Introdução:
Como vimos antecipadamente, a centralidade da parábola
não está no filho que sai, nem no filho que fica, mas no amor do Pai. Os dois
filhos não são o centro da parábola, mas o pai, como como aquele que lida com as
tensões da casa: Com o filho que sai, com sua atitude egoísta e relativista; e com
o filho que fica, que nunca saiu, mas nunca esteve por inteiro.
Esta parábola nos ensina sobre ser pai. Como o Pai
lida com cada um deles?
Esta parábola nos fala sobre Deus, como ele nos trata.
Como o pai trata
o filho que sai?
- Sabe deixar sair - Há
pais que não deixam sair, e isto impede que os filos amadureçam. Precisamos
deixar os filhos crescerem e muitas vezes para que isto aconteça, eles
precisam sair.
Este é um tempo difícil e
dolorido, principalmente para a mãe que possui uma relação uterina com seus
filhos.
Existem muitos filhos que
não querem sair, porque quebrar o cordão umbilical implica em dores, exige
maturidade. Existem muitos pais que não querem deixar sair: Isto implica em
impedir que os filhos se tornem maduros.
Existem filhos que saem, sem
sair. Mantém sempre uma relação de recaídas, mesmo depois de casados, ficam
numa relação simbiótica, que é reforçada ora pelos pais, que não querem que eles
voem, nem por eles mesmos, que se sentem ameaçados e com dificuldades de voar.
Deixar sair, não é um
processo fácil. Envolve sofrimento e dor, mas ajuda no crescimento e
desenvolvimento. Recentemente vi uma filmagem no Discovery Channel sobre a
criação de uma águia. Durante 1 ano eles alimentam o filhote, que passa a ficar
cada vez mais impaciente e com o ninho cada vez menor, na medida em que cresce.
Então, um dia, quando o filhote já pode voar e não o faz, a águia simplesmente
deixa seu filhote no ninho e não volta mais. Então, o filhote percebe que esta
é a hora de voar, e ele, de forma indeciso, inicialmente, finalmente assume
coragem e risco e salta do ninho, dando seu primeiro voo solo.
- Deixa a porta aberta
para o filho voltar – Deixa o filho sair, mas não fecha as
portas para ele voltar.
O Pai não é ranzinza nem mau
humorado. A casa continua sendo sua casa, mas ele deixa claro que tem saúde
emocional suficiente para perdoar, restaurar e acolher. Quando o filho tem
dificuldades, sua casa está aberta para curar, abraçar e beijar.
Alguns anos atrás, ainda
pastor no Rio de Janeiro, recebi uma inesperada ligação da policia de
madrugada. O Rio de Janeiro faz muito calor, mas naquele dia, estava frio. O
policial me disse que havia alguém na delegacia da Urca, que precisava de minha
ajuda. Depois de saber quem era, me lembrei vagamente daquela moça que
esporadicamente frequentava nossa igreja. Atendendo ao pedido policial, fui
àquela delegacia, e encontrei aquela moça, com seus 19 anos de idade, encolhida
num banco frio de cimento, numa posição quase fetal, meio dormindo meio
acordada. E ela comecei a conversar com ela.
Ela vinha de uma igreja
evangélica, e era fumante de maconha e estava absolutamente dependente. Em
geral as pessoas afirmam que não são viciadas, mas se você está passando por
uma situação na qual você não consegue viver sem beber ou fumar um baseado,
esteja certo de que você já é um dependente. Na tentativa de conseguir algum
cigarro de maconha, ela foi até uma boca de fumo, tentando conseguir um trago,
e ali foi envolvida numa situação com os traficantes e o resultado foi que ela
acabou sendo abusada sexualmente e foi neste estado de vergonha e humilhação
que a policia a encontrou e a trouxe.
Levei aquela moça para sua
casa, ela neste tempo estava morando com um rapaz que em troca de sexo fornecia
o dinheiro para ela fumar, e ele agora não a queria mais recebe-la em casa.
Disse-lhe então, que a única possibilidade dela seria voltar para casa, no
interior do Paraná, e ela então me revelou que quando saiu de casa, tivera um
briga muito feia com seu pai, e ele lhe disse que se ela saísse nunca mais
deveria voltar. E agora, na sua angústia, precisava voltar, mas as portas
estavam fechadas para ela. Eventualmente ligamos para seu pai, que decidiu
aceitá-la novamente, e ela retornou para sua cidade natal.
Este é o cenário comum de
tantas casas, nas quais os filhos desorientados, machucam, ferem seus pais, e
perdem para sempre a possibilidade de voltar.
O pai deixa sair.
O pai deixa voltar.
Existem lares que não querem
deixar sair – e impedem o crescimento, ainda que doloroso.
Existem lares que não querem
deixar voltar – e impedem o processo da cura e da reconciliação.
- Tem capacidade para restaurar
o filho –Pais são facilitadores da restauração e da
redenção dos filhos.
O Pai se revela mediador,
ele é agente de Deus para curar e salvar aquele garoto tão ingênuo e tolo, de
dar uma segunda oportunidade.
O que o pai faz:
- Ele
lhe veste com a melhor roupa – Isto significa tirar
a vergonha do filho. A Bíblia muitas vezes afirma que Deus nos dá, por
meio de Jesus, uma nova roupagem.
Isto pode ser visto na
parábola das bodas, quando o honrado senhor convida as pessoas para virem para
a sua festa, e coloca roupas novas naqueles que são seus convidados. É o amor
do pai que nos restaura.
Em Apocalipse lemos: “Alegremo-nos e exultemos e demos-lhe a
glória, porque são chegadas as bodas do Cordeiro, cuja esposa a si mesma se
ataviou, pois lhe foi dado vestir-se de linho finíssimos resplandecente e puro.
Porque o linho finíssimos são os atos de justiça dos santos” (Ap 19.7-8).
Esta é a figura do amoroso
Deus, que dá nova roupagem para aqueles que são redimidos pelo sangue do
Cordeiro.
- Ele
lhe coloca anel no dedo – Este é o símbolo da autoridade
familiar.
Cada família tinha um anel
de identidade familiar. Quando o filho saiu, ele rompeu com sua família, ele
desprezou os vínculos familiares, mas agora seu pai lhe coloca de novo um anel.
Há muitos filhos aqui que precisam novamente, colocar anéis da família em seus
dedos. Precisam voltar à identidade familiar.
- Ele
lhe coloca sandália nos pés. A verdade é que escravos
não usavam sandálias.
Seu pai muda sua condição e
seu status, que nem o próprio filho cria que teria mais. Ao retornar para casa,
ele sabia que havia quebrado todas as convenções sociais, e desrespeitado todos
valores, por isto afirma: “Pai, pequei
contra os céus e diante de ti, já não sou digno de ser chamado teu filho,
trata-me como um dos teus trabalhadores” (Lc 15.18-19).
Ele havia perdido seus
direitos, por todos os erros cometidos.
Muitos filhos vivem assim, e
perdem todo respeito e dignidade. O Pai restaura sua vida.
- O
pai faz uma festa para recebê-lo - Isto é deixar a porta aberta!
Às vezes a restauração é
aparentemente feita, mas a volta do filho se torna um peso.
Existe um fenômeno que
precisa ser estudado em relação à recuperação de drogados. Muitos jovens saem
para clinicas ou casas de recuperação para se livrar da sua dependência de
drogas ou álcool, e ali, depois de seis meses ou mais, encontram-se
completamente limpo, eles não precisam mais da droga para viver, seu organismo
foi descontaminado. Entretanto, o que acontece quando voltam para casa? Mesmo
sem que seus organismos precisem da droga, eles voltam à droga.
O que está acontecendo? O
problema não é apenas droga, mas o sistema em torno do qual a droga se
retroalimenta. O ambiente precisa ser também descontaminado, porque ele está
tóxico.
O pai da parábola faz uma festa. Convida amigos para
festa, celebra a volta do filho. Seu
retorno, apesar das circunstâncias tão pesadas, não é um peso, portanto, há espaço
para dança. Quantos lares carecem de dança e alegria...
- O
pai, ajuda o filho rebelde a ser gracioso para consigo mesmo
– O Filho que volta precisa experimentar novamente a dimensão da vida
perdoada.
Muitas pessoas jamais
recuperam a graça da vida, depois de rupturas, porque não conseguem se perdoar,
sentem-se envergonhadas de tudo que fizeram de errado.
Certa vez convidei uma
pessoa a assumir uma posição de liderança numa igreja que pastoreei, e ele se
mostrava relutante. Eu o havia levado a Cristo, ele se convertei através de meu
ministério, eu via seu crescimento espiritual, ele se tornara um dos homens
mais ativos e generosos no serviço e na obra da igreja, mas não queria assumir
sua liderança oficialmente. Um dia ele me disse porque. Ele afirmou que muitos
naquela igreja conheciam sua vida pregressa e sabiam tudo o que ele fez de
errado, então, pensava ele, ele nunca poderia ser um líder por causa de sua vida
pecaminosa do passado. E então, ele sinceramente olhou para mim e me disse: “O
Senhor me entende pastor?”
Eu olhei para ele, e da
forma mais sincera, direta e amorosa que eu poderia falar respondi que não o
entendia. Ele ficou assustado com minha resposta. E eu expliquei:
O que você está dizendo tem
alguns problemas:
ü Primeiro,
o que você está dizendo é anti-evangélico – O que Cristo fez por nós? Ele nos
perdoou completamente. Através de seu sangue fomos declarados justos pelo pai
eterno. Nós fomos absolvidos. Sua declaração me dá a impressão de que você
ainda está debaixo da condenação e culpa do diabo. Você não está entendendo o
evangelho.
ü Segundo,
as pessoas tem duas opções ao te olhar com líder da igreja. Ou elas,
legalisticamente afirmam que você não pode ser um líder por causa de sua vida
pecaminosa, e não entenderam a essência do evangelho; ou podem dizer: A vida
daquele homem era tão complicada, e é um milagre que ele possa agora estar
vivendo desta forma, portanto, se Deus fez isto com ele, pode fazer também
comigo. E isto serviria como testemunho ao evangelho.
Foi exatamente o que o pai
da parábola fez. Ele ajudou o filho a entender a graça do pai celestial. Ele
realmente não tinha nada a oferecer ao pai, mas o pai o ajuda a olhar para si
mesmo como pessoa perdoada e aceita.
Como você se vê em relação a
Deus?
Como o pai trata
o filho que fica?
Na parábola, o pai tem dois
filhos perdidos:
Um é auto centrado,
narcisista, imediatista, que acha que o correto é fazer o que lhe dá na cabeça,
sem dar satisfação a ninguém,
O outro filho, é um
legalista religioso, faz tudo certinho, mas é frio, amargurado, duro, e
desamoroso.
O pai tem que lidar com os
dois filhos. Porque há duas formas de estar perdido, e só existe uma forma de
ser perdoado: você pode estar perdido por achar que não tem responsabilidade
com ninguém, ou por achar que é tão bom
que não precisa do pai, mantendo seu coração frio e distante, tanto do pai,
como de seu irmão, como o segundo filho faz.
II.
Sua relação que com o filho que fica
- O
Pai administra as tensões do filho que fica.
O filho não era rebelde, mas
era complicado, reprimido, amargurado, duro e descaridoso. Ele está perto do
pai, mas não conhece o coração do Pai. Infelizmente algumas das pessoas mais
frias e mau humoradas que já vi na vida são religiosos zelosos e ciosos de sua
responsabilidade.
Eu fujo de pessoas assim,
como disse Tereza D’Ávila: “Deus me livre dos santos de cara amarrada”.
- O
pai procura levar o filho à dimensão do afeto.
O Pai procura mostrar o outro
lado do relacionamento que aquele rapaz certinho não conhecia. A dimensão do
acolhimento, da aceitação, do abraço que restaura.
O pai procura demonstrar que
é possível restaurar alguém que já fez tudo errado na vida e precisa de
reconciliação. O pai tenta lhe mostrar como Deus nos trata. Ele trabalha da
dimensão do afeto com aquele filho tão cheio de direitos e tão vazio de alegria.
A verdade é que não há
maturidade espiritual sem maturidade emocional. Quando os “entranhados afetos
de Cristo” (Fp 2.1) se mesclam com nossa história, só assim estamos descobrindo
a verdadeira essência e significado do que significa ser cristão. Por isto
devemos, como filhos de Deus, nos revestirmos dos “ternos afetos de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão e
de longanimidade” (Col 3.12).
- O
pai ensina a virtude do perdão.
O pai procura demonstrar o
quanto o perdão pode ser transformador. Como disse no sermão anterior, sua
disposição é tão impressionante em perdoar, que ele não espera o filho pedir
perdão para perdoar e beijá-lo, mas o beija para ajudar a perdoar.
Existe um texto que tem
desafiado minha compreensão do poder da restauração. “Ou ignorais que a bondade de Deus é quem te conduz ao arrependimento”
(Rm 2.5). Somos transformado pela bondade de Deus, pela sua aceitação. Certa
vez ouvi uma palestra na qual o homem dizia que quando era criança, arteira, ele
não tinha medo de quando sua mãe lhe batia, mas sentia muita vergonha quando
sua mãe o colocava no colo para conversar sobre algo que ele precisava mudar.
O que nos muda não é a
pancada, mas a aceitação.
O que nos transforma, não é a disciplina, mas o amor
que deve estar presente até mesmo na disciplina. Sem ela, a disciplina falha. “O que semear a perversidade
segará males; e a vara da sua indignação falhará.” (Pv 22.8).
- O
pai ensina a importância de ser gracioso.
O Evangelho nos ensina que
Deus não nos trata mediante a nossa justiça, mas através da sua graça. Este foi
o grito desesperado do salmista: “Se
observares, Senhor, iniquidades, quem Senhor, subsistirá? Contigo, porém, está
o perdão, para que te temam” (Sl 130.3,4).
O pai promove um ambiente de
paz e alegria em sua casa. Esta é função
de um pai e de uma mãe. Ele busca a conciliação entre os filhos. Eles precisam
aprender, vendo o exemplo em seus pais.
Conclusão:
Nouwen no livro, “a volta do filho pródigo”, afirma
que esta parábola fala de uma jornada espiritual, que esta relação é um espelho
para nossas almas, e que devemos sair da posição de filho e caminhar em direção
à paternidade, já que o pai é o centro do acontecimento.
“O chamado é para que eu mesmo me torne o Pai. Por
muito tempo vivi com a convicção de que voltar à casa do meu Pai seria o
chamado final...Há um outro chamado. É o apelo para que me torne o pai que acolhe
e deseja festejar. Tendo recuperado a minha filiação, tenho agora de reivindicar
a paternidade (pg 129).
Minha vocação final é realmente me tornar como o Pai e
exercer no meu dia-a-dia sua divina compaixão...(pg 132).
“Você quer ser como o pai?”... Será que desejo ser não
somente aquele que está sendo perdoado, mas também aquele que perdoa; não
somente aquele que é bem-vindo, mas aquele que acolhe; não unicamente aquele
que é tratado com compaixão, mas aquele que tem compaixão? (pg 133).
“Chegou a hora de ultrapassar todas as barreiras e
confessar a verdade que tudo o que desejo é me transformar no velho à minha
frente. Não posso permanecer criança para sempre, não posso continuar usando
meu pai como uma desculpa para a minha vida” (pg 135).
“O... caminho para se tornar como o Pai é o da
generosidade. O Pai não somente dá a seu filho tudo o que pede, mas também o
cumula de presentes na sal volta. Todas as vezes que dou um passo em direção à
generosidade, sei que estou me movendo do medo para o amor” (Pg 144).
Questões:
Em que sentido sou confrontado com estas verdades?
Será que poderíamos caminhar um pouco a mais para a
paternidade?
Quem aceita o convite para se tornar como pai?