Introdução:
No dia 20 de março 2015, celebramos os 50 anos de organização da Igreja Presbiteriana Pioneira em Anápolis. Uma história repleta de milagres, salvações, redenção de vida. Se fossem escritos as narrativas dos feitos maravilhosos de Deus, e como ele levantou toda uma geração maravilhosa de gente que passou por este lugar, as intervenções sobrenaturais no meio deste povo, certamente teríamos conteúdo suficiente para escrever um livro inteiro. Infelizmente a história se perde facilmente, a menos que seja registrada, por isto Deus ordena a Moisés: Escreve!
Algum tempo atrás foi sondado por uma das igrejas mais tradicionais e antigas de nossa denominação sobre a possibilidade de um diálogo com vistas à transição pastoral. Fui convidado pela igreja para pregar, e lá, os presbíteros se reuniram comigo num agradável restaurante, e tivemos oportunidade de falar de sonhos, projetos e esperança. Um dos membros do conselho, porém, me fez uma pergunta que eu não gostaria de ter ouvido e muito menos de ter respondido. Ele me indagou sobre qual era a visão “de outros pastores e líderes” sobre a igreja deles. E eu me lembrei de um amigo meu que, quando ouvia perguntas difíceis gostava de responder brincando: “Você quer que eu fale a verdade ou minta?”. Em tom de humor, tentando ser simpático, respondi brincando usando esta frase. E depois falei sério. “O que eles dizem é que esta igreja foi uma das igrejas mais importantes da igreja, mas perdeu sua relevância na história”. Uma resposta ruim, mas honesta.
Este é um dos maiores perigos das igrejas históricas.
Olhar apenas para seu passado, seus monumentos, seus feitos. Acreditar que “aqueles dias é que foram bons”, e se esquecer de contemplar as perspectivas e possibilidades do futuro. A Mocidade Para Cristo tem um lema muito importante: “Ao compasso dos tempos, mas ancorados na Rocha”.
Quando olhamos apenas para o passado, corremos o risco de nos tornamos monumentos ao invés de movimento. Igrejas-museus, vivem do passado de sua história, mas não tem muita idéia do que fará no futuro. Aferram-se às tradições acreditam que o novo é um problema. Esquecem-se que a verdade não está nem no novo, nem no velho, mas no eterno. Confundem acidente com essência e histórico com revelado.
É certo que não podemos perder a história – E este é um problema também, porque quem despreza a sua história, esquece-se da sua história. A Igreja Bíblica é apostólica. Não podemos pensar como Hegel afirmava que “sua a história nos ensina alguma coisa, nos ensina que não nos ensina nada”. O rei Belsazar foi confrontado por Daniel porque esqueceu-se das lições da história. “Tu, Belsazar, que és seu filho, não humilhaste o teu coração, ainda que sabias de tudo isto” (Dn 5.22). Ele viu a tragédia que se abateu sobre seu pai por causa da arrogância em que vivia, no entanto continuou fazendo e agindo da mesma forma. Quem não aprende com as lições da história, acaba aprendendo pela prática, que é o caminho mais doloroso.
Em 1 Crônicas 12.32, Davi estava formando o time para o seu reinado.
Nomeou pessoas importantes e de confiança para seu primeiro escalão. Convocou pessoas com capacidade para o exercício de determinadas funções, e contratou de uma só vez, duzentos jovens de uma tribo quase desconhecida de Israel para estarem com ele. Eles eram todos da tribo de Issacar. Você já ouviu falar desta tribo de Israel?
Leia este versículo e veja o que havia de especial nestes jovens.
“Dos filhos de Issacar, conhecedores da época, para saberem o que Israel devia fazer, duzentos chefes e todos os seus irmãos sob suas ordens”.
1. Eles conheciam a época
2. Eles sabiam o que Israel devia fazer.
O que vemos aqui?
Estes jovens tinham lucidez para saber as tendências de seu tempo. Eles sabiam para onde as coisas deveriam caminhar.
Grandes líderes são homens que se antecipam ao seu tempo, que trabalham tendências e percebem o rumo que a história está seguindo. Os filhos de Issacar “sacavam” o tempo que estavam vivendo, faziam hermenêutica correta da história. Davi ficou tão impressionado com estes rapazes que contratou duzentos de uma só vez. É uma enorme contratação coletiva.
Por serem capazes de lerem corretamente o texto afirma que “eles sabiam o que Israel devia fazer”. Quem não faz leituras corretas, não produz uma prática correta. Grandes fracassos surgem por causa de leituras equivocadas. Alguém afirmou que “falhar na interpretação da bíblia, gera fracasso na missão”. Uma leitura equivocada da missão da igreja, da época, pode trazer grandes danos.
O poeta Moacir Bastos escreveu o hino da mocidade da Igreja Presbiteriana do Brasil, que se inicia com a seguinte afirmação: “Somos jovens num mundo velho, a pregar novos ideais; do mesmo evangelho, que pregaram nossos pais”. O problema é que, não raramente, nos tornamos velhos num mundo jovem – pregando ideais antigos. Se não entendermos as perguntas que atualmente são feitas, não conseguiremos dar respostas adequadas.
Os filhos de Issacar conheciam a época.
E nós?
Traços desta geração?
A geração atual possui traços bem conhecidos.
Num primeiro bloco colocaria o Subjetivismo, relativismo e pluralismo.
Num segundo bloco, midiática, virtual e urgente
No terceiro bloco, mística, esotérica e solitária.
Subjetivismo, relativismo e pluralismo.
No Subjetivismo se afirma que a verdade não está fora a pessoa, mas dentro da pessoa. Por esta razão, o budismo é tão aceito em nosso tempo. Ele afirma que existe um “pequeno Deus” em nós, e que precisamos encontrar a verdade que se encontra dentro. A verdade não é algo que se percebe fora do individuo, mas dentro dele.
A belíssima música de Almir Sater e Paulo Simões, “o vento e o tempo” fala disto:
Por mais que tente
Não entendo
Todo mundo enlouquecendo
Quem é que está com a razão
E tanta gente ainda lendo
Velho e novo testamento
Sem compreender a lição
Verdade é voz que vem de dentro
E mata a sede dos sedentos
O pior entre os meus sentimentos
De mim foi levado enfim pelo tempo
A verdade, na visão pós moderno encontra-se dentro da pessoa. Verdade não é aquilo que é, mas aquilo que acho que é. Isto é subjetivismo.
O Relativismo sustenta que a verdade tem múltiplas possibilidades. A sua verdade pode não ser “a minha verdade” e por isto, tudo depende do seu ponto de vista, tudo é relativo. O que determina a verdade são as percepções e leituras que se faz. Portanto, a verdade de alguém pode ser absolutamente a minha mentira, mas isto não interessa. É tudo uma questão de hermenêutica e ponto de vista.
Hegel, com sua síntese dialética foi quem colocou a verdade neste prisma filosófico. Ele afirma que, quando A (a verdade) é diferente de B (a mentira), mesmo sendo opostos, não quer dizer que A é a única verdade, e que B é mentira, mas pensar em síntese de que mesmo sendo opostos, cada um abriga a sua verdade. A verdade não é o que é, mas aquilo que a interpretação de cada um diz ser.
O Pluralismo afirma que para cada conceito, existe uma multiplicidade de ideias, e todas são válidas. Deve-se respeitar as diferenças, afinal, cada um vê dentro de sua cultura e concepção, de um jeito específico. Tudo depende da percepção individual, precisamos ser tolerantes e inclusivos. Uma pergunta clássica do pluralismo é “o que você pensa disto”. Se sua opinião for divergente ou radical, você é intolerante e preconceituoso. Certa pessoa indagou a uma jovem da igreja se ela tinha preconceito, e ela respondeu: “Não, não creio que o seja. Eu não tenho preconceito, tenho conceitos”. A filosofia do Raul Seixas, o maluco beleza diz: “Eu prefiro ser, esta metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”. No pluralismo, não se pode ter opinião formada sobre nada. Preceitos e conceitos são considerados intolerância.
Midiática e virtual
A geração pós-moderna enfrenta ainda outro grande desafio: Lidar com as novas formas e padrões de comunicação.
Enquanto os cinquentões lutam para acompanhar um pouco de tecnologia e entender como funcionam as máquinas modernas, a nova geração parece ter nascido com um chip de computador na cabeça, com um software de fábrica. O mundo é virtual. As notícias do mundo inteiro são atualizadas a cada segundo. É possível ter um chat no qual conversamos com pessoas da Europa e Ásia, mas não conhecermos a pessoa que se encontra ao nosso lado. Inclusive aquelas que são da mesma família.
Tudo é visual, virtual, líquido e rápido. As comidas são fast-food, cada vez mais fast e intransigentemente menos food. A linguagem é codificada e os relacionamentos são distanciados. Recentemente foi lançado um aplicativo no qual a pessoa se inscreve e seleciona alguns amigos ou amigas, com o qual teria coragem de transar. Se a pessoa selecionada, tiver marcado você também, o próprio aplicativo envia uma mensagem comunicando o fato. Daí prá frente, é só marcar o horário e a agenda para o encontro sexual, com uma clausula especifica: “Sem nenhum compromisso!”
Mística e esotérica
Se durante a fase moderna falava-se do secularismo e morte de Deus, atualmente a ênfase é na espiritualidade. Esta religiosidade se revela de formas absolutamente estranhas como Santo Daime, pessoas que bebem um chá alucinógeno e entram em transe, pessoas em torno de ET´s, cristais e pirâmides. Surgem cada vez pessoas mais espiritualizadas e com comportamentos religiosos mais e mais bizarros. A marca desta geração é a fé, numa realidade espiritual, que não se define quem, mas não interessa.
São pessoas em busca de sentido e propósito. Aderindo a causas estranhas como Estado Islâmico, e identificadas com atitudes desumanas em nome de Deus. Alguns anos atrás, o mundo ficou estarrecido com o suicídio de quase mil pessoas lideradas por Jim Jones, um religioso fanático e carismático. Em Waco, Texas, quase 40 pessoas também cometeram suicídio coletivo quando o planeta estava mais próximo da terra, por acreditarem que na cauda do cometa, havia uma grande nave espacial, que os receberia assim que morressem.
São bruxos, xamãs, curandeiros, pregadores, profetas, cada vez mais esdrúxulos falando em nome de Deus. Milhares de pessoas seguindo apaixonadamente estes cultos e rituais. Uma geração crédula e adoecida.
Poderíamos falar de muitos outros pontos para descrever esta geração, mas a grande questão é: “Estamos sabendo discernir os tempos e perceber com qual geração estamos lidando?” A capacidade de fazer perguntas certas, hermenêuticas corretas, nos ajudará a comunicar de forma mais efetiva com a cultura na qual estamos inseridos.
Mas os filhos de Issacar tinham ainda outra característica: “Eles sabiam o que Israel deveria fazer”.
O que devemos fazer?
1. Responder com graça e profundidade às perguntas honestas – Dr. Francis Schaeffer diz que devemos “dar respostas honestas às perguntas honestas que são feitas”. Não é uma tarefa fácil. Comumente somos consumidos pelo simplismo, superficialidade e irrelevância.
Certa pessoa de boa fé escreveu no muro de sua cidade. “Cristo é a resposta”. Alguém veio e colocou em cima: “Qual é a pergunta?”.
A Bíblia afirma que Jesus tinha uma forma simples de comunicar efetivamente. “E com muitas parábolas lhes expunha a palavra, conforme o permitia a capacidade dos ouvintes” (Mc 4.33). Ele tinha sensibilidade para perceber o nível de compreensão de seus ouvintes e lhes comunicar as verdades do reino, dentro da capacidade que tinham. A questão na comunicação não é o que você diz, mas o que o outro entende. Jesus mudava sua abordagem, seu estilo, método, na medida em que variava também seu público. O uso de parábolas, em certo sentido, uma linguagem metafórica, foi usado para facilitar a compreensão das pessoas.
2. Usar canais efetivos – Se lidamos com uma geração midiática, superficial na linguagem, precisamos aprender a transmitir conceitos espirituais dentro do universo de compreensão que possuem. O uso dos métodos acessados torna-se extremamente importante em nossos dias. Como transmitir? Quais métodos deveremos usar? Que estratégias adotar?
Um grupo de pessoas na Coréia do Sul, desejoso de comunicar o evangelho àqueles que vivem no Norte, estudaram o vento, a velocidade, a direção, e encheram balões com literaturas cristãs e soltado, de tal forma que quando ele explodir, a literatura cairá em centros urbanos ao norte. Facebook, whats up, e-mails, TV, tudo o que for acessível deve ser dito, para que a mensagem chegue ao coração desta juventude.
A Igreja corre sempre o risco de sacralizar os métodos. Mas toda metodologia deve servir como meio, e não como fim. Portanto, deverá ser adequada e sofrer mudanças, tantas vezes quantas for necessário.
3. Não se intimidar – Muitos ficam assustados com as notícias que ouvem diariamente. Que futuro haverá para esta geração? O que vai acontecer com uma nação tão perversa e ímpia? Que esperança podemos ter que o evangelho penetrará no coração deste povo em dias com tantas ofertas e possibilidades?
Se os cristãos primitivos ficassem assustados com a decadência moral de Roma, teriam recuado. No entanto, Paulo afirma oportunamente aos irmãos de Roma: “Porque o evangelho é o poder de Deus, para salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu, e também do grego” (Rm 1.16). Precisamos olhar para o Evangelho e sua potencialidade, e não para a força das trevas; devemos considerar o poder do sangue e não das forças malignas; refletir sobre a autoridade de Cristo e não amofinar diante da pressão do diabo.
Precisamos crer no poder do Evangelho.
Adoniram Judson afirmou: “As perspectivas são tão grandes quanto às promessas de Deus”. Por isto Deus diz a Paulo: “Fala, e não te cales, porque tenho muito povo nesta cidade” (At 8.5-11).
4. Precisamos vida de Santidade – Pedro afirma: “Antes, santificai a Cristo em vosso coração, como Senhor, estando sempre preparados para responder a todos aqueles que vos pedir razão da esperança que há em vós ” (1 Pe 3.15).
Mesmo com todos os meios, com leitura e hermenêutica correta da história, precisamos de vida santa, para responder com autoridade e simpatia, com integridade e profundidade, com paixão e razão, àqueles que quiserem saber o porquê da nossa fé. Uma geração incoerente e frágil, pede de nós, coerência santidade. Assim enfrenta-se as trevas.
Recentemente numa classe de Apologética cristã, discutíamos as provas racionais da existência de Deus, no entanto, frisamos que, apesar de toda lógica dos argumentos, a razão não é suficiente para convencer o pecador de que ele está perdido sem Jesus, e que precisa se arrepender e reconhecer a Jesus como Senhor e Salvador de sua vida. Paulo, apesar de ter usado nas suas mensagens todo seu poder de convencimento e arguição para provar que Jesus era o Messias e Salvador, foi categórico ao afirmar: “A minha palavra e a minha pregação não consistiram em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em demonstração do Espírito e de poder, para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria humana, e sim no poder de Deus” (1 Co 2.4-5). Por mais que sejamos convincentes na exposição do pensamento cristão, sem a operação do Espirito Santo, não haverá transformação no caráter do pecador, e ele continuará em pecado, mesmo que se convença de que exista um Deus (Tg 2.19).
Conclusão:
Queremos concluir pensando que, a grande questão não é apenas o que fomos, mas o que seremos. Ao celebrar 50 anos de aniversário e da fundação de uma igreja, não podemos apenas nos apegar no passado, mas indagar “O que seremos daqui 5, 10, 50 anos?”
A história nos serve para olhar com gratidão as intervenções históricas de Deus e suas manifestações entre seu povo. Tendo “tal grande nuvem de testemunhas”, podemos olhar com esperança, o nosso Deus é o mesmo ontem, hoje, e o será para sempre. Ele é o Alfa e o ômega, principio e fim.
A história também deve nos lembrar para onde Deus quer nos levar.
Decisões de hoje influenciaram daqui a 10, 20 e 50 anos, se Jesus não voltar antes. Por isto precisamos fazer com fé, santidade, temor, zelo. Precisamos deixar legados que perdurem. Plantar e semear com alegria, sonhando na colheita que virá.
Hoje estudiosos cristãos estão falando muito da Janela 4/14, que seria o tempo que temos para alcançar nossos filhos para Jesus. Depois, eles entram num mundo competitivo de vestibular, simulados e mercado de trabalho. Historicamente filhos demoram a voltar depois deste tempo, quando voltam. Precisamos cuidar desta geração que se encontra no nosso meio.
Precisamos plantar novas igrejas, congregações, avançar na obra missionaria, “Sede firmes e inabaláveis, sempre confiantes na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso trabalho não é vão” (1 Co 15.58).
Que Deus nos abençoe!
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