Introdução
Vivemos
dias de muito movimento na igreja evangélica brasileira. Shows gospels, igrejas
lotadas, grandes eventos evangélicos. Muitos já falaram em avivamento, mas o
que acontece no Brasil, infelizmente, não pode ser definido desta forma.
Avivamentos duram longos anos, tem impactos sociais imensos, e afetam
consideravelmente as novas gerações. Podemos afirmar que muitas igrejas tiveram
renovações espirituais, mas não avivamento – que não é algo local, nem de uma
igreja apenas.
O
lado negativo disto é o fato de que, cada vez temos igrejas com mais
freqüência, e pessoas com menos compromisso com Jesus e com o Reino. São
pessoas que se tornam apenas nominalmente evangélicas, eventualmente são
batizadas na igreja, mas pouco conhecem de Jesus, e cujo compromisso espiritual
é raso e superficial. É o discipulado barato no qual se referiu Dietrich
Bonhoeffer.
O
pr. José Pereira, num tom ainda um pouco mais sarcástico gosta de afirmar que
“igreja grande é covil de malandro”, de gente que não quer compromisso algum
com sua comunidade, quer assistir um bom culto, participar de um bom louvor,
ouvir uma boa palavra, estar com pessoas interessantes, mas que não querem
compromisso, não querem pagar o preço de seguir a Cristo.
Nos
muitos anos de pastorado tenho visto algumas coisas interessantes.
- Vir à
igreja não diz nada – Mas não vir à igreja diz muito. Muitas pessoas
freqüentam igrejas, de forma religiosa e sistemática, mas será que
realmente a Palavra de Deus está moldando suas vidas, seu caráter, sua
ética? Ela pode freqüentar igreja por anos e não assumir compromisso algum
com sua fé – nem mesmo batizar. Com a igreja local e com o reino de Deus,
muito menos ainda. Por outro lado, se uma pessoa começa a se afastar da
igreja, substituir as atividades de sua igreja local, desinteressar-se
pela adoração, isto aponta para algo sério. A adoração, o culto ao Senhor,
não tem muita importância na sua história.
- Entregar
o dízimo, não diz nada – Não entregar, diz muito. Uma pessoa pode trazer
seus dízimos, porque aprendeu a fazer isto com os pais, porque tem uma
motivação de receber benção de Deus, porque acha interessante participar,
mas o coração dela pode estar longe, sua alma distante do Senhor.
Portanto, entregar, não diz nada. Por outro lado, não entregar, diz tudo.
Demonstra como as coisas de Deus são desinteressantes para ele, revela que
qualquer sacrifício que Deus exigir dele, ou reivindicação da Palavra para
sua vida, não é interessante. Não dar demonstra que a autoridade da Palavra
não é muito importante, que ele não confia muito nas promessas de provisão
de Deus, e que ele não tem qualquer responsabilidade pelo sustento daquela
comunidade na qual ele freqüenta e da qual ele faz parte. Não fazer, neste
caso – é um fazer altamente revelador, e nocivo.
Neste
texto de Atos 8, nos deparamos com a história de Simão, o Mago.
Este
texto nos revela algumas coisas:
A.
O poder do engano.
Toda Samaria, uma vasta região, vivia sob o domínio de uma pessoa, que tinha
certo acesso aos poderes espirituais e era temido por todos. Era uma grande
região, e todos naquela região foram absorvidos pelo temor a este grande vulto
espiritualizado. Era um macumbeiro poderoso, um feiticeiro com grandes poderes.
As pessoas, diz a Bíblia, viviam enganadas por este homem e por estes poderes
espirituais.
C.S.
Lewis, no seu livro “A cadeira de prata” fala do poder da ilusão da rainha do
submundo, que criava a impressão de que as coisas eram diferentes da realidade.
Ela invertia os fatos, impressões, criava sensações que enganava as pessoas.
Ainda hoje os poderes do submundo estão presentes em todas as culturas.
B.
O
poder do convencimento e da mentira. Maus produtos podem ser vendidos por bons
vendedores. Naqueles dias as pessoas criam ser verdadeiro o que não era, mas
elas estavam convencidas e viviam debaixo deste espectro espiritual.
Espiritualidade e filosofia falsa tem um enorme poder de convencimento, desde
que você creia neles. A questão não é se são verdadeiros ou não, mas quanto de
poder de convencimento, possuem. O apóstolo Paulo fala do mistério da
iniqüidade, e que “o aparecimento do
iníquo é segundo a eficácia de Satanás, com todo poder, e sinais, e prodígios
da mentira” (2 Ts 2.9). O mal e a mentira são muitas vezes demasiadamente
convincentes.
Todo
o povo de Samaria estava rendido a este homem. A mentira e o engano o convenceu
de que ele era uma pessoa realmente muito poderosa espiritualmente.
Simão
começa a participar da comunidade recém surgida em Samaria, se insere nela, sem
ser dela, e sua participação tornou-se cada vez mais envolvente, ele convencia
os apóstolos de que era crente e talvez ele mesmo estivesse convencido de que
era um discípulo de cristo. Passa a circular com desenvoltura na igreja, mas
não fazia parte do povo de Deus. Eis alguns sinais que revelam a sua falta de
relação com a fé cristã:
1.
Simão
interessa-se pouco por Deus e muito por prestígio pessoal: Suas motivações não eram corretas.
Havia algo naquela comunidade que ele queria, que era o poder do Espírito
Santo, mas ele ainda estava preso por laços de iniqüidade e não queria romper
com estas estruturas do pecado. Para avaliar nossa espiritualidade cristã
devemos sempre indagar sobre os motivos de nossa fé. Pergunte a si mesmo:
“Tenho interesse pelas coisas de Deus? As coisas de Deus atraem meu coração?”
2.
Simão
tem interesse pelo poder de Deus mas não pelo Deus do poder - Não existe nada mais inescrupuloso
que “poder” nas mãos de quem não sabe lidar com ele. O povo brasileiro é
“power-centered”. Aliás, a cultura hoje é assim, campo aberto para a ação de
Lúcifer que se levantará nos últimos dias com muitos sinais de poder (Ap
13.13-15). O poder de Deus restaura, mas o de Satanás destrói. Preocupa-me a
obsessão pelo poder, sem interessar pela fonte do poder. Simão apenas aderiu a
algo que era um poder maior do que os que ele fazia através da ilusão, mas ele
não percebeu que a fonte deste poder maior era que fazia diferença.
3.
Simão
é tão acostumado a arte de iludir, que torna-se incapaz de perceber o sagrado
nos acontecimentos que vê: Tudo para ele é business, técnica. Ricardo
Barbosa fala de um homem que começou a freqüentar sua comunidade em Brasília, e
que era um homem que tinha muito prestigio financeiro, mas era um homem
autoritário, arrogante e insensível nos seus negócios. Certo dia ele disse ao
pastor que estava buscando poder, e o Ricardo lhe perguntou para que ele queria
este poder. Para continuar sendo autoritário e trazer Deus para ser aliado de
sua vida que achava que podia mandar e dominar sobre todos? Tem muito poder
maligno travestido de espiritualidade cristã.
4.
Simão
convive com o povo de Deus, mas nunca entende o que está acontecendo - Um líder de renomada instituição na
América resolveu se aposentar, reuniu seu staff e apontou seu filho como seu sucessor
no ministério, pedindo que orassem transferindo sua unção de pai. Um membro do
staff ao ser indagado se isto de fato aconteceu, respondeu: “Que a unção saiu é
fato, mas para onde ela foi ninguém sabe”. Reino de Deus não é técnica, alguns
se acostumaram a determinados jargões, cacoetes, palavras mágicas e a
espiritualidade é percebida a partir dai.
5.
Simão
participa da Igreja, mas seu coração nunca deixou as velhas motivações para
trás - Onde estava sua
motivação: “Observando extasiado os
sinais” (At 8.13). Simão, o mágico
era irresistivelmente atraído ao mágico. Tinha especial interesse pelas
manifestações, os sinais o deixavam impressionado, e diante disto faz uma
oferta aos apóstolos para receber tais poderes.
Como se voltar
verdadeiramente para Deus -
a)
Não
simular conversão. O
que assusta nesta história é:
*
Simão
muda externamente suas atitudes. Anda
com gente diferente, vai para a igreja, cria hábitos diferentes, age de forma
diferente, mas não é diferente.
*
Dá
impressão de conversão- “Acompanhava de
perto” lit. “atendia constantemente”.
*
Batiza-se
- Torna sua ligação oficial com a Igreja. Assume compromissos de fé.
*
A
Igreja é incapaz de perceber que nada interior tinha acontecido. Seu coração era
ainda o mesmo, nenhum toque real de Deus. Filipe, que era o pastor dele não
teve percepção.
b)
Não
assumir compromissos irresponsáveis
- Batizar sem entender o discipulado, batizar sem seriedade. O batismo é sinal
da ruptura com o passado e do ingresso na vida cristã. O fiel sabe que, em
Jesus, morreu o antigo modo de viver e ressuscitou para uma nova vida, sabe que
foi perdoado, agraciado, revestido do Espírito Santo. Batismo deve ser algo
cheio de temor, deve arrancar lágrimas e emoções na alma.
c)
Não
se perder em sinais externos
– (At 8.13) Sinais são indicadores, apontam para algo, não são o alvo. Nosso foco
é Cristo. Jo 20.31 diz: “Estes sinais
foram feitos para que creiais no Filho de Deus”. Há pessoas que se perdem nos
sinais. Eles são importantes, necessários, mas não são o alvo último da fé
cristã. Falsos profetas, espíritos demoníacos, falsos obreiros e Lúcifer fazem
sinais. Aderir aos sinais de Deus não é, necessariamente uma adesão ao Deus dos
sinais. Jesus já alertava aqueles que o seguiam, não por causa da Palavra, mas
dos sinais: motivação errada.
d)
Entender
o sentido da fé cristã:
(At 8.20,21) Não usar o poder como instrumento para auto-promoção. Você não é
convertido enquanto não recebe o Espírito Santo, pode estar ligado à Igreja,
andando próximo ao pastor, ser batizado, mas se não receber o dom do Espírito,
não há vida. Tem que nascer de novo.
ü
Simão
concordou intelectual com o discipulado - “Abraçou a fé”
(At 8.13). Admitiu determinadas realidades cristãs, sem se converter de fato.
ü
Simão
cumpriu um programa de discipulado.
“Seguia a Filipe de perto” – (At 8.13).
Que discipulado fabuloso, aos pés de Filipe, um homem cheio do Espírito Santo. Não perde um culto, participa dos programas
de evangelização, está próximo ao pastor.
ü
Simão
percebe fatos espirituais-
Observou sinais, andou perto dos acontecimentos, mas aquilo não foi capaz de
torná-lo um homem consciente do que era vida cristã
e)
Desenvolver
genuíno temor a Deus –
(At 8.22-24). A exortação de Filipe é direta: “arrepende-te”.
Mude sua mente: Conversão é antes de tudo uma mudança na forma de pensar,
na visão das coisas de Deus, nas atitudes e na ética. Conversão é algo de
dentro para fora, tem a ver com mudança de nossa mente e de valores.
O
temor a Deus é essencial.
Brennan
Manning afirma que foi visitar um velho sacerdote que lhe disse: “Nunca pedi riqueza,
projeção, status, posição, aplausos, mas sempre orei a Deus para que eu jamais
perdesse a capacidade de assombro”.
Em
Atos lemos que na comunidade primitiva, em cada alma havia “temor”. Uma tradução
mais antiga fala de “espanto”. A NIV (versão inglesa), afirma que em cada alma
havia “awé”, uma interjeição que deve ser lida como “oh”. As pessoas percebiam
que estavam diante do Sagrado, e esta espiritualidade contagiante os envolvia
nos cultos, nos louvores, na celebração diária da vida.
Conclusão:
O
tema que deu a este sermão foi: “Dentro, mas ainda do lado de fora”.
Tema
é, certamente, uma das últimas coisas que brotam na preparação de um sermão.
Simão
estava dentro da igreja, conhecia o linguajar dos crentes, participava da vida comunitária,
viu os sinais, mas ainda estava do lado de fora.
Pedro
e João o exortam a se “arrependerem”. Quando estamos nesta condição, só existe
uma forma de quebrar este “fel de amargura e laço de iniqüidade”. Precisamos
entender que nossa situação é desesperadora, a não ser que Deus tenha misericórdia
de nós. Arrependimento significa que entendo a necessidade de mudar a trajetória
da vida, o jeito com que faço as coisas, e voltar.
Para
Simão, o arrependimento era a última e única chance.
E
para nós?
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