segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

João 4:19-24 Quebrando Paradigmas




Introdução:

Muitas pessoas encontram dificuldade em ler o Antigo Testamento. É natural que isto aconteça, até que a gente se acostume com a linguagem empregada, mas acima de tudo, descubra a “pista hermenêutica” que nos ajuda a entender e aplicar as verdades ali contidas. A dificuldade eventualmente é tão grande que certo garoto, vendo os relatos do AT e comparando-os com o NT, perguntou ao seu pai: “O Deus do Antigo Testamento é o mesmo do Novo?”. Diante da afirmativa, declarou: “Então ele deve ter se convertido”.
Por isto, ao lermos o AT, precisamos entender um princípio simples: O AT está patente no NT e o NT está latente no AT. Ao lermos a antiga aliança, precisamos entender que tudo aquilo era paradigmático, e apontava para a Nova aliança. Os sacrifícios apontam para Jesus, as oferendas e holocaustos contém princípios que devem ser entendidos à luz do Novo Testamento. O Livro de Hebreus é um livro que nos ajuda a interpretar corretamente o AT. O autor desta carta afirma que a velha aliança era sombra das coisas presentes (Hb 10.1).
A função primordial de Cristo foi se manifestar como o cumprimento das profecias e se identificar com as promessas. Por isto existem mais de 600 profecias no AT apontando para a figura de Cristo, algumas com detalhes impressionantes da sua morte. Para que uma nova roupagem teológica acontecesse, Jesus teve que quebrar alguns paradigmas que estão na mente dos rabinos e do povo judeu. Existem dois livros que podem nos ajudar sobre este assunto. O primeiro, Adoração no Novo Testamento, de autoria do Dr. Russel Shedd; o segundo, escrito de forma menos teológica e mais pastoral é “Quebrando paradigmas”, do Ed René Kivitz. Se quiser aprofundar o assunto, vale a pena checar.

Este texto nos fala de pelo menos dois paradigmas que Jesus quebrou: Sobre o local de adoração, onde Deus deveria ser adorado; e a questão do tempo: quando Deus deveria ser adorado. Além destes paradigmas, queremos analisar dois outros aspectos que formam a espinha dorsal do AT: O Sacrifício e o Sacerdócio.

O texto narra o encontro de Jesus com uma mulher samaritana. Ela fazia parte de um pequeno grupo étnico-religioso aparentado aos judeus que habitavam na região onde hoje fica a Cisjordânia. Designavam-se a si próprios como Shamerim o que significa "os observantes" da Lei. Suas convicções baseavam-se no Pentateuco assim como o judaismo, mas  ao contrário deste, rejeitavam a importância religiosa de Jerusalém. Os samaritanos não possuiam rabinos e não aceitavam o Talmude dos judeus ortodoxos, e estes consideravam-nos descendentes de estrangeiros, que teriam adotado uma versão adulterada da religião hebraica; como tal, recusam-se a reconhecê-los como judeus ou até mesmo como descendentes dos antigos israelitas.

Esta mulher adúltera, faz uma pergunta que estava presente nas questões teológicas da época: Onde adorar? “Nossos pais adoravam neste monte; vós, entretanto, dizeis que em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar” (Jo 4.20). Ainda hoje, a questão da forma, locais sagrados, modelos litúrgicos, são amplamente discutidos por muitos grupos. Como Deus deve ser adorado?

O tema da adoração sempre está presente nas páginas do AT e NT. Existe um “jeito” de adorar que agrade a Deus? Deus não rejeitou a adoração de Caim? Rejeitou os adoradores descritos no livro de Isaias e Amós? Paulo não adverte para um grupo cristão que a reunião deles era “para pior, e não para melhor”? (1 Co 11.17).
O sistema de adoração do AT e do NT possuía 4 pilares: Sacrifício e Sacerdócio, Templo e Tempo. Mas a forma como tratam destas questões sofre uma alteração profunda entre um e outro. Vejamos como as abordagens são diferentes:

Sacrifício – Como eram os sacrifícios do AT e como são no NT?

O sistema de sacrifício do Antigo Testamento era montado em cima da expiação. Um animal deveria morrer para que acontecesse a purificação. Quando Jesus foi levado para o templo, seus pais, por serem pobres, levaram o sacrifício de um par de rolas ou de dois pombinhos, conforme prescrevia a antiga aliança, e viram o sacerdote ofertando estas aves conforme os preceitos da lei (Lc 2.22-24).

O autor aos hebreus afirma que “Com efeito, quase todas as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue; e, sem derramamento de sangue, não há remissão” (Hb 9.22). Por esta razão, quando abrimos o livro de Êxodo e Levítico, vemos diversas formas de sacrifício, e excetuando as ofertas pacificas que eram feitas com ofertas de sementes e grãos, toda oferta pela expiação e culpa, eram feitas com sacrifício. Por isto há sempre a presença de sangue nos sacrifícios, e não eram pouco sangue. Muitos animais eram mortos em algumas cerimônias ou dias de festa.

Deus ordenou que Israel  executasse inúmeros sacrifícios diferentes. O animal tinha que ser perfeito; a pessoa que estava oferecendo o animal tinha que se identificar com ele. Então, a pessoa oferecendo o animal tinha que infligir morte ao animal. Quando feito em fé, esse sacrifício providenciava perdão dos pecados. Outro sacrifício no dia de expiação, demonstra perdão e a retirada do pecado (Lv 16). O grande sacerdote tinha que levar dois bodes como oferta pelo pecado. Um dos bodes era sacrificado como uma oferta pelo pecado do povo de Israel (Lv 16.15), enquanto que o outro bode era para ser solto no deserto (Lv 16.20-22).

Por que, então, não oferecemos mais sacrifícios de animais nos dias de hoje? Jesus desestrutura o sistema de sacrifícios. Ele se oferece a si mesmo, uma vez por todas “assim também Cristo, tendo-se oferecido uma vez para sempre para tirar os pecados de muitos, aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o aguardam para a salvação” (Hb 9.28). Não há necessidade de mais sacrifícios, pois Jesus encerra em si mesmo toda violência, tendo ele mesmo sofrido toda violência para nos purificar de nossos pecados, “Isto é o meu corpo. Este é o meu sangue”.

O sacrifício de animais terminou porque Jesus Cristo foi o sacrifício supremo. João Batista confirmou isso quando O viu pela primeira vez: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!” (João 1:29). Jesus tomou sobre si o nosso pecado e morreu no nosso lugar. “Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus.” (2 Co 5.21). Através da fé na obra de Cristo podemos receber perdão. Ele foi o substituto, vicário, e agora torna-se mediador entre Deus e os homens (1 Tm 2.5). Sacrifícios de animais serviam como um sinal, uma figura da oba do sacrifício de Cristo a nosso favor.

Portanto, o sacrifício do AT e do NT, sofre uma reviravolta profunda. Jesus desestrutura o sistema de sacrifícios ao se oferecer, a si mesmo, uma vez por todas pelos nossos pecados. Ele assumiu nosso lugar. Qualquer tentativa de sacrificar novamente os animais, torna-se não apenas ridícula, mas uma ofensa a Deus, já que significa que desprezamos o que Cristo fez por nós ao morrer naquela cruz.

2. Sacerdócio – Como os homens se aproximavam de Deus?

No Antigo Testamento, a adoração estava montada na figura sacerdotal. Um dos papéis principais dos sacerdotes era oferecer sacrifícios em nome do povo. Representavam o pecador quando este entrava na presença de Deus para fazer seus sacrifícios. O Pentateuco inclui instruções detalhadas sobre sua função.
Na testa de Arão havia um diadema de ouro no qual se lia: “consagrado ao Senhor”. O texto afirma que todo povo deveria saber que Arão levaria a culpa de qualquer pecado que os israelitas viessem a cometer em relação às coisas sagradas (Ex 28.36-38). Arão era o sacerdote, representando o povo diante de Deus e intermediando as relações entre Yawé e Israel. O homem devia ir a Deus por meio de um sacerdote que apresentava os rituais a Deus.

No Novo Testamento, a figura do sacerdote, deste homem que se colcoa entre Deus e os homens desaparece por completo. As poucas passagens em que ocorre a palavra sacerdote referem-se apenas ao sacerdócio judaico. Em relação com o Cristianismo, o termo “sacerdote” nunca é aplicado senão a Jesus Cristo. As funções sacerdotais, relacionadas com o sacrifício e a intercessão, acham-se, freqüentemente, no Novo Testamento em conexão com Jesus Cristo (Rm 8.34; Ap 1.5). O sacerdócio de Cristo é a tônica da epístola aos Hebreus.

Dentre os princípios fundamentais defendidos pelos reformadores do século XVI, estava o “Sacerdócio Universal dos crentes”, um dos pontos doutrinários defendidos por Lutero. Não precisamos de ninguém, exceto Cristo, para irmos a Deus. No Novo Testamento, Jesus é o grande sumo sacerdote, portanto, todas as funções do sacerdócio da antiga dispensação concentram-se nele. Ele é o único mediador entre Deus e os homens (1 Tm 2.5). Ele é o representante de Deus junto aos homens e o representante dos homens junto a Deus. Ele é, ao mesmo tempo, o sacerdote e o sacrifício.

Outro aspecto que nos é apresentado no Novo Testamento é que todos os crentes partilham desse sacerdócio, na adoração, serviço e testemunho. “Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1 Pe 2.9). “...e nos constituiu reino, sacerdotes para o seu Deus e Pai” (Ap 1.5-6); O Novo Testamento não menciona a existência de um ofício sacerdotal na Igreja embora Tertuliano e Hipólito se referissem aos ministros cristãos como “sacerdotes” e “sumos sacerdotes”.

Uma das verdades maravilhosas do Novo Testamento é que Jesus desmonta a ideia de homens sagrados. Ir a Deus não é privilégio de alguns iluminados. Por meio de Jesus, todos são convidados a adentrar o local sagrado. Na hora da morte de Cristo, o véu do santuário, que isolava os homens especiais dos homens comuns se rasgou. Não há mais divisão, todos somos aceitos e convidados a adentrar a presença de Deus. Temos um reino de sacerdotes constituído de todos os remidos de Deus. Por isto o autor do livro de hebreus nos convida jubiloso: “Acheguemo-nos, portanto, confiadamente, junto ao trono da graça, a fim de recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna” (Hb 4.16).

O novo Testamento fala de dois sacrifícios, e apenas dois, que atualmente são importantes aos olhos de Deus. Nenhum deles passa pela espiritualidade popular de auto flagelação e martírio que tanto vemos ao nosso redor. São eles: O sacrifício da prática do bem e da mútua cooperação e o sacrifício de Louvor e o sacrifício de louvor! Deus espera que nossos corações e lábios verdadeiramente o adorem, que nossa vida seja para glorificar seu nome, que, quer comamos ou bebamos façamos tudo para a gloria de seu nome. (Hb 13.15).

3. Templo – Onde Deus deve ser adorado?

No Antigo Testamento, Deus se manifestava por meio de coisas e locais. A arca da aliança tinha 1.10 de comprimento, por 70 cm de largura e 70 cm de altura. Era feita de madeira de acácia, revestida de ouro. 2 querubins de ouro, colocados sobre ela, ficavam de frente para o outro, e ali “no meio dos querubins, que se encontram sobre a arca da aliança, eu me encontrarei com vocês” (Ex 25.22-NVI). Onde estivesse a arca da aliança, ali estaria a presença de Deus (Ex 29.42-43). O resultado é que esta arca se tornou uma relíquia e objeto de veneração por parte dos judeus. Não é sem razão que, misteriosamente, ela tenha desaparecido da história. Senão os judeus ainda continuariam acreditando que ter a arca por parte significaria garantir a presença de Deus entre eles.

Posteriormente o judeu desenvolveu uma concepção clara de que Deus estava no templo. Esta síntese pode ser encontrada em Habacuque: “O Senhor, porém, está no seu santo templo; cale-se diante dele toda a terra” (Hab 2.20). O templo era o local temido, porque Deus habitava aquele espaço sagrado. Quando Antíoco Epifânio, no ano 164 a.C., profanou o Santo dos Santos, matando um porco no sacrifício para louvor da religião judaica, os ortodoxos judeus quase morreram, porque este era um local sagrado. Muitos entraram em crise com sua fé, pois afinal, Deus, que morava naquele lugar, no Santo dos Santos, não deveria ter exterminado os profanos com sua santa presença?

Esta questão teológica estava na mente da mulher samaritana. “Nossos pais adoravam neste monte; vós, entretanto, dizeis que em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar” (Jo 4.20). A pergunta de sua mente era: “Onde se deve realmente adorar a Deus. Já que você é um profeta talvez possa resolver esta antiga disputa entre os samaritanos e os judeus”.

Jesus afirma que não se trata de um local santo, mas de pessoas santas. Disse-lhe Jesus: “Mulher, podes crer-me que a hora vem, quando nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai. Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus. Mas vem a hora e já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque são estes que o Pai procura para seus adoradores. Deus é espírito; e importa que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade” (Jo 4.21-24).

Jesus desfaz o conceito de um local sagrado. Nem Gerizim nem Sião são locais santos.

Os ensinamentos posteriores do Antigo Testamento procuram mostrar o fato de que Deus não está preso numa determinada construção ou local. Quando Davi resolve construir templo para Deus; Natã, o profeta, recebeu a seguinte palavra de Deus: Vai e dize a meu servo Davi: Assim diz o SENHOR: Edificar-me-ás tu casa para minha habitação? Porque em casa nenhuma habitei desde o dia em que fiz subir os filhos de Israel do Egito até ao dia de hoje; mas tenho andado em tenda, em tabernáculo. Em todo lugar em que andei com todos os filhos de Israel, falei, acaso, alguma palavra com qualquer das suas tribos, a quem mandei apascentar o meu povo de Israel, dizendo: Por que não me edificais uma casa de cedro? (2 Sm 7.5-7). Deus deixa claro para Davi, que ele nunca aspirou esta ideia de um “local sagrado”. O tabernáculo era feito de lona, e a arca da aliança tinha duas varas para carregá-la, e isto representava mobilidade.

Quando Estevão, o primeiro mártir cristão está sendo apedrejado pelos guardiões do templo de Jerusalém, ele percebe a idolatria com que o templo era tratado, e cita então um texto do Antigo Testamento, proferido por Isaías: “Entretanto, não habita o Altíssimo em casas feitas por mãos humanas; como diz o profeta: O céu é o meu trono, e a terra, o estrado dos meus pés; que casa me edificareis, diz o Senhor, ou qual é o lugar do meu repouso? Não foi, porventura, a minha mão que fez todas estas coisas?” (At 8.48-50). Deus não habita em templos!

O Rev. Silvio Lobo, pastor da Igreja Presbiteriana Independente de anapolis, meu amigo e colega relatou que quando resolveram mudar da Engenheiro Portela em Anápolis, e construir um novo templo, uma irmã abraçou chorando as paredes do templo e disse: “Isto aqui foi consagrado por Deus, estas paredes são santas”.

Deixe-me dizer o que é santo, e onde Deus realmente habita na visão do Novo Testamento: “Não sabeis que sois santuário de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? Se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá; porque o santuário de Deus, que sois vós, é sagrado. (1 Co 3.16). “Fugi da impureza. Qualquer outro pecado que uma pessoa cometer é fora do corpo; mas aquele que pratica a imoralidade peca contra o próprio corpo. Acaso, não sabeis que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo, que está em vós, o qual tendes da parte de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por preço. Agora, pois, glorificai a Deus no vosso corpo” (1 Co 6.18-20).

Qual é o templo do Espírito Santo? Onde Deus resolve habitar? Nos nossos corpos. Este é o local sagrado. Por que devemos evitar a prostituição, a lascívia, o adultério, os vícios, o abuso de nosso corpo? Porque nele habita o Espírito Santo de Deus. “Se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá; porque o santuário de Deus, que sois vós, é sagrado”. Dentre todos os locais do mundo, cada um com sua beleza exótica e exuberante, Deus resolveu habitar em você. Não existe cachoeira sagrada, local sagrado, acampamento sagrado, mas pessoas sagradas, porque nelas habita o Espírito Santo de Deus. Quando alguém se envolve em pecado no seu corpo, está vilipendiando o Espírito de Deus.

Jesus desfaz o conceito de um local sagrado – Gerizim ou Jerusalém?  Não importa. Deus decidiu morar em você. Jesus esvazia esta idéia de um local sagrado “A hora vem, quando nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai...Mas vem a hora, e já chegou, quando os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque são estes que o pai procura para seus adoradores” (Jo 4.21,23). O Local deixa de ter este caráter sacral. O sagrado são os adoradores e não o local onde se adora. Infelizmente esta idéia vétero testamentária não saiu da mente do cristianismo. Existem milhares de pessoas que ainda hoje fazem romarias para lugares que consideram sagrado.

 4. Tempo – Quando Deus deve ser adorado?

Jesus destrói a ideia de um tempo sagrado – “Vem a hora, e já chegou em que os verdadeiros adoradores, adorarão o Pai em espírito e em verdade”. Não é mais um culto realizado em um determinado tempo e espaço. Culto envolve a vida.

No Antigo Testamento, dias e datas sagradas foram criadas. Em Levítico 23, são descritos os dias santos, que deveriam ser respeitados. O povo de Deus precisava guardar estes dias, pois eram santificados. Ainda hoje, antigas controvérsias sobre dias santos surgem no meio do povo de Deus. Alguns acham que o sábado é o dia sagrado, outros defendem ardorosamente a guarda do domingo. Quando Deus deve ser adorado? Existe realmente o conceito de um dia santo no Novo Testamento?

Ao analisarmos cuidadosamente, verificamos que o Evangelho traz uma mudança completa de paradigma. Não mais dia e datas sagradas, mas um estilo de vida que incorpora e santifica todas as coisas em todo tempo.
A adoração bíblica necessariamente deve passar por 1 Co 10.31: “Portanto, quer comais, quer bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus” e Col 3.23 : “tudo o que fizerdes, seja em palavra ou em ação, fazei-o para a glória de Deus”. Nossa adoração tem que alcançar dimensões mais amplas, a força do nosso culto não deve estar no ritual (Am 5.21,23 e 8.3), nem na liturgia (forma, paramentos),  mas na vida.  É necessário integrar todas as áreas e tempo da minha vida. Não mais um tempo santo, mas uma vida santa. O culto cristão é o culto da vida, faz da vida liturgia e da liturgia, vida. O esporte é louvor a Deus; o sexo, dentro dos princípios de Deus é louvor, os negócios que fazemos e nosso trabalho devem glorificar a Deus. Quando que descanso, tiro um tempo de lazer, também glorifico a Deus; quando ando de bicicleta, pesco, dou uma caminhada de motocicleta, faço uma viagem. Tudo é sagrado.

Não existe um tempo no qual se possa dizer: “agora é espiritual, vou para a igreja”, ou “agora é profano, vou fazer um negocio”. Esta dicotomização da vida cristã traz sérios problemas para nossa espiritualidade. Não conseguimos entender que o trabalho, estudo, casamento, relacionamentos, tudo é um convite para adorar a Deus, e não apenas no momento em que vimos para “a casa de Deus”. Quando separamos nossas vidas em coisas santas e coisas  profanas, criamos áreas sagradas e áreas seculares. Dizemos mais ou menos o seguinte:Isto é para Deus”. E estabelecemos as áreas “espirituais”: vir a igreja, trazer o dízimo, cantar, ler a Bíblia. Também estabelecemos as áreas seculares ou profanas:  “isto é para mim, não tem nada a ver com Deus”: Negócio, esporte, matrimônio, relações trabalhistas, etc. Não conseguimos integrar todas as áreas de nossa vida num culto a Deus.

Desta forma, concebemos que o sábado, ou o domingo, são santos. Mas e os demais tempos da minha vida? Quando estou negociando, namorando, brincando? Será que Deus é glorificado nelas. No entanto, a exortação bíblica é “Portanto, quer comais, quer bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus”, e Jesus demonstra isto neste diálogo com a mulher samaritana. “Os verdadeiros adoradores adoram o Pai em espírito e em verdade”. Não se trata de um local, nem de um tempo; trata-se de uma vida inteira de adoração.

Conclusão:
Jesus muda os paradigmas, e traz uma nova compreensão das verdades do Evangelho. Ao tocar nestas quatro áreas da vida cristã: Sacrifício, Sacerdócio Templo e Tempo. Quanto ao Sacrifício as pessoas os ofereciam para expiar pecados. Milhares de animais, bodes e touros, foram mortos  para expiar pecados. O sangue derramado apenas apontava para o sacrifício perfeito e pleno que o Filho de Deus haveria de ofertar à humanidade. Quanto ao Sacerdócio, havia um grupo de pessoas privilegiadas diante de Deus, mas esta ideia agora é desmistificada: Deus suscita não um grupo de foro privilegiado, mas ao rasgar o véu do templo destrói esta distancia entre sacerdotes e não sacerdotes. Todos temos acesso ao Pai por meio de Jesus. Quanto ao Templo, o culto a Deus era centralizado em Jerusalém, Deus era adorado no lugar Santo. O templo era o local para o qual as pessoas afluíam para adorá-lo. Agora, na nova aliança, o local deixa de ter este caráter sacral. Sagrado são os adoradores e não o local onde se adora. Até hoje, os judeus oram na parede do muro das lamentações, porque acredita que Deus está presente naquele lugar; e quanto ao Tempo, não existe mais a ideia de um “um dia de adoração”, nem de um momento sagrado, mas todos os dias são feitos para adoração a Deus. O dia que reservamos para ele é uma forma de lembrarmos a nós mesmos de seu cuidado e adoração.

Jesus afirmou que vinhos novos devem ser postos em odres novos, para que sua fermentação não destrua os antigos e surrados recipientes. Novos paradigmas exigem de nós nova disposição e nova forma de ler e ver as Escrituras Sagradas. Como fez a mulher samaritana, podemos colocar nossas questões teológicas em formas, estruturas, locais, e deixarmos de considerar o que o Pai procura como seus adoradores. Pessoas que o adorem em espírito e em verdade!

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

At 13.36 Sirva à sua geração





Introdução:

O texto afirma que “...tendo Davi servido à sua própria geração, conforme o desígnio de Deus, adormeceu, e foi para junto de seus pais...”.

Lições:
1.       Temos um chamado de Deus para servir uma geração. Num tempo e cultura específicos. Só podemos servir e tocar uma geração. A qual geração estamos servindo?

2.       Não fomos chamados por Deus para servir uma outra geração, mas àquela na qual estamos inseridos. Nossos contemporâneos e conterrâneos;

3.       Este é o desígnio de Deus para nossas vidas. Deus nos fez para esta realidade, e isto faz parte do seu plano para nossa historia. Deus nos chamou para um temo especifico e para um ministério especifico. Voce não está aqui, nesta hora, neste lugar, por acaso.

Em janeiro de 2003, 10 anos atrás, precisamente no dia 03/01/2003, cheguei à Anápolis, assustados com a nova igreja, Eu, Sara e Matheus, com seus 16 anos de idade, forte influencia da cultura Black dos Estados Unidos, apreciador de rap e hip-hop, enquanto eu gostava de musica sertaneja, trajando aquelas calças que mostram as cuecas, e se achando o máximo com o seu estilo. No dia 05, tomamos posse do pastorado e fomos recebidos na igreja. Fomos morar por um gesto de bondade e doação, na chácara do Billy e Jussara Fanstone, a quem somos eternamente gratos, e por ali ficamos cerca de 2 meses.
Muitas pessoas perguntavam porque havíamos retornado dos Estados Unidos. Naqueles dias a economia brasileira estava horrível, os poucos e abençoados dólares que trouxe de lá foram vendidos a 3.30 e 3.50, e até mesmo uma pequena quantia vendi a 3.70 por um real. Tínhamos uma igreja que nos amava, filhos adaptados à cultura, por ter achado, num determinado momento de nossa vida que nunca sairíamos de lá, nos tornamos cidadãos americanos, Sara Maria tinha um excelente salário trabalhando num emprego público, com plano de saúde maravilhoso, filhos adaptados à cultura e minha filha tinha acabado de ser aprovada para a Universidade Harvard, sem duvida alguma, uma grande honra para qualquer pai. Então, por que sair de lá e retornar ao Brasil?

Eu tinha 4 respostas clássicas para dar:
A.     Entendia que meu tempo de pastorado naquela igreja chegava ao fim. Eu já não tinha os mesmos projetos e entusiasmo que me empolgaram antes. Nos quase 9 anos que ali passamos, estivemos envolvidos diretamente na plantação de 4 novas igrejas. Trouxera minha comunidade num determinado patamar, mas agora não estava mais com entusiasmo como sempre tivera, para continuar naquele lugar;

B.      Não suportava o frio de nossa região. Morando em Boston, leste dos EUA, tínhamos uma temperatura, de outubro a abril, em torno de zero grau. Em janeiro, a media era de 5 graus negativos.

C.      Gostaria de estar ao lado de meus pais, e dos pais da Sara na sua velhice. Recebi um convite para ser pastor de uma grande igreja no recife, mas a geografia da cidade de Anápolis foi decisiva para nós, pois estamos a 10 hs de carro da casa de minha sogra, em Piracicaba-SP, e a 6 horas da casa de meus pais em Gurupi-TO. Quando o meu sogro faleceu, minha esposa pode acompanhar todo o dolorido processo, o que consideramos uma bencao, apesar de ter sido um tempo muito dolorido.

D.      Não queria envelhecer nos EUA, achava os idosos daquele país muito solitários e queria retornar às minhas origens. Disse ao meu irmão que a baleia, quando sente a morte aproximar, procura a região onde nasceu, e ele me disse que eu nem estava próximo de morrer, nem era uma baleia – confesso que fiquei muito feliz com estas duas noticias, apesar de não saber se elas são verdadeiras.

Um dia, depois de compartilhar estas 4 razoes com um o meu conselho, o Dr. Edmo me disse para acrescentar outra: Esta igreja estava orando para Deus enviar um pastor e eu era a resposta de Deus, ao me inquietar e trazer para cá.
É assim, realmente que quero entender minha vida. Quero estar no lugar certo, na hora certa, fazendo a coisa certa, com os dons que Deus me tem dado, servindo à minha geração, porque este é o desígnio de Deus para minha vida.
É exatamente isto que nos diz o texto: “...tendo Davi servido à sua própria geração, conforme o desígnio de Deus, adormeceu, e foi para junto de seus pais...” Deus não chamou davi para servir outra geração, senão a sua; e não nos chamou para servir outra geração, senão a nossa.
Então, precisamos saber que geração é esta, a quem nos chamou para servir. Esta igreja precisa saber a que geração deseja ministrar. Sabendo o seu público, ela terá que fazer as adequações necessárias para cumprir sua missão.

Eis algumas características de nossa geração:
1.       Pluralismo – Admite-se vários universos de “verdades”, opiniões divergentes sobre o mesmo assunto são possíveis. Não existe um único conceito sobre a verdade, mas vários. O filme “as aventuras de Pi”, fala-nos de um garoto que se converteu ao mesmo tempo, a três religiões antagônicas: Hinduísmo, cristianismo e islamismo, e conseguia conviver com as três. Acho que esta geração é mais ou menos assim. Para uma mesma teoria, existem varias interpretações.

2.       Relativismo – Não existem mais absolutos. Tudo depende do seu ponto de vista. Desde que Hegel formulou a dialética, tendemos a achar que não existe mais certo e errado, mas o certo, pode ser errado; e o errado, pode ser certo. Não existe mais verdade, existem apenas teorias. A verdade não é o que é, como afirmava Sócrates, mas é aquilo que consideramos ser. Isto gera uma ética situacionista.

3.       Subjetivismo – Esta geração acredita que a verdade não está fora dela, mas dentro dela. É o humanismo antropocêntrico levado ao extremo. Se eu acho que a palavra de Deus não é verdade, ela não é. Eu sou a medida de todas as coisas. Eu tenho a verdade em mim, e não preciso de nenhum conceito fora de mim.

4.       Hedonismo - “vou ser feliz”, na sua forma mais plena. “To nem ai”... filosofia do tipo: “estou que nem chuveiro velho, nem ligo; e quando ligo, nem esquento”. Homem de 50 anos querendo resgatar sua adolescência perdida. “Eu me amo,não posso vier sem mim”.

5.       Mobilização – Uma geração que muda muito de lugar. Depende de emprego onde tem. Nestes 10 anos de pastorado, só tenho um diácono da antiga geração, todos os demais se tornaram oficiais depois que cheguei, ou se batizaram, transferiram e vieram no meu pastorado. 4 destes (Etiene, Samuel Coutinho, Nirlan e Adalton), já mudaram de cidade e nos deixaram.

6.       Urbanização e migração. Temos que pensar a igreja com uma teologia urbana, usando os instrumentais de uma metodologia e sociologia urbana. Nossos modelos e estratégias precisam se adequar para um novo tempo, se queremos dar resposta a novas perguntas e necessidades que surgem no contexto urbano. Temos uma igreja na cidade, mas ainda pensando com uma mentalidade rural.

7.       Pragmatismo – Esta geração está constantemente perguntando se “Isto funciona?”. O pragmatismo pode ser um problema na relação com Deus, pois tendemos a transformá-lo em alguém que terá que satisfazer nossos desejos, e atender nossas orações do nosso jeito, senão vamos buscar uma opção melhor. Igrejas tendem a se tornar uma espécie de supermercado com determinados produtos, e se não temos mais o produto que desejamos, já não mais nos satisfaz.

8.       Experiencialismo – mudamos o paradigma antigo, fruto do iluminismo descartiano que dizia: “ergo, logo sum”, para uma nova forma de julgar o falso do verdadeiro. “sinto, logo me autentico”. A verdade não é estabelecida pela razão, mas pela forma como sinto e interpreto as coisas. Se me senti legal, então deve ser bom. É o império dos sentidos.

9.       Misticismo – Milhares de intelectuais, artistas globais, universitários, estão se perdendo no esoterismo e nos exótico. Dias atrás vimos a mobilização sobre a profecia maia de que no dia 21.12.2012, seria o fim do mundo. Milhares de pessoas, realmente se mobilizaram para este dia, fizeram mudanças. Existem pessoas pagando fortunas hoje em dia para fazerem seu “mapa astral”, e estão definindo suas vidas, por gurus e mantras. É uma geração mística, sensorial. Festa Rock in rio, 2012, tinha 50 bancas de médiuns, pagas pela programação, será que algum pastor foi convidado?

10.    Desconstrucionismo – Eu prefiro ser, esta metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo. Marido e mulher sem papéis definidos. Ninguém sabe como se situar, se tem orientação ou não. Soube de uma mãe que comprava revistas pornográficas para seu filho pré-adolescente, porque, afinal de contas, ele deveria saber das coisas. Falamos muito de uma geração sem significado, mas acho que os pais estão mais perdidos que os filhos. Não sabem mais o certo e o errado, mesmo pais cristãos não estão sabendo se posicionar. Tem medo dos filhos, mas tem, antes de mais nada, de parecerem radicais.  

11.    Envelhecimento da população – Dia a dia vemos a população envelhecimento mais e mais. Antigamente comemorávamos com grande festa o aniversario das pessoas quando faziam 80 anos. Tenho dito na minha igreja, que agora só vamos fazer festa quando fizerem 90 anos. Isto tem trazido um serio problema que é a ditadura da estética. As pessoas esquecem que vão envelhecer, e não há nada que consiga parar este irreversível movimento para a velhice. No novo templo que sonho ver construído, gostaria de ter na entrada, vagas de garagens para pessoas com mais de 75 anos. 10 vagas. Prioritárias. Nossos idosos merecem respeito. São pessoas lúcidas, gente de oração, contribuintes fieis.  

12.    Consumismo – Geração que gasta com vontade. São hotéis cada vez mais caros, viagens cada vez mais exóticas, carros cada vez mais luxuosos. Gente que gasta dinheiro que não tem, com coisas que não precisa, para impressionar gente que não gosta.

13.    Geração virtual – Sem abraço, sem compromissos. Eu te adiciono ou não. Não toca em ninguém. Filhos não conseguem mais viver sem a “mamadeira”. Dormem abraçados com os tablets e i-phones, e acordam querendo saber das noticias da madrugada. Geração plugada.

14.    Família – universo em frangalhos – recentemente soube de uma mulher que mandou sua babá levar a filha ao consultório médico, porque teria uma reunião e não poderia acompanhá-la ao hospital.

Qual é o perfil de sua igreja neste universo plural? Creio que três filmes podem nos apontar as dicas de como se tenta responder:

ü       Parque Jurássico – uma igreja que se perdeu no tempo, em termos de propostas e alternativas. Ela não percebeu que o tempo mudou, que seus filhos mudaram, que seus netos vão exigir respostas diferentes à perguntas diferentes. Ela não consegue se traduzir no novo tempo. Ela ainda serve “à outra geração”. Quando se discute métodos e novas abordagens, soa anti-espiritual. Afinal, sempre fizemos assim...

ü       Beleza americana – Uma igreja que não sabem o que está pensando, nem o que é valor. Tudo está uma bagunça, quando muito existe uma resposta moralista, que esconde desejos complicados por detrás e crises não resolvidas. Resultado: Não são os filhos que estão perdidos, mas sim os pais, e os filhos tentando se encontrar neste emaranhado de relacionamentos truncados que vivem seus pais e a sociedade.

ü       Matrix – Geração tecnológica. Comunicação visual (imagens). Mulheres definem os valores e o mercado criando um novo perfil sexual. O místico está por detrás do confuso, o mundo real e o virtual estão cheios de avatares confusos. Homens em crise na sua masculinidade, mulheres desencontradas. Que visão a sociedade tem de igrejas evangélicas? Bizarrices gospel...

Como ser uma igreja para esta geração:

1.       Temos um chamado de Deus para servir esta geração. Precisamos de graça de Deus para sermos relevantes. Dar respostas honestas a perguntas honestas. Penetrar no universo de nossos filhos, de forma coerente, amorável. Ter famílias com mais dialogo, filhos e pais antenados. Usar os elementos de mobilização e redes sociais. Traduzir-se. Há uma geração inteira, aberta a ouvir; interessada em saber, precisando de amizade, aceitação e resposta espiritual para seus dilemas.

2.       Precisamos retraduzir a mensagem – ou atualizar. John stott afirma que os conservadores costumam ter conteúdo sem relevância, ao passo que os liberais tem relevância sem conteúdo. Como fazer para que esta antiga mensagem de salvação, chegue aos ouvidos desta nova geração, de forma poderosa e impactante. Que a obra de cristo seja traduzida e aplicada aos seus corações de forma profunda. Esta geração exige coerência e graça, solidez e flexibilidade, posicionamento e amor.

3.       Este é o desígnio de Deus para nossas vidas. Deus nos fez para esta realidade, e isto faz parte do seu plano para nossa historia. Deus nos chamou para um temo especifico e para um ministério especifico. Voce não está aqui, nesta hora, neste lugar, por acaso. Orar para que Deus nos revele como devemos viver. Pedir graça a Deus.

Conclusão:
Só tenho uma vida para viver. Minha energia e sonhos devem ser consumidos desta forma. À semelhança de Davi, quero “adormecer”, e voltar para os braços do pai, tendo servido com todos meus recursos, inteligência, oração – à esta nova geração que está chegando. Quero como Davi, deixar preparado toda estrutura, para que novos pastores como Alexandre, Hassen, Giovanni e Alfredo, encontrem uma igreja com saúde, vigoroso, com vitalidade, proclamando Jesus à esta geração e neste tempo no qual estamos inseridos.