domingo, 31 de julho de 2022

Lc 3.15-16; 4.1; 4.14 Ele vos batizará com o Espírito Santo

 



 

 

Introdução

 

No Norte da Inglaterra, há inúmeras minas de onde se extrai carvão há longo tempo, sendo que algumas vezes já atingiram camadas muito profundas, com muitos e longos corredores e túneis, havendo constante perigo de que as pessoas se percam nos seus labirintos. Certa ocasião dois velhos operários passaram por uma amarga experiência ao se perderem e suas lanternas se apagarem nas intrincadas galerias da mina. Depois de muito caminharem, um deles sugeriu que parassem, ficassem quietos e tentassem descobrir de que lado vinha o vento, pois ele se desloca sempre em direção à entrada do poço. Repentinamente um deles se pôs de pé e disse: Já o senti, é naquela direção. E assim conseguiram encontrar a saída.

 

Esta é uma boa ilustração para uma vida orientada pelo Espírito Santo. Sem o mover do Espírito, nos sentiremos perdidos, desorientados, com um barco a vela em dias sem vento. Precisamos não de mais conhecimento, nem de melhores estratégias, precisamos da orientação do Espírito de Deus. Precisamos nos orientar pelo movimento do Espírito Santo, que tanto no hebraico quanto no grego vem da palavra vento: Ruah e pneuma, respectivamente.

 

No seu conhecido livro, “O Cristo de todos os caminhos”, um clássico sobre a obra do Espírito Santo, o pregador metodista E. Stanley Jones citando Artur Hard: afirma: “O Espírito Santo é o país desconhecido do cristianismo, o continente negro da vida cristã, o território onde se encontram as fontes da nossa vida espiritual, mas fontes que jazem inexploradas”. E adiante diz ainda: “Quando o ES se distancia de qualquer corrente de opinião, ou forma de caráter, estes definham como planta sem seiva.” (...) “O Natal é a comemoração de Deus conosco. No pentecoste comemoramos Deus em nós. Está Deus apenas conosco e não em nós?” (p.45) “Não sei de outra coisa mais urgente que a necessidade de despirmos o pentecoste dos seus fenômenos e apegar-nos ao fato, no seu sentido real e no seu valor. Acaso teve Cristo visões ou manifestações de emocionalismo? Ele prometeu o Outro da mesma essência.” (p. 50) “Só o pentecoste satisfaz a vida, porque a vida exige ambos, profundidade e extensão. Sem profundidade é superficial.” p. 92)

 

Os escritos Lucanos (Evangelho e Livro de Atos) dão muita ênfase, à obra do Espírito Santo. Lucas faz questão de sintetizar a obra missionária da igreja em Atos afirmando: “mas recebereis poder ao descer sobre vós o Espírito Santo e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém, Judéia e até os confins da terra.” (At 1.8) Estou extraindo três ideias que brotam do texto bíblico que lemos acima, para considerarmos a importância do Espírito Santo na nossa caminhada de fé. Jesus vivia sob a direção e o poder do Espírito, e da mesma forma precisamos de seu poder para caminharmos a jornada cristã.

 

Para nossa reflexão vou usar três textos. O primeiro deles se encontra em Lc 3.3.15-16. Esta é a primeira verdade que precisamos aprender:

 

1.     Precisamos da obra do Espírito Santo para a jornada cristã. Estando o povo na expectativa, e discorrendo todos no seu íntimo a respeito de João, se não seria ele, porventura, o próprio Cristo, disse João a todos: Eu, na verdade, vos batizo com água, mas vem o que é mais poderoso do que eu, do qual não sou digno de desatar-lhe as correias das sandálias; ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo. (Lc 3.15-16)

 

Deste texto podemos extrair duas ideias:

 

A.    Precisamos deste batismo para sermos verdadeiros cristãos. É interessante observar que este texto nos diz que quem nos batiza é Jesus e o que ele nos dá no batismo é o Espírito santo. Portanto, não existe batismo do Espírito Santo, mas batismo com o Espírito Santo. Jesus é o batizador.

 

Jesus foi muito claro sobre o papel essencial do Espírito Santo. O Espírito Santo é quem nos introduz na vida cristã. “Se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.”(Jo 3.3) e “Se alguém não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus.”  (Jo 3.5). Quem nos regenera e dá o novo nascimento é o Espírito Santo, trata-se, portanto, de uma obra do Espírito Santo em nós.

 

A obra cristã não começa, como alguns equivocadamente creem, com o ato público do batismo ou se tornando membro de uma determinada igreja. O princípio é simples: Não nos batizamos para nos tornarmos cristãos, mas porque nos tornamos cristãos, entendendo o evangelho, somos batizados. O batismo de água é apenas sinal, reflexo de algo muito mais profundo. Assim como não assumimos um compromisso público, e colocamos a aliança no dedo, para amarmos determinada pessoa, mas porque amamos queremos selar e declarar publicamente que assumimos integralmente determinada pessoa com o compromisso de cuidar dela, amá-la e protegê-la. O batismo com água é simbólico, aponta para algo mais profundo, assim como a aliança é simbólica, aponta para algo muito mais profundo.

 

A experiência com o Espírito Santo nos dá compreensão espiritual, nos regenera, nos converte, nos santifica, inclina nosso coração em direção a Deus, nos convence do pecado, da justiça e do juízo. Assim, só nos tornamos cristãos quando somos visitados pelo Espírito Santo, quando Jesus nos batiza no Espírito.

 

B.    Precisamos deste batismo para sermos “energizados” por Deus.

 

Não gosto muito do termo “energizado”, porque ele tem sido muito usado pelos espiritualistas e esotéricos, mas foi exatamente esta ideia que Lucas descreveu em At. 1.8). “Mas recebereis poder.” A palavra poder, vem de “dínamo” e existem algumas palavras em português derivadas deste termo.

 

Em máquinas elétricas, dínamo é um aparelho que gera corrente contínua (CC), convertendo energia mecânica em elétrica, através de indução eletromagnética. Outra palavra conhecida é dinamite. Dinamites são artefatos explosivos à base de nitroglicerina e um material absorvente. Têm grande poder destrutivo e são utilizadas na mineração e na construção. Quem descobriu a dinamite foi Alfred Nobel, que perdeu seu irmão e mais quatro funcionários no laboratório quando eles estavam fazendo testes experimentais com este material.

 

Quando Jesus afirma que seus discípulos receberiam “poder”, (At 1.8) ele usa a palavra dínamo. Jesus tinha a compreensão clara de que, sem a obra do Espírito não teríamos força nem combustão para seguir o discipulado e fazer a obra missionária.

 

Alguns anos atrás, eu preguei sobre o texto no qual Joào Batista falava afirma que Jesus nos batizaria com Espírito Santo e com fogo, e uma irmã estava se sentindo muito desanimada na fé cristã, sua vida carecia de fogo, alegria, entusiasmo, ela estava desanimada e quando lemos o texto bíblico, antes mesmo que eu pregasse, ela entendeu: “É disto que realmente estou precisando.” Eu preciso deste poder que vem do Espírito Santo.

 

Vivemos vida pobre e miserável espiritualmente, dominados por medos e patologias, levamos a fé cristã num ritmo debilitante. Precisamos de fogo, precisamos de algo que exploda nosso peito, nos desafie, nos energize, nos potencialize. Falamos muito atualmente de “empoderamento” social e psicológico, mas ninguém tem considerado seriamente a maravilhosa benção de Deus para nossa vida: o empoderamento espiritual, o fogo de Deus acendendo em nossa vida.

 

 “O crente não precisa apenas de perdão, mas de poder para vencer o domínio do pecado. O plano de salvação abrange, pois, o Calvário e o Pentecoste. Calvário é perdão; Pentecoste é poder.” (A.B. Langstom). O ES não só habita em nós, porém cria força e poder em nós. Ele á e força motriz da vida. É o dínamo que põe em movimento todas as faculdades da alma. Se alguém dirige o carro pela estrada, não desce e empurra o veículo, mas guia-o por meio da força que está dentro dele. Assim é aquele que é conduzido pelo Espírito Santo.

 

João Batista afirma que ele nos batizaria com o “Espírito Santo e com fogo.” Será que não deveríamos orar sinceramente para que Deus nos visite com sua maravilhosa graça e nos encha do fogo dos céus, cuja obra é realizada pelo Espírito Santo?

 

O segundo texto que gostaria de analisar encontra-se em Lc 4.1: “Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão e foi guiado pelo mesmo Espírito, no deserto.”

 

2.     Precisamos do Espírito para enfrentar o deserto – “Foi guiado pelo mesmo Espírito, no deserto.”

 

Este texto é curioso porque nos diz que Jesus “foi guiado pelo Espírito, no deserto.” O texto correlato de Mt 4.1 nos diz: “A seguir, foi Jesus levado pelo Espírito Santo ao deserto, para ser tentado pelo diabo.”

 

O Espírito leva Jesus ao deserto, onde seria tentado pelo inimigo. Por que Jesus precisava passar pelo deserto? Por que o Espírito Santo não apenas permite, mas o leva ao deserto? Sejamos honestos: ninguém quer ir ao deserto. Deserto é lugar de privação, carência, necessidades não satisfeitas, e no caso de Jesus, a companhia não era muito legal. O diabo estaria presente com uma agenda muito clara: Tentação!

 

Ir para o deserto já é, por sua própria natureza, ruim. Ir para o deserto para ser tentado complica ainda mais a realidade. Ter a presença do diabo instigando e provocando, torna tudo muito mais denso e tétrico.

 

Mas a realidade é que muitos personagens bíblicos, e nosso mestre Jesus, tiveram que lidar com o deserto. Este lugar de clima inclemente, grande calor durante o dia e frio intenso à noite. Todos nós atravessamos desertos, alguns irmãos queridos estão passando pelo deserto nestes dias, onde as perguntas e inquietações mais profundas desabrocham, onde as tensões se tornam visíveis e o sofrimento é indescritível. Nestes lugares experimentamos a fome, a solidão, o medo, as questões, as provocações.

 

Jesus também é levado pelo Espírito ao deserto. É importante observar os verbos que descrevem este adentramento espiritual de Jesus no deserto.

 

Como observamos, ele foi levado ao deserto pelo Espírito. (Mt 4.1) Ele não vai sozinho. O Espírito vai com ele. Lucas é ainda mais enfático nesta ideia ao afirmar: “Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão e foi guiado pelo mesmo Espírito ao deserto.” (Lc 4.1)

 

O problema não é se você vai ao deserto, se você tem que ser inserido neste contexto de provocação e medo, a questão é se, além da presença do diabo para tentá-lo e provocá-lo no deserto, você tem a presença do Espírito Santo para ir contigo e guiá-lo. Atravessar o deserto e enfrentar o diabo sem o Espírito é um desastre. O problema não é o deserto nem o diabo, mas a ausência do Espírito Santo. Por isto, Lucas diz que Jesus vai para o deserto, “cheio do Espírito Santo.” Ore para que Deus não permita que você atravesse o deserto sem o poder e a graça do seu Espírito.

 

Por esta razão, o texto de Mateus, descreve assim o final da tentação: “Com isto, o deixou o diabo, e eis que vieram anjos e o serviram.” (Mt 4.11) O diabo deixa Jesus, porque a unção do Espírito está sobre ele. Com o Espírito temos vitória, consolação e provisão de Deus no deserto. Deus envia seus anjos para se aproximarem dele e o servirem. Deus vai estender uma mesa no deserto, vai suprir as necessidades no deserto e vai cuidar de nós no deserto.

 

3.     Precisamos do Espírito Santo para retornar à Galileia – “Então, Jesus, no poder do Espírito, regressou para a Galileia, e a sua fama correu por toda circunvizinhança.” (Lc 4.14)

 

Ele não sai do deserto fragilizado, mas fortalecido. Ele sai “no poder do Espírito.” O deserto não pode ser lugar para abater, mas para fortalecer. Para onde ele vai? Para a Galileia. O que representa a Galileia?

 

A maior parte do ministério de Cristo foi exercido nesta região desprezada pela elite política de Jerusalém. Apesar de ser uma região de terra boa e agricultura, ela não tinha representatividade política e nem relevância religiosa. Ela era até chamada de “Galileia dos gentios” como afirmou o Profeta Isaias. (Is 9.1) Por estar geograficamente mais perto do Mediterrâneo, recebia muita influência de pessoas de outros países e muitos imigrantes. 

 

Galileia representa a região dos enfrentamentos diários que temos na vida. O lugar onde se vive a vida comum. Deserto é excepcionalidade, mas a Galileia possui a característica de ser o lugar no qual precismoz estar diariamente, representa o comum, o ordinário, a vida no seu senso diário.

 

O que Jesus encontra na Galileia?

A primeira coisa que notamos foi sua rejeição. (Lc 4.16-30) Ao entrar cheio do Espírito Santo e fazer a leitura do Profeta Isaias na sinagoga de Nazaré, apesar da admiração de alguns, ele tem que lidar com a oposição. As coisas chegam num nível tão profundo que as pessoas da cidade, decidiram atirá-lo montanha à baixo de uma região montanhosa que era o ponto final daquela cidade e tem uma vista incrível de todo o Vale de Jezreel. Já estive neste lugar, e é uma formação rochosa magnífica. Daquele lugar eles queriam jogar Jesus no precipício. O texto relata que Jesus “passando por entre eles, retirou-se.” (Lc 4.30)

 

Galileia é o lugar onde precisamos lidar com a injustiça, rejeição, oposição. Todos passamos por situações assim. Por alguma razão inexplicável, mas ameaçadora, somos colocados contra o muro, e temos que nos virar para nos livrarmos das acusações e das pedras que nos atiram. Se observarmos o texto, veremos que não havia razão para uma fúria tão desproporcional, mas ao mesmo tempo, veremos Jesus tendo com a ameaça real contra ele.

 

A segunda coisa que acontece na Galileia é que Jesus, mais uma vez, terá que enfrentar o diabo. A luta não se encerra no deserto. Jesus precisa lidar com a realidade bruta da ação do diabo na sociedade em que vive. Quando desce a Cafarnaum, a cidade onde ele havia crescido, naquela sinagoga um “espírito de demônio imundo bradou em alta voz: Ah, que temos nós contigo, Jesus Nazareno. Vieste para perder-nos? Bem sei quem és: o Santo de Deus!” (Lc 4.33-34).

 

Jesus agora não lida com a oposição do diabo contra si mesmo, mas com a realidade brutal do que Satanás está fazendo na vida das pessoas. Ele é um “demônio imundo”, esta é uma boa definição do diabo. É maligno e é imundo. Ele destrói a vida das pessoas, oprime, escraviza, subjuga, e Jesus precisa confrontar o diabo.

 

Precisamos estar atentos ao mal que o diabo tem feito ao nosso redor, nas relações familiares e na sociedade, no ordinário da vida e nos lugares por onde andamos. Discernir o mal na dor humana. Criar uma santa suspeita dos eventos meramente humanos. Há muita coisa estranha acontecendo na vida das pessoas que andam ao nosso redor. É preciso confrontar o mal no dia a dia. O maligno anda na Galileia, na vida comum, no dia a dia. Satanás vive de “andar pela terra e passear por ela”, como ele mesmo se definiu no livro de Jó diante de Deus. Jesus também afirmou que “o espírito imundo procura um lugar para repousar”, anda inquieto, procurando pessoas vulneráveis e desatentas espiritualmente e quando encontra as condições propícias se desenvolve rapidamente como um fungo ou uma bactéria mortal.

 

Alguém chegou a afirmar: “Se você acordar de manhã e não encontrar o diabo, você está seguindo na direção errada.”

 

Conclusão

 

O texto de Lucas 4, começa com a seguinte declaração: “Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão e foi guiado pelo mesmo Espírito, no deserto.” (Lc 4.1), depois de todas as lutas contra as forças espirituais do mal ele conclui com uma descrição final marcante: “Sendo dia, saiu e foi para um lugar deserto; as multidões o procuravam, e foram até junto dele, e instavam para que não os deixasse. Ele, porém, lhes disse: É necessário que eu anuncie o evangelho do reino de Deus também às outras cidades, pois para isso é que fui enviado.” (Lc 4.42,43)

 

Jesus enfrenta as lutas diárias e o poder das trevas, cheio do Espírito Santo e guiado pelo Espírito Santo, mas para não perder a referência, o texto por ser assediado e procurado, “Sendo dia, saiu e foi para um lugar deserto.” (Lc 4.42) É preciso permitir que a alma se encontre com Deus. É desta forma que nosso espírito é tomado pelo Espírito divino. Não podemos nos distanciar da fonte de todo bem e toda autoridade. Esta fonte encontra-se no poder do Espírito Santo.

 

Por isto a promessa dada por João Batista se reveste de um significado muito profundo: “Ele vos batizará com Espírito santo e com fogo.” Somente a visitação do Espírito e sua obra em nós, cheia de vida e autoridade, pode capacitar-nos a viver a vida que agrada a Deus. Se existem algo que precisamos na nossa vida pessoal, nos lares, nas igrejas e na sociedade, é do revestimento maravilhoso e poderoso do Espírito Santo e do fogo e poder que ele derrama sobre seu povo.

 

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