domingo, 10 de outubro de 2021

Ex 2.1-10 A Subversão divina

 



 

 

Introdução

 

 

A história segue um plano divino e um cronograma divino, e ninguém pode impedir que os planos divinos se cumpram. No livro de Daniel lemos: “O céu domina”. (Dn 4.26) Na carta aos Romanos está escrito: “Os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis” (Rm 11.29).

 

Então, os homens fazem a vontade de Deus de duas formas:

 

(a)-Em obediência, submetendo-se a Deus de forma voluntária como fez Isaias: “Eis-me aqui, envia-me a mim” (Is 6.8), e Maria: “Aqui está a serva do Senhor; que se cumpra em mim conforme a tua palavra” (Lc 1.38)

 

(b)- Involuntariamente – A Bíblia afirma que “O Senhor fez todas as coisas para determinados fins e até o perverso para o dia da calamidade” (Pv 16.4). As Escrituras Sagradas relatam que o povo de Deus estava sendo perseguido, mas os cristãos sabiam que não estavam nas mãos dos opositores, mas sob o controle de Deus, nada do que estava acontecendo era alheio ao plano divino.

 

Levantaram-se os reis da terra, e as autoridades ajuntaram-se à uma contra o Senhor e contra o seu Ungido; porque verdadeiramente se ajuntaram nesta cidade contra o teu santo Servo Jesus, ao qual ungiste, Herodes e Pôncio Pilatos, com gentios e gente de Israel, para fazerem tudo o que a tua mão e o teu propósito predeterminaram.”

(At 4.26-28)

 

Eles entendiam que o caos e a perseguição não estavam fora do controle divino. Apesar da perseguição, eles estavam fazendo “tudo o que a tua mão e o teu propósito predeterminaram.” Afinal, o Deus que determina os fins, também determina os meios.

 

Esta é a subversão divina.

Os homens pensam que tem o controle de todas as coisas, mas na verdade, quem tem o controle é Deus. A história de Moisés, seu nascimento nos atribulados dias em que o povo de Deus estava oprimido pelo Egito, a forma como foi levado ao palácio e depois ao deserto, tudo estava dentro dos planos divinos. A história de Moisés mostra como a subversão divina acontece.

 

Primeiro, Deus transforma riscos reais em rotas de libertação.

 

O menino Moisés estava sentenciado à morte. Ele nasceu debaixo de um duro decreto de Faraó de que todas as crianças do sexo masculino que nascesse dos hebreus deveria morrer. Sua mãe Joquebede, ficou grávida, e ao nascer seu querido filho, ela não tinha como escondê-lo por muito tempo.

Então, ela bolou um plano arriscado: colocar seu filho num berço calafetado de betume, e levá-lo ao rio Nilo, que atravessava a cidade, na esperança de que alguma alma caridosa o pudesse acolher. Os riscos eram grandes: Uma onda do rio poderia encher o cesto de água, a proteção do berço poderia ter um vazamento e afundar, se ninguém o encontrasse rapidamente ele morreria de fome ou sede, os soldados poderiam encontrá-lo e executá-lo... Tudo era arriscado, mas na verdade, este mirabolante e estranho plano, esta rota arriscada, era o caminho de Deus para levar aquela criança ao palácio para receber a melhor instrução possível e mais tarde liderasse o seu povo para a liberdade, guiando-o pelo deserto.

 

Deus estava executando seu plano. Nada deste assustador incidente é coincidência ou acaso. Deus está no controle. Este é seu poder subversivo.

 

O mesmo aconteceu com José.

Toda maldade, injustiça e crueldade ao ser vendido como escravo pelos seus próprios irmãos, era o plano de Deus para levar José ao palácio. Os amalequitas o compraram, ele é submetido a uma humilhante condição de escravo, mas este caminho se torna o meio de Deus para executar seu plano na história.

 

Será que conseguimos ver Deus em nossa história, nos dirigindo por estradas impensadas, às vezes dolorida? Temos sido capazes de ver este poder de Deus em transformar as rotas de risco em caminhos de libertação?

 

A subversão divina é claramente percebida por Maria, no seu cântico, magnificat:

 

“Derribou do seu trono os poderosos e exaltou os humildes.

Encheu de bens os famintos e despediu vazios os ricos.”

(Lc 1.52,53)

 

Paulo percebe como Deus age estrategicamente para estabelecer seus planos:

 

Irmãos, reparai, pois, na vossa vocação; visto que não foram chamados muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de nobre nascimento; pelo contrário, Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes; e Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são.”

(1 Co 1.26-28)

 

Deus transforma riscos reais em rotas de libertação. Grandes perdas podem se transformar em bençãos. Ameaças podem ser meios de libertação.

 

Segundo, Deus transforma ambientes de morte em manifestações da vida.

 

Não há lugar onde a morte era tão banalizada como na casa de Faraó. Eles eram vistos como deuses e tinham o poder da vida e morte. Sob suas ordens as pessoas eram executadas. Ele não hesitou em decretar, por razões de ordem social e econômica, políticas e estratégicas de que todas as crianças judias do sexo masculino deveriam morrer.

 

Da casa de Faraó saem os decretos da morte, da antivida, da condenação, e apesar disto, a casa de Faraó transforma-se no reduto de proteção a Moisés, esta criança condenada à morte.

 

Muitas vezes os milagres de Deus podem ser percebidos nos detalhes. No dia em que Joquebede, a mãe de Moisés, entendeu que não poderia mais ocultar seu bebê e o coloca num rio na esperança de que alguém encontre seu filho, “coincidentemente”, a filha de Faraó desce ao rio, para tomar banho levando consigo toda sua comitiva e ouve o choro da criança. Ela entende o contexto político, e sabe o que está acontecendo, mas agora diante desta criança seu coração é movido de cuidado maternal. Ela decide criá-lo. Na verdade ela rejeita a ordem do pai. Isto poderia causar graves incidentes na corte.

 

Mas o que interessa é esta grande verdade. A casa de Faraó de onde saem os decretos de morte torna-se o lugar onde Moisés crescerá em segurança. Seu pai ordena a morte, Deus usa a filha para decretar vida.

 

É desta forma que Deus age, mudando as circunstâncias para seu propósito. No Leste Europeu, o fechado sistema que tão duramente perseguiu os cristãos, caiu por terra, pelo poder da oração dos cristãos; Na África do Sul, Deus levantou Nelson Mandela, para salvar o povo sul africano da terrível divisão entre negros e brancos e desmantelando pacificamente aquele sistema maligno; Na China, o maior despertamento da fé na história irrompeu em um Estado ateu que tenta de todas as formas cruéis e violentas sufocar a fé cristã. A vida jorra em ambientes de perseguição. A vida ironiza a morte. Deus sempre tem feito isto na história.

 

É a subversão divina que transforma ambientes de morte em manifestações da vida.

 

Gordon MacDonald acompanhou de perto a tragédia dos atos terroristas de 11 Setembro de 2001 em Nova York. Ele descreve muito bem como ambientes de morte podem  ser transformados em manifestações de vida. Ali, trabalhando como voluntário para trazer conforto às pessoas enlutadas ele escreveu:

 

“Deus está aqui? Cheguei à conclusão de que ele está mais próximo deste lugar do que qualquer lugar que tenha visitado. A estranha ironia é que, em meio a esta catástrofe absoluta de proporções indizíveis, há uma beleza na forma pela qual os seres humanos estão agindo, o que desafia a imaginação. Todos – sublinhe isto, todos – são irmãos e irmãs entre si. Não ha nenhum estranho entre os milagres no local de trabalho. Todos conversam, todos cooperam, todos fazem a próxima coisa que precisa ser feita. Nenhuma tarefa é pequena demais, humilde demais ou, por outro lado, grande demais. As lágrimas escorreram livremente, o afeto se expressou de forma mútua e aberta, a exaustão foi desafiada. Todos nós deixamos de nos preocupar conosco mesmos. As palavras “não se trata de mim”,  nunca foram tão verdadeiras. Nenhum culto numa igreja, nenhum santuário de igreja, nenhum culto religiosamente inspirador já falou tão profundamente à minha alma e testemunhou da presença de Deus como aquelas horas na noite passada, no local da tragédia.“

 

Foi assim que Deus fez nessa história de Moisés: Ela faz brotar a vida no ambiente de morte. Do mesmo lugar de onde partiu o decreto para morte de tantas crianças, encontra-se o ambiente no qual Deus preservaria Moisés. Esta é a ironia divina. Esta é a santa subversão.

 

Terceiro, Deus dá condições quando os recursos humanos desaparecem

 

Sempre fico tentando imaginar quais foram os sentimentos ambíguos que a mãe de Moisés teve ao tomar a decisão de colocá-lo num cesto e deixá-lo no rio. Como você que é mãe, e lê este sermão, se sentiria tendo que fazer o mesmo com seu filho?

 

Imagine sua relutância, sua culpa, seus temores, seus conflitos. Abandonar seu filho às margens de um rio, sofrendo as intempéries da água, do calor, da fome e da sede... Por que ela toma esta decisão?

 

O texto responde à esta pergunta: “Não podendo escondê-lo por mais tempo” (Ex 2.3). Na verdade ela toma esta atitude por absoluta impotência. O que fazer quando todos recursos que temos não são suficientes? Como esconder seu filho de três meses dos implacáveis guardas egípcios?

 

Só a situação de absoluta ausência de recursos pode levar uma mãe a tomar uma atitude tão radical. Ela não tinha a quem recorrer, a quem buscar, ela é obrigada a desistir. Esta situação de impotência atinge milhares de pessoas todos os dias, que são obrigadas a viver em condições sub-humanas, simplesmente porque não há recursos disponíveis.

 

Esta é a situação da viúva de Sarepta ao se encontrar com o profeta Elias. Ele lhe pede um pedaço de pão, e ela, resignadamente afirma: “

 

Tão certo como vive o Senhor, teu Deus, nada tenho cozido; há somente um punhado de farinha numa panela e um pouco de azeite numa botija; e, vês aqui, apanhei dois cavacos e vou preparar esse resto de comida para mim e para o meu filho; comê-lo-emos e morreremos.” (1 Rs 17.12)

 

Esta viúva não era uma pessoa avarenta, que não queria distribuir o que tinha. Ela simplesmente não tinha como distribuir. Os recursos não existiam.

 

Pessoas que passam por situações de extrema escassez afirmam que a falta de recursos gera apatia, resignação, desistência. Você não luta mais, pois não crê que algo possa ser feito. É o que acontece com a vítima rendida, abusada e violentada. Com o pai de família sem recursos para colocar alimentos à mesa.

 

Muitas vezes não há recursos para lidar com questões espirituais. A pessoa está presa pela ação do maligno e já buscou soluções em lugares errados. Muitas vezes não há recursos emocionais, e o casamento está chegando ao fim apesar de todos esforços. Outras vezes são pais que precisam lidar com a rebeldia do filho. Faltam recursos humanos, psicológicos, espirituais.

 

Assim aconteceu com a mãe de Moisés. Ela não abriu mão porque faltava amor, mas porque faltava recursos. Sua atitude se torna: “Deus vai cuidar, eu nada posso fazer!” Ao colocá-lo no cesto ela sabia que apenas um milagre mudaria o quadro. Seu filho havia sido condenado à morte antes de nascer, ela adiou o máximo, mas agora nada mais poderia ser feito. Ela preferiu que ele morresse longe dela, ainda que certamente isto se transformaria para sempre num fantasma na sua história.

 

É nesta hora que algo incomum acontece: Deus dá condições quando os recursos humanos desaparecem. O recurso que esta mulher não tinha é providenciado por Deus. Ele está cuidando! Ele vai providenciar o necessário. Os recursos surgem de forma miraculosa e inusitada. Deus providencia os recursos.

 


Conclusão  

 

A subversão divina aponta para três direções:

 

Primeiro, Deus transforma riscos reais em rotas de libertação. A providencia desta mulher não é a melhor, embora seja a única. O risco para a vida daquela criança se transforma no meio da sua proteção. A subversão divina é claramente percebida, ameaças se transformam em rotas de libertação.

 

Segundo, Deus transforma ambientes de morte em manifestações da vida. Do palácio vem a ordem para matar as crianças, mas do palácio vem a filha de Faraó para proteger a criança condenada a morrer.

 

Terceiro, Deus dá condições quando os recursos humanos desaparecem. Esta mulher não tem recursos, sua vida chegou a um poço sem fundo, nada mais pode ser feita. Entretanto, Deus providencia os recursos onde os recursos não existem.

 

Mas a grande subversão, na verdade, acontece na cruz de Cristo. Nada é mais ameaçador e estranho que a cruz. O livro da Lei afirma: “Maldito todo aquele que for pendurado no madeiro.” (Dt 21.23). O Novo Testamento analisa muito bem esta questão ao afirmar: “

 

“Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar (porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro” (Gl 3.13).

 

Nenhum lugar é tão marcado pelo ambiente de morte que a cruz. Ali contemplamos a morte na sua pior expressão, num espetáculo de horror, a cruz é ambiente de execução. Entretanto, na cruz encontramos a vida. Um antigo hino diz o seguinte:

 

“Há uma fonte cheia de sangue das veias de Emanuel

E pecadores mergulhados neste sangue, são purificados de todas as manchas de culpa”

(...) Este sangue nunca perderá seu poder, até que a igreja redimida seja salva, para não mais pecar. (...) Este sangue nos purifica de toda culpa”.

 

A grande subversão de Deus se dá na vida daqueles que, condenados pelos seus pecados, são resgatados para viver para a glória de Deus e consagram sua vida para viver para o Senhor. Pecadores redimidos e restaurados para sua honra e glória.

 

 

 



 

 

 

 

 



 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário