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paz
No livro de Isaias lemos: “Gritam-me de Seir: Guarda, a que hora estamos da noite? Guarda, a que horas?” (Is 21.11).
Séculos depois, Cícero cunharia a famosa frase: “O tempora! O mores!” em seu discurso no Senado, nas célebres Catilinárias, bradando contra os vícios e a corrupção de Roma. “Que tempos os nossos! E que costumes!”. Na sua visão, conspirações e corrupção solapavam o Império, e as atitudes mereciam ser desprezadas em alta voz, como repúdio à vileza presente na elite romana. Mais recentemente, uma frase de Bertolt Bretcher se tornaria clássica: “Que tempos são estes em que temos que defender o óbvio?”
Tanto a pergunta de Isaias, como a frase de Cícero e de Bertolt Bretcher são profundamente contemporâneas. Que dias são estes, que tempos são estes, que horas são estas? Assim é a pergunta do profeta: “Guarda, a que hora estamos da noite?”.
Estamos vivendo em tempos de calamidade e perplexidade. Ouvi recentemente um discurso do governador de Nova York, Andrew Cuomo, dizendo que o estado deve "começar a reabrir" mas com um plano inteligente", já que a pandemia não é como ligar e desligar um interruptor e que adoraria que isso acontecesse, mas não vai. "É como assistir a um incêndio atravessando a grama seca com um vento forte".
Pensando nestes tempos, escrevi a seguinte reflexão:
Pensando nestes tempos, escrevi a seguinte reflexão:
O que tenho aprendido na quarentena?
Esta pergunta veio à minha mente na semana passada. O que este tempo de reclusão e distanciamento me fez observar sobre mim mesmo? O que tenho aprendido e descoberto sobre quem sou?
1. Descobri que é difícil viver apenas comigo mesmo. Como disse J Quest: “quero ficar só, mas sozinho comigo eu não consigo”. Fiquei mais de dois meses vivendo solitariamente, pois minha esposa estava acompanhando o nascimento do neto e os voos foram cancelados. Descobri que a solidão não é brincadeira...
2. Ficou evidente, que preciso de rotinas claras e definidas. A falta de uma agenda, de acordar e sair de casa, de saber o que fazer diariamente, de uma dinâmica pessoal, me deixou ineficaz e angustiado.
3. Aprendi que tempo de sobra não me torna mais produtivo e efetivo. Tinha todo tempo para ler e escrever mas a produtividade se tornou pobre e escassa. O fato de não ter horário para dormir e acordar, pode ter sido uma das justificativas para isto.
4. Conclui que tenho sede de relacionamentos, ainda que superficiais: tomar café com alguém, conversar com pessoas, sorrir, faz parte da minha natureza, vocação e formação. Estas coisas simples me fizeram muita falta.
5. Percebi a fragilidade do ser humano. A grande ameaça não veio de uma bomba atômica, nem cataclismas ou hecatombes, mas num invisível e pequeno vírus que mudou hábitos, estagnou a economia de metade do planeta. Apesar de todo avanço da pesquisa e da ciência, o vírus ironizou a prepotência humana.
Minha esposa, também fez suas observações, que julgo importantes:
A. Ter tempo não tem a ver com cronos, mas com propósito. Nunca tive tanto tempo e jamais produzi tão pouco. Quando não temos propósito, o tempo desaparece. Já dizia o velho Salomão. Há tempo pra todo PROPÓSITO.
B. O fim dos cultos públicos e reuniões semanais demonstrou que muitos precisam ter um encontro real com Deus.
C. Acredito também que Deus colocou os seres humanos em quarentena, para a natureza se recuperar um pouco de nós e aguentar até sua redenção. Tem até golfinhos nos antes fétidos canais de Veneza!
D. Muitos descobriram o que todos já sabiam sobre seus filhos, mas ninguém podia ou tinha coragem de dizer...rsrsrs
A frase do Isaías suscita algumas perguntas:
Primeira: As pessoas estavam desorientadas e não conseguiam julgar corretamente o momento que viviam. Não sabiam discerniam sua época, nem o tempo no qual estavam inseridas. Não saber a hora é típico do fuso horário, no efeito jet lag, sensação de cansaço extremo ocasionada pela diferença de horário entre a origem e o destino. Isto acontece porque o relógio biológico perde a sincronização com o horário cronológico do novo ambiente, pois o ritmo dia/noite em que a pessoa estava acostumada a viver sofre mudança súbita.
Outra comparação sobre o sono. Se você está acostumado a dormir tarde e um dia, cansado, decidi dormir cedo, acordará totalmente desorientado tentando entender a que horas da noite você se encontra.
Com a chegada do vírus, que obrigou escolas, autarquias, convenções, eventos esportivos, e até mesmo igrejas a se fecharem certamente não há ninguém que não tenha sido afetado. Nada e ninguém escapa. E não se trata de um evento local, nem de apenas um país, é um evento global, com graves efeitos na saúde e na economia das pessoas. Todos estamos sujeitos a desastres naturais e a eventos da natureza. Pode ser na
Área da saúde, econômico, político. O povo de Deus não é poupado nestes eventos. Isto tem a ver com os propósitos de Deus e sua pedagogia na história humana. Precisamos ser realistas. Homens de Deus na história viram grandes calamidades atingindo o povo de Deus. Viram a escassez, viu a falta de alimentos, guerras e mortes e estas coisas abalavam a todos.
A pergunta do profeta, portanto, olhando os tempos que ele estava vivendo, se tornam muito atuais:
Guarda, a que hora estamos da noite? Guarda, a que horas?”
Como lidar com a vida se não somos capazes de perceber o tempo? Quanto mais idosos ficamos, menos capacidade de entender o que está acontecendo ao nosso redor, e julgar todas as realidades envolvidas na vida.
Como interpretar este momento?
Juízo de Deus?
Alguns pregadores mais ousados não hesitam em bradar: “Isto é juízo de Deus!”, e passam a citar os abusos do carnaval, a insensibilidade elite politica brasileira, a moral decadente da juventude, etc., esquecendo-se que este juízo é muito mais abrangente, pois tem alcance mundial. Os pecados do Brasil, certamente atraem o juízo de Deus, mas não podemos afirmar que o coronavirus surgiu no mundo por causa do pecado do Brasil.
Por outro lado, não posso deixar de ver tudo o que acontece como juízo de Deus, mas encontro enorme dificuldade em estabelecer relação de causa/efeito, entre coronavirus e o pecado do Brasil, ainda que consiga admitir que Deus, sempre age com critério, equidade e justiça, e tudo que nos acontece, sempre tem um propósito, e até mesmo o mal, tem propósito didático.
Por outro lado, é fácil atribuir tudo ao juízo de Deus, mas se a raça humana não respeita as leis naturais, certamente ela sofrerá as consequências de suas transgressões, então, porque questionar a Deus sobre a responsabilidade divina na tragédia? É certo que Deus, reina soberanamente sobre toda a criação e tudo está sobre o domínio do Senhor, mas isso não significa que tudo o que ocorre na criação e na história é obra direta da mão de Deus. Em muitas situações, os pecados e falhas humanas são responsáveis por grandes tragédias e complicações na história.
Da mesma forma, no dia de Isaias, as pessoas estavam indagando assustadas sobre o que estava acontecendo, porque o que estavam vivenciando era incomum e causava perplexidade. Os tempos estavam confusos e tudo parecia diferente. Nova moral, novos costumes, nova espiritualidade, por isto estavam amedrontadas e apavoradas. O novo assusta! Que hora é esta? Que tempo é este?
Alinhamento Divino?
Algumas pessoas estão entendendo este tempo como uma forma de “alinhamento divino”, com a natureza.
Algumas pessoas estão entendendo este tempo como uma forma de “alinhamento divino”, com a natureza.
Curiosamente, a chegada do coronavírus, e a consequente suspensão das atividades industriais e do comércio, levou as máquinas poluentes a parar de produzir gases e monóxido de carbono, e o resultado é que, os canais de Veneza, outrora poluídos, estão ficando limpos novamente, assim como a camada de ozônio está demonstrando visível recuperação e as grandes cidades estão menos poluídas.
No antigo Testamento, deu ordenava a seu povo que não plantasse no sétimo pois a terra precisava de descanso. Então, os judeus semeavam seis anos consecutivos e paravam no sétimo, dando assim ensejo para que a “terra descansasse”. Não seria esta uma boa alegoria dos tempos modernos, nos quais os homens, incansavelmente tem explorado a natureza, sem trégua?
Avivamento e despertamento da igreja?
Algumas pessoas estão entendendo este momento como um momento de avivamento e despertamento do povo de Deus na história. Historicamente, a igreja de Cristo sempre evidenciou muito a graça de Deus em tempos de calamidades.
Algumas pessoas estão entendendo este momento como um momento de avivamento e despertamento do povo de Deus na história. Historicamente, a igreja de Cristo sempre evidenciou muito a graça de Deus em tempos de calamidades.
Desde os primeiros séculos a Igreja tem sido um instrumento de Deus para contribuir e amenizar o sofrimento humano. Em Atos 3.39-47, os cristãos viviam em comunidades, suprindo as necessidades do outro. Em Atos 11.27-30 encontramos os discípulos, na primeira viagem missionaria, planejando e enviando alimentos aos irmãos da Judéia, que passavam por grande necessidade.
Rodney Stark descreve o que aconteceu no ano 260 d.C., quando muitos cristãos entregaram suas vidas para socorrer os enfermos que ficavam abandonados por estarem infectados pela segunda grande epidemia, que matou quase um terço da população mundial. De acordo com Dionisio, durante esta epidemia em cada casa havia mais de uma morte. Os cristãos se mobilizaram para cuidar das pessoas e protegê-las nesta calamidade.
A fé dos cristãos frutificava em boas obras. As pessoas não eram apenas socorridas em suas angústias e enfermidades, mas eram também consoladas. Outro aspecto que tornava os cristãos diferentes era a maneira como viam a ação de Deus nos momentos difíceis. A fé que os cristãos professavam oferecia segurança e descanso. A morte não era um fim em si mesma, por isto, mesmo aqueles que morriam encontravam paz, pois haviam encontrado o caminho e estavam na presença de Deus. Os cristãos encontraram a maneira adequada para anunciar o Evangelho e contribuir com a transformação da sociedade, através de boas obras, engajados na melhoria das condições humanas.[1]
A igreja de Cristo sempre se agigantou em tempos de sofrimento. Não seria esta a forma de Deus despertar seu povo para que, com inteligência, sabedoria e compaixão, possa cuidar daqueles que padecem, evidenciando assim a glória de Deus por meio do seu povo?
Existiria neste texto uma dimensão escatológica? Algo conectado ao futuro?
A Bíblia afirma que precisamos remir o tempo porque os dias são maus. Precisamos entender no tempo de Deus, qual é o seu calendário, que agenda ele tem. Jesus advertiu que a volta do Filho do Homem se daria quando não estivéssemos apercebidos, seria como a vinda do ladrão da noite, na hora em que não estaríamos prevenidos. Precisamos, pois, vigiar, estar atento! Que hora é esta no plano de Deus, em que hora da noite estamos?
É comum ouvirmos nestes dias as expressão no meio do povo de Deus: “É, Jesus está voltando...” Estariam errados aqueles que olham os eventos calamitosos destes dias como sinais da iminente volta de Cristo? Afinal de contas, não foi ele mesmo que disse: “Porque nesse tempo haverá grane tribulação, como desde o princípio do mundo, ate agora não tem havido e nem haverá jamais? Não tivessem aqueles das sido abreviados, ninguém seria salvo; mas, por causa dos escolhidos, tais dias serão abreviados” (Mt 24.21).
O apóstolo Pedro segue na mesma direção ao afirmar: “nisso exultais, embora no presente, por breve tempo, se necessário, sejais contristados por varias provações, para que, uma vez confirmado o valor da vossa fé, muito mais preciosa do que ouro perecível, mesmo apurado por fogo, redunde em louvor, glória e honra na revelação de Jesus Cristo” (1 Pe 1.6,7).
Será que sabemos “a que hora estamos da noite?”
Conclusão: Oito considerações finais
Certamente não saberemos responder, ”Que horas são estas?” que tempos são estes?”. Isto é, não somos capazes de decodificar todos os motivos espirituais presentes neste tempo de pandemia. Mas creio que algumas coisas precisam ficar claras para nossa vida.
1. Em que Deus interpela você pessoalmente? Como está sua vida? O que você está aprendendo de Deus? Sua fé tem crescido neste tempo? Como está a leitura da palavra de Deus? O que você acha que Deus está querendo revelar ao seu estilo de vida, à sua relação com sua família, amigos, igreja e trabalho neste momento? Não podemos sair desta situação da mesma forma como entramos...
2. Em que Deus está interpelando você sobre cuidado e preocupação com outras pessoas. Como você pode ser um instrumento de benção e paz nestes tempos? Peça a Deus para que, da sua casa, você possa estar dando gestos de cuidado e abençoando outras vidas e pessoas. Não sabemos quais os reais efeitos das carências nestes momentos. Algumas pessoas, com a ajuda do governo podem estar vivendo melhor do que viviam antes da calamidade. Eu conheço pelo menos duas pessoas simples e pobres, que estão agora, vivendo economicamente, melhor que antes...
3. Como você está orando neste momento pelo mundo, pelos campos missionários, pelos perdidos? Será que a igreja de Cristo tem sido efetiva neste momento da história? Como sua igreja local pode servir melhor, abençoar mais? Como você tem abençoado sua igreja, mesmo que à distância? Você tem abençoado sua igreja? O povo de Deus deve uma luz na escuridão, ser os olhos e as mãos de Cristo no meio da tragédia.
4. Quando Habacuque estava passando por um tempo de grandes calamidades em Israel ele demonstra sua fé, crendo que Deus estava agindo e que os povos conheceriam a glória de Deus de uma forma nunca antes vista no mundo: “E a terra se encherá do conhecimento da glória do Senhor, como as águas enchem o mar” (Hc 2.14). Devemos ter essa mesma confiança.
5. Precisamos lembrar que Deus não esqueceu seus propósitos, sua missão não terminou ainda. Ele quer nos usar para o novo momento que estamos vivenciando na história. Vamos escrever novos capítulos, vamos proclamar a confiança e segurança de Deus em nosso tempo fragilizado. Tragédias não podem abalar e destruir os objetivos de Deus na história.
6. O povo de Deus nunca perdeu a esperança em Deus. Habacuque disse no meio da tragédia: “eu exultarei no Senhor e me alegrarei no Deus da minha salvação”. As circunstâncias o levaram ao louvor, não ao desespero; à fé, e não à incredulidade. Circunstâncias não podem determinam se cremos ou não.
7. Precisamos expressar nossa total confiança no caráter amoroso de Deus e em sua soberania. Deus é dono da história, e seus intentos serão cumpridos na história. Ele nos chamou para sermos luzes a brilhar no meio da escuridão, e não para ser uma luz brilhando na eternidade. Nosso tempo é hoje. Precisamos viver este tempo com fé e ousadia.
8. A cruz de Cristo nos dá esperança. Quando olhamos para o calvário, vemos a confusão nas autoridades, os interesses políticos expressos, o sofrimento das pessoas piedosas como Maria, que se encontra ao lado de seu filho, vendo o absurdo naquela crucificação, mas a cruz também nos fala de outra coisa: fala-nos da reconciliação da humanidade pelo sangue de Cristo, fala-nos da vitória de Cristo sobre as trevas, fala-nos do amor de Deus pela humanidade.
Naqueles tempos confusos, onde até a própria natureza reage, com o céu se escurecendo e um terremoto acontecendo na cidade, o Filho de Deus estava sendo crucificado. Mas o que vemos no Filho é a graça no meio do caos, a morte sendo vencida.
O que Deus está querendo nos ensinar nestes tempos de trevas e calamidades.
Talvez precisamos entender melhor a pergunta: “Guarda, a que horas estamos da noite?”
[1] Se quiser aprofundar: Leia Jorge Iridoin Fortes dos Santos: “A função social das igrejas nas situações de calamidades”. http://www.ibfea.com.br/artigo/a-funcao-social-da-igreja-nas-situacoes-de-calamidades
Olá! O texto seria Is 21.11. Houve uma falha na digitação.
ResponderExcluirAbraço!
obrigado. corrigido.
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