Introdução
Por que devemos orar Se Deus é soberano e sabe de todas as coisas, e seu plano já está traçado, por que interceder? Por que oramos, mesmo crendo na onisciência divina? Há sempre tensão entre a soberania de Deus e a responsabilidade humana na oração.
Creio que, de todas as respostas que podemos dar, a mais impressionante é que Jesus orava. O Evangelho de Marcos, em particular, destaca a prática constante de oração na vida de Jesus. Eis alguns textos bíblicos que mostram isso:
· Mc 1.35 - “De manhã, bem cedo, quando ainda estava escuro, Jesus levantou-se, saiu e foi para um lugar deserto, onde ficou orando." Este é um dos primeiros exemplos em Marcos, mostrando que Jesus priorizava a oração, mesmo antes de um dia cheio de ministério.
· Mc 6.46: "Depois de se despedir deles, foi para o monte a fim de orar." Após a multiplicação dos pães e a dispersão da multidão, Jesus busca um lugar isolado para orar.
· Mc 14.32-42: Este é um relato mais extenso e significativo da oração de Jesus na noite anterior à sua crucificação:
- Mc 14.32: "Foram para um lugar chamado Getsêmani, e Jesus disse aos seus discípulos: 'Sentem-se aqui enquanto eu oro.'"
- Mc 14.35: "Indo um pouco mais adiante, prostrou-se e orava para que, se possível, aquela hora não viesse sobre ele."
- Mc 14.36: "E dizia: 'Aba, Pai, tudo te é possível. Afasta de mim este cálice; contudo, não seja o que eu quero, mas o que tu queres.'"
- Mc 14.39: "Mais uma vez ele se afastou e orou, dizendo as mesmas palavras."
- Mc 14.41: "Voltando pela terceira vez, disse-lhes: 'Vocês ainda estão dormindo e descansando? Basta! Chegou a hora! O Filho do homem está sendo entregue nas mãos de pecadores.'"
Perspectivas sobre a Intercessão e Soberania de Deus:
A. A Oração como Meio Escolhido por Deus: Embora Deus seja soberano e Seu plano final esteja estabelecido, a Bíblia consistentemente apresenta a oração como um meio pelo qual Deus escolhe realizar Seus propósitos na história e na vida das pessoas. Em vez de ver a soberania de Deus como um impedimento à oração, podemos entendê-la como o contexto dentro do qual nossa oração se torna significativa. O Deus que orienta os fins, orienta também os meios.
Deus, em Sua infinita sabedoria, inclui as orações em Seu plano soberano. A nossa intercessão é elo causal que Ele estabeleceu para que certas coisas aconteçam. Não diminuímos a soberania de Deus ao orar; pelo contrário, podemos estar agindo em conformidade com ela, mesmo que não compreendamos totalmente como isso funciona.
2. Expressão de Dependência:
- A intercessão é, antes de tudo, uma expressão do nosso reconhecimento da dependência de Deus. O ato de interceder molda o nosso coração, nos torna mais compassivos e nos lembra da nossa conexão uns com os outros no Corpo de Cristo.
- Orar nos lembra que não temos controle final sobre as circunstâncias. Confiamos que Deus agirá segundo a Sua vontade, mas expressamos nosso desejo de que Sua graça e misericórdia se manifestem na vida daqueles por quem oramos.
3. O Mistério da Vontade de Deus:
- A relação exata entre a soberania de Deus e a agência humana, incluindo a oração, é um mistério que não podemos sondar completamente. A Bíblia afirma ambas as verdades: a soberania absoluta de Deus e a importância da oração. Tentar resolver essa tensão de forma simplista pode levar a extremos não bíblicos (fatalismo ou autonomia humana completa).
- Podemos confiar que Deus, em Sua perfeição, orquestra todas as coisas de acordo com o Seu bom propósito, e que a nossa oração tem um lugar significativo dentro desse propósito, mesmo que não entendamos plenamente o "como".
4. O Exemplo de Cristo e dos Apóstolos:
- Jesus intercedeu fervorosamente por seus discípulos e por todos os que creriam nele (João 17). Os apóstolos também dedicaram tempo de oração pelas igrejas e indivíduos (Rm 1.9-10, Ef 6.18). Se a intercessão fosse inútil diante da soberania de Deus, seria difícil entender por que Jesus e os apóstolos a praticariam e a ensinariam.
5. O Convite ao Envolvimento:
- Deus nos convida a participar do Seu trabalho no mundo através da oração. Ele poderia agir diretamente em todas as situações, mas escolheu envolver Seu povo em Seus planos através da oração e de outras formas de serviço. A intercessão é uma maneira de nos alinharmos com o coração de Deus e de participarmos ativamente do Seu Reino.
Analogia:
Pense em um pai que tem um plano para o futuro de seu filho, mas ainda assim valoriza e ouve os pedidos e as preocupações do filho. O pai pode não mudar seu plano fundamental, mas o diálogo e a expressão dos desejos do filho fortalecem o relacionamento e podem até influenciar a maneira como o plano é implementado ou os detalhes ao longo do caminho. Da mesma forma, nossa oração a Deus, mesmo dentro do contexto de Sua soberania, é uma expressão de nosso relacionamento com Ele e pode ter um impacto que nem sempre compreendemos.
Conclusão:
Intercedemos em oração não porque acreditamos que podemos manipular ou mudar a vontade soberana de Deus no sentido de frustrar Seus planos. Oramos porque Deus nos convida a fazê-lo, porque expressa nosso amor e dependência, porque buscamos o Seu coração para aqueles por quem oramos e porque confiamos que nossa oração tem um lugar significativo dentro do Seu plano misterioso e perfeito. É um ato de fé, esperança e amor que nos conecta mais profundamente com Deus e com o Seu povo.
Jesus orava
Todas as vezes que leio passagens que narram as orações de Jesus, tenho aquela pergunta em meu coração: Por que Jesus orava se ele era o próprio Deus?” Responder a esta questão abre toda uma nova compreensão sobre o significado da oração.
- Jesus orava para alinhar sua visão com o Pai – Isto significa comunhão. Jesus orava para que assim pudesse estar perto de Deus. Nós oramos para conseguir coisas de Deus, como se a oração fosse um segredo para arrancar coisas das mãos do Pai. C.S. Lewis parece ter entendido bem esta dimensão da oração ao afirmar: “Não oro para Deus mudar o seu coração, mas para que meu coração seja mudado”.
- Jesus orava para fugir da estressante pressão popular. Em Mc 1.37, depois de longa busca os discípulos encontraram Jesus e lhe disseram: “todos te buscam”. E Jesus poderia ter respondido: “Por esta razão, por ser tão requisitado, é que me escondi na oração”.
A verdade é que, quanto mais exigido publicamente, mais teremos que nos esconder das exigências públicas. Bill Hybels escreveu interessante livro: “Muito ocupado para deixar de orar”. Em geral dizemos que estamos deixando de orar por causa das exigências, negócios e solicitações que nos fazem, mas em Jesus vemos o contrário. Ele sabia que as pessoas iriam exigir sua atenção, por isto se refugiava na oração.
Esta tem sido a dimensão mais perdida de nossa vida espiritual. Tentamos transformar Deus num “faz-tudo” particular, e por isto mantemos uma relação de interesse com ele. Jesus, porém, orava por outros motivos.
- Jesus orava para se capacitar ao ministério – Em Mc 1.38-39, depois de ter sido cobrado de seus discípulos, ele os convida à missão dizendo “para isto vim”. Faz missão depois que ora. Uma atividade não é substituta da outra. Por isto não vemos Jesus orando para expulsar demônio, ele simplesmente exercia sua autoridade recebida da vida de comunhão com o Pai, para exercê-la.
Quanto maior o senso de nossa missão, “para isto vim”, maior será nosso tempo e nossa oração. Na comunhão torna-se claro o que você foi chamado a fazer e não o que o povo espera de você. O que o público exige (demandas e senso de urgência), não é exatamente o que você deve tentar satisfazer.
Jesus parece ter recebido uma “censura velada” dos discípulos quando afirmaram: “todos te buscam”, mas Jesus sabe exatamente o que é importante para sua alma, e prioriza seus valores de forma serena e profunda.
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