segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Mc 7.1-23 Perigos da Tradição

Introdução:Este texto começa com uma questão relacionada a Jesus e os líderes religiosos daqueles dias. Quando ouvimos falar de “fariseus” e “ escribas” (vs.1), nossa tendência imediata é achar que estes homens eram um grande problema. Na verdade, sua religiosidade era muito melhor, em muitos pontos, que as que professamos hoje em dia. Os fariseus faziam parte da vertente mais estrita e rígida do judaísmo, eram rigorosos no cumprimento da lei, tinham perfil conservador, seriam na nossa cultura os “bons garotos” ou “gente boa!”.
Os escribas eram homens que viviam diariamente transcrevendo os textos do Antigo Testamento. Conheciam os termos do Antigo Testamento e seu significado, eram gente culta, os teólogos no dia de Jesus.
Este texto, porém, é um texto de crise. Jesus está confrontado a forma deles viverem em relação a Deus. A palavra “tradição” surge 4 vezes neste texto: vs.3,5,9,13. Obviamente Jesus estava querendo trazer iluminação a uma coisa tão cara ao povo judeu que era a tradição.
Particularmente não gosto de ser cunhado de tradicional. Igreja tradicional tem ranço de museu, de arquivo. Gosto de pensar numa igreja histórica, isto é, não sopra aos primeiros ventos de idéias e doutrinas que aparecem e sabe julgar neo movimentos que de tempos em tempos surgem na nossa história. No entanto, isto não me livra de ser um “tradicional” e “conservador”, no pior sentido da palavra.

Quais são os perigos da tradição?
1. Dá sacralidade ao temporal – Valoriza o antigo em detrimento do novo. Confundem acidente com essência, histórico com revelado, temporal com o eterno. Acham que a verdade está no velho ignorando que o velho, quando surgiu, era novo. A verdade não está no velho nem no novo, mas no eterno. Tradição tem a ver com o que aconteceu com a história, e não dá para sacralizar tudo o que aconteceu. Jesus critica aqui o critério da "tradição dos anciãos" (Mc 7.3).

2. Valoriza o externo em detrimento do interno – Confundem acidente com essência. Colocam força em coisas externas, quando a ênfase deveria ser no coração e na essência das coisas. Rituais passam a valer mais que pessoas, construções valem mais que vidas, programas mais que salvação de almas, organização mais que organismo (vida), lugar santo mais que pessoas santas, monumentos tornam-se mais importantes que movimentos, religiosidade mais que relacionamentos, regras mais que coração. Jesus lida com isto quando se refere ao comportamento daquelas pessoas que estavam tão preocupadas em lavar a mão para se assentar à mesa, mas sem que aquilo tocasse o coração endurecido e arrogante que tinham (Mc 7.4).
Este é um dos problemas básicos do legalismo. Muita ênfase no externo, pouco no coração. O legalismo toca superficialmente na questão, por isto não atinge o coração. Dá ênfase aos aspectos exteriores da vida. O grande problema do texto: Lavam as mãos (cerimônia de purificação), mas não tem o coração quebrantado.
Este é o grande perigo que nós, que freqüentamos diariamente a igreja, corremos. Será que temos um coração quebrantado? Contrito? Realmente preocupado com o coração de Deus? Ou fazemos as coisas apenas para manter as nossas reputações e darmos uma impressão de que somos “gente boa”?
Jesus afirma: “Este povo honra-me com os lábios, mas seu coração está longe” (Mc 7.6). No crivo de Deus, como está nossa vida? Seu coração treme pelas coisas de Deus? Você tem chorado e preocupado diante de Deus com seus estilo de vida? Você tem pedido graça de Deus para sua alma? Gente religiosa se contenta com o externo. Coração fica frio, distante de Deus, mas ele continua ainda a fazer seus rituais, sem perceber a seriedade de seu mal. Por isto homens que lideram a igreja, muitas vezes, são capazes de estar a frente da obra, vivendo uma vida dupla, de adultério, de indiferença, etc.
Ao chegar em casa, Jesus vai explicar seu discurso aos discípulos (Mc 7.17-23). Faz critica aos comportamentos externos. Estas pessoas adoram controlar o exterior, as formas das coisas. Neste caso, rituais de comida (Mc 7.19). Este texto arrepia muitos legalistas que adotam restrições alimentares em nome de Deus. Nosso problema não é comida, mas o coração. Aqui está o cerne de nossa espiritualidade.

3. Muita ortodoxia, pouca afetividade – Zelosos por Deus, pela lei, pela ortodoxia.
Jesus mostra que muitos estavam omitindo o cuidado com seus pais, que em muitos casos dependiam da ajuda dos filhos, justificando o fato de estarem envolvidos na obra do Senhor (Mc 7.11-12). “Aquilo que poderias aproveitar de mim é corbã” (Mc 7.11). Corbã é um tipo de oferta religiosa. Pessoas que se julgavam muito espirituais, se eximiam de cuidar de seus pais. Justificando seu descaso por causa da fé. Se nossa fé tem algum problema com espiritualidade, ela é doentia. “Se alguém não cuida dos seus, especialmente dos de sua própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente” (1 Tm 5.8).
Badú: “O critério para escolher um diácono e um presbítero da igreja não deveria ser pelo afeto?”. Quanto de nosso coração é afetivo.
Pastores se tornam profissionais – sem afeto em relação sua esposa e filhos, a sua igreja e á Deus.
Pense no líder de sua igreja a partir de sua família. Este homem tem seu coração convertido aos filhos, à sua esposa? Os filhos destes líderes são capazes de perceber que Deus realmente está presente na sua prática?

4. Valoriza o humano em detrimento do divino – Paulo mostra isto em 2 Corintios 3, quando faz comparação entre a velha e a nova aliança. Ele afirma que a Velha estava ligada a coisas: A lei fora inscrita em pedra, não no coração. A velha aliança relaciona-se a pedras, a Nova relaciona-se ao coração: pessoas. O cristianismo falso está sempre preocupado com a importância das coisas: Pedras, rituais, templos, vitrais, órgãos. Se o pastor vem de paletó, toga: Coisas. Na Nova Aliança, pessoas são importantes. As coisas são importantes como auxílio às pessoas. Jesus curou no sábado: escândalo. Os fariseus se preocupavam com coisas. Quantas vezes vemos esta atitude na Igreja. A reputação vem antes da pessoa. Tradições são mantidas para atender necessidades de alguém. O que está em jogo é o status e a aceitação de alguém. Valoriza as formas ao invés do coração.

Resultados:
A. Facilmente encobre a verdade, pregando a verdade- Pregam, não todo conteúdo, mas o conteúdo que lhes interessa. Criam o evangelho dos santos evangélicos (J. Carlos Ortiz).
Toda vez que pregamos a palavra devemos perguntar: Esta verdade é bíblica, mas traduz toda verdade divina? Paulo afirma: “Jamais deixei de vos anunciar todo o desígnio de Deus” (At 20.27). Heresia, não é a rejeição da verdade, mas a minimização da verdade em detrimento de outra. É uma questão de ênfase. Veja os exemplos abaixos, se você valorizar qualquer um deles, você se torna herético.
Oração & Ação social
Responsabilidade humana & Soberania de Deus.
Evangelização sem humanização.
Humanização sem evangelização.
Justiça social & Evangelho da cruz.
Evangelho da cruz & Justiça social
Em qualquer destes casos, é fácil tomar uma bandeira e se esquecer do equilíbrio que existe entre as duas. Assim esquecemos, suprimimos ou negamos o todo.

B. Manipula a palavra para justificar atitudes contrárias – "jeitosamente rejeitais" (7.9) A gente dá um jeito brasileiríssimo de ajeitar a Bíblia aos nossos interesses. Dá um jeitinho...
Como fizeram isto? Tornaram-se religiosos o suficiente para perder a essência da lei. (Mc 7.10-12). Cumpriam a lei de forma suficiente para não a cumprirem.
Exemplo: Pastor em Medford, que deixou de cuidar de seus filhos por causa do ministério.
Pessoas que se tornam ótimos religiosos, mas a vida deles não é tocada pela operação do Espírito Santo.
Ilustração: D. Divina, Vila Morais: "Pastor, é possível a gente falar em língua, e depois xingar os outros e falar palavrões dentro de casa?"
O Evangelho só é autenticado quando penetra nas nossas relações horizontais, mexe com nossa forma de ser e viver, atinge nossa ética. Traz conversão de pais a filhos, filhos a pais, esposos a esposas, e assim por diante. A Bíblia não te desobriga do cuidado com sua família, mas te convida a envolver-se ainda mais com ela. "se alguém não tem cuidado dos seus, especialmente dos de sua própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente".

C. Não permite que o Evangelho penetre no coração: Tudo é externo: comportamentos, normais, tudo exterior.
Os discípulos foram questionados pelo exterior. Jesus lhes dá uma explicação baseada nas leis cerimoniais: Cita o exemplo de comida. Comida é exterior. Jesus mostra que o problema não é o que se come, mas aquilo que está comendo você. Aquilo que penetrou sua alma. Lei está muito preocupado com o cumprimento externo da lei, mas não atenta para o coração.
Filipe Yancey no seu livro, maravilhosa graça, conta a história do Big Harold, um homem que o protegeu tremendamente na sua infância.
Pedro em Atos 10: mata e come!
Coração e Evangelho são correlatos: Tirarei o vosso coração de pedra e colocarei coração de carne. O problema é meu coração, ele precisa ser mudado.
Culto sem paixão: Nenhum sentido! "Este povo honra-me com os lábios, mas seu coração está longe!" ((Mc 7.6).
O legalismo é incapaz de abraçar o evangelho. Sua ênfase não está no que Cristo fez, mas no que ele faz. A cruz aponta para a expiação de Cristo, antes de mais nada, fala das “bad news” da nossa existência. Por nós mesmos somos incapazes de qualquer coisa. Nossos sacrifícios, boa obra e justiça própria retiram a centralidade da obra de Cristo. O legalismo aponta par ao homem, o que ele faz; a cruz aponta para Deus, o que Ele faz.
Legalismo cria uma espiritualidade paralela. “Evangelho dos santos evangélicos”. O legalista nunca entende a gravidade de seu coração longe de Deus, ele acha que o que faz é correto, e ele não sente necessidade de Deus.
No entanto, só a cruz tem o remédio para a frieza e indiferença de nosso coração para as coisas de Deus. Naturalmente somos inclinados á vaidade, auto exaltação, auto glorificação.
Por isto Jesus fala de coisas difíceis de entender, como “novo nascimento”, e a “necessidade de morrer para si mesmo”. O legalismo e a tradição nunca impedem que você adentre esta dimensão que Deus quer dar à sua vida.

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