O profeta Jeremias enviou uma carta de Jerusalém aos exilados na Babilônia, incluindo anciãos, sacerdotes, profetas e todo o povo que Nabucodonosor havia deportado. Essa deportação incluiu figuras importantes como o rei Jeconias, a rainha-mãe, oficiais, príncipes, carpinteiros e ferreiros – estes últimos, essenciais para a sociedade da época.
A carta, foi levada por Gemarias, e trazia uma mensagem surpreendente do Senhor dos Exércitos, o Deus de Israel:
"Assim diz o Senhor dos Exércitos, o Deus de Israel, a todos os exilados que eu deportei de Jerusalém para Babilônia.
- Edificai casas e habitai nelas.
- Plantai pomares e comei o seu fruto.
- Tomai esposas e gerai filhos e filhas.
- Tomai esposas para vossos filhos e dai vossas filhas a maridos para que tenham filhos e filhas.
- Multiplicai-vos aí e não vos diminuais.
- Procurai a paz da cidade para onde vos desterrei e orai por ela ao Senhor, porque na sua paz vós tereis paz."
Em julho, dedicamos nossa programação à temática "Igreja e Cidade". Aos domingos à noite, estudaremos o livro de Jonas, que aborda a relação da igreja com a cidade. Nas manhãs, falamos sobre os desafios que a igreja enfrenta em relação à cidade.
Na semana anterior, levantamos cinco perguntas cruciais para entender nossa conexão com o ambiente urbano:
- Como Deus vê a cidade?
- Como a cidade vê a nossa igreja?
- Como nós vemos a cidade?
- Como a igreja pode abençoar a cidade com seus dons, talentos e recursos?
- Como você, individualmente, pode abençoar a cidade com seus dons, talentos e recurso
Os Seis Desafios da Igreja na Cidade
Agora, vamos nos aprofundar nos desafios que a igreja enfrenta em relação à cidade:
- Desafio da Oração: A igreja precisa aprender a orar pela cidade de forma sistêmica, intencional e apaixonada, agindo como protetores espirituais. Este é um ponto central no texto de Jeremias.
- Desafio Kerigmático (Proclamação do Evangelho): Entendemos que a plantação de novas igrejas é a melhor estratégia de evangelização, seguindo o exemplo do livro de Atos. Ao analisarmos os projetos missionários que chegam à igreja seguimos três critérios:
- Foco na plantação de uma igreja. mesmo que muitas vezes a plantação de igrejas não siga uma linha institucional.
- Prioridade para missionários que estão servindo diretamente no campo, não apenas na base. Apesar de entendermos que existe necessidade de termos missionários nos escritórios, houve uma época em que quase 50% dar parcerias missionarias que tínhamos estava ligada a missionários que estavam trabalhando nas bases e não nos campos avançados.
- Conexão com a Agência Presbiteriana de Missão Transcultural para maior suporte e alinhamento. Temos parcerias com outras denominações, mas ficamos mais confortáveis quando tais parcerias estão relacionadas à nossa igreja, por causa do acompanhamento e da teologia dos obreiros.
- Desafio da Koinonia (Cuidado e Comunidade): Em cidades que tornam as pessoas anônimas e solitárias, é fundamental oferecer comunidade. O envolvimento em pequenos grupos é essencial para acolhimento, recepção, integração e discipulado. Precisamos de pessoas que abram suas casas e liderem esses grupos, promovendo o cuidado mútuo.
- Desafio Diaconal (Serviço e Acolhimento): A igreja é chamada a olhar para a cidade, usando seus recursos e espaços para acolher e servir, especialmente os grupos mais vulneráveis. No Antigo Testamento eram três os grupos que mais precisavam de atenção e cuidado: órfãos, viúvas e estrangeiros. Projetos sociais e iniciativas de cuidado com os necessitados refletem essa visão bíblica do Reino de Deus.
- Desafio do Oikos (Sustentabilidade e Ecologia): Como cristãos, temos a responsabilidade de cuidar da criação de Deus. Isso inclui zelar por florestas, rios, combater a poluição e promover um ambiente saudável. Cuidar do próprio lar e da comunidade ao redor demonstra uma fé integrada, que se preocupa com o bem-estar e a beleza do lugar onde vivemos.
- Desafio da Politicidade (Cidadania): Somos chamados a exercer nossa cidadania de forma inteligente e organizada. Isso significa usar nossos dons e talentos para influenciar positivamente a cidade, incentivando o bom uso dos recursos públicos e, se necessário, envolvendo-nos em esferas de influência para promover melhorias. A espiritualidade cristã não deve se isolar, mas engajar-se para abençoar a sociedade.
Pensando de forma mais direta no texto de Jeremias, vamos seguir o texto para, a partir daí, encontrarmos algumas diretrizes.
Jeremias 29
O povo de Deus estava exilado na Babilônia, uma cidade opressora. Mas Deus deixou claro: "eu deportei de Jerusalém para Babilônia". Isso significa que eles estavam ali por um plano divino. Para nós, isso ensina que onde quer que estejamos – seja em Anápolis, ou em qualquer outra cidade –, estamos ali por direção de Deus, com um propósito de sermos uma bênção.
Vamos analisar os desafios que Deus apresenta a eles:
- Cidadania: A ordem de "Edificai casas e habitai nelas" (Jr 29.5) é um chamado para se instalar e participar ativamente da cidade. Não se trata apenas de construir fisicamente, mas de se envolver, melhorar o ambiente e deixar um legado. Se viajarmos para o interior de Goias veremos como os missionários no passado tinham preocupação com cidade. Em todos os templos construídos eles colocavam uma escola do lado, junto com igrejas, em algumas cidades como Porangatu e Gurupi, o melhor IDEB das escolas da cidade pertencem às Escolas Presbiterianas. Nosso compromisso deve ser duradouro. Linthicum afirma que quando formos para uma cidade, a primeira coisa que devemos fazer é comprar um "túmulo" , dando a ideia de que entendemos que ali é o local que Deus deseja que passemos a vida inteira, onde estamos dispostos a ficar e investir nossa vida.
- Legado e Cuidado Ecológico: Ao dizer "Plantai pomares e comei o seu fruto" (Jr 29.5), Deus enfatiza a visão de longo prazo. Árvores levam tempo para frutificar, significando que o plantio é um ato de pensar na próxima geração. Isso nos lembra da nossa responsabilidade ecológica: cuidar da natureza, das fontes, evitar a poluição e zelar pelo ambiente. Nossa fé deve se traduzir em ações que promovem a saúde e o bem-estar da cidade. Devemos desfrutar da cidade, e comer dos seus frutos.
Deus não ordena que seu povo plante hortaliças ou legumes. Quanto tempo leva um pé de alface para ser colhido? Cerca de 40 dias. Um pé de tomate de 3-5 meses. Mas uma árvore leva tempo. Se for uma mangueira cultiva a partir de semente, estamos falando de 5 a 8 anos, enquanto a mangueira enxertada leva de 3-5 anos. Uma jaboticaba leva de 8-12 anos, enquanto a enxertada leva de 3-5 anos. Uma tâmara, antigamente, levava de 70-100 anos, com a tecnologia moderna pode produzir e, 7 anos. Existe até mesmo um ditado antigo que diz: “quem plantar tâmaras não colhe tâmaras.” Era um projeto visando a próxima geração. Deus está desafiando o povo a um projeto a longo prazo.
- Lutar pela Paz (Politicidade): A ordem mais surpreendente é "Procurai a paz da cidade para onde vos desterrei e orai por ela ao Senhor, porque na sua paz vós tereis paz" (Jr 29.7). Mesmo em uma cidade que os oprimia, Deus pediu que buscassem sua paz.
O chamado de Deus não era para que fossem pacifistas, mas pacificadores. Qual a diferença em um e outro. O pacifista, foge de conflitos, quer viver em paz e harmonia. É algo mais passivo, mas o pacificador é alguém que luta ativamente pela harmonia e pelo bem-estar comum. Jesus não disse: “bem-aventurados os pacifistas”, mas, “bem-aventurados os pacificadores.” Alguém que toma uma iniciativa para que a paz seja estabelecida.
A cidade muitas vezes é campo de batalhas, nichos, lutas políticas, pelo poder ou dinheiro. Nesse sentido vale a oração de S. Francisco de Assis
Senhor,
Fazei de mim um instrumento de vossa Paz.
Onde houver Ódio, que eu leve o Amor,
Onde houver Ofensa, que eu leve o Perdão.
Onde houver Discórdia, que eu leve a União.
Onde houver Dúvida, que eu leve a Fé.
Onde houver Erro, que eu leve a Verdade.
Onde houver Desespero, que eu leve a Esperança.
Onde houver Tristeza, que eu leve a Alegria.
Onde houver Trevas, que eu leve a Luz!
4. Orar pela cidade
Talvez esta tenha sido a maior batalha para o povo de Deus que não os convida a orar por Jerusalém, mas pela Babilônia. Há um efeito pragmático revelado subjacente revelado na ordem de Deus em orar por esta cidade. A paz da cidade resulta na paz de seus habitantes.
Muitos de nós não temos dificuldade em orar por Jerusalém. O Salmo 122 nos ensina a orar por esta cidade. Entretanto, muitos veem Jerusalém como a única cidade por quem se deve orar, não entendendo que Jerusalém aponta para todas as cidades do mundo incluindo lugares hostis ao povo de Deus.
O apóstolo Paulo instrui ao jovem pastor Timóteo com clareza e urgência: "Antes de tudo, peço que se façam súplicas, orações, intercessões e ações de graça em favor de todas as pessoas. Orem em favor dos reis e de todos os que exercem autoridade, para que vivamos vida mansa e tranquila, com toda piedade e respeito. Isso é bom e aceitável diante de Deus, nosso Salvador, que deseja que todos sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade." (1 Tm 2.1-3)
Analisemos essa passagem por partes:
- "Antes de tudo": Isso indica a prioridade máxima. Antes de qualquer outra coisa, a oração é fundamental.
- "Súplicas": Não é apenas uma oração comum. A súplica é uma oração carregada de intensidade, de profunda emoção, muitas vezes acompanhada de lágrimas, expressando dor ou um desejo que toca a alma.
- "Orações e intercessões": A oração se expande para a intercessão. Interceder significa entrar na brecha, orar não apenas por si mesmo, mas pelos outros, pelas circunstâncias, pelos governantes e pelas autoridades. Frequentemente, nossas orações ficam restritas ao nosso círculo íntimo, mas Paulo nos desafia a olhar para fora, a orar por aqueles que nos afetam e que precisam de direção.
- "Ações de graça": Expressar gratidão é parte integrante da nossa vida de oração. O contrário da gratidão é a murmuração e a reclamação.
O Propósito da Oração Pela Cidade
O objetivo de toda essa oração é que possamos viver uma vida mansa e tranquila, com piedade e respeito. Isso é bom e aceitável diante de Deus, que, acima de tudo, "deseja que todos sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade".
Nossas orações pela cidade devem, portanto, ter um olhar de compaixão, com o propósito de que o Evangelho e o amor de Jesus alcancem os corações das pessoas. Isso nos leva ao desafio da evangelização: anunciar, pregar e ensinar as boas novas de Jesus.
Este texto, e o Evangelho de modo geral, nos apresentam múltiplos desafios. Precisamos, com cuidado, temor e alegria, entender nosso lugar na cidade onde estamos.
Jesus chorou sobre Jerusalém, clamando: "Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas aqueles que te são enviados! Quantas vezes quis eu reunir os teus filhos... mas não quiseste!" Esse clamor, essas lágrimas de Jesus, revelam um coração que anseia em resgatar a cidade, mesmo sabendo da sua rebeldia e do juízo que viria (a destruição de Jerusalém por Tito Lívio em 68 d.C., apenas 40 anos após a profecia de Jesus, e a dispersão do povo de Israel que durou até 1948).
Quando olhamos para o Evangelho, vemos um Deus que ama a cidade, se preocupa com ela e coloca Seus filhos na cidade para abençoá-la. Nós somos o povo de Deus chamados para exercer:
- Cidadania
- Proteger à natureza
- Orar pela cidade
- Cuidar dos grupos vulneráveis
- Acolher os que sofrem
- Pregar o evangelho aos perdidos
Ser sensível a essas necessidades implicará em investir tempo, talentos e dinheiro. É um envolvimento profundo que Deus deseja de nós, seguindo o exemplo de Jesus.
A História de Jack: Um Exemplo de Impacto na Cidade
Robert Linthicum, em um de seus livros, relata uma comovente história sobre um homem chamado Jack, um entregador de farmácia em Chicago:
Jack era um homem de cerca de 40 anos, com deficiência intelectual, mas de uma sinceridade e diligência notáveis. Seu compromisso com Cristo era impressionante; embora não compreendesse a fundo o Evangelho, sua devoção era imensa. Todo domingo, após o culto, ele se despedia do pastor, sempre dizendo: "Não posso [ficar], querido. Tenho que fazer minhas entregas."
Durante sete dias por semana, 52 semanas por ano, Jack pedalava sua bicicleta, fielmente entregando remédios e outros itens para uma farmácia local. Mesmo com bom ou mau tempo, tráfego intenso ou calmo, Jack estava lá, dia e noite. Em uma comunidade com alta taxa de criminalidade, Jack era o único que tinha acesso à maioria dos prédios de apartamentos e era bem-vindo em cada lar, em uma vizinhança onde as pessoas temiam umas às outras.
Oito anos depois de deixar a igreja de Chicago, o pastor recebeu uma notícia sobre Jack em um recorte de jornal. Uma senhora chamada Vera, uma das clientes de Jack, chorava ao relembrar: "Toda vez que eu me sentia doente e desanimada, Jack trazia o remédio e eu me sentia animada. Ele era um homenzinho maravilhoso." Ela contava como Jack ia e vinha com os remédios, mesmo em noites frias e chuvosas, sempre com palavras de carinho e preocupação: "Querida, como você se sente agora? Você se parece melhor?"
Jack amava seu trabalho e estar nas ruas. Ele nunca ficava doente ou reclamava do frio, sempre pedalando por ruas geladas e em tempestades. Por isso, foi um choque quando, em um dia de sol e em uma rua sem tráfego, Jack foi atropelado por um motorista em alta velocidade, que não parou para socorrê-lo. Jack quebrou a clavícula e teve um traumatismo craniano. Levado ao hospital, entrou em coma e, cinco dias depois, faleceu.
A comunidade lamentou sua perda profundamente. O artigo conclui: "A seu jeito, Jack fez mais pelas pessoas desse lugar do que qualquer autoridade, pregador ou assistente social. Você não tem que ser rico, famoso, bonito ou inteligente para que as pessoas se lembrem de você. Você pode ser manso, honesto e bom. Você pode ser apenas um simples homenzinho, assim como foi Jack."
Oração
Que a história de Jack nos inspire. Que Deus nos ajude a olhar para a cidade de Anápolis com amor, compaixão e cuidado. Que Ele nos mova como cidadãos e discípulos de Cristo para espalhar a beleza e o amor de Jesus.
Ó Deus, dá-nos a visão certa, a estratégia certa, e a disponibilidade de recursos. Ajuda-nos a sermos generosos, bondosos, cuidadosos, a acolher e a receber as pessoas, a amar e a cuidar. Essa é a nossa oração em nome de Jesus.
Que a bênção do Deus Pai, Filho e Espírito Santo esteja com vocês, irmãos, e com todo o povo de Deus, hoje e para sempre. Amém.
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