segunda-feira, 29 de setembro de 2025

Mc 5.18-20 Vai para tua casa!

 


sábado, 27 de setembro de 2025

Rm 7.14-25 A Entropia espiritual

 




 

"Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte? Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor. De maneira que eu, de mim mesmo, com a mente, sou escravo da lei de Deus, mas segundo a carne, da lei do pecado" (Rm 7.24-25).

 

Einstein defendeu uma famosa lei chamada da 2a Lei da termodinâmica, que afirmava que todas as coisas entregues a si mesmas, tendem à decadência. É a famosa lei da entropia, que seria um "Progresso" para a destruição! Como afirma o Dr. Mario Bruno Sproviero, segundo ele, "a lei da entropia mina a idéia da história como progresso. A lei da entropia destrói a idéia de que a ciência e a tecnologia criam um mundo mais ordenado". [1]Uma matéria entregue a si mesma, tende à desorganização e não à ordem!

 

Esta lei da física é importante. Ela se opõe diretamente à ideia do evolucionismo, fundamentado na geração espontânea desenvolvida por Darwin, que entendia que a matéria e a complexidade dos seres vivos como temos hoje, se deu por uma orientação cega, que organizou o caos. Percebem que a lei da entropia se contrapõe à teoria da evolução? Somos bombardeados por uma teoria, uma hipótese e nossos professores querem sempre nos fazer aceitar a ideia de que tal suposição é verdadeira, quando ela é ainda hipotética, isto é, não provada. Você tem que fazer tanto esforço para crer na teoria da evolução quanto no design inteligente, que afirma que a matéria e a criação foram criadas por uma inteligência e um ser superior.

 

A decadência não está apenas na lei física, mas nos atinge também no campo moral.

 

Compre um carro novo e logo ele é um velho carro. Tudo tende à decadência. Compre um novo computador e em três anos ele está out of date. Recentemente estava mostrando o meu Iphone 8, que só tinha 8 anos de existência, e as pessoas do meu lado começaram a dizer: “é melhor você trocar logo seu celular, pastor, porque ele já não permite que você baixe alguns aplicativos.” Tudo tende a obsolescência. A tecnologia rapidamente começa a dar problemas e a travar.

 

Compre uma casa e eventualmente você precisará de pinta-lá e fazer reparos. Sempre precisará de reformas e cuidados. Consertar um cano, corrigir um vazamento no telhado, reparar alguma coisa quebrada. O mesmo se dá em nossa vida espiritual. As coisas tendem a decadência. A nossa natureza pecaminosa está sempre acenando e exercendo força em nós. Precisamos estar sempre voltando à mensagem do Evangelho para receber as boas novas em nossas vidas, do contrário, a decadência se manifesta.

 

Paulo termina o capítulo 7, que lemos, clamando em voz alta: "Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?". Se esta força do pecado (singular) age em mim quase como uma entidade, como quebrar o seu efeito, como desfazer a ação desta força intrínseca em minha alma? Como gostava de afirmar D. Jalma Wilding: “Quando eu sou boa, eu sou mais ou menos, quando eu sou ruim, eu sou ótima!”

 

Francis Schaeffer inicia um de seus livros “O que aconteceu com a raça humana?”, fazendo um sinistro panorama da realidade humana. "Eventos inimagináveis tem acontecido em nosso mundo de hoje. O que era impensável, hoje é uma realidade, e de fato tem acontecido"[2].  E passa à descrição dos fatos, narrando eventos assustadores.

 

Basta olhar o jornal de hoje para vermos como a questão da entropia de Einstein tem correlação com a entropia espiritual

 

  • Em 1982, cerca de 1.6 milhões de crianças foram assassinadas ainda no ventre de suas mães, somente na América;

 

  • Um padrasto estuprou a enteada de 9 anos que se engravidou de gêmeos e isto gerou todo um debate sobre o assunto (01/03/09). O padrasto da menina foi preso no dia 26 de fevereiro em Alagoinhas (PE), onde a família vivia, quando se preparava para fugir para a Bahia. Ele seria o pai dos gêmeos que ela está esperando. Segundo a polícia, a menina sofria violência sexual desde os 6 anos. O padrasto também é suspeito de abusar da enteada mais velha, uma adolescente de 14 anos. 

 

  • Em Setembro de 2025 identificaram um serial killer na cidade de Rio Verde, que se vestia de gari, e matava mulheres indefessas na madrugada. Pelo menos três destas vítimas já foram identificadas, mas estima-se que exista um número bem maior de pessoas. Ele veio fugido da Bahia quando começaram a suspeitar de algumas de suas práticas criminosas por lá.  

 

  • Cada dia que passa, temos visto a desvalorização do ser humano numa escala massiva. Mais e mais absurdos grotescos acontecem diariamente. A maldade tem se assumido formas sofisticadas: câmaras de tortura, arsenal de guerra nuclear, armas químicas, sistema econômico perverso, sistema judicial iniquo. Recentemente um vídeo sobre a adultização das crianças viralizou. O que este vídeo fez foi mostrar aquilo que já percebíamos. A erotização de nossos filhos por meio das mídias sociais que leva nossas crianças a comportamentos bizarros cada vez mais precoce, muitas vezes com a anuência e incentivo dos pais e da família.

 

Isto não deveria nos surpreender, afinal, O Evangelho não nos ensina a bondade inerente na raça humana, pelo contrário, afirma a decadência do coração humano, que é tentativa a autogratificação e a autossatisfação. Stott[3] analisa a visão de Jesus sobre a depravação humana, da seguinte forma:

 

  1. Extensão universal do mal – Jesus não enxergava apenas um determinado segmento degradado da sociedade, pelo contrário, muitas vezes estava lidando com respeitáveis membros da sociedade como os fariseus e escribas. Não adianta mudar o nível social. Tanto a classe baixa quanto a alta é perversa, marcada por violência, abuso e exploração: Corrupção, pedofilia, máfia no Congresso, luta pelo domínio e controle entre os três poderes, a manipulação das notícias pelos canais oficiais e não oficiais. Povos antigos e novos: Os incas e maias, nações violentas, nações modernas, holocausto, etc.

 

  1. A natureza autocentrada do mal no homem – Jesus descreve em Marcos 7.14-15,21-23, que por ter a natureza egoísta, o homem fere a Deus e aos homens. O coração do homem é propenso ao mal: De dentro do homem procede toda sorte de maldade.

 

  1. A natureza do mal encontra-se no seu interior – Jesus afirma que o mal estava dentro do homem, não era resultante primariamente de um ambiente degradante ou de uma educação falha, antes tinha a ver com o coração. "Do coração é que procedem os maus pensamentos." Mc 7.21 Não é problema de sistema, ainda que o pecado possua uma dimensão social, estrutural e corporativo, mas o problema são os homens que geram os sistemas. A diferença entre o capitalismo é uma só: “No capitalismo o homem explora o homem, no capitalismo é o contrário.” (Schaeffer)

 

  1. A maldade humana degrada o homem – Jesus afirma que por esta razão os homens se tornam imundos na sua ética. A decadência humana é interna e moral. “Porque do interior do coração dos homens saem os maus pensamentos, os adultérios, as fornicações, os homicídios, Os furtos, a avareza, as maldades, o engano, a dissolução, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura. Todos estes males procedem de dentro e contaminam o homem.” (Mc 7.21,23)

 

No texto lido acima, Paulo focaliza na sua própria experiência. Corremos o risco de falarmos do mal como algo fora de nós mesmos, mas Paulo é bem realista em relação à sua própria condição. O evangelho leva-nos a considerar que nós não apenas fazemos coisas pecaminosas, mas temos uma natureza pecaminosa. Não é apenas uma questão de fazer coisas erradas, não é um acidente de percurso, mas reflete a natureza humana. “Não somos pecadores porque pecamos, mas pecamos por que somos pecadores.” O coração do problema é o problema do coração.” Nossa natureza moral é falha. Paulo reconhece isto em si mesmo: "Porque não faço o bem que prefiro, mas o mal que não quero, esse faço" (Rm 7.19). Existe algo intrinsecamente errado no meu coração. É natureza falida. Infectada por um vírus letal. “Eu nasci em pecado e em pecado me concebeu minha mãe.”

 

Você já esteve numa situação na qual você gostaria de fazer a coisa certa, mas acabou fazendo tudo errado? Quantas vezes você já tomou nossas resoluções na vida, de fazer (ou não fazer) determinada coisa, e depois perceber que você fez exatamente o oposto que desejava?

 

Vivemos a mesma tensão de Pilatos. Racionalmente concordamos com o que é correto, mas falhamos em fazer as coisas que são corretas. Pilatos sabia o que era correto fazer, ele fez o diagnóstico certo, sua esposa o advertiu sobre o risco de fazer as coisas para agradar homens, mas apesar de tudo ele fez o que era errado e condenou uma pessoa que ele mesmo havia absolvido, ao declarar: “Não vejo nele crime algum.”

 

Neste texto Paulo fala de “pecado”. Observe que ele está falando no singular. Não são “pecados”, manifestações externas e ética. Neste texto inspirado por Deus, somos levados a considerar que existe um fator predisponente no nosso coração, que precisa constantemente de reavaliação, confissão e arrependimento. Precisamos entrar em contato com nosso mal, e isto não é algo que gostamos de fazer, mas algo que precisamos fazer. Seu problema é bem mais sério. Não se trata apenas do que você faz: “pecados” ou atitude pecaminosa, mas daquilo que você é: “pecado”, ou natureza caída.

 

Calvino usa o termo "depravação total", para descrever a corrupção inerente a natureza humana. Pecado afeta todo aspecto do nosso ser: corpo, alma, mente, vontade. Não há vestígio de uma "ilha de justiça" (Sproul) que escape da queda. Sproul prefere o termo "corrupção radical", uma vez que o termo "radical" vem de radix, palavra latina que significa raiz. Pecado atinge a essência da raça humana, não é algo tangencial nem periférico, mas está no centro de meu ser. Vem do coração.

 

Paulo percebe a terrível tensão em sua própria vida. Ele sabe o que é bom, mas a despeito disto, não consegue fazer o que é bom. Paulo quer viver de outra forma, mas não consegue. O pecado está sempre trazendo-o para baixo.

 

Que antídoto pode ser aplicado para quebrar o efeito tão violento e degenerativo que corre no meu sangue? A resposta é: A obra da cruz. Quando pastores pregam autoajuda, além de estarem negando o evangelho, dão esperanças falsas. Colocam a esperança na capacidade dos homens em fazer as coisas certas por escolhas morais, entretanto, como bem advertiu Lutero, e foi o tema de seu primeiro livro no qual ele fala da “escravidão da vontade.” Nossa vontade é cativa da força do pecado que habita em nós. “O bem que eu quero fazer eu não faço, mas o mal que eu detesto, este se apega a mim.”

 

Em meio ao desespero, Paulo conclui sua mensagem com as boas novas:

"Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor. De maneira que eu, de mim mesmo, com a mente, sou escravo da lei de Deus, mas segundo a carne, da lei do pecado" (Rm 7.24-25).

 

Paulo deixa de olhar para si, e compreende a graça e o poder do Evangelho. Apenas a obra de Cristo pode neutralizar a violenta força do pecado. Quando o sangue de Cristo é aplicado em nós, o pecado continua sendo um agente poderoso, mas não tem o poder e domínio de outrora. Em Rm 8.3 ele diz que "o que fora impossível pela lei", isto fez Jesus por meio de seu sangue. O Evangelho, portanto, não fala de um novo código moral, nem de uma ética nova, mas de um novo poder. O Evangelho é o poder de Deus (Rm 1.16).

 

Um antigo hino diz:

Do teu pecado te queres livrar?
Seu sangue tem poder, sim tem poder
Almejas tu do maligno escapar?
Seu sangue tem este poder

Há poder, sim, força sem igual!
Só no sangue de Jesus
Há poder, sim, prova-o pecador
Oh! Aceita o dom de Jesus

Os códigos morais estão enfermos por causa de nossa natureza carnal. A nossa carne, inoculada por este veneno que é o pecado na raiz de nosso ser, precisa do poderoso antídoto que foi providenciado por Jesus. Por isto ele diz: "Graças a Deus por Jesus!"

 

Um exemplo disto pode ser encontrado na natureza. A lei da gravidade afirma que todo objeto mais pesado que o ar será atraído inexoravelmente para o centro da terra. A gravidade puxa para baixo todo elemento mais pesado que ele mesmo. Entretanto, o avião, muitas vezes mais pesado que o ar, consegue voar, decolar, planar. O que acontece com a lei da gravidade, ela por acaso teria deixado de existir?

 

Obviamente não. Existe uma outra lei que quebra ou neutraliza a gravidade. É a lei do impulso ou da propulsão. Quando o avião atinge uma determinada velocidade, associada à sua aerodinâmica, ele se torna mais leve que o ar. A gravidade puxa para baixo, mas a propulsão o mantém acima desta força.

 

O mesmo se dá na nossa vida espiritual. A força da carne continuará agindo, e nossos esforços são nulos para quebrar sua eficácia, a menos que outra força aja e interaja em nós. Esforços humanos, automotivação, decisões novas, são ineficientes. A lei está enferma (Rm 8.3), por causa da carne, isto é, pela incapacidade do homem de romper com este círculo gravitacional em torno do pecado. Nossa carne estraga tudo, não é a lei que tem problema, é a nossa natureza humana que tem problema.

 

O Evangelho nos convida a desistirmos de nós mesmos e colocarmos nossa confiança na obra plena, suficiente e completa de Cristo, que desfaz o poder e a eficácia da força do pecado. A menos que Deus mude a disposição de meu coração, o que opera é a carne. O pecador sempre resiste a Deus, ele é rebelde à sua lei. Paulo diz: "vejo na minha carne algo operando contra a lei de Deus", e por isto ele sabe que precisa tanto da obra de Deus em sua vida.

 

Precisamos render nossa vida a Jesus. Vida cristã é Deus agindo em nós pelo Espírito Santo. O evangelho não fala do homem realizando, mas de Deus fazendo em nós. Paulo afirma: “Porque é Deus quem realiza em vós tanto o querer como o realizar.” (Fp 2.13) Nossa vontade e ação, dependem da força do Espírito Santo agindo em nossa vida. O Evangelho não é sobre você, sua competência, sua moral, sua espiritualidade, mas sobre o que Deus faz.

 

Quando desisto de mim mesmo e transfiro minha condição plena para Jesus acontece o milagre: “Já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim”. O evangelho é Deus fazendo em nós. O que fora impossível à carne (Rm 8.3), isto fez Deus, enviando-nos seu filho: Novo poder, nova força, nova compreensão e motivação, nova energia.

 

A Cruzada estudantil, que foi um movimento importante para estudantes universitários na década de 80 e 90, falava como a vida no Espírito Santo se torna efetiva. É necessário respirar e expirar. Menos de mim, mais de Jesus. Quanto mais me esvazio de mim mesmo, e abro espaço para o Espírito, maior será a vitória espiritual. “Não é por força, nem por violência, mas pelo meu Espírito” (Zc 4.6), como somos advertidos no livro de Zacarias.

 

O segredo é Deus em nós. Por isto nossa vida deve ser vivida pela ação do Espírito Santo. É vida no Espírito. Não olho a natureza como recurso e possibilidade, mas olho para cruz como meu recurso. Não olho para minha competência moral ou espiritual como possibilidade, Seu poder e sua vida sendo transferidos para minha vida.

 

Um famoso evangelista canadense ao ler Romanos 7 assim escreveu:

“O som de Romanos 7 poucas vezes é ouvido hoje em dia. É bom ouvi-lo de novo. O dia em que fui libertado da lei foi um dia de céu na terra. Depois de ser cristão vários anos, ainda dava o meu melhor para agradar a Deus, mas, quanto mais tentativas fazia, tanto mais fracassava. Considerava Deus o ser mais exigente do universo, e considerava-me incapaz de cumprir o menor de seus mandamentos. Certo dia, enquanto lia Romanos 7, de repente a luz se derramou sobre mim, e percebi que fora libertado, não só do pecado, mas também da lei. Pulei de alegria ao descobrir esta maravilhosa verdade.”

 

As exigências de Deus não foram alteradas, mas não somos nós quem vai enfrentá-las. Ele faz as leis e também as satisfaz. Deus deseja nos ensinar que não podemos fazer nada e, enquanto não reconhecermos plenamente esta verdade, não cessarão nossas decepções e desilusões.

 

Você ainda deseja ter o controle? Em outras palavras, você ainda não é fraco o suficiente. Quando você for reduzido à fraqueza completa e estiver persuadido que não consegue fazer absolutamente nada, então Deus fará tudo. “Senhor, sou incapaz de fazer alguma coisa para ti, mas confio que farás tudo em mim”.

 

Quando uma pessoa está se afogando, o resgate pode ser muito complicado, porque ela não para de se debater. Se você tentar se aproximar de uma pessoa nesta condição, existe a grande possibilidade de que ela te arraste para o fundo e ambos morram afogados. A pessoa não pode ser resgatada, senão quando ficar completamente exausta e deixe de fazer esforço para se salvar. Sua salvação deve vir de algum agente externo. O mesmo se dá na nossa caminhada espiritual. É Deus quem faz! Precisamos apenas deixar que ele faça, e nos rendermos ao seu Espírito.

 

A carne de nada aproveita, Deus já a condenou à morte! Neste texto lemos: “(miserável) desventurado homem que sou, quem me livrará o corpo desta morte?” Quando olha para si mesmo Paulo se desespera. A natureza pecaminosa está ativa. Se formos honestos e sinceros veremos como esta linha do desespero age poderosamente em nós.

 

Cada uma de nossas tentativas de fazer a vontade de Deus é uma negação da sua obra na cruz e falta de compreensão de que nossa suficiência vem dele. Não podemos pensar qualquer coisa como se partisse de nós.

 

Por isto conclui Paulo: “Graças, a Deus por Jesus Cristo nosso Senhor.” (Rm 7.25) Agora Paulo coloca seu olhar no lugar certo. Até então estava procurando vitória dentro de si mesmo, mas o que encontrou foi o desespero, a compreensão de seu fracasso. Agora ele tira o olho de si mesmo e o coloca para fora de si, para o seu Salvador. As palavras do profeta Isaias se aplicam perfeitamente a nós: “Olhai para mim, e sereis salvos, vós, todos os termos da terra; porque eu sou Deus, e não há outro.” (Is 45.22).

 

Lutero descobriu que “A justiça de Deus não é algo que ele requer, mas é algo que Ele próprio nos concede.” Lutero certa vez afirmou: “Quando olho para mim, sei que é impossível me salvar; mas quando olho para Cristo, reconheço que é impossível que eu me perca”. Dois séculos depois, John Wesley (Londres, 1703-1791), também entendeu que “Esta doutrina significava o fim de qualquer ilusão a nosso próprio respeito (Bondade, boas obras, moralidade, esforços). Não preciso fazer nada para minha salvação, apenas descansar na sua justiça. Existe apenas uma espécie de justiça que agrada a Deus, e esta era a justiça perfeita criada por Jesus.” Esta compreensão mudou completamente a vida de John Wesley. O evangelho nos convida a não continuar operando com nosso próprio esforço, toda sua expectativa deve estar em Cristo e no poder da sua ressurreição.

 

Por isto Paulo fala em Fp 3.10: “Quero ser encontrado em Cristo, não tendo justiça própria, senão a justiça de Deus, que procede de Jesus”.

 

A entropia espiritual me diz que se eu for entregue a mim mesmo: Meus desejos, sonhos e vontade. O resultado será decadência e degradação, mas se eu fizer mortificar minha carne e for crucificado na cruz, o resultado é vida e poder.

 

Em Cristo, a nova natureza de Deus se estabelece.

"Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor. De maneira que eu, de mim mesmo, com a mente, sou escravo da lei de Deus, mas segundo a carne, da lei do pecado." (Rm 7.24-25)



[1] http://www.hottopos.com.br/regeq8/mario.htm

[2] Schaeffer, Francis – Whatever happened to the human race? Westchester, Illinois, Crosway books, 1986, pg IX e X.

[3] Sttot, John R. W. – The contemporary Christian, Intervarsity press, Illinois, IVP, 1992, pg 41

sexta-feira, 26 de setembro de 2025

Palestra CTPI. 2025. Fazer discípulos de toda geração: problemática

 


 

Este é o tema que me foi proposto para exposição no Congresso CTPI-2025, em Campinas, são Paulo. Fiquei feliz porque não me pediram pra falar sobre soluções, mas sobre os problemas. É mais fácil pensar nos problemas que nas soluções, não acham?

 

Na verdade, o diálogo entre as gerações e os desafios são imensos. Numa conhecida música que é mais comumente cantada nos finais de ano a letra diz assim: “Toda geração culpa a anterior e todas as suas frustrações vem bater na sua porta.” (Mike & The Mechanics). Entender, engajar, ser relevante é desafio constante de cada geração. E precisamos estar atentos a isto.

 

Duas questões devem ser levantadas aqui:

1.     Estamos sendo eficientes em transmitir o evangelho

2.     Quais desafios são necessários para enfrentar esta tarefa?

O livro de Juízes faz um relato trágico da realidade do povo de Deus longo após a porte de Josué.

“Foi também congregada a seus pais toda aquela geração; e outra geração após eles se levantou, que não conhecia o Senhor, nem tampouco as obras que fizera a Israel. Então, fizeram os filhos de Israel o que era mau perante o Senhor; pois serviram aos baalins. Deixaram o Senhor, Deus de seus pais, que os tirara da terra do Egito, e foram-se após outros deuses, dentre os deuses das gentes que havia ao redor deles, e os adoraram, e provocaram o Senhor à ira. Porquanto deixaram o Senhor e serviram a Baal e a Astarote.” (Jz 2.10-13)

 

A geração seguinte, logo após a morte de Josué, se afastou de Deus, por duas razoes:

 

A.    A comunicação da geração anterior não fora eficiente em falar dos grandes feitos de Deus. Os milagres grandiosos de Deus e suas intervenções sobrenaturais sequer foram compartilhadas pelos pais e avós. Houve uma grave lacuna na comunicação dos feitos de Deus. 

 

B.     Por conseguinte, os filhos não conheceram a Deus.

 

A experiência dos filhos com o Yahweh, é algo pessoal, mas é assustador pensar que eles sequer ouviram falar dos grandes feitos de Deus. Os pais falharam na comunicação entre uma geração e outra.

 

Uma das mais perfeitas atividades atléticas é a corrida de revezamento 4 X100, que exige muito treino, habilidade e sincronia. Entre suas características podemos destacar:

 

§  Todos os atletas precisam estar em condições físicas semelhantes. Se um corredor for bom demais e o outro tiver um nível muito inferior, a performance da equipe será comprometida;

§  O bastão deve ser passado no tempo certo. Existe uma linha demarcada e não pode ser entregue nem antes, nem depois. Se entregar antes ou depois a equipe será desqualificada.

§  O bastão deve ser passado em movimento. Não dá para parar, tomar um cafezinho, nem perder tempo em discutir qualquer assunto. Simplesmente deve ser entregue.

§  O bastão não pode cair. Se não for corretamente entregue na mão do próximo atleta, a corrida perde seu efeito.

Acho que esta é uma boa ilustração quando se fala de transições e gerações. O desafio de fazer discípulo de todas as gerações, precisa ser cuidadosamente planejado. Deve ser sincrônico (harmônico) e complementar (porque um completa o outro). A obra da evangelização e a missão não pode encerrar em nós. A missão não se encerra em nós.

O desejo e propósito do Deus da Alliança, sempre caminhou nesta direção.

 

No chamado de Abraão em Gn 17 nos é dito:

“Quando atingiu Abrão a idade de noventa e nove anos, apareceu-lhe o Senhor e disse-lhe: Eu sou o Deus Todo-Poderoso; anda na minha presença e sê perfeito. Farei uma aliança entre mim e ti e te multiplicarei extraordinariamente. Prostrou-se Abrão, rosto em terra, e Deus lhe falou: Quanto a mim, será contigo a minha aliança; serás pai de numerosas nações. Abrão já não será o teu nome, e sim Abraão; porque por pai de numerosas nações te constituí. Far-te-ei fecundo extraordinariamente, de ti farei nações, e reis procederão de ti. Estabelecerei a minha aliança entre mim e ti e a tua descendência no decurso das suas gerações, aliança perpétua, para ser o teu Deus e da tua descendência.” (Gn 17.1-7) 

 

Deus não estava fazendo uma aliança apenas com Abraão, apenas com um individuo, mas sua aliança era geracional. Os descendentes de Abraão estavam envolvidos neste pacto. E para confirmar isto, Deus exigiu que um rito complexo fosse praticado: “Esta é a minha aliança, que guardareis entre mim e vós e a tua descendência: todo macho entre vós será circuncidado. Circuncidareis a carne do vosso prepúcio; será isso por sinal de aliança entre mim e vós.” (Gn 17.10-11)

 

Raramente paramos para considerar, mas a verdade é que é o rito da circuncisão era algo bem complexo. A cerimônia era pública, na presença dos pais, familiares e amigos, o sacerdote (e não o médico), sem anestesia e sem bisturi, com faca de pederneira, fazia fimose, uma cirurgia no órgão sexual masculino. Este é o ritual da circuncisão.

 

Por que Deus não exigiu um rito menos complexo? Por exemplo, um furo na orelha como nos rituais de muitas tribos brasileiras, ou um sinal na testa como fazem os indianos? Além de mais visível seria muito mais descomplicado...

 

Na verdade, a circuncisão é uma forma de vincular o rito ao compromisso com a descendência. Afinal, os filhos pertenciam à família de Deus, estavam envolvidos e participavam por meio deste pacto. Tinha algo a ver com a fecundidade, procriação.

 

Susan Hunt[1] descreve algumas destas características deste pacto, mostrando que ele era Relacional (Deus é pessoal e se liga a nós em fidelidade pactual), Iniciado soberanamente (Não merecemos nada, a base é a graça e a iniciativa amorosa de Deus), Corporativo (A salvação é pessoal, mas Deus não nos trata apenas como indivíduo. Ele vê nossa família na dimensão pactual. Somos uma comunidade marcada pela aliança) Gn 17.7 e Generacional – Ligado a gerações. Uma geração contará a outra geração este pacto feito com Deus (SL 78.1-8; 145.3). Esta ordem é familiar e abrangente. Gn 12.1,2; 17.3-7).

 

Este pacto tinha o sinal no órgão sexual masculino, e isto certamente possui uma grande simbologia porque está ligado à procriação. As gerações seriam consagradas a Deus. Pertenciam à comunidade da aliança (Gn 17.11-14).

 

Charles Hodge afirma:

“Aos olhos de Deus, os pais são representantes autorizados dos filhos, agem por eles, contraem obrigações em nome deles. Onde os pais entram num pacto com Deus, eles levam consigo seus filhos...Se um homem se unisse à comunidade de Israel, assegurava para seus filhos os benefícios deste pacto, a não ser que eles, voluntariamente os renunciassem. E assim, quando um crente adota o pacto da graça, ele traz seus filhos para dentro dessa aliança, no sentido que Deus lhes promete dar, no tempo determinado por ele, todos os benefícios da redenção, se eles não renunciarem voluntariamente ao comprometimento batismal”.[2]

 

George Whitefield complementa:

“O pacto gracioso e terno de Deus com sua igreja dá aos pais crentes uma promessa de bênçãos espirituais e salvadoras para seus filhos. A promessa é que ele será Deus – para eles e para a semente deles. É de suma e eterna importância que os pais se apeguem a esta promessa pela fé, e procurem no Senhor as bênçãos que ela traz para seus filhos”[3].

 

Este parece ser também o entendimento do Novo Testamento, já que quando o carcereiro indaga sobre sua condição, Paulo responde: “Crê no Senhor Jesus e serás salvo, tu e tua casa.” A salvação tem um impacto direto na família, uma dimensão comunitária. “Tu e tua casa.” Não apenas algo individual, mas com desdobramentos e promessas que iriam muito além da salvação individual.

 

Deus tem interesse em impactar as gerações. Este é o desejo do Pai Celeste:” Da mesma forma, o Pai de vocês, que está nos céus, não deseja que nenhum destes pequeninos se perca.” (Mt 18.14) Jesus está se dirigindo às crianças que dele se aproximam e estão sendo abençoadas. O evangelho precisa ser eficientemente comunicado às novas gerações. Será que temos cumprido bem esta missão?

 

Ao estabelecer a problemática, gostaria de suscitar cinco grandes desafios para que a missão de fazer discípulos de todas as gerações seja efetiva. Estes desafios não podem ser ignorados:

 

1.     Desafio hermenêutico

 

1 Cr 12.32 – “Dos filhos de Issacar, conhecedores da época, para saberem o que Israel devia fazer, duzentos chefes e todos os seus irmãos sob suas ordens.”

 

Na formação de sua equipe, Davi se preocupou com a escolha certa de determinados homens, líderes relacionados à manutenção da provisão do palácio, daqueles que também cuidariam da segurança e da guerra. Mas surpreende quando vemos que ele contratou 200 homens da tribo de Issacar e alguns dos seus auxiliares, uma tribo quase esquecida de Israel, para cuidar da logística. Os filhos de Issacar seriam a intelligentsia no governo de Davi.

 

O que havia de especial nestes jovens que atraiu Davi? Eles tinham duas virtudes:

 

A.    Eram conhecedores da época. Sabiam fazer a leitura correta da realidade e do momento de Israel. Trabalham como estrategistas.

 

B.    Como resultado final disto sabiam o que Israel devia fazer. Fazer a leitura certa nos habilita a tomar ações concretas e certas. Sem entender a hermenêutica da história, da cidade, do ambiente em que vivemos, corremos o risco de fazer muita coisa, mas atabalhoadamente.

 

A pergunta inicial para nós é se estamos fazer a leitura adequada desta época da história. Que geração é esta? Qual sua cosmovisão, cultura, símbolos? Será que conhecemos seus anseios, sonhos, desejos e questões que estão incomodando seus corações? Podemos estar fazendo muita coisa, mas respondendo perguntas e tentando resolver problemas que não são os mais importantes e relevantes.

 

Uma pessoa, certamente bem-intencionada, gostava de escrever nos muros na beira da estrada: “Jesus é a resposta!” Era comum vermos esta frase em muitos lugares. Um dia me deparei com uma reação de um gaiato que escreveu embaixo: “Qual é a pergunta?”

 

Francis Schaeffer afirma:

“Precisamos ser conhecedores do contexto moderno, não apenas num nível superficial, mas no nível filosófico, sabendo por que acontecem as mudanças — por exemplo, a obsessiva preocupação com divertimento, com sexo e com riqueza.” Isto implica em penetrar no que é dito, não dito, o que se fala e o que se reprime. Ler corretamente o presente tempo nos ajudará a dar o foco certo e criar as estratégias e metodologias efetivas para o presente tempo.

 

Como ser uma igreja histórica, que sabe interpretar, entender e responder aos anseios espirituais desta sociedade pluralista, subjetivismo, secularizada, relativista? Será que somos capazes de entender a cultura atual e traduzir a mensagem poderosa do evangelho a esta geração?

 

Uma criança de 3 anos foi ao departamento infantil da igreja e a professora pediu para que um dos alunos falasse um versículo de cor. Ela respondeu: “Mais bem aventurado é dar que receber! “A professora admirada com a resposta indagou: “seu pai é missionário?” E ela respondeu: “Não, ele é pugilista!”

 

2.     Desafio da Linguagem

 

Precisamos adequar a forma de comunicação, entendendo o que se torna mais compreensível para a geração. Isto implica até mesmo em estilo, terminologias, forma de dizer as coisas.  O que falamos e a forma como falamos faz sentido?

 

Existem pelo menos três formas de comunicação. Linguagem conceitual, intuitiva ou relacional. 

 

Conceitual – Se preocupa em derramar uma quantidade imensa de conteúdo e informação. É a forma clássica de comunicação. O modelo antigo considera que quanto mais conteúdo o aluno receber, melhor. Como o evangelho trata de conteúdo e conceitos, muitos pastores transformam o púlpito numa classe de Escola Dominical. Os alunos devem prestar muita atenção e reter o maior número de informações doutrinárias. Não é errado fazer isto, a questão é saber quão efetiva esta comunicação se torna para a presente geração.

 

Intuitiva - Procura despertar o ouvinte com uma linguagem provocativa, questionadora, critica, tentando fazê-lo refletir e indagar se o que está sendo comunicado é certo ou não? Muitos pastores usam de forma poderosa esta forma de comunicação, aliando a uma linguagem de narrativa, contando histórias, envolvendo seus ouvintes.

 

Relacional – O interesse está em se tornar pragmático. Ajudar o ouvinte a resolver seu problema diário e as lutas que ele enfrenta. Como se relacionar com finanças, saúde, família, filhos, amigos, etc. A ênfase encontra-se em um conteúdo com forte ênfase na aplicação.

 

A discussão da efetividade de cada uma destas formas não é o ponto central da nossa palavra, mas queremos pelo menos refletir. Como a mensagem está chegando àquele que a recebe? Afinal, comunicação não é o que se diz, mas o que o outro entende.

 

Pastoreei a cidade de Cambridge, nos arredores de Boston, uma região conhecida como pós-cristã, nos Estados Unidos. A maioria das igrejas outrora relevantes se tornaram pubs, viraram condomínios, ou ainda mantem um grupo pouco significativa de uma comunidade que envelheceu e não soube traduzir as verdades do evangelho para as novas gerações.

 

Em 1992, a nossa denominação comprou o prédio de uma antiga igreja perto da Central Square, lugar estratégico da região de Cambridge. Próximo da Harvard e do MIT, duas das melhores universidades do mundo. O templo foi construído em 1870, uma magnifica catedral gótica, com lindos vitrais. Por que aquela igreja perdeu seu poder de impacto? Adquirimos o prédio de um grupo de irmãos, e negociamos diretamente com  o líder que era o caçula do grupo, na época tinha 82 anos. O templo já estava fechado há 25 anos, e aqueles irmãos se reuniam numa sala no fundo do prédio. Eles não tinham mais recursos para manter o prédio que estava se desmoronando por dentro.

 

Ao estudar o tema e a realidade a pergunta foi: O que aconteceu com aquela igreja outrora vibrante? Aquela região havia crescido e muitos prédios modernos haviam sido construídos, mas porque ao invés de acompanhar o crescimento a igreja declinou?

 

Três respostas imediatas podem ser dadas:

A.    A teologia liberal – Dos sete seminários evangélicos da região, apenas o Gordon-Conwell ainda continua ortodoxo. A teologia liberal forjou a mente dos futuros pastores que rejeitaram a inspiração, autoridade e a inerrância das Escrituras, e agora estavam perdidos entre os conceitos da teologia da crítica das formas.

B.     Os filhos perderam o interesse pela igreja, que não se renovou. Ela não apenas não conseguia mais atrair novos membros, mas não conseguiu manter os filhos que se afastaram sistematicamente da igreja. A igreja perdeu a nova geração.

C.    O terceiro aspecto, que nos interessa aqui de forma mais direta foi a inadaptabilidade e inadequação da linguagem para o novo momento que aquela igreja tinha que lidar. Ela era uma igreja White american, e não conseguiu acolher os orientais, hispânicos, negros que começaram a chegar em grande número na região. Eles não sabiam ser uma igreja para aquele momento da história, nem para as pessoas da vizinhança. Perderam o contato com o seu tempo e sua comunidade.

 

Isto se contrapõe de forma surpreendente com a percepção e cuidado que Jesus tinha com seus ouvintes. Veja o que nos diz o relato bíblico: E com muitas parábolas semelhantes lhes expunha a palavra, conforme o permitia a capacidade dos ouvintes.” ( Mc 4.33) Jesus tinha sensibilidade com os seus ouvintes. Seriam eles capazes de apreender aquilo que ele estava tentando anunciar? Sua estratégia de contar parábolas era uma forma de facilitar o entendimento de seus ouvintes. Será que somos sensíveis a este ponto?

 

3.     O desafio da coerência

 

Neste terceiro ponto queremos afirmar que para fazer discípulos desta nova geração, precisamos ser uma igreja íntegra, coerente e que não deixe dúvidas sobre sua seriedade. Esta geração pode até ser incoerente, mas não admite incoerência e liderança dúbia. Se a geração anterior era capaz de calar-se esta não fará isto, sua resposta será imediata. Ela rejeitará uma igreja infiel e hipócrita.

 

O texto que escolhi aqui encontra-se em Tt 2.5 – “…Para que a Palavra de Deus não seja difamada” que fala do relacionamento das mulheres com seus maridos incrédulos. A visão de Paulo é que uma mulher coerente com seu estilo de vida, atrairia seu marido a Cristo, e a Palavra de Deus não seria envergonhada, nem contraditada. Trata-se, pois, do foco na construção de pontes e não na imposição de dogmas, através de uma vida de coerente, testemunho do amor de Deus.

 

Ruben Alves, educador da Unicamp, certa vez indagou porque os alunos rejeitavam a educação? E para ele, uma criança deveria aprender por prazer, não por imposição, e quando ela rejeita o modelo educacional ela o faz porque a forma de educar seria inadequada. Sua pergunta era a seguinte: “vômito é sinal de saúde ou de doença?” qualquer resposta que você der é correta.

 

Quando seu organismo rejeita um alimento estragado e o joga fora, ele o faz porque percebe que se aquilo permanecer dentro do estômago, vai causar grandes danos. Então, ao vomitar, sua impulsão revela saúde. Por outro lado, quando rejeita, pode também revelar que algo muito ruim pode estar acontecendo visceralmente, e não se trata de uma comida estragada, mas de um corpo adoecido.

 

No Brasil 3.8% das pessoas se consideram evangélicos não praticantes. Elas não estão negando ainda a sua fé, nem se dizem ateias, mas simplesmente acreditam que não estão conseguindo viver numa estrutura adoecida, neurotizada e esquizofrênica que tantas vezes se encontra presente nas igrejas locais. Há muita doideira. Muito pastor maluco! Por isto elas decidem, lamentavelmente, jogar fora o bebê com a água suja.

 

A verdade é que se a igreja é opcional para os pais, ela se tornará descartável para os filhos.

 

4.     O desafio da Relevância

 

O quarto desafio é o da relevância: A mensagem do evangelho tem que ser atualizada para o homem do Século XXI. Isto não significa negar as verdades fundamentais da Bíblia, e nem que devemos “atualizar a Bíblia” para satisfazer o homem ou justificar seus pecados. É uma forma de tornar o evangelho atraente ao pecador. Afinal, “A igreja local ou o grupo cristão deve estar certo, mas também deve ser belo.” (Schaeffer)

 

Certamente a compreensão de Paulo sobre este assunto pode nos ajudar e orientar:  “Porque, sendo livre de todos, fiz-me escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível. Procedi, para com os judeus, como judeu, a fim de ganhar os judeus; para os que vivem sob o regime da lei, como se eu mesmo assim vivesse, para ganhar os que vivem debaixo da lei, embora não esteja eu debaixo da lei. Aos sem lei, como se eu mesmo o fosse não estando sem lei para com Deus, mas debaixo da lei de Cristo, para ganhar os que vivem fora do regime da lei. Fiz-me fraco para com os fracos, com o fim de ganhar os fracos. Fiz-me tudo para com todos, com o fim de, por todos os modos, salvar alguns. Tudo faço por causa do evangelho, com o fim de me tornar cooperador com ele.” (1 Co 9.19-23)

 

Será que percebemos o esforço e o desejo de Paulo de tornar o evangelho atraente aos seus ouvintes. Isto parece leviandade ou compromisso com o evangelho? O que estamos dizendo tem sido relevante à atual geração? Muitas vezes confundimos histórico com revelado, temporal com eterno, essência com acidente, forma com conteúdo. E desta forma nos tornamos irrelevantes e incapazes de tangenciar as questões que mais desafiam esta geração com a beleza do evangelho

 

Dr. John Stott no seu livro, “o discípulo radical”, coloca em um dos seus capítulos a temática da ecologia. Este tema talvez fosse desnecessário e irrelevante em outras situações, mas não neste momento da história. Ao pensar na comunicação do evangelho, precisamos considerar estratégias, abordagens e liturgia, temáticas. Como o evangelho trata as questões relacionadas a ideologia do gênero, ao materialismo e consumismo do presente século.

 

Como ser uma igreja relevante numa cultura em transformação? Isto inclui métodos, estratégias, abordagens e adequação litúrgica, afinal, “as armas de ontem não matam os coelhos de hoje.” A mensagem do evangelho é eterna, não pode ser negociada, não estamos falando de conteúdo, mas precisamos entender que um mundo em transformação exige uma resposta inteligente, e estratégias novas para um mundo digital e permeado pela inteligência artificial.

 

5.     O desafio do afeto

 

Por último, mas não menos importante, para fazer discípulos de todas as gerações precisamos de uma linguagem que passe pelo coração. As pessoas crerão mais facilmente quando perceberem que realmente nos interessamos por elas, não por motivos escusos e interesseiros, mas por causa de Cristo e do evangelho. Precisamos de pastores cuidadosos e atentos, e igrejas amáveis e acolhedoras. Apenas uma igreja com esta compreensão será capaz de romper a indiferença e o descaso dos tempos modernos.

 

Na década de 1980, Ivone Gebara, teóloga católica, começou a escrever sobre a teologia do corpo. Mais recentemente o Papa João Paulo II escreveu livro com a mesma temática. Apesar da relevância do tema, acredito que devemos introduzir a discussão em uma temática ainda mais urgentemente necessária: A Teologia do Afeto. Pensando nisto escreveu um livro com este tema em 2012. [4]

 

Precisamos ser uma igreja marcada pela afetividade. Nossos filhos e as novas gerações só serão convencidas pelo poder do amor. Aliás, esta é a base da nossa salvação. “Ou ignorais que a bondade de Deus é quem te conduz ao arrependimento?” (Rm 2.4) Quando somos confrontados com a beleza da graça e as ricas misericórdias de Deus, o Evangelho se torna poderoso em nós. Precisamos liderar a partir da afetividade.

 

Butterfield, escreveu um livro que relata sua conversão. O título é para lá de provocativo: “Pensamentos secretos de uma convertida improvável.”[5] Sua biografia relata a interessante jornada de uma professora de língua inglesa rumo à fé cristã. Com sólida formação humanista e secular, professora universitária, homossexual assumida e líder do movimento feminista de sua universidade, de repente tem um inesperado encontro com a família de um pastor, que a ama sem se importar com sua cosmovisão, e este amor de Deus marca sua vida de forma sensível. No primeiro encontro que tiveram, aquele casal perguntou se poderiam orar agradecendo o alimento, e aquela oração simples foi tão marcante que Deus, até então uma ideia esquecida na sua visão de vida, passa a fazer sentido. Deus de fato parecia real, de alguma forma. A partir da aceitação, do amor, e de uma fé simples que ela viu na vida deste casal, ela começou a ser atraída a Jesus. Sua declaração é interessante: “Uu não me converti do homossexualismo para o heterossexualismo, mas do ateísmo para Deus.”

 

O que impactou a sua vida? A forma carinhosa, sem preconceito, amorosa, com que Deus lhe foi demonstrado. A igreja precisa ser santa, mas não preconceituosa. A verdade é que se quisermos discipular a nova geração, precisamos construir uma teologia do afeto.

 

Conclusão

 

O evangelho precisa atingir as novas gerações e para isto precisa ser intencional e estratégico. Não podemos descuidar: a geração pós cristã da Europa e dos Estados Unidos está sempre nos lembrando: precisamos de teologia ortodoxa, bíblica, mas atraente, relevante. Precisamos entender o momento de nossa história como foram capazes de fazer os filhos de Issacar.

 

O evangelho tem poder para salvar, a semente por si só frutifica como nos ensinou Jesus. Temos o poder do Espírito, somos resultados da obra eficiente da cruz e do sangue. Como igreja precisamos pedir ao Senhor que nos ajude a “aproveitar a oportunidade com os que são de fora.”

 

Henry Nouwen escreveu um livro interessante sobre um velho tema: “A volta do Filho Pródigo.” Ele decidiu escrever este livro depois de passar algumas horas apreciando a clássica obra do Rembrandt, no museu da Holanda. Duas coisas foram bem interessantes na leitura deste livro:

 

Primeiro, ele disse que o centro da parábola não são os filhos: nem o filho licencioso moral, egoísta e perdulário; nem o filho que fica na casa, mas é um justo amargurado que não consegue entender o coração do seu amoroso do Pai.

 

Segundo, chamou a atenção que normalmente nos identificamos com um dos filhos, mas que o grande desafio da parábola é nos identificarmos com o Pai, afinal, somos chamados a imitar o Pai, que tinha três características básicas:

 

Generosidade

Misericórdia

Reconciliação

 

Este é o grande chamado da igreja de Cristo. Imitar o Pai. Tratar a atual geração com o coração marcado por estas três virtudes. Precisamos de uma igreja generosa, pronta a abençoar, misericordiosa, pronta a acolher e que tem o grande chamado para reconciliar as gerações e ser pacificadora.

 

Só assim conseguiremos de forma eficiente, fazer discípulos de toda geração.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



[1] Hunt. Susan – A graça que vem do lar, Casa de Cultura Cristã, São Paulo, 2002, pgs 27-29

[2] Hodge, Charles – Systematic Theology, Vol 3, Grand Rapids, MI, Eerdmans, 1991, pg 555

[3] Whitefield, George. Org The Godly family, essays on the duties of parent and children. Morgan, Penn, Soli Deo Glory Publications, 1993, pg 91

[4] Vieira, Samuel – Teologia do Afeto. Goiânia, Ed. Kelps, 2012

[5] Butterfield, Rosaria Champagne. São Paulo, Ed. Monergismo, 2017