte e a traição que ele experimentou na vida, são descritos na Bíblia como julgamento de Deus sobre sua vida. Provavelmente Manassés tenha sido um rei espiritualmente muito mais danoso para o o povo de Deus que Jorão, mas Manassés se arrependeu e voltou a Deus, buscou o perdão e a restauração, e seu fim foi marcado por quebrantamento e volta a Deus. O fim do rei Jorão foi linear: Sem conversão, sem arrependimento, sem mudança. Ele morreu traído por um dos comandantes de guerra de Israel.

Ex 15.22-27 Águas Amargas



Introdução

A primeira frase do no seu best-seller “The road less traveled” de Scott Peck, é: “A vida é difícil”. De fato, viver é uma aventura. Jim Carrey sarcasticamente afirmou: "Sabe qual o problema da vida real? Ela não tem trilha sonora de ação". 

A vida é marcada por desapontamento. 

Se existe um lugar onde as frustrações e traições estão presentes é na vida. Warren Wiersbe, popular comentarista bíblico, na sua exposição de Filipenses “Be happy” afirma que quatro coisas podem tirar de nós a alegria: 

a) Circunstâncias – nem sempre os acontecimentos são favoráveis; 

b) Coisas – Aquilo que possuímos ou não possuímos e aquilo que nos possui; 

c) Pessoas – Até mesmo os amigos, porque quebram promessas intencional/ ou não; ferem, mentem, enganam, traem; 

d) Pré-ocupação – Isto é, ocupar-se antecipadamente de um problema.

Por isto vale a máxima: Se quiser ficar desanimado olhe para si, se quiser ficar decepcionado olhe para os homens, mas se quiser ter esperança, olhe para Jesus.

No texto lido, o povo de Israel está lidando com uma situação aflitiva. Três dias antes experimentaram um dos maiores livramentos da história do povo de Deus, ao atravessarem, a pé enxuto, o mar vermelho, mas agora estão diante de um novo desafio. Estão no deserto, e falta-lhes água. É bom lembrar que provavelmente, nenhum daqueles homens jamais tivesse atravessado o mar vermelho antes e não conhecia a geografia da região, onde estavam as fontes de água, oásis e poços. A situação deles se torna desesperadora.

Nunca vivi situação como a de Moisés, sendo pressionado agressivamente por um grupo de pessoas. Deve ser uma situação angustiante. Embora ele não fosse “o responsável”, ele era o líder e deveria ter o controle da situação e saber para onde estavam indo. Ele está igualmente perdido, e provavelmente também angustiado, apesar de terem tido uma enorme experiência de livramento poucos dias atrás, o fato é que a vitória de ontem não dava resposta à crise de hoje. Faltava água para o povo e estavam no deserto. 

Desta angustiante narrativa, podemos tirar algumas lições praticas para nossa vida diária:

1. Grandes sucessos podem ser seguidos de grandes lutasMuitas vezes passamos por experiências abençoadas, mas tais experiências não nos livram de novos embates. Muitas vezes sequer somos capazes de evocar fatos que poderiam nos dar esperança, como afirmou Jeremias: “Quero trazer à memória, o que me pode dar esperança”, ou lembramos dela como se fosse um arquivo morto na nossa breve história de vida, já que pouca diferença ela faz no problema que enfrentamos hoje.

Assim foi com Elias. A Bíblia registra que ele desafiou 800 profetas de Baal, e todos vieram para o Monte Carmelo. O povo de Israel havia se desviado, e estava em dúvida quem era o Deus verdadeiro, e Elias os confronta: “Até quando coxeareis entre dois pensamentos: Se Baal é Deus, segui-o; se Yawé é Deus, segui-o”. O teste era desafiador. Aquele que dos céus colocar fogo no holocausto, sem intervenção humana, este é Deus. Sabemos o resultado da história. Se você não sabe, vale a pena ler a história (1 Rs 19).

Elias poderia se sentir um herói, afinal, o livramento foi maravilhoso. Mas o que vemos? Ele ouve a notícia de que a perversa rainha Jezabel o jurou de morte, e ele fugiu para o deserto, entrou numa caverna, num ambiente de profunda depressão e desejo de morrer. Onde está o herói? O homem de fé? Mergulhado numa crise existencial, sem projetos e sonhos. 

Ontem era um herói, hoje um perseguido. Ontem um homem intrépido, hoje sentindo-se fracassado. 

A vida não é muitas vezes assim?

Logo após a maravilhosa vitória do povo de Deus, quando as muralhas ruíram apenas “no grito” e o povo de Deus foi vitorioso numa batalha quase impossível, vemos o povo de Deus sendo derrotado de forma vergonhosa na cidade de Ai. Duas semanas antes: vitória, celebração, festa no arraial. Agora, desânimo, tristeza, morte e luto. 

Observe a vida de Jesus: ao lado de Pedro, Tiago e João, tiveram uma experiência celestial na transfiguração, experimentando um pouquinho do gostinho do céu aqui na terra. Os discípulos gostaram tanto da experiência que não queria sair do monte, queria construir tendas naquele lugar de glória e viverem eternamente em retiro espiritual. O êxtase chega ao fim e eles precisam descer o monte. Ainda inebriados pela experiência de glória, o que encontram ao sair daquele lugar? Um alvoroço de pessoas, e os discípulos emparedados por um jovem que estava endemoninhado, completamente dominado pelo maligno. Saíram de um retiro pentecostal, para entrar num culto de libertação. (Mc 9)

Logo após o derramamento do Espírito, a igreja estava ainda ruminando a maravilhosa manifestação que presenciaram. Devem ter voltado para a casa, envolvidos por esta santa atmosfera, sentindo-se poderosos e invencíveis, mas longo em seguida os problemas começam a se manifestar, e os religiosos e políticos fizeram uma aliança de perseguir a igreja. O derramamento do Espirito é seguido por perseguição política. 

Esta é a grande verdade: Grandes sucessos podem ser seguidos de grandes lutas. Depois de um culto abençoado, você pode encontrar com o diabo em sua casa. 

Por que Deus permite estas coisas? 

O texto lido afirma: “(Deus)... ali os provou” (Ex 15.25). Isto fazia parte da pedagogia e dos propósitos divinos. Ele estava usando estas coisas para ensinar determinadas coisas, avaliar a firmeza da fé do povo de Israel, ver a consistência de seus fundamentos espirituais. Parece que não foram aprovados nesta prova... Não é assim que acontece também conosco?

Gosto do provérbio: “As pessoas são como saquinhos de chá, ninguém sabe o que tem dentro, até que se derrame água quente”. A provação serve para nos dar experiência e nos fazer dependentes de Deus. Não devemos temer a pressão. É ela que transforma o carvão em diamante. 


2. Os maiores serviços são seguidos pelo esquecimentoComo afirmamos, este incidente acontece apenas três dias depois (Ex 15.22) da travessia do mar vermelho. Moisés, que naquela ocasião fora o herói, agora se torna vilão. Saiu de uma situação de exaltação para ameaça e medo. 

Situação semelhante ocorre com Jesus. Uma semana antes do seu julgamento, no domingo de ramos, foi ovacionado pela multidão, que cantava eufórica: “Hosana ao que vem em nome do Senhor!”. Na semana seguinte, a mesma multidão grita enlouquecida: “Crucifica-o! Crucifica-o!”. As pessoas não mais se lembravam dos seus milagres, curas, multiplicação dos pães. Ele era agora um bandido que precisava ser eliminado, persona non grata do povo judeu. 

Líderes, não raramente experimentam momentos de euforia e de acusação de seus liderados. Alguns são quase divinizados, para em seguida, serem acusados de torpezas, equívocos e incompetência. 

Algum tempo atrás conversei com um rapaz que trabalhava numa multinacional. Ele teve ascensão rápida no seu trabalho, executou criteriosamente sua função, foi promovido. Mas ao ser transferido para outro área da sua empresa, os resultados não mais apareciam, ele se desgastou rapidamente com seu chefe e oito meses depois foi demitido. Tudo o que ele fez pela empresa agora não mais o qualificava. Sequer pensaram em muda-lo de posição ou função. 

É mais ou menos assim que se dão todas relações funcionais: performances, resultados, promoções. Se estas coisas não mais aparecem, ou se as circunstancias históricas ou financeiras mudam, os maiores serviços são seguidos pelo esquecimento. Ninguém se lembra mais de quem ele foi, o que fez, os benefícios que trouxe. A humanidade é ingrata. Pastores que se deram pelo campo, se desgastaram física e emocionalmente pelas suas ovelhas, sofrem constantemente disto. Certo pastor desiludido me disse: “Ovelhas não amam seus pastores; pastores é que amam suas ovelhas”. Não sei se esta frase é certa, mas revela um pouco do sentimento deste colega.

3. Grandes aflições frequentemente são seguidas por grandes alegriasO povo se desorientou. Moisés estava acuado e sem capacidade de resolver a situação, mas Deus, novamente intervém e aponta uma solução que estava logo adiante de seus olhos. Moisés corta uma árvore e a joga na fonte, e as águas insalubres se tornaram saudáveis. 

Logo após o incidente, resolvido a questão da sede, os batedores começaram a caminhar pela região e encontraram Elim, um oásis que ficava a 8 km de distância. Para quem estava no deserto, o que encontraram parecia uma miragem celestial. Elim tinha 12 fontes e 70 palmeiras, e naquele lugar, o povo de Deus ficaria um tempo considerável. 

A grande lição é que com Deus, jamais uma desgraça será a última notícia.

Mesmo o sofrimento, pode ter uma dimensão e nos apresentar uma ótica absolutamente surpreendente. Considere, por exemplo, a maravilhosa frase de Isaias, referindo-se ao servo sofredor e ao sacrifício de Jesus: “Ele verá o fruto do seu penoso trabalho de sua alma, e ficará satisfeito; o meu servo, o justo, com o seu conhecimento, justificará a muitos, porque as iniquidades deles levará sobre si” (Is 53.11).

Jesus suportou a cruz de forma tão ousada, porque não via o sofrimento como mero sofrimento. Ele sabia o que aquela cruz poderia fazer na vida daqueles que viessem a crer e entendessem o seu sacrifício. Ele sabia que o sangue que estava sendo derramado era a apólice da vida eterna que Deus concedeu a todos aqueles que viessem a crer em Jesus. Sua morte era o passaporte para vida eterna. O seu sofrimento haveria de trazer paz, reconciliação e vida para todo aquele colocasse inteiramente sua confiança na obra plena e suficiente que aquela cruz providenciaria. 

Sua dor não era mera dor. Como a mulher quando está para dar a luz sente tristeza por ter chegado a hora, mas logo se esquece da dor por ter trazido ao mundo uma vida, assim, grandes aflições são seguidas pela consolação de Deus, trazendo grandes e maravilhosas alegrias. Elim estava a apenas 8 km de distância. A resposta de Deus já deve estar chegando no meio da noite triste e pesada que estamos enfrentando. Deus não permite que seu povo fique parado e inerte diante das aguas amargas. Seus olhos, sempre atentos, permanecem em nós, mesmo quando ele permite que tenhamos que lidar com a secura da alma, porque ele deseja provar nosso caráter e a consistência de nossa fé. 

Conclusão: 

Este texto nos mostra como Moisés reage a esta angustiante situação? Suas atitudes podem se tornar nossas, quando encaramos com fé os problemas para os quais não temos soluções plausíveis: 

i. Moisés clamou ao Senhor – (Ex 15.25). Ele não entrou num quadro de depressão, nem se sentiu vítima das pessoas e das circunstancias, mas correu para seu lugar de refúgio, dirigindo-se ao seu Pai amoroso. Ele “clamou a Deus”. Todo clamor e súplica na bíblia, por definição, é algo intenso. Nós sempre oramos diante das tribulações, mas será que temos intensidade nas orações. A diferença das petições comuns que fazemos e das súplicas é apenas de intensidade. 

Quando nos sentimos incompreendidos e achamos que as pessoas são ingratas conosco, devemos buscar a Deus, de forma intensa, com clamor e súplica. Esta foi a única coisa que lhe veio à mente. O que fazer quando não sei o que fazer? Moisés convida o Senhor para mudar a situação. 

ii. Moisés estava atento à direção de Deus Se você está orando por alguma coisa, fique atento. Se está pedindo chuva, é melhor levar o guarda-chuva na mão. Não raramente oramos mas não temos expectativas do que pedimos. Como Deus respondeu a Moisés? “E o Senhor lhe mostrou uma árvore” (15.25). Deus não criou um fato novo, mas mostrou o já existia. Muitas vezes a resposta às dificuldades estão diante de nossos olhos, mas apenas a sabedoria de Deus poderá trazer discernimento para fazermos o que é necessário e tomar decisões diretas, simples e efetivas, que transformarão situações constrangedoras em bênçãos. 

iii. Moisés aproveitou a intervenção para reorientar o povo ao que realmente interessava. “Deu-lhes ali estatutos e uma ordenação” (Ex 15.25) O ponto não era a dificuldade, mas o poder de Deus. Novas experiências criam novas realidades. Em outras palavras, não saia o mesmo de uma tribulação. Aprenda novas verdades, cresça em maturidade e fé. Atribui-se à C. S. Lewis a seguinte afirmação: “Não desperdice suas lágrimas”. 

iv. Moisés não alimentou mágoa. Não transformou aquela experiência de provocação do povo em uma situação perene de dor e acusação. Não se transformou em vítima, nem ficou ferido pelo que fizeram com ele, e por toda pressão recebida. Muitos, ao passarem por oposição, tornam-se amargos, embrutecidos e críticos. A mágoa olha para trás, a preocupação olha em volta, a fé olha para cima.

Uma das maiores tragédias da humanidade ficou conhecida como “Os Sobreviventes dos Andes”, quando um avião caiu, nas cordilheiras dos Andes, no meio de uma grande tempestade e muitos miraculosamente sobreviveram, mas, à medida que o tempo passava, e não chegava ajuda, as pessoas, para sobreviver, começaram a comer a carne das pessoas que haviam morrido. Um dos aspectos mais lacônicos deste macabro incidente, é que a apenas 9 Km de distância fica um luxuoso parque Balneário. Estavam tão perto, mas ao mesmo tempo tão longe do socorro e livramento, mas nem eles sabiam deste balneário, nem as pessoas que estavam no balneário sabiam que numa curta distância, seres humanos estavam passando por uma terrível provação. 

O relato bíblico nos mostra que Moisés gastou 40 anos pensando que era alguém, 40 anos aprendendo que não era ninguém e 40 anos descobrindo o que Deus pode fazer com um NINGUÉM. Mais uma vez, ele teve que aprender a depender de Deus e entender que “a fé ri das impossibilidades”.

Veja o que diz este verso:

A estrada para o sucesso não é uma reta.
Há uma curva chamado fracasso, um trevo chamado confusão,
Quebra-molas chamados amigos,
Faróis de advertência chamado família e 
pneus furados chamados empregos...

Mas... se você tiver um estepe chamado determinação,
Um motor chamado perseverança
Um seguro chamado fé e um motorista chamado Jesus,
você chegará ao seu porto Seguro.




quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Ef 4.1-4 Ande de Modo digno


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Até o capítulo 4, a carta ao Efésios é predominantemente doutrinária. Daqui em diante, Paulo sai da exposição para a exortação. Do indicativo (Deus fez) para o imperativo (devemos fazer),  dos pressupostos teológicos para as implicações práticas. “No capitulo 3 Paulo é pioneiro em divulgar tão grande mistério, que tem suas repercussões até entre os poderes do mal... chegando agora ao capitulo 4... chama a, individualmente reconhecermos nossa parte neste novo homem, ou corpo de Cristo” (Shedd, pg 59).
Isto nos mostra que Deus nunca exige antes de dar de si mesmo. Até este texto a Bíblia nos ensina o aspecto teológico; daqui para a frente, o aspecto ético. Paulo não tem preocupação moralista, senão de levar os cristãos à maturidade. “Quando um homem entra em qualquer sociedade, ele assume a obrigação de viver certo estilo de vida; e se ele falha nestas obrigações, e adoece tal sociedade e traz descrédito para seu nome” (Barclay, 135)

No capítulo 4 são desenvolvidas cinco linhas:

A. Nosso caráter e conduta - vs. 1,2
B. A unidade da fé - vs.3-6
C. A diversidade dos dons - vs. 7-12
D. A maturidade da vida cristã - vs. 13-16

Queremos destacar aspectos desta caminhada:

1. A vida cristã é uma vocação
Vocação é mais que tendência, é compulsão. Não se trata de profissão, mas de chamado. Quando temos interesses, motivos, desejos e vontade, tudo passa a girar em torno daquilo que mobiliza o coração. Vocação atrai, como o tropismo (o inseto para a luz, ou da planta que se volta em direção ao sol). Teologicamente nossa relação com Deus é chamada de "vocação eficaz". Vocação é algo que nem sempre a pessoa determina, pode ser que inicialmente a ideia se torne até motivo de rejeição, mas depois começa a fazer sentido, e encharca a vida, Assim é a vocação divina.
Rev. José Borges dos Santos Jr procurava fazer uma diferença entre profissão e vocação afirmando que "profissão é secular, vocação é divina !" Neste sentido, todos temos uma determinada profissão, mas vocação, apenas uma.

2. A vida cristã evidencia-se pela dignidade
Rev. Eudaldo Silva Lima, na posse do pastor da Igreja Presbiteriana do Lago Sul em Brasília, nos idos de 1987 afirmou:  "A vocação pastoral anda meio desmoralizada". A ausência de consciência vocacional gera vexame, leva as pessoas a questionarem o evangelho, em alguns casos, vivemos um cristianismo tão desautorizado que começamos a ter vergonha de declarar que somos cristãos. Qual é a herança, o nome que temos legado aos nossos filhos? Houve época em que ser evangélico era motivo de respeito, integridade, hoje de questionamento. Um pastor era respeitado e honrado, sóbrio e honesto, hoje é identificado com charlatanismo, engodo e mentira. Como temos forjado atualmente o nome de Cristo?
Neste texto aprendemos que devemos andar de modo digno da vocação cristã. Temos um nome a zelar, e este nome é de Jesus, nosso Senhor.
Quando criança morei na cidade de Gurupi-TO, e havia um homem muito querido, mas com uma vida de auto destruição pelo alcoolismo. Ele perdia o senso do ridículo quando estava dominado pela bebida, dormia nas calçadas, e andava com as roupas toda suja e fedida, mas quando estava sóbrio, era trabalhador e respeitoso, mas o álcool estava roubando dele toda dignidade. Meu pai e ele eram xarás, tinham o mesmo nome, meu pai gostava muito dele e tentava ajudá-lo, às vezes dando comida e roupa, conversando e aconselhando. Um dia ele disse ao “Jonas bêbado”, como era chamado: “Jonas, assim não dá, temos o mesmo nome, e você precisa mudar. Então, decida: ou você muda de nome ou muda de vida”. Acho que é assim que Deus muitas vezes olha para o povo que se chama pelo seu nome: “Ou mudem de nome, ou mudem de atitude”.
Existe uma dignidade inerente ao povo cristão, e esta dignidade deve ser preservada.

3. A dignidade evidencia-se pelo estilo de vida. Cinco atitudes cristãs tornam-se as colunas desta vida digna: Humildade, mansidão, longanimidade, mútua tolerância e unidade no Espírito.

  1. Humildade - Humildade não é modéstia (embora muitas vezes possa estar associada), e  nem pobreza. Certa vez, o famoso filósofo Sócrates, que gostava de se vestir bem, encontrou-se com  Antístenes, um filósofo que defendia a virtude da pobreza e andava maltrapilho, e tiveram um debate, no qual afirmou:  "Posso ver o teu orgulho, pelo buraco de teus mantos".
A falsa modéstia, servilidade, subserviência, comodismo e abnegação, podem se tornar poderosos instrumentos de manipulação e pretensa virtude, mas é bom lembrar que a maioria delas é fraqueza, não algo para ser exaltado, são falsas evidências de humildade. Jesus não proclamava sua humildade, embora vivesse um estilo de vida simples. Podia ser rei, mas optou por ser servo. Humilhou-se a si mesmo, abriu mão de prerrogativas pessoais, reconhecia a dignidade e valor de outras pessoas e abria espaço para elas.

  1. Mansidão – A palavra grega é “prautes”, que poderia ser traduzida por suavidade dos fortes, de quem poderia esmagar pela sua força, mas prefere mantê-la sob controle. Originalmente pode ser traduzida por “aquele que se torna útil”. Era usado para cavalos selvagens, fortes e brutos, mas que era domados e agora, apesar da força que possuíam, eram usados para o serviço, deixavam de ser indomáveis, selvagens, para ajudar. “um animal que foi treinado e domesticado até o ponto em que ele está completamente sob controle. Portanto, é o homem que tem todo seu instinto e controle sobre perfeito controle”(Barclay), ou como afirma Foulkes: “O homem que é manso não reivindica sua própria importância ou autoridade”( Foulkes, 91).
Barclay sugere que a palavra grega traz a ideia de ser um cavalheiro, já que Aristóteles afirma que esta é a virtude que fica entre dois extremos. Um homem com esta virtude é alguém que pode se irar em determinado momento mas nunca fica irado no tempo errado.

  1. Longanimidade -  A palavra original é “makrothimia”, uma palavra composta de “makro” (grande ou distante), com “thimia” (ira). Portanto, a palavra se refere à capacidade de lidar com a  ira, colocando-a bem longe. Esta é uma das virtudes de Deus, que é longânimo com o pecador, não tendo pressa em julgá-lo, mas desejando que ele se arrependa e abandone seu erro.

Deus não se apressa em retaliar o pecado, a vingar imediatamente. Muitas vezes achamos Deus indolente, por não julgar imediatamente o mal, mas a ira de Deus não é uma ira emocional. "Nao retarda o Senhor a sua promessa, como alguns a julgam demorada, pelo contrário, ele é fiel, não querendo que ninguém se perca" (2 Pe 3.9) Ele não reage às provocações dos homens, ele vai julgar, a seu tempo, todas as coisas, mas não é alguém explosivo e iracundo. “É a atitude de espirito que suporta insulto e injúria sem amargura e reclamação. É o espírito de quem pode sofrer maus tratos de pessoas desagradáveis com graça e tolos sem, sem irritação” (Barclay, 139)
A Bíblia demonstra como Deus é longânimo no episódio dos amorreus. Ele antecipa a Abraão que sua descendência será levada cativa, mas afirma que voltaria à terra prometida e assumiria aquele lugar como sua herança afirmando: "Porque não se encheu ainda a medida da iniquidade dos amorreus" (Gn 15.15). Não é curioso? Só depois de 400 anos de cativeiro, os iníquos amorreus seriam julgados e despojados de sua terra. Deus não exerceu imediatamente o juízo. Sua ira e justiça virão no tempo certo. Assim é a ira de Deus.
A vocação cristã é caracterizada por esta capacidade de não reagir às provocações, a não agir com impulsividade e carnalidade.

  1. Tolerância em amor  - Esta é outra qualidade inerente à vocação cristã. Quando Cristo está presente, ele nos ensina a amar, até mesmo aqueles que são amistosos e provocativos. “Significa ser clemente com as fraquezas dos outros, não deixando de amar o próximo ou os amigos devido àquelas suas falas ainda que, talvez, nos ofendam ou nos desagradem” (appud, Foulkes, 91)

Nem sempre é fácil tolerar. Muitas vezes sentimos a vontade de gritar: “Ai minha senhora do chuveiro, dá-me resistência!” Ou como o resignado que falou: “tô que nem chuveiro queimado : nem ligo e quando ligo nem esquento!” 

  1. Preservar a unidade do Espírito – Esta é a última característica desta vida digna de Deus. Ela se evidencia pela constante luta pela unidade do Espírito.
Existem algumas coisas muito importantes neste texto:
Primeiro, precisamos diferenciar unidade e união. A Bíblia não está falando de laços externos, de vínculos associativos como numa agremiação ou clube, mas coisas do coração. A Bíblia está falando de unidade, algo que brota no coração, atinge o âmago do ser, gerada pelo Espirito de Deus.
Em segundo lugar, preservar, não é criar . O texto não exorta os crentes a criar a unidade, mas, preservá-la. Só se preserva o que já existe. A unidade é obra do Espírito Santo, nunca dos homens, nossa função não é produzi-la, mas lutar para que ela seja mantida.
Terceiro, há necessidade de diligência. O texto diz: "esforçai-vos diligentemente por preservar a unidade do Espírito". Isto sugere que a unidade da igreja sempre enfrenta obstáculos e várias razões podem gerar tal crise:
            a. As pessoas podem interpretar os fatos de forma distinta;
            b. As pessoas podem fazer afirmações verdadeiras de forma desamorosa;
            c. A ação satânica, que sempre procura dividir o povo de Deus.

Entretanto, como povo de Deus, precisamos estar atentos a isto e lutar pela unidade.
Igrejas muitas vezes sofrem divisões e enfrentam disputas, resultantes da vaidade, orgulho, desejo de proeminência, e dificuldade de perdoar o erro do outro. Muitas vezes interpretamos equivocadamente as situações, falamos descaridosamente, ou falam desta forma conosco. É preciso lutar para manter a paz que o Espirito Santo tem criado.

Conclusão:

Paulo tenta lembrar à Igreja de Efésios a sua vocação/identidade. Quem eram em Cristo, povo amado, redimido, comprado pelo sangue do Cordeiro.
talvez a identidade perdida do povo de Deus seja, ainda hoje, um dos problemas centrais da espiritualidade cristã. Você sabe sua identidade? Como Deus o vê?
No filme "O rei Leão", temos o relato de um pequeno rei que precisa fugir de sua terra depois da morte de seu pai. Ele foi injustamente acusado, e para salvar sua pele, agora vai para lugares distantes de sua terra. Ali encontrou dois hilários personagens: Pumba (um javali, atabalhoado), e Timão (um suricata bagunceiro). Eles se tornam seus amigos, e os três começam a se meter em confusão e a comer insetos. Passam o dia inteiro sem propósito, e cantando "Hakuna matata", mas um dia um fato novo acontece. Rafiki (o macaco místico) se apresenta ao pequeno rei Leão, para lembrar-lhe de quem ele era e de suas responsabilidades. no primeiro diálogo, espantado, o leãozinho pergunta: "quem é você", e Rafiki responde: "A questão não é quem eu sou, mas quem você é". Retomado a consciência de sua identidade, ele volta para sua terra para livrar seu povo da opressão e das trevas.
muitas vezes perdemos a noção de nossa identidade de filhos amados, herdeiros com Cristo, e da vocação e identidade que temos. 
Quando soubermos, realmente, da verdadeira identidade, passaremos a nos comportar como povo santo, real, propriedade valiosa e exclusiva de Deus. Tudo é questão de identidade e vocação.

Preparado:
Igreja presbiteriana da Gávea. 1991.
Refeito, Anápolis, 2016

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

2 Rs 1.17 Deus, meu inimigo!


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Introdução:

Um dos problemas mais recorrentes e que aflige profundamente a raça humana é a mania de ver Deus como inimigo ao invés de aliado.

A relação de desconfiança com Deus é adâmica, faz parte da raça humana, por isto Satanás não encontrou muita dificuldade em convencer Adão a desobedecer a Deus:
- Ele afirma que “Deus estava mentindo”- Ele construía seu universo em cima de falsas afirmações;
- Ele afirma que Deus estava mal intencionado - Ele, na verdade, não queria que o homem comesse do fruto do conhecimento do bem e do mal porque "sabia" que no dia em que o comesse, tornar-se-ia, como ele, conhecedor do bem e do mal.
- Ele insinua a Adão que Deus regia seu universo tiranicamente, querendo ser "o único", apenas para ter o domínio das coisas.
- Satanás sugere que Deus estava mau intencionado.

Adão não questionou nem confrontou o diabo, antes foi facilmente convencido de suas afirmações luciféricas, porque de alguma forma, isto já estava sutilmente presente em seu coração, fazia parte de sua gênese. Deus era opositor, não amigo.

No segundo livro de Reis, durante o ministério de Eliseu, que era do reino do Norte, o rei Jorão desenvolve contra Deus um explicito senso de antagonismo e oposição. Ele sempre via Deus como alguém querendo conspirar contra ele. Deus era inimigo, não companheiro; opositor, não aliado. Deus era o desmancha prazer. Ele não era “ateu”, ele cria em Deus. Seu problema não era falta de fé, pois ele sabia da existência de Deus. Seu problema era a desconfiança no caráter de Deus. Ele via Deus como antagonista.
Jorão nasceu numa família espiritualmente complicada, filho de Acabe e Jezabel. Esta mulher tinha fortes opiniões e era controlada por uma certa entidade espiritual cujo nome era Baal. Seu marido era rei, mas quem dava as cartas era sua mulher. Ela orientava, sugeria, intervia nas questões do estado, e ele sempre acatava sua palavra. Nenhum casal conspirou tanto contra o Deus de Israel quanto este. Ela era estrangeira, filha de Etbaal, rei dos sidônios, e ao se casar com Acabe, trouxe consigo, os símbolos, ritos e elementos do culto pagão que ela aprendera na suta terra natal. Por sua força politica conseguiu construir um altar em Samaria (1 Rs 16.31), e também por sua influência, muitos abandonaram o Deus verdadeiro para seguir esta entidade, e o culto a Baal se tornou popular, muitas pessoas aderiram.
O Reino do Norte, formado pelas 9 tribos dissidentes de Jerusalém entrou numa profunda decadência espiritual. Elias era o profeta daqueles dias e os embates espirituais entre o deus falso e o Deus verdadeiro, tornaram-se violentos, incluindo aquele que deflagrou a batalha de Elias contra os sacerdotes de Baal no Monte Carmelo, quando Deus se manifestou mandando fogo do céu. Naquele dia, 850 profetas de Baal foram desafiados por um único profeta, e morreram (1 Rs 18.19).
Com a morte de Acabe, seu filho Acazias assumiu o trono, mas por um tempo muito curto. Ele sofreu um grave acidente, caindo ao cair da janela de um quarto, e na busca por cura, decidiu enviar um grupo de mensageiros aos sidônios, onde ficava o quartel general do culto a Baal-zebube, cuja tradução mais provável seria “o deus das moscas”, para que estes deuses lhe fossem favorável. A intervenção de Elias foi dura. “Acaso não existe Deus em Israel para que busques outros deuses pagãos?”. Acazias morreu logo em seguida, e Jorão assumiu seu lugar. É sobre este rei que queremos refletir. Sua mãe, Jezabel, ainda vivia.

Jorão aparece neste contexto complexo. Mãe idólatra e sacerdotisa de Baal, um pai sem muitas convicções, e o irmão adorador de baal-zebube. Ele rejeita o Deus de Israel e ainda o hostiliza. A Bíblia afirma que satanás é “o adversário de nossas almas”, mas para Jorão, seu adversário é o Deus de Israel. Jorão o coloca sob suspeita. Todas as coisas ruins que lhe acontecem, e as que ele acha que vão acontecer, ele sempre responsabiliza e culpa Deus.
Sua vida é uma boa forma de entendermos sobre o que acontece quando achamos que Deus é opositor? Veja alguns sinais que surgem quando transformamos Deus em nosso inimigo pessoal?

Primeiro, quando transformamos Deus em nosso inimigo, nós o culpamos até pelos erros que cometemos.
Em 2 Rs 3.4ss, quando surge o conflito entre o Reino do Norte com os moabitas, Jorão alia-se com Josafá, Reino do Sul (Judá), para irem à guerra. A estratégia deles não parece ter sido muito boa, porque no meio da viagem, depois de sete dias da caminhada,  são surpreendidos com uma situação fatal: não há agua nem para os soldados, nem para os animais. A situação se torna desesperadora. Não nos parece ter sido um erro de planejamento? Ao lermos o texto temos a impressão de que não estudaram bem a região, nem as necessidades e desafios que teriam, e por isto encontram-se agora nesta situação de risco. Na verdade o erro deles foi estratégico. Esta, portanto, deveria ser uma hora de reconhecerem que não avaliaram bem seus próprios erros. Entretanto, o que faz Jorão? Ele culpa a Deus!
Então disse o rei de Israel (Jorão):
Ai! O Senhor chamou a estes três reis para os entregar nas mãos de Moabe”
(2 Rs 1.10)

Deus não era o culpado, mas Jorão vê nisto uma “armadilha” de Deus, segundo ele, Deus teria criado esta situação caótica para os humilhar e eles morrerem. Contudo, ir para o deserto exige planejamento, e sair com um exército exige ainda mais. Jorão não admite que o erro era dos reis e comandantes, mas prefere acusar sutilmente a Deus.

A palavra de Deus mostra como isto acontece:
"A Estultícia do homem perverte o seu caminho,
mas é contra o Senhor que o seu coração se ira""
(Pv 19.3)

Não é assim que fazemos? Culpamos a Deus, mesmo quando somos os responsáveis pelas trágicas consequências. Estamos com raiva de Deus.
Certa vez fui procurado por uma jovem que estava muito sofrida. Ela tinha perdido seu namorado, e no mesmo acidente morreram ainda duas meninas e um amigo dele. Ela estava furiosa com Deus, queria que eu respondesse seus questionamentos. E já aprendi que não tenho de justificar a Deus, nem tenho respostas aos seus insondáveis mistérios e planos. No final a abracei, deixei-a desabafar, oramos e não disse muita coisa. Posteriormente soube, porém, que todos os quatro ocupantes do carro estavam bêbados, e que as duas garotas eram meninas de programa, dirigindo em alta velocidade pela BR. Continuei ainda com dor pela situação trágica, pela dor da família e amigos, mas este era, certamente, um quadro visível de pessoas que quebraram todas as regras básicas da vida, mas que agora se levantavam contra o Senhor.
Eles sequer consultaram a Deus para saber se deveriam ir. Mesmo Josafá, um dos reis presentes, que era piedoso, sugeriu que buscassem a Deus. Eles tomaram seus caminhos por decisão pessoal, sem saber o que Deus pensava sobre o assunto. Seus projetos humanos agora seguem a rota do fracasso, mas Deus, na visão do rei, é o culpado.

Como é comum, ainda hoje, vermos estas mesmas atitudes presentes.

As pessoas fazem maus negócios, namoram e se casam, sem nunca terem buscado a direção de Deus, não oram e depois, quando as coisas dão errado, culpam a Deus. São negócios irresponsáveis, sem cuidado e planejamento, dívidas e alianças assumidas sem a orientação de Deus, e quando as coisas não dão certo, culpam a Deus, achando que ele é o culpado. Nós o desobedecemos e ainda o culpamos, somos infiéis e mesmo assim não relutamos em acusá-lo.
Neste texto, apesar de todos os erros e acusações feitas, Deus ainda é quem os socorre. O texto mostra a irritabilidade do profeta com aquele rei arrogante e ímpio, quando este o procura, Eliseu é duro na sua abordagem, porque o rei se aproxima ironizando e acusando a Deus (2 Rs 1.13), mesmo assim, por causa de sua misericórdia, Deus responde e intervém miraculosamente socorrendo o povo que estava perto de morrer agonizantemente sem água.

Em segundo lugar, quando colocamos Deus como inimigo, somos incapazes de considerar com gratidão e louvor, os feitos evidentes de Deus.
Em pelo menos duas situações, Jorão vê a clara e maravilhosa intervenção de Deus, que redunda em libertação para sua vida, mas ele não glorifica a Deus por isto, ele joga estes dados para um arquivo morto de sua memória e ignora a obra de Deus.

A.     Jorao vê a intervenção de Deus no deserto, mas isto não muda sua visão, nem o transforma em um adorador (2 Rs 3.4-20). Era a hora dele dizer: “Agora vejo que o Deus de Israel tem poder”. No entanto, não há nenhuma evidência no texto que ele tenha percebido isto. Não o vemos adorando ou agradecendo.

B.     Jorão vê a intervenção de Deus na cura de Naamã, mas isto não o muda nem gera conversão.

Naamã é o poderoso comandante do exercito da síria, que procura o rei por causa de sua lepra. Ele se vê num conflito internacional e entra em desespero, rasgando as vestes, achando que este incidente diplomático era um pretexto de Ben-Hadade para guerrear contra ele. Eliseu intervém, resolve o problema, certamente Jorão viu o desdobramento desta história, mas isto não o aproxima de Deus.

Esta é a mesma realidade até nossos dias.
Quando consideramos Deus nosso adversário, fechamos os olhos para as realidades espirituais mesmo quando algo maravilhoso se dá entre nós. Na verdade, sinais e prodígios tem pouco efeito para gerar fé. Pessoas obcecadas por sinais geralmente são incrédulas, quer tenham um background religioso ou não. O povo de Deus no deserto viu mais milagres que qualquer outra geração, mas continuou sendo rebelde e obstinada contra Deus.
Jesus censura veementemente duas cidades que em seus dias presenciou milagres portentosos, mas ignorou a obra de Deus: “Passou, então, Jesus a increpar as cidades nas quais ele operara numerosos milagres, pelo fato de não se terem arrependido: Ai de ti Corazim! Ai de ti, Betsaida! Porque se em Tiro e em Sidom se tivessem operado os milagres que em vós se fizeram, há muito que elas se teriam arrependido com pano de saco e cinza. E, contudo, vos digo: no dia do Juízo, haverá menos rigor para Tiro e Sidom do que pra vós outras” (Mt 11.20-22).
Quando Deus se torna suspeito, nos tornamos incapazes de perceber sua manifestação, e isto nos impede de o adorarmos. Os franceses afirmam que “gratidão é a memória do coração”. Se o coração não se lembra, não há gratidão, nem adoração, nem louvor.

Terceiro, Quando colocamos Deus sob suspeita, passamos a hostilizar seus servos – A Síria estava sempre em guerra contra o povo de Deus naqueles dias. Ben-Hadade decidira tomar e saquear Samaria, e para isto usou uma arma letal: fez um cerco à cidade, impedindo que qualquer pessoa entrasse ou saísse.
A lógica é simples. Ao invés de guerrear tentando quebrar os muros, o que sempre trazia grandes baixas ao exército, fazer o cerco era mais demorado, mas eficaz. Uma cidade fortificada não é auto sustentável, não possui auto subsistência, e os estoques de comida acabam rapidamente. Por isto, logo a cidade de Samaria viveria uma situação calamitosa, a ponto de uma mulher comer seu próprio filho (2 Rs 6.28-30). Diante deste horrendo quadro, o rei ficou com raiva de quem? De Eliseu, o profeta, a quem responsabilizava pela dramática situação, e por isto o jurou de morte (2 Rs 6.31). O que tinha o profeta a ver com isto? Nada. A situação chegou a este ponto por causa da infidelidade do povo de Israel, era juízo de Deus. O problema do rei só seria resolvido com o próprio Deus.
Ao invés de arrependimento, ele desenvolveu raiva contra Elizeu.
Assim acontece com pessoas iradas contra Deus, elas hostilizam seus servos. Já sofri expressões de raiva simplesmente por ser pastor. Pessoas já me rejeitaram, desprezaram e ignoraram, simplesmente por ter a função ou ofício pastoral. De alguma forma nos transformam em para raios. Nada podendo fazer contra Deus, resolvem fazer contra aqueles que são “seus representantes”.

Quarto, quando Deus é considerado inimigo, cria-se uma relação constante de suspeita contra ele
Em 2 Rs 6.33 vemos um desabafo do rei diante da dramática situação e crise politica que seu governo enfrenta: “Eis que este mal vem do Senhor, que mais, pois, esperaria eu do Senhor?”

Conseguem ver o que ele está afirmando?
“De Deus eu só posso esperar o mal”.

Durante algum tempo em minha vida tive uma relação de suspeição com Deus. Todas as vezes que as coisas estavam bem, eu ficava imaginando que algo de ruim poderia acontecer à minha vida, e que as coisas não continuariam boas como estavam. Um dia considerei no meu coração: “Por que vivo sempre esperando e aguardando o pior?” E cheguei à conclusão de que se tratava de uma suspeita de Deus, que foi bem definida por uma querida ovelha: “Nosso problema não é que não apenas não confiamos em Deus, mas que desconfiamos de Deus”.
Por que esperar o mal de Deus?
Por que antecipar que algo vai dar errado quando tudo tem sido tão abençoador?

A esposa de Jó experimentou isto de forma clara na sua vida. Diante da tragédia família, vendo ainda o sofrimento de seu marido, ela chega perto dele e diz: "ainda conservas a tua integridade? Amaldiçoa a Deus e morra!"  Mas Jó lhe respondeu: Falas como qualquer doida. temos recebido o bem de Deus e não receberíamos também o mal? Deus deu, Deus tirou, bendito seja o nome do Senhor" (Jó 1.9-10). 

Conclusão:

Dois detalhes interessantes:
1. Jorão é inimigo de Deus, mas gosta de ouvir falar sobre Deus - Não é curioso? Veja o que acontece em 2 Rs 8.4. Ele tem interesse nas coisas espirituais. Não gosta de Deus, mas mantém uma certa "admiração por Deus".
Neste texto vemos Geazi no palácio para falar das coisas sobrenaturais que ele vira.
lembra-se do Geazi?
"Pardal que quer acompanhar João de barro vira auxiliar de pedreiro". 
Ele conseguiu o que queria. Sua ambição não era ter vestes festivais e olivas? Ele agora se sente importante na presença do rei, mas qual a relevância disto?
Seu corpo está condenado, e sua alma corre sério risco por ter se entregue à cobiça.
Fico pensando se não é assim a vida?
Aspiramos coisas, desejamos glória, popularidade, honra, e vendemos a alma para isto.
No Salmo 106.15 lemos: "Deu-lhes (Deus) o que queriam, mas fez definhar-lhes a alma". Muitas vezes temos o que desejamos, mas isto é bom?
Este desejo que hoje devora sua alma, pode destruir você. Eventualmente ele será atingido, mas a que preço? Você o terá, mas será leproso!
Pois bem, Jorão tem interesse nas coisas de Deus: " Ora, o rei falava a Geazi, moço de Deus, dizendo: conta-me , peço-te, todas as grandes obras que Eliseu tem feito" (2 Rs 8.4), E Geazi relatava os milagres portentosos de Deus. Lamentavelmente, tais informações não mudavam o coração do Jorão idólatra. Seu interesse era pura curiosidade, mas ele, de fato, não se interessava pelas coisas de Deus. Por isto continuou distanciado de Deus até sua morte.
Isto pode acontecer conosco.
interessados, por mero diletantismo, das verdades de Deus; curiosos das coisas espirituais, mas lamentavelmente longe de Deus. o texto demonstra que o rei Ben-Hadade, pagão, tem maior respeito por Eliseu que Jorão, que presencia os fatos sobre Deus. Tanto que aquele rei vem consultar Eliseu acerca de sua vida (2 Rs 8.7). Jorão, entretanto, nunca se dirigiu a Deus a não ser ameaçadoramente e com hostilidade.

2. A resistência e oposição de Jorão lhe custou caro - Sua resistência trouxe juízo sobre si e atingiu severamente a sua casa. Ele tanto se opôs a Deus que este suscitou um capitão chamado Jeú, que não somente o traiu, mas exterminou todos os setenta filhos do rei, (2 Rs 10.1-14), e à sua danosa mãe (2 Rs 9.30,31). Jeú encerra em Samaria, o culto a Baal, matando todos os sacerdotes do deus-das-moscas, destruindo seus templos e altares (2 Rs 10.18-31).


Antes de concluir, gostaria de trazer três palavras finais:

A. Para pessoas quebradas e trituradas pela dor e tragédia - Não tente explicar a dor, nem justificar a Deus. Sei que Deus é amor, mesmo quando a tragédia me abate, mas não sei o porquê, os motivos dos incidentes doloridos e caóticos. Sei que ele é bom, ele é Deus.

B. Grandes crises contra Deus quase sempre revelam fé - Ateísmo quase sempre não é falta de fé, mas uma visão distorcida ou equivocada de Deus. O ateu, em muitas situações, não é aquele que não crê, ele reconhece a divindade. Na verdade, muitos ateus são a-teus, isto é, contra Deus, já que o prefixo grego indica oposição. Jorão não era ateu. Era contra Deus. Do tipo de pessoa que implicitamente está dizendo: "Eu creio em Deus, mas não coloco nele a minha confiança, desconfio dele, e o odeio!". Você não pode ser contra alguém que não existe, nem odiar um ser não-existente. Pense nisto!

C. Deus entende e restaura corações quebrados - Acometidos pela tristeza, ira, raiva contra ele, engolidos pela dor. Deus entende o que é dor, porque ele mesmo viu seu Filho se agonizar na cruz, dizendo: "Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?". A Bíblia afirma que Jesus é o sumo sacerdote que pode se compadecer de nós, porque ele também experimentou oposição, martírio, violência e até mesmo o abandono de Deus. Jó passou pelas grandes perdas de sua vida, mas no final consegue dizer de forma absolutamente majestosa: "Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te vêem!".

Quando você estiver vivendo numa situação semelhante, vale a pena ler para você mesmo, talvez em voz alta, quem sabe se olhando no espelho, a seguinte afirmação:

Eu creio que verei a bondade do Senhor na terra dos viventes.
Espera pelo Senhor, tem bom animo, e fortifique-se o teu coração;
Espera, pois, pelo Senhor” (Sl 27.13-14).


Quanto a mim, decidi:
Não vou mais esperar o mal. Não desconfio de Deus. O Senhor é meu refugio e fortaleza Ele é fiel, e não pode negar-se a si mesmo, não pode deixar de ser fiel porque se fizesse isto deixaria de ser quem ele é. Sua fidelidade vai de geração a geração, preciso aprender a discernir as sementes adâmicas e luciféricas de minha suspeita e rejeitá-las, para que eu não tenha que atribuir a Deus todas as experiências negativas que me acontecem, e mesmo quando a tragédia se abater, entender que ele é santo e amoroso. Deus não brinca com a minha dor, não está jogando dados com minha vida.