1 Então Jesus começou a lhes falar por parábolas: Certo homem plantou uma vinha, colocou uma cerca ao redor dela, cavou um tanque para prensar as uvas e construiu uma torre. Depois arrendou a vinha a alguns lavradores e foi fazer uma viagem.
2 Na época da colheita,
enviou um servo aos lavradores, para receber deles parte do fruto da vinha.
3 Mas eles o
agarraram, o espancaram e o mandaram embora de mãos vazias.
4 Então
enviou-lhes outro servo; e lhe bateram na cabeça e o humilharam.
5 E enviou ainda
outro, o qual mataram. Enviou muitos outros; em alguns bateram, a outros
mataram.
6 Faltava-lhe
ainda um para enviar: seu filho amado. Por fim o enviou, dizendo: “A meu filho
respeitarão”.
7 Mas os
lavradores disseram uns aos outros: “Este é o herdeiro. Venham, vamos matá-lo,
e a herança será nossa”.
8 Assim eles o
agarraram, o mataram e o lançaram para fora da vinha.
9 O que fará
então o dono da vinha? Virá e matará aqueles lavradores e dará a vinha a
outros.
10 Vocês nunca
leram esta passagem das Escrituras? “A pedra que os construtores rejeitaram
tornou-se a pedra angular;
11 isso vem do
Senhor, e é algo maravilhoso para nós”.
12 Então
começaram a procurar um meio de prendê-lo, pois perceberam que era contra eles
que ele havia contado aquela parábola. Mas tinham medo da multidão; por isso o
deixaram e foram embora.
Esta parábola de Jesus é dita logo após a inquirição que herodianos e fariseus lhe fazem sobre a fonte de sua autoridade. Ao terminar sua narrativa, os judeus entenderam claramente o que ele lhes falara. “E procuravam prendê-lo, mas temiam o povo; porque compreenderam que contra eles proferira esta parábola. Então, desistindo, retiraram-se” (Mc 12.12).
A vinha era uma referência clara a Israel: “Porque a vinha do Senhor dos exércitos é a casa de Israel” (Is 5.1-7). Na narrativa de Lucas, ao entenderem o que Jesus lhes expunha, teriam dito o seguinte: “Tal não aconteça!” (Lc 20.16).
Este texto é uma alerta extremamente atual na história da igreja:
Há sempre um grande perigo da religião acreditar que tem a posse do sagrado, que pode domesticar a Deus.
A trilogia de Ken Follet, “Os pilares da terra”, é um exemplo muito claro de como isto pode se dar. Muitos religiosos acreditam inconscientemente que possuem o controle da divindade. Muitas denominações agem desta forma, como Deus fosse posse deles. Uma das características das seitas evangélicas é que a salvação depende do vinculo estabelecido com aquela comunidade, porque no intimo acreditam que Deus age somente naquele grupo.
Historicamente muitos líderes, pastores, padres e bispos, acreditam que podem deter ou controlar o Espírito que é livre como um vento, e sopra onde quer (Jo 3.8). Crêem que o poder está nas suas mãos e o sagrado é controlado por eles. Isto acontece nas religiões animistas de forma muito constante, mas também em grupos restritos.
Quais os perigos mais comuns entre estes grupos que tentam domesticar o Sagrado?
1. Se sentem ameaçados com os mensageiros divinos – Esta foi uma constante do povo de Israel: “Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram enviados! Quantas vezes quis eu reunir teus filhos como a galinha ajunta os do seu próprio ninho debaixo das asas, e vós não o quisestes!” (Lc 13.34). Israel acreditava num deus tribal, que não se importava com os demais povos do mundo, afinal, eles eram a nação eleita, o povo especial de Deus. Por isto desenvolveram um etnocentrismo que os impediu de fazerem missões para o mundo.
Quando isto acontece, passam a não mais aceitar a chamada de Deus para o arrependimento e para a santidade.
Quando João Batista começou seu ministério, disse aos seus compatriotas cheios de uma segurança falsa: “Produzi, pois, frutos dignos do arrependimento e não comeceis a dizer entre vós temos por pai a Abraão; porque eu vos afirmou que destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão” (Lc 3.8).
A igreja de Laodicéia se sentia segura.
Não havia nela traços de perseguição, nem de pobreza, nem de escândalos morais ou heresias, no entanto Jesus a chamou ao arrependimento, porque lhe faltava fervor. Era uma igreja morna. Jesus então lhe recomenda que se arrependa e volte. O excesso de confiança em determinadas doutrinas bíblicas como predestinação, certeza da salvação, eleição, podem desvirtuar em uma moral decadente, porque as pessoas não se sentem desafiadas a ouvir os mensageiros divinos.
Jesus afirma que os filhos da luz produzem frutos da luz. A igreja de Cristo tem a grande tentação de se achar detentora do Sagrado, e não ouvir a exortação de Deus à piedade, arrependimento e santidade.
Jesus afirma que o povo de Israel , o povo eleito, se especializou em rejeitar os mensageiros divinos, os profetas, que lhe exortavam a dar frutos dignos de arrependimento e que demonstrassem sua relação com o Pai das luzes, mas ao invés de ouvi-los, ficaram irados e os matavam. Assim a igreja de Cristo pode fazer, e muitas vezes tem feito na história.
2. Aqueles que acham que podem “domesticar a Deus”, facilmente rejeitam seu Filho – Jesus lhes pergunta: “Que fará, pois, o dono da vinha?” (Mc 12.9).
Sua pergunta é diretamente apontada aos líderes.
Quem pensa em ter o controle da divindade, exclui facilmente a mensagem do evangelho, e nega-se a pregar Cristo, ainda que aparentemente o faça. É fácil pregar um sermão não cristocêntrico, ter um discurso moralista, uma liturgia humanista e antropocêntrica, mas não anunciar a mensagem central do evangelho que é Jesus.
Os domesticadores de Deus, não apenas rejeitam os profetas que os chamam ao arrependimento, mas matam o Filho de Deus. “Jerusalém, Jerusalém... Quantas vezes quis eu reunir teus filhos como a galinha ajunta os do seu próprio ninho debaixo das asas, e vós não o quisestes!” (Lc 13.34). Jesus afirma que a cidade santa não reconheceu a oportunidade de sua visitação.
É costumeiro que religiosos se esqueçam de Cristo e que igrejas de Cristo conspirem contra ele.
Recentemente o Rev. Ricardo Barbosa esteve num encontro em Edinburgh, Escócia, para discutir a famosa Conferência Mundial que se deu em 1910 naquela cidade e que agora estava celebrando 100 anos. No encontro, um dos pastores disse que seria melhor não colocar o nome de Jesus no evento, para que isto não distanciasse as demais religiões e não fosse impedimento para o diálogo interreligioso.
Esta é uma tendência moderna.
Pastores evangélicos são capazes de pregar tudo, de moral a política, de cura a exorcismo, mas não falar da centralidade da cruz e da obra de Cristo. Rejeitam o filho porque querem ser donos da vinha. “Este é o herdeiro, matemo-lo, e a herança será nossa” (Mc 12.7).
Laodicéia é uma das igrejas de Apocalipse a quem Jesus enviou uma de suas cartas. Jesus diz algo estranho àquela igreja: “Eis que estou à porta e bato, se alguém abrir, entrarei em sua casa, cearei com ele e ele comigo” (Ap 3.20). É interessante que o dono da igreja esteja do lado de fora, tentando entrar, mas que sua igreja não permita que ele possa entrar. Jesus tem estado historicamente, muitas vezes, fora da igreja que se supunha ser sua.
3. Domesticadores de Deus, se esquecem que o legitimo dono julgará a infidelidade de seus mordomos “Virá, exterminará aqueles lavradores, e passará a vinha a outros” (Mc 12.9).
Jesus afirma que “no tempo da colheita” (Mc 12.2) ele enviou um servo aos lavradores. Hora de prestação de contas!
Quem lida com os dons e a vocação de Deus para a história, terá um dia que prestar contas.
A coisa mais temida pelos judeus aconteceu. Deus passou sua vinha a outros. Sua vocação missionária, sua tarefa de proclamar ao mundo as virtudes do Deus criador e salvador, foi dado à igreja de Cristo, aos gentios. Os judeus, que se achavam donos da vinha, perderam sua relevância espiritual para o mundo, porque achavam que dava para continuar administrando a vinha, sem o Filho. Por causa deste fechamento missiológico, Jesus veio para os que eram seus, e os seus não o receberam, mas a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que creem em seu nome (Jo 1.12).
A Igreja de Cristo deve lembrar-se sempre que o dono da vinha é o Senhor. A igreja não tem dono, porque seu dono é Cristo. Somos apenas trabalhadores na vinha, mas que grande privilégio temos! A igreja não pode ter donos, porque o dono é Jesus. Nós somos trabalhadores da vinha, e queremos servir o dono. Quando o senhor voltar, ele vai querer ver os frutos desta vinha, e o que temos a apresentar são as almas daqueles que reconheceram sua autoridade e se tornaram seus servos.
Conclusão:
Os judeus quiseram construir o grande edifício divino, sem a pedra angular. Os construtores rejeitaram a pedra de esquina. Esta é a atitude dos “domesticadores de Deus”.
Jesus lhes lembra ainda a profecia do Sl 118.22,23, passagem também conhecida dos judeus.
A pedra de esquina o pilar principal de todo antigo prédio. Ao remover a pedra, destruíram toda a obra de Deus. Por isto Jesus diz que o reino lhes seria tirado e dado a outro povo e que o juízo de Deus viria sobre Israel : “Aquele sobre quem esta pedra cair, será esmagado” (Mt 21.43,44).
O dono da vinha é o Senhor.
Sempre existe o perigo de nos julgarmos donos da obra. Para evitar este desvio, nosso louvor, liturgia, mensagem, culto e programas precisam estar alicerçados na pessoa de Cristo. Cristo está sendo glorificado naquilo que fazemos, ou agimos assim para nos mantermos como donos da obra que pertence a Jesus?