segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Mc 8.31-33 O fermento da Religiosidade

Introdução:Fermento na Bíblia tem duplo sentido:
 Negativo- Usado para se referir a atitudes malignas que penetram no meio do povo de Deus e o afasta do propósito inicial.
 Positivo – O Reino é comparado ao fermento em Mt 13.33. Reino traz em si idéia de conspiração.
Neste último sentido, somos semeadores do “fermento” que penetra silenciosamente e provoca grandes transformações onde ele é aplicado, levedando toda a massa.
Pr. Glenio Paranaguá, conta a história de um avivamento acontecido no Brejo do Maroto, Piauí, que alcançou sua mãe. Este episódio revela muito bem como o Evangelho pode ser transformador.
Passou por lá um pregador itinerante que evangelizou Seu Filomeno, homem semi-analfabeto, mas que entendeu a graça de Deus e procurava ler a Bíblia para seus filhos e amigos da fazenda. Aos poucos, pessoas da redondeza, foram atraídas ao “oculto”, que era como chamavam o culto cristão dirigido por aquele irmão simples. Eles não tinham pastor nem hinários, e o único hino que sabiam cantar era “deixa a luz do céu entrar, deixa o sol em ti nascer; abre o coração e deixa Cristo entrar”. Este cântico estava presente em todos os encontros dominicais. Depois de algum tempo, as pessoas passaram a chegar em grande número, e no auge daquele mover de Deus, cerca de 500 pessoas já participavam do culto, com a leitura bíblica claudicante que era feita pelo irmão Filomeno. Tempos depois, passou por lá outro pastor, da Igreja Batista, que teve de batizar 200 novos convertidos naquela fazenda. Este é o fermento positivo do Evangelho, que leveda a massa e transforma o pecador em pessoa redimida, trazendo compreensão do amor de Deus e salvação ao seu coração.
Neste texto Jesus fala do perigo do mau fermento, que penetra sorrateiramente através de doutrinas perniciosas e a ensinos de homens, e que leveda e profana aquilo que é bom, e é capaz de diluir a boa semente da mensagem cristã, em mentiras ardilosamente criadas por homens, causando sérios danos espirituais às pessoas. Por isto Jesus adverte seus discípulos para tomarem cuidado com o fermento dos fariseus e dos saduceus (Lucas fala ainda do fermento de Herodes).
Qual o fermento dos fariseus e saduceus? O texto faz uma menção clara que se trata do fermento da religiosidade. Como os religiosos tem o poder de destruir e contaminar a simples mensagem do Evangelho. Bastar lermos a carta aos Gálatas, escrita apenas 30 anos depois da subida de Jesus aos céus, para vermos como os cristãos já estavam passando do evangelho genuíno para “outro evangelho”. Paulo afirma que se sentia admirado de que isto tivesse acontecido assim tão depressa (Gl 1.6-8)
Por esta razão, Jesus foi mais crítico dos fariseus e religiosos de seus dias, que eram homens respeitáveis moralmente, do que dos pecadores. Chegou mesmo a ser chamado de “amigo dos pecadores” (Mt 11.19) e afirmou que publicanos e meretrizes precederiam os religiosos no reino dos céus.
Estes grupos religiosos citados por Jesus gozavam de excelente reputação. Eram líderes religiosos e tinham grande admiração de toda comunidade, ocupavam cargos de liderança e posições importantes no templo. No entanto, Jesus adverte seus discípulos contra o fermento dos mesmos.

Por que?
1. Religiosos tropeçam na sua justiça própria – Jesus ensina que “os sãos não precisam de médicos”. Os religiosos, geralmente se sentem acima da necessidade de confissão de pecados e não reconhecem o mal que existe em seus próprios corações. Religiosos não entendem o risco de suas almas, pois acham que quem precisa de Jesus são os pecadores, e eles não se acham dentro desta categoria humana.

A justiça própria sempre desemboca em duas graves conseqüências:

A. Orgulho espiritual – Pessoas que acreditam que porque praticam atos bons, são merecedoras do céu. No entanto, o evangelho não fala de conquistas humanas, mas fala da conquista de Jesus a nosso favor, alcançada por intermédio de seu sacrifício. O evangelho não focaliza no que os homens tem feito por Deus, mas no que Deus tem feito para os homens.
Rm 3.19 nos ensina: “Para que, diante de Deus se cale toda boca!”. Na verdade, os mandamentos de Deus apenas demonstram como somos incompetentes espiritualmente para cumpri-los, então, a lei que é boa, acaba se tornando instrumento de execução e juízo, porque ela diz o que devemos fazer mas não conseguimos praticá-la. A Bíblia afirma que nenhum homem foi capaz de cumprir a lei. Na lei descobrimos o que devemos fazer, mas infelizmente não temos força para fazer o que é necessário.
Por esta razão o homem é salvo “pela graça”, e apenas “pela graça” (Ef 2.8-9). Paulo afirma em Fp 3.8-10, que queria ser encontrado em Deus, não tendo justiça própria. Normalmente cremos que “nossa bondade é suficiente”. Isto gera orgulho. O evangelho diz que somos incapazes de responder positivamente a Deus, nossa vontade e mente, são escravizadas pelo pecado, e apenas o Espírito de Deus operando em nós pode nos levar a desejar as coisas de Deus. Nossa vontade é contaminada desde a queda e por isto somos constantemente inclinados para o mal.

B. Depressão espiritual – O outro resultado da confiança em nossa justiça própria é o oposto do orgulho, quando vem sobre nós o sentimento de desencorajamento e frustração que temos ao perceber que somos viciados no pecado. Pecado não é acidente de percurso, mas a nossa essência. Não somos pecadores porque pecamos, mas pecamos porque somos pecadores. O problema central não é o que fazemos, mas o que somos. Nossa natureza, entregue a nós mesmos, nos destrói.
Então, quando buscamos servir a Jesus de forma profunda, sempre enxergamos nossa incapacidade, e nos sentimos frustrados e tristes com o nosso coração.
Minha esposa estava discipulando uma jovem que afirmou estar desistindo de Deus por se sentir incapaz de seguir a Cristo. Ela havia se embrenhado nas drogas na sua adolescência, e um dia, sozinha no seu quarto, desistiu de si mesma e desesperada, pediu forças a Deus. Jesus trouxe libertação dos seus vícios e restituiu sua dignidade que já havia se perdido, quando sua família, amigos e nem ela mesma acreditava que pudesse se libertar de sua dependência. Agora, minha esposa a lembra de como ela havia obtido vitória: Através do sangue do Cordeiro, pela ação de Jesus em sua vida. Sara Maria então a convidou, mais uma vez, a desistir de si mesma e olhar para Jesus.
Os puritanos alertavam suas comunidades de que, quando olhamos para fora, contemplamos as pessoas, o resultado é cinismo (sociedade corrompida, moral destruída, políticos mal intencionados, corrupção, decadência, etc); quando olhamos para nós mesmos, nos desesperamos (as tentações, luxuria, vaidade, ira, ressentimento, etc). Parece que não conseguimos avançar na fé e descansar nos braços do Senhor. Vemos o nosso fracasso, e compreendemos que nossas intenções não são fortes o suficientes para glorificar a Deus. Por isto, precisamos olhar para a cruz. Quando olhamos para a obra de Cristo, podemos encontrar descanso para nossas almas. Paulo afirmava o seguinte: “Eu me glorio na cruz!” (Gl 6.10). Em que ou quem estamos nos gloriando? Nos nossos méritos, na nossa justiça própria? Nos trapos morais que apresentamos diante de Deus ou na obra vicária e perfeita de Seu Filho?
Por causa disto, os puritanos diziam: “Cada vez que olharmos para dentro de nós e vermos nosso fracasso, arrogância ou desespero, devemos olhar dez vezes para cruz”.

2. Religiosidade é como fermento: Contamina! Temos apenas duas opções: Ou olhamos para a cruz (O poder do evangelho), ou para nós mesmos (justiça própria). Quando a comunidade cristã aprende a olhar para Jesus, sua reputação e honra – tudo é obra de Cristo. Nenhum mérito, mas plena aceitação.
Apesar disto, temos que considerar que a religiosidade nos atrai: Códigos externos, rudimentos morais, guarda de dias, meses e anos exercem um grande fascínio sobre a raça humana (Gl 4.8-11). Sutilmente a lei nos escraviza. Paulo diz à Igreja da Galácia, que ela havia se afastado do Evangelho e por isto havia perdido a exultação. Por isto perfunta: “O que foi feito da vossa alegria?” (Gl 4.15).
O que Cristo fez na cruz? Ele “nos resgatou da maldição da lei”. O que é isto? Ele assumiu o nosso lugar, tirando de nós todos os encargos, ordenanças e mandamentos que nunca poderíamos cumprir. Ele cumpriu toda a lei, para satisfazer a exigência de justiça que um Deus santo requer, e nos trouxe para o domínio da graça, que se realiza em nós por meio do poder do Evangelho que nos é comunicado pelo Espírito Santo.
Os religiosos contaminam os outros com ensinamentos focados na habilidade humana, no esforço humano e na competência pessoal. Jesus adverte: “Acautelai-vos do fermento dos fariseus”. Tome cuidado! Isto pode ser atraente, mas é fermento do mal, que leveda toda a massa.
Em Fp 3.2-3, vemos a mesma expressão: “Acautelai-vos dos cães, acautelai-vos dos falsos obreiros, acautelai-vos da falsa circuncisão”. Se lermos atentamente, veremos que ele chama os falsos obreiros de verdadeiros cães. Eles ensinam mentira, apesar de serem obreiros, isto é, estão envolvidos teoricamente na obra de Deus, mas conspiram contra a mensagem de Deus. Circuncisão, por sua vez, fala de algo externo, periférico. Aqueles que se firmam na lei, sempre tratam da superficialidade da espiritualidade. Por isto a lei tem tanto prazer nos rituais, em prédios, coisas, paramentos, etc.
“Não sou o que devo ser, não sou o que quero ser, não sou o que um dia espero ser, mas graças a Deus não sou o que fui antes, e é pela graça de Deus que sou o que sou” (John Newton). Se minha mensagem está centralizada no que o homem pode fazer, e não no sacrifício de Cristo, eu ainda não estou pregando o evangelho.

3. Religiosos encontram grande dificuldade em entender o Evangelho – Vemos isto em Mc 8.21: “Não entendeis ainda?” e em Mt 8.11: “Como não compreendeis que não vos falei a respeito de pães?”. Os discípulos tinham todo o peso de obrigações, leis e costumes do AT e não estavam conseguindo entender o que Cristo ensinava.
Paulo encontrou este mesmo problema na mentalidade das novas comunidades cristãs que foram alcançadas pelo Evangelho, mas que eram contaminados pela influencia religiosa judaica, que se fundamentava em rudimentos (stoicheias). A Carta aos Gálatas fala da liberdade cristã que alcançamos em Cristo. Paulo está procurando tirar o velho fermento que dificultava a compreensão da mensagem do Evangelho.
Ele ensina que só Jesus era suficiente, mas os judaizantes queriam colocar algumas regras: Guarda do sábado, circuncisão, guarda de dias santos, etc. A Lei torna difícil a compreensão da carne.
Na Epistola aos Hebreus, vemos o autor tentando formar a compreensão teológica do significado da obra de Cristo, comparando-o ao Antigo Testamento. Ele afirma que a Lei tinha “sombras”, mas não a imagem perfeita (Hb 10.1), e que sangue de touros e de cabritos jamais poderiam purificar a consciência (Hb 9.24), no entanto as pessoas tinham dificuldade para assimilar o conteúdo do Evangelho. Como entender agora que todo sacrifício se cumpre em Cristo?
Nos nossos dias, encontramos a mesma complexidade na questão da salvação pelas obras. Quando falamos que apenas a graça é suficiente, como o nosso software religioso é voltado para salvação através de méritos pessoais, temos dificuldade de crer que Cristo, e a penas Cristo é suficiente. Lutero mesmo reconhecia sua própria dificuldade em viver na plena convicção da graça, ele afirmou certa vez, que depois de estar pregando sobre a Obra suficiente e plena de Cristo na cruz, ele ainda se sentia tentando fazer alguma coisa para Deus a fim de convencê-lo de que era digno de ser amado.
Por esta razão pessoas religiosas e que se acham boas moralmente, tem grande dificuldade em entender a graça de Deus.

Conclusão:“Guardai-vos do fermento dos fariseus e saduceus”. Como precisamos estar atentos às inclinações da nossa própria religiosidade. Porque ela nos fazem tropeçar na justiça própria, contaminam o Evangelho e sua simplicidade, e dificultam a compreensão e aceitação da graça simples do Evangelho que diz que não somos salvos pela graça, mas pela obra salvadora de Cristo (Tt 3.5). Por isto, tome cuidado com sua religião. Católicos, espíritas, evangélicos e todas as outras formas de religião, facilmente nos levam a tirar os olhos de Cristo e olhar em outra direção, afastando-nos da mensagem reconciliadora que Deus propôs em Cristo Jesus.

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