domingo, 21 de setembro de 2014

Ap 20 O Milênio


                                                                                         

Introdução:


É importante entender que não existe interrupção entre o capítulo 19 e o 20. Esta divisão que a Bíblia nos dá foi feita por Stephen Langton, Arcebispo de Canterbury no início do século XIII numa tentativa de nos ajudar a entender a Bíblia. Apesar de ser uma ajuda interessante, muitas vezes estas divisões quebram a sequência de um texto. No texto original, que não possui estas divisões em capítulos e versículos, a ideia entre estes dois capítulos flui naturalmente, relatando o retorno do Senhor. Além do mais, é bom lembrar que estas divisões não são inspiradas pelo Espírito Santo.
O capítulo 20 segue a ideia presente no capítulo 19. Logo após a visão do cavalo branco vindo nas nuvens em poder e glória, cercado de seu exército celestial, João vê outra figura, desta vez, o cenário se volta para o aprisionamento de Satanás.
Esta passagem é uma das mais controvertidas e disputadas nas Escrituras. No texto anterior, nos é revelado que a besta, e o falso profeta já foram aprisionados. Agora o texto nos fala do destino final do mais poderoso membro da tríade maligna: Satanás. Primeiramente João vê um anjo descendo dos céus para a terra, onde Satanás atualmente reside. Este anjo desce na forma de um carcereiro e traz as chaves do abismo, e uma grande corrente para manietar o diabo e mantê-lo acorrentado na prisão.
Uma pergunta de difícil resposta surge neste texto: O que significam estes mil anos? A diferença de opiniões quanto a esta interpretação existe deste a patrística.

A Igreja Primitiva e o milênio:

Papias, (70-155 A.D), discípulo de João, e respeitado apologeta cristão defendia o conceito do milênio, “Haverá um milênio após a ressurreição dos mortos, quando o Reino pessoal de Cristo será estabelecido nesta terra”, enquanto
Eusébio discordava de sua visão afirmando que Papias acreditava nestes conceitos baseado numa “má compreensão dos textos apostólicos, não percebendo que estas coisas eram ditas por eles, de forma mística e em figuras, por isto ele (Papias) tinha uma compreensão muito limitada deste assunto”.[1]
Justino, o Mártir, (110-165 AD) afirma: “Eu, e outros, que somos cristãos em todos os pontos, estamos certos de que haverá uma ressurreição dos mortos, e mil anos em Jerusalém, quando ela será adornada e ampliada como os profetas Ezequiel e Isaías declararam”. [2]
Orígenes repreendeu aqueles que tinham uma concepção física destes mil anos.[3]
Agostinho rejeitou veemente a ideia do milênio, porque na sua concepção induzia a prática da indulgência e imoralidade. Para ele, os mil anos referiam-se ao intervalo entre o primeiro advento e o último conflito. Esta é a posição atualmente defendida pelos a-milenistas[4].
Barclay afirma a ideia dos mil anos era muito comum entre os judeus quando se referiam a era messiânica. “Este texto em Apocalipse é o único texto que inequivocamente ensina o milênio, e seu background é, de fato, judeu e não cristão, e esta interpretação literal tem sempre descambado em perigos e excessos”.[5] Afirma ainda, que esta doutrina só é defendida nos últimos dias “por grupos excêntricos da fé cristã”.[6]
Na verdade, a palavra “Milênio” não é encontrada na Bíblia. Se por um lado, a ideia de mil anos não apareça em nenhum outro texto da Bíblia, exceto em Apocalipse 20, por outro lado, este conceito é repetido seis vezes neste capítulo.
Estes mil anos referem-se a anos cronológicos? São figuras de um tempo final ou são anos literais? Referem-se à queda do diabo acontecida na época da vinda do Messias porque Jesus afirma aos discípulos que “Vi Satanás caindo do céu como um relâmpago” (Lc.10:18) ou se refere a um tempo futuro, relacionado imediatamente à vinda de Cristo?
Três correntes teológicas de interpretação surgem aqui no texto relacionadas a ideia do Milênio:

Pós-milenismo
A-milenismo
Pré-milenismo.

Estas três correntes estão cercadas de interesses ideológicos e apologéticos e por esta razão o conceito do milênio torna-se ainda mais confuso. Na tentativa de iluminar este ponto, Wall[7] sugere que se reconstrua o pensamento original que estava na mente de João e seus leitores no tempo em que foi escrito este livro[8]. Wall afirma que o conceito do reino messiânico fascinava os rabinos no estudo da escatologia bíblica do VT. Para eles, o Messias viria de fora da história para estabelecer um novo sistema e uma nova ordem que substituiria a antiga transformando assim a história da humanidade.

Várias correntes de interpretação do milênio:
Três correntes são as mais conhecidas, embora exista um sem número de variações debaixo destas escolas.

Pós – milenismo
Esta corrente é uma das menos seguida atualmente. Foi defendida por um grupo de teólogos, alguns até respeitáveis, no século XIX. Com o advento da revolução industrial, e com o período de progresso da ciência e da pesquisa, muitas pessoas acreditavam que o mundo daria uma volta moral, e alguns desenvolveram a ideia de que o Reino de Deus iria se ampliar, com a pregação do Evangelho, de tal forma que chegaria uma idade de ouro, no qual Cristo reinaria por meio de sua igreja. O mal seria restringido, o cristianismo reavivado, o Espírito Santo influenciando vidas de tal forma que os sinais do Evangelho estariam presentes em toda a sociedade. Depois deste período de conquista do Evangelho, a apostasia iria retornar novamente, haveria um surto de maldade e o anticristo seria solto por um breve tempo. Diante desta situação caótica e conflitiva que surgiria, então se daria a segunda volta de Cristo, a ressurreição geral e o julgamento final.
Com a vinda de duas guerras mundiais, e a manifestação do ódio de forma cada vez mais violenta no século XX, esta posição teológica caiu no descrédito. Poucos se recusam a acreditar que a história humana possa melhorar sem que haja uma intervenção sobrenatural, direta e profunda de Jesus.

A-milenismo:

Apesar da palavra amilenismo, não ser composta, prefiro colocar uma divisão nela. Porque o prefixo “a”, significa “não” ou “nenhum”.. Os amilenistas não crêem na existência de um milênio literal, nem no reinado de mil anos de Cristo no futuro[9]. “Mil equivale a dez elevado à terceira potência – um número ideal. Não precisamos tomar o número literalmente, mas todas as aparências indicam que ele representa um período de tempo real, não importa se curto ou longo”. [10] Ladd ainda afirma: “Esta forma de interpretação envolve o princípio da recapitulação, isto é, a estrutura de Apocalipse não aponta para eventos consecutivos mas frequentemente cobre o mesmo tema com diferentes perspectivas”.[11] O milênio se iniciou com a vinda de Jesus.
Para ilustrar isto afirmam que Ap 12 fala aparentemente de algo escatológico (que ainda está para acontecer), quando na verdade refere-se a uma realidade histórica, que se deu quando Jesus nasceu. Para os amilenistas, o milênio descrito neste texto é uma figura da presente época da igreja e que está sendo preenchido de uma forma alegórica. Satanás foi acorrentado quando Jesus o derrotou na cruz. Satanás está acorrentado durante toda a história da Igreja Cristã.

Vários textos revelam que o estágio final de Satanás se inaugurou na vinda de Jesus:

Primeiro, e certamente o prioritário. A vinda do Reino do Messias inaugurou uma nova fase na história da humanidade. O nascimento e ministério de Jesus iniciam um momento em que Satanás é confrontado e derrotado. “E, se eu expulso demônios por Belzebu, por quem os expulsam vossos filhos? (…) Se, porém, eu expulso demônios pelo Espírito de Deus, certamente é chegado o reino de Deus sobre vós”. (Mt 12.27,28)

Segundo, Jesus declara que o seu ministério era para destruir e destronar Satanás. “Eu via Satanás caindo do céu como um relâmpago. Eis aí vos dei autoridade para pisardes serpentes e escorpiões e sobre todo poder do inimigo, e nada absolutamente vos causará dano”. (Lc 10.18-19)  Jesus afirma neste texto, que Satanás foi primeiramente destronado e subsequentemente, a autoridade foi dada ao seu povo, a igreja.

Terceiro, é verdade que em um sentido profundo e inequívoco, Jesus destruiu o diabo e o acorrentou na cruz. Em Col 2.15 lemos que Jesus “despojou os principados e as potestades, e publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz”. Noutra frase ainda mais contundente Jesus afirmou: “Chegou o momento de ser julgado este mundo, e agora o seu príncipe será expulso”. (Jo.12:31) Muitas vezes no NT a ideia de amarrar o diabo está associada a primeira vinda do Senhor.

Quarto, os demônios sabiam disto. Quando Jesus se aproximou do endemoniado gadareno, ele gritou: “Que temos nós contigo, ó Filho de Deus!  Vieste aqui para atormentar-nos antes do tempo?” (Mt.8:29). Os demônios sabiam que seu tempo estava chegando, e a vinda do Messias era tempo de julgamento e confrontação para os espíritos malignos. Os textos correlatos desta passagem sugerem outros fatos curiosos. Enquanto em Mateus 8.29, a pergunta dos demônios se focaliza no tempo. “Viestes atormentar-nos antes do tempo?”, em Marcos 5.10 a preocupação dos demônios refere-se ao lugar de seu destino final. “Não nos mandes para fora do país”. A preocupação dos demônios era de não serem enviados para o lugar de onde vieram. Alguém, parafraseando este texto afirma que o inferno é um lugar tão horrível, que nem os demônios queriam estar nele. Em Lucas 8.31, os demônios “rogavam-lhe que não os mandasse sair para o abismo”. O termo “abismo”,  é o mesmo encontrado em Ap 20.3 quando diz que “satanás foi colocado no abismo, fechado e posto selo sobre ele”. O abismo é o mesmo de onde saíram os gafanhotos demoníacos que torturaram os homens (9:1-6) Um anjo tinha a chave deste abismo e a usou para abri-lo e soltar os gafanhotos, é também o lugar onde mora a besta. (Ap 11.7) Para os amilenistas esta é uma linguagem simbólica que descreve a redução radical do poder e da atividade de Satanás, “não significa imobilidade total”.[12]

Quinto, Paulo se refere em Tessalonicenses a um poder que restringe a ação do diabo. “E, agora, sabeis o que o detém, para que ele seja revelado em ocasião própria” (2 Ts 2.6). Paulo menciona que existe uma força bloqueando a operação do erro, e que, apesar de toda a maldade que podemos perceber na história humana, satanás está detido. O que detém esta força maligna, que grande poder é este? Duas possíveis explicações surgem aqui. Uma delas isto se refere ao poder do Espírito Santo. O Espírito, que é santo, restringe e limita a ação do diabo. O diabo está “detido” para ser revelado em ocasião oportuna. Seria esta uma referência ao “pouco tempo” em que ele será solto, mencionado em Ap 20.3?  Os amilenistas dizem que sim. Outra possibilidade, derivada da primeira, é que seja uma referência á igreja. A força que deteria a ação do diabo hoje seria a igreja de Cristo. A oração, os louvores, a adoração são forças que limitam a obra do diabo.
Paulo ainda menciona neste mesmo texto citado: “Com efeito, o mistério da iniquidade já opera e aguarda somente que seja afastado aquele que agora o detém, então, será, de fato revelado o iníquo, a quem o Senhor Jesus matará com o sopro de sua boca e o destruirá pela manifestação de sua vinda” (2 Ts 2.7-8).   Ora, todos estes textos nos mostram satanás amarrado, retido, detido. Seria isto uma referência paralela a Apocalipse 20?

Sexto, Nenhuma nação, além do povo judeu, tinha a revelação e o conhecimento do Deus verdadeiro. Roma era subordinada a terríveis e densas trevas espirituais, a corrupção moral e espiritual alcançava níveis horríveis. As abominações, os vícios, o paganismo, a idolatria estavam presentes em todos os lugares, por todo o mundo pessoas estavam presas a rituais demoníacos. Antes da vida de Cristo, todas as nações estão debaixo da dominação de Satanás. Contudo, as promessas messiânicas, falam de um novo tempo. “O povo que andava em trevas viu grande luz, e aos que viviam na região da sombra da morte, resplandeceu-lhes a luz”.  A vinda do Messias desfaz a obscuridade, o paganismo, muda os valores morais e espirituais de muitas nações, costumes demoníacos são abolidos. Satanás encontra-se de certa forma amarrado pelo poder de Deus que encontra-se de forma concreta na sua igreja.
Outro texto messiânico afirma:“Pede-me, e eu te darei as nações por herança, e as extremidades da terra por tua possessão”(Sl 2.8). A obra missionária da Igreja tem refreado a atividade do diabo com seu testemunho, pregação do evangelho, sua presença salvífica e com seus atos de misericórdia. A verdade do evangelho tem desmascarado a obra satânica de tal forma que satanás não tem tido condições de enganar as nações de forma efetiva. Os eleitos de Deus tem trazido a luz do evangelho a todas as partes do mundo e tem desfeito as trevas da mentira e do engano. A antiga dispensação é marcada por uma igreja tribal, local e de um pequeno povo. A Nova dispensação é caracterizada pelo seu alcance universal. A Bíblia já foi traduzida em mais de 1000 línguas e é hoje o livro mais vendido no mundo, o maior bestseller de todos os tempos. Em muitas nações o Evangelho afetou profunda e radicalmente a vida política, econômica, social e intelectual. Apesar de tudo isto, os amilenistas não acreditam num pleno domínio antes da segunda vinda do Senhor. O diabo ainda age, mas o Evangelho tem efetivamente trazido libertação para milhões de pessoas. Neste sentido o diabo está acorrentado. A influência do diabo na terra tem sido paralisada com a vinda do Senhor e a manifestação da sua igreja. Milhares de pessoas tem sido libertas da escravidão e miséria através de ministério de libertação e do testemunho da igreja.

Aqueles que defendem a posição amilenista como Ellul, afirmam: “É evidente que não saímos aqui do simbólico, para entrar bruscamente no descritivo temporal e histórico. Mas é claro, devemos lembrar, como sempre, que o Apocalipse não é ‘a-histórico’ não é ‘sincrônico’ apenas (da mesma forma que não é apolítico). Para ele, a história é constantemente a matéria prima, a ocasião, o exemplo, o motivo do símbolo”[13]

Os amilenistas crêem que o milênio já está agora sendo cumprido e que apocalipse 20 nos dá um relato simbólico da obra de Cristo na cruz. A descrição desta cena onde o diabo é acorrentado e colocado no abismo por mil anos é na verdade, um “flashback” da crucificação. Satanás permanece atado durante mil anos, isto é, durante toda a era evangélica. E durante este tempo ele encontra-se agindo, mas com poder limitado por meio de seus demônios. Esta é a era da igreja, em que as nações ouvem a palavra do Senhor. No final, porém, ele vai se revelar de forma intensa.
Paulo afirma que a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo “não acontecerá sem que primeiro venha a apostasia e seja revelado o homem da iniquidade, o filho da perdição”. (2 Ts 2.3). Os amilenistas indubitavelmente acreditam que este texto seja uma referência a obra do diabo, quando no final dos tempos, Deus o libertará “por pouco tempo”. (Ap 20.3)  Neste tempo, “Satanás será solto de sua prisão, e sairá a seduzir as nações que há nos quatro cantos da terra, Gogue e Magogue, a fim de reuni-las para a peleja”. (Ap. 20.7,8)  e, depois de sua derradeira atitude, será “lançado para dentro do lago de fogo e enxofre, onde já se encontram não só a besta como também o falso profeta; e serão atormentados de dia e de noite, pelos séculos dos séculos” (Ap 20.10).
Outro ponto a favor dos amilenistas é que a ideia de “mil anos”,  referindo-se ao reino de Cristo só aparece neste texto, que é fortemente carregado de simbolismo. Esta doutrina não aparece em nenhum outro lugar no NT.

Pré-milênio


Os pré-milenistas acreditam que um milênio literal ainda vai acontecer na história da humanidade, e este evento ainda é uma realidade futura, totalmente escatológico.

Muitos argumentos são usados pelos pré-milenistas para justificarem seu ponto de vista:

Primeiro, Várias passagens na Escritura revelam que Satanás está amarrado e restrito apenas em relação àqueles que entregaram suas vidas a Jesus. Argumentam que se Satanás está amarrado hoje, esta corrente deve ser muito grande já que “O deus deste século tem cegado o entendimento dos incrédulos, para que não vejam a luz do Evangelho da glória de Cristo”. (2 Co 4.4) Satanás tem tido o poder de cegar os incrédulos, embora ele não tenha o poder de subjugar aqueles que colocaram suas vidas nas mãos de Jesus. Os pré-milenistas concordam que, de fato, os cristãos podem e devem exercer sua vida e se opor as obras satânicas. Admitem que a Igreja tem o poder de expulsar demônios e de quebrar cadeias que amarram a vida de pessoas, e opressões que se manifestam na vida de muitos, por meio do Evangelho e da obra do Espírito Santo. Por isto Pedro afirma: “Resisti-lhe firmes na fé”. (1 Pe 5.8), E que o diabo está amarrado e proibido de atacar aqueles que foram lavados pelo sangue do Cordeiro, mas isto é algo diferente do que está sendo dito em Ap 20.

Segundo, Afirmam ainda que, apesar de toda certeza que temos do poder da cruz sobre os eleitos de Deus, todos os cristãos concordam que Satanás tem o controle da raça humana. Paulo chama Satanás de “O deus deste século”  (II Co. 4:4) Paulo também intitula os demônios de “forças espirituais do mal principados, potestades e dominadores deste mundo tenebroso” . (Ef 612)

Terceiro, afirma que existe uma grande diferença da forma como o diabo é acorrentado na cruz e da forma como ele é acorrentado em Ap 20. O texto, seguindo o fluxo do capítulo 19, fala da volta de Cristo em poder e glória, portanto não está se referindo à sua morte na cruz, mas à sua segunda vinda.

Quarto, a prisão aqui é feita  por um grande anjo, provavelmente o arcanjo Miguel. O anjo traz uma grande corrente, simbolizando que ele possui uma autoridade para acorrentá-lo. Obviamente não podemos entender esta corrente de forma literal, porque satanás é um ser espiritual. Mas revela que algo vai acontecer a Satanás, e que vai fazer cessar toda sua atividade. Os premilenistas rejeitam a ideia de que Satanás já está preso como afirmam os amilenistas. Para eles, a prisão de Satanás implicará um domínio absoluto da Igreja. Todas as instituições, governos e indivíduos estarão debaixo do domínio e governo de Cristo, e isto se dará logo após a vinda de Jesus. Durante este tempo, os ímpios ainda não serão julgados, mas viverão ao lado da igreja vitoriosa de Cristo, sem poderem praticar o mal.

Quinto, O uso da frase, “Então eu vi”. (Kai eidon) 20.1  Para os premilenistas indica progressão cronológica. MacArthur Jr., afirma: “A localização desta passagem no fluir cronológico do livro de Apocalipse é consistente com a uma visão premilenista do Reino. Após a tribulação (caps 6-19), Cristo vai retornar (19.11-21) e estabelecer seu reino (20.1-10), que vai ser seguido pelo novos céus e nova terra (21.1)”[14]

Conclusão

Como dissemos anteriormente, esta controvérsia nos antecede de forma histórica e antiga, desde a patrística. Embora provavelmente nunca saibamos o exato sentido destas palavras, seja em que sentido for, a Bíblia nos ensina que o diabo deve ser preso por um período de mil anos, ou num longo período no abismo, no final deste período ele será liberto por um pequeno tempo.

Qual é a verdade permanente detrás deste simbolismo? O que este texto nos ensina?

1.       A libertação temporária do diabo significa um tempo de teste para os cristãos e para a raça humana. É interessante observar, que mesmo após o reinado de mil anos de Cristo, as pessoas ainda tem a tendência inerente nelas de seguirem o mal. Mesmo diante das evidências mais claras ainda existe dentro do ser humano, um forte potencial para ser enganado e seduzido. Tão logo o diabo é solto, ele sai a seduzir os quatro cantos da terra. Isto me fez lembrar de pessoas em processo de discipulado, que ouvem a palavra de Deus, estão aprendendo as Escrituras e que, de repente, ouvem uma heresia e esta heresia faz mais sentido do que tudo quanto lhes foi ensinado. Esta inerente propensão para aceitar aquilo que não é correto está presente na raça humana. À semelhança dos dias de Noé, “A maldade do homem se tem multiplicado na terra e é continuamente mau todo desígnio do seu coração”. (Gn. 6:5).

2.       Precisamos negar e afirmar o milênio - É impossível negar a existência do milênio, embora não necessariamente como afirmam os pré-milenistas: Um período literal de mil anos. (II Pd. 3:8) Ninguém discorda do milênio, as controvérsias se referem à forma de interpretá-lo. Mesmo os amilenistas, que por definição são a-milênio, admitem um milênio não literal. Honestamente não me importo com sua cronologia. Pode ser que já estejamos nele, pode ser que ele se dará como um evento escatológico, e pode ser que ele seja, até mesmo, diferente de tudo quanto até hoje temos conseguido interpretar. Se desde a patrística já existe esta controvérsia sobre o assunto certamente nossas respostas nunca serão conclusivas. Seria muita pretensão tentar ser conclusivo, quando o texto em si mesmo não o é. Resta-nos esperar com fé e santa expectativa...

Seja como for, estes mil anos serão apenas o ponta pé inicial, o capítulo número um do eterno retorno de Cristo. Tenho dificuldades de crer em duas vindas de Cristo, como advogam os pré-milenistas. Quando enfatizamos excessivamente os mil anos, criamos a Ideia de que Cristo vai reinar apenas por mil anos, mas na verdade, com a batalha do armagedom, ele vai reinar pelos séculos dos séculos, para sempre na eternidade. O que o texto nos descreve é que haverá um tempo de mil anos e no final haverá um teste final de obediência da humanidade ao Messias. Será um período em que Satanás usará todas suas armas para convencer-nos de segui-lo. A rebelião final está descrita em Apoc.20:7-9, chamada de guerra de Gogue e Magogue. Nestes “mil anos” a igreja deverá reinar com Jesus. 20:4 Jesus afirmou que quando ele retornar na sua glória, seus 12 discípulos assentar-se-iam nos 12 tronos e julgariam as tribos de Israel. (Mt 19.28). Paulo afirma que o destino dos santos é julgar o mundo. (1 Co 6.2)  Em Ap 2.26-27 Jesus fala à Igreja de Tiatira: “Ao vencedor, que guardar até ao fim as minhas obras, eu lhe darei autoridade sobre as nações, e com cetro de ferro as regerás e as reduzirá a pedaços como se fossem objetos de barro”.

Estamos nos “mil anos”, ou devemos “esperar os mil anos?  A Igreja é chamada para confrontar as sutilezas do diabo, expulsar demônios, amarrar o valente pelo poder da cruz. Neste sentido, o tempo de Jesus já está aqui, a autoridade da Igreja já está aqui, e o diabo já está amarrado. Mas a igreja é chamada, também, a esperar com fé num novo tempo. Tempo em que Satanás será “lançado no abismo, para que não mais engane as nações”. (20.3) Esta tensão dialética do “já” e do “ainda não”,  está sempre presente na escatologia bíblica. Algo grandioso já aconteceu, mas algo grandioso está para acontecer. É melhor não perdermos o próximo flash desta arquitetura em movimento. Certamente ficaremos surpresos com as coisas que ainda vão acontecer. “Agora ainda vemos como em espelho, obscuramente;  então, veremos face a face”. (1 Co 13.12)

Um dos fortes argumentos dos pré-milenistas é que a experiência atual da igreja não traduz o reinado da Igreja. Na verdade temos sido a “escória do mundo”, desprezados, humilhados, tidos por loucos, zombados, mas no meio da sua dura luta, a igreja segue vitoriosa e firme, realizando os propósitos do Senhor na história e dando sinais do seu reino. Por outro lado, a ideia de amarrar o diabo é uma forma simbólica de descrever a perda de seu poder e atividade, não necessariamente completa imobilidade. Os pré-milenistas afirmam que “amarrar o diabo”, é tirá-lo da circulação, sua completa imobilidade. “Satanás e seus anjos são removidos da atividade na terra. Isto é um completo exílio de onde eles não podem escapar por mil anos. Demônios serão banidos da terra por mil anos completos”.[15] Stedman continua: “Hoje, as mentiras do diabo prendem as nações. O mundo está cativo pelas drogas, pelo mau uso do sexo, pela luxúria do poder, pela luxúria do status e da fama. Estas mentiras tem sido derramadas nos ouvidos humanos vindo de forças invisíveis…O recorde da história humana é um recorde do engano realizado por satanás”. [16]
Ambas as interpretações deixam lacunas: Os pré-milenistas insistem em dizer que haverá um reinado de Cristo literal, de mil anos, e os pré-milenistas dispensacionalistas (uma variável do pré-milenismo) afirmam não haverá apenas mil anos literais, mas também uma restauração literal e física de Israel. Jerusalém vai se tornar a capital do mundo, e todas as profecias como a do monte das Oliveiras sendo partido ao meio serão cumpridas literalmente. (Zc 4.4) A restauração política da nação judaica em 1948 tem reforçado grandemente este argumento dos dispensacionalistas. Por causa desta convicção, existe uma espécie de Sionismo Evangélico muito comum nas nossas comunidades, algumas igrejas tem enviado grandes somas de dinheiro para ajudar a reconstruir Jerusalém. Será que para que o Reino de Deus seja estabelecido precisamos realmente enviar dinheiro para Israel, não seria isto uma leitura ideológica presente em nossas comunidades?
Esta vertente dispensacionalista espera uma restauração das promessas teocráticas de Deus a Israel. O templo seria novamente reconstruído, o culto restaurado e as nações se submeteriam ao governo de Israel. Esta ideia faz parte da expectativa judaica e estava presente na escatologia dos discípulos, apesar de Jesus não subscrevê-la. (At 1.6). Ensinam ainda sobre a restauração do culto e da legislação mosaica, mas a Bíblia afirma que esta velha aliança já passou. (Hb 8.13). Obviamente, se o Reino de Deus for instaurado aqui na terra, não temos dificuldade alguma para crer que o seu centro seja Jerusalém, mas devemos lembrar que a Nova Jerusalém será em nada semelhante ao que conhecemos, pois antes que venha o novo “Os céus passarão com estrepitoso estrondo, e os elementos se desfarão abrasados; também a terra e as obras que nela existem serão atingidas, …essas coisas serão assim desfeitas”. (2 Pe 3.10-11).

3.       Retornamos  mais uma vez à grande verdade bíblica de que “Tudo está sob controle”. Seja qual for a interpretação que você adotar sobre este texto, o poder do diabo é limitado, delimitado, demarcado. Quem tem o controle da história não é Satanás, nem seus aliados. Ele não tem o poder absoluto de satisfazer sua sede insaciável de matar, roubar e destruir. A história não caminha para um vácuo, para um nada, mas tem a direção amorável de Deus sobre ela. A vitória é do Cordeiro. Deus certamente aprisiona ou aprisionará Satanás, porque assim são seus decretos eternos, e Deus o libera para executar também seus propósitos eternos. Não existe maniqueísmo nem relativo nem absoluto nas Escrituras. A história humana não está nas mãos de duas forças poderosas e antagônicas: bem e mal. A história humana está nas mãos de Deus, incluindo aí, todos os principados e potestades, a besta, o falso profeta e a antiga serpente, Satanás. O vs. 7ss descreve sua derrota final. Gogue e Magogue são nomes bíblicos para as nações hostis que se rebelam contra Deus. Ez 38 e 39 fala sobre esta batalha.
O diabo tem seus dias contados. Sua derrota já está decretada. Ele deve retornar para o lugar que ele mesmo odeia, para sua casa. Os demônios do Gadareno imploravam a Jesus para que não os mandasse para o abismo. (Lc 8.31), embora soubessem que seus dias estavam contados. “Vieste aqui atormentar-nos antes do tempo?” (Mt. 8:29) Mas agora o seu tempo de juízo chegou, a sentença é dada. “o diabo, o sedutor deles, foi lançado para dentro do lago de fogo e enxofre, onde já se encontram não só a besta, como também o falso profeta, e serão atormentados de dia e de noite, pelos séculos dos séculos”. (Ap 20.10)

4.       Somos introduzidos a um novo tema aqui neste texto: A participação da Igreja no julgamento do mundo – Deus coloca o seu povo numa função tríplice. (a) - No papel de juiz: “Vi também tronos, e nestes sentaram-se aqueles aos quais foi dada autoridade de julgar”. (20.4), (b)- Na função de governo - Dá poder de também reinar com Cristo: “e viveram e reinaram com Cristo durante mil anos…e reinarão com ele os mil anos”. (20.4,6) Daniel profetiza esta mesma verdade afirmando que “os santos do Altíssimo receberão o reino e possuirão o reino para todo o sempre”. Dn 7.13,18,22. Às vezes nos perguntamos, como será este reinado do povo de Deus? Certamente esta é uma pergunta que só terá resposta quando as coisas se derem. (c), E no papel de sacerdotes : “serão sacerdotes de Deus e de Cristo” (20.6) São chamados de sacerdotes por que tem acesso direto à presença de Deus, sua função será eternamente aquele de levar a Deus as aflições do povo, de serem intercessores diante do Pai.

5.       A hora do julgamento – Este texto nos fala do juízo, não apenas do diabo, mas também de indivíduos. É hora de acerto de contas. “Então se abriram os livros”. 20.12 O julgamento é individual: “um por um” (20.13), E é baseado naquilo que o livro da vida de cada um relata, nas obras e na forma de crer de cada um, conforme o que está escrito no livro.

Um conselho final: Nesta hora você vai precisar de um bom advogado. Porque Deus não vai julgar apenas o que você fez, mas as motivações, intenções e motivos secretos. O critério é justo e absolutamente incorruptível. Você não vai poder ter caixa dois sem que isto seja conhecido, seus subterfúgios e argumentos que você usa para enrolar os outros não valerão, sua atitude de levar as coisas na base da brincadeira não servirão, sua retórica falaciosa e sua estratégia de acobertamento e mentira não servirão. É hora da verdade. “O LIVRO DA VIDA, FOI ABERTO”. (20.12)
A Bíblia diz: “Filhinhos, estas coisas vos escrevi para que não pequeis, mas se alguém pecar, temos advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo”. (1 Jo 2.1)  Deus, sabedor de minha limitação, conhecedor de minhas pretensa justiça própria, consciente de meu fracasso como gente, ciente de minha natureza pecadora, já providenciou para mim um advogado: Jesus. “Ele é quem tomou a ira de Deus contra nossos pecados e colocou sobre si mesmo e trouxe-nos para a comunhão com Deus. Ele é quem perdoou os nossos pecados, e não somente os nossos próprios, mas ainda os do mundo inteiro”.(BV I Jo 2.2).
O apóstolo Paul revela que existe apenas uma esperança para o homem escapar do julgamento do grande trono branco e de ser eternamente condenado ao inferno. “O dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus”. (Rm 3.23) A única justiça que Deus irá aceitar está em Jesus. Nós simplesmente não conseguimos atingir o patamar de perfeição que Deus exige de nós. Somente em Jesus podemos ter o dom da vida eterna.

Por isto, você precisa de um advogado!

Este advogado, porém, cobra caro. O preço para isto é a entrega de sua vida. Ele não aceita cauções, nem ações da bolsa, nem seu carro, nem seus imóveis, nem sua família, ele exige sua rendição plena e absoluta àquilo que ele é. Este advogado pede de você sua fidelidade, uma entrega total, sua vida, tudo o que você é.
Em contrapartida, ele inscreve seu nome no livro da vida. Ele assume toda sua culpa, toda sua vergonha, tudo o que foi inscrito contra você. O preço para isto foi seu sangue derramado no calvário. Cristianismo não é uma religião baseada nas conquistas que o homem consegue pela sua habilidade de ser bom, mas nos revela como Deus atinge o homem pelo seu amor. Jesus representa você junto ao Pai, ele intercede por você, e paga o preço do resgate por você. A Bíblia afirma que “Nenhuma condenação há para aqueles que estão em Cristo Jesus”. (Rm 8.1) Aqueles que se assentarão diante de Deus para o grande julgamento serão os pecadores que não se arrependeram e rejeitaram a salvação providenciada por Deus. Por isto seu nome não está inscrito no livro da vida.

Você está preparado para isto?

Medford, 16.02.01 – 38o. graus F






[1] . Eusebius, The Ecclesiastical History  3.38
[2] (Dialogue with Trypho, 80).
[3] (De principiis, 2.II.2,3).
[4] Agostinho, A cidade de Deus, 20.7

[5] . Barclay, William – The revelation of John, Vol. II, Edinburgh, St. Andrew Press, 2a. Impressão, 1961, pg. 244
[6] . Idem, pg. 245
[7] . Wall., Robert W., - Revelation, Peabody, MA – Hendrickson Publishers, Inc., 1991.
[8] . Wall., Robert W., - Op. Citado,  1991, pg. 235
[9] . McDowell afirma: ´Quanto à duração dos mil anos, não há razão alguma para interpretar esta figura ao pé da letra. Os demais números no Apocalipse que indicam períodos de tempo são símbolos. Em 11:2 “os 42 meses simbolizam um período limitado de guerra e perseguição; “uma hora”em 17:2 simboliza o período mui breve em os dez reis reinam com a besta”.  McDowell, E. A – A soberania de Deus na História, Rio de Janeiro, Juerp, 2a. edição, 1976, pg. 158
[10] . Ladd, 1980, pg. 195
[11] . Ladd, 1980, pg. 193
[12] . Ladd, George – 1980, pg. 194
[13] . Ellul, Jacques – 1980, pg. 227,228
[14] . MacArthur Jr.,, John – Revelation 12-22  Chicago, Moody Press, 2000 – Pgs. 233,234
[15] . Stedman, Ray C. – God’s final wordGrand Rapids, MI – Discovery House,  1991 – pg.322
[16] .Idem, pg. 322

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