sábado, 30 de junho de 2018

Ef 3.10 Mosaico





Introdução:

Para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne agora conhecido dos principados e potestades nas regiões celestes” (Ef 3.10).
Este texto que serve de referência para nossa reflexão na inauguração desta comunidade que recebe o nome de mosaico, é o mesmo texto que foi utilizado no boletim da Igreja Presbiteriana de Anápolis (Central), por 62 anos. Não é interessante observar como as peças se encaixam perfeitamente? Quando o tema foi escolhido, nenhum daqueles que sugeriram fizeram qualquer associação com isto. A escolha foi aparentemente casual, mas demonstrou ser providencial no seu nível mais profundo.

Muitas vezes, “a casualidade” possui elementos surpreendentes. Na verdade, a Bíblia nunca fala de coincidências, mas de providência. A primeira é vaga, incerta, a segunda é dirigida por Deus. A história humana não é feita de sorte e acaso, mas de direção divina e propósito.
Minha esposa e eu temos um curioso incidente que mostra como as peças se encaixam perfeitamente na história:

Meus avós viveram muito tempo na cidade de Resplendor-MG, onde também viveram os pais da minha esposa Sara Maria. Quando minha esposa estava de férias passou um tempo naquela cidade visitando parentes e resolveu tirar uma fotografia na casa onde seus pais moraram, um antigo casarão em frente à estação ferroviária da cidade.

No primeiro dia de namoro com minha esposa, que morava em Registro-SP, fomos olhar fotografias e ela me mostrou esta fotografia, tirada no alpendre daquela casa. Quando vi a foto, falei que ela estava equivocada e que aquela casa era, na verdade, dos meus avós. Ela entrou no alpendre da casa, sem pedir licença, e com medo de ser descoberta pelos proprietários, tirou rapidamente a fotografia e saiu correndo.

Quando afirmei que era a casa de meus avós, ela teimou comigo e disse que eu estava errado, porque aquela era a casa paroquial da igreja presbiteriana. Ficamos teimando e resolvemos pedir para a D. Loyde (minha sogra), nos explicar a confusão. Ela então afirmou que aquela casa era a antiga casa da igreja, mas que havia sido vendida a um homem chamado Sr Antonio Vieira (que era o meu avô). Resumo da opera: se Sara Maria tivesse batido na porta daquela casa, teria conhecido meus avós... não é surpreendente? Tenho uma foto de criança, junto com minha família, na mesma varanda onde a Sara anos depois tiraria uma foto na sua adolescência. 


Quando o nome Mosaico foi escolhido, ninguém sabia deste fato de que, por mais de 60 anos, a igreja Presbiteriana Central, que assume este projeto, utilizou este texto no seu boletim. Não é isto surpreendente?
O que significa este texto?
Para que, pela multiforme sabedoria de Deus, seja agora conhecida dos principados e potestades, nas regiões celestiais em Cristo” (Ef 3.10).
A palavra “multiforme”, vem do grego “policromia” (que inclui diversidade de cores). A sabedoria de Deus não possui apenas uma tonalidade branca, ou preta, ou cinza. Sua sabedoria se expressa de formas diferentes. Um mosaico só é compreensível porque ele possui multiformes colorações. Na medida em que as cores se sobrepõem e se completam, o quadro vai tomando forma.

Este texto nos ensina que Deus possui uma “sabedoria multiforme”, como um mosaico, e Deus quer usar sua igreja para que esta forma seja manifesta.

Já viram um mosaico?
Ele é formado de pequenas pedras, de cores diferentes, que vão assumindo forma nas mãos de um habilidoso artista. Por ser feito de pedras, mesmo que o tempo o desgaste, ele pode ser restaurado pelo olhar atento de um artista, que poderá colocar novamente as pedras no lugar. Isto pode ser percebido em muitas escavações de antigas ruinas que estão sendo reconstruídos com a ajuda dos arqueólogos.

O texto de Efésios 3.10 nos ensina grandes lições:

Primeira, Deus tem propósitos claros para sua igreja – “Para que, pela igreja”, nos aponta o rumo.
O “para que, pela igreja”, demonstra uma intencionalidade explicita de Deus em usar sua igreja. Deus a estabeleceu com propósitos específicos. A igreja está incluída no  seu projeto para a história, e que possui planos cósmicos, já que ele fala de “principados e potestades nas regiões celestiais”. Deus quer usar a igreja para propósitos que transcendem a esfera do natural, indo para uma dimensão sobrenatural que atinge principados e potestades. Precisamos entender as oportunidades que se abrem como formas divinas de Deus orientar a agenda que a igreja precisa seguir.
Esta doação do terreno aqui na área do Anaville, aponta nesta direção. Não tínhamos orado por isto, não tínhamos pedido por isto, não fizemos planos de nos estabelecer aqui, entretanto, Deus mesmo abriu as portas para que aqui estivéssemos. É por isto que esta doação assume uma dimensão tão surpreendente.

Segunda, Jesus prometeu que edificaria a sua igreja
Nós, seres humanos, somos transitórios e temporais. Somos como um conto ligeiro, com a erva, como um breve pensamento, nossa curta história na terra é muito pequena quando consideramos a eternidade. Somos fugazes, “como nuvem passageiro, que com o vento se vai”. Mas o projeto de Jesus é eterno. Esta comunidade aqui transcende a nossa história curta.
Perguntaram a Rubem Alves quantos anos ele tinha, e ele respondeu: “Quantos tenho eu não sei, mas quantos já gastei eu sei”. O projeto de um homem na terra é transitório e passageiro. Não tem durabilidade. Por isto Jesus encorajava seus seguidores a construírem tesouros nos céus, onde traça nem ferrugem corroem. Os projetos de Deus, contudo, transcendem a história humana.
Este espaço que hoje recebemos, ultrapassará nossa história. Se Jesus não voltar logo, este projeto aqui orientará os filhos dos nossos filhos e pessoas que jamais imaginávamos, serão seus futuros lideres e membros. Quanta surpresa esta nova comunidade, Mosaico, revelará na história. Daqui a pouco seremos apenas história. Mas a história não se perde porque vai muito além de nós mesmos.
Quem está por detrás disto tudo é a Rocha Eterna.

Um antigo hino afirma:
1.     Da igreja o fundamento, é Cristo, o Salvador,
em Seu poder descansa, é forte em Seu amor.
Pois nEle alicerçada, segura e firme está
e sobre a rocha eterna, jamais se abalará.

2.     A pedra preciosa que Deus predestinou
sustenta pedras vivas que a graça trabalhou.
E, quando o monumento surgir em plena luz,
a glória do edifício será do Rei Jesus.


Jesus afirmou aos seus discípulos: “Eu edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 1618). Ele assegurou aos seus discípulos que edificaria a sua igreja. Quem edifica não somos nós, mas ele. Jesus está comprometido direta e pessoalmente com este projeto. Esta promessa é clara. Sua igreja se expressa na história de diversas formas e nomes: Católica, Ortodoxa, Reformada, Presbiteriana, Pentecostal, Neo-Pentecostal. Todas estas igrejas, por terem a presença humana que é falha e tendente à corrupção, podem sofrer distorções e heresias, mas a igreja verdadeira, construída por Jesus, neste mosaico, vai se firmar como sua igreja, transcendendo a história.
Podemos afirmar que desta igreja espalhada em todo mundo, com diversas formas, diferentes cores e tamanhos (mosaico), 1/3 dos seus seguidores não são apenas nominais, e estão dispostos a morrer por sua fé. A igreja de Cristo, já superou perseguição, martírio, oposição, enfrentamentos, infidelidade, e se mantém como uma rocha, porque quem a edifica é o próprio Senhor Jesus. Não se trata de projeto humano. Jesus morreu por sua igreja. Ele está comprometida em edifica-la.

Terceira, Deus não tem plano B para a história.
A Igreja ocupa um plano central no projeto de Deus para a história. Um plano cósmico.
Preste atenção no encadeamento da ideia do texto.
Por três vezes a palavra “mistério”, aparece (3,4,9), Paulo diz que recebeu este mistério através de uma revelação e que deveria comunicá-lo aos pagãos. Agora ele aprofunda o tema afirmando o povo redimido, tem a missão de tornar conhecida esta multiforme sabedoria que existe em Deus.
A igreja de Cristo é chamada para revelar o projeto de Deus à humanidade, e proclamar esta dimensão abrangente do domínio de Deus sobre todas as coisas, aos poderes históricos e espirituais, principados e potestades. Deus poderia ter feito isto através de revelação “direta”, ou lançar mão do ministério dos anjos, mas decidiu que esta proclamação seria feita através da igreja.
Jesus capacita sua igreja, dando-lhe o poder do Espírito e a envia ao mundo. Sua missão, portanto, ocupa um lugar central no projeto de Deus. A Igreja faz parte da estratégia de Deus para a humanidade.

Elizabeth Elliot narra uma parábola do encontro de Deus com seus anjos nos céus.
Certo dia, Deus estava apreciando a sua criação, quando os anjos chegaram e lhe perguntaram:
-“Senhor, para onde mandastes teu Filho?
E Deus então, apontou o dedo para a imensidão das galáxias, e foi dando um “close” na grandiosidade do universo até chegar à terra, um pequeno e aparentemente insignificante planeta, nebuloso e azul. E disse:
-“Para este planeta”.
Os anjos então indagaram:
-“E depois da saída do teu Filho, quem está cuidando do seu projeto”
Deus então respondeu:
-“Eu deixei o meu povo lá”
Os anjos responderam:
-“E se este povo falhar?”
Deus olhou, seguro e confiante e respondeu:
-“Eu não tenho plano B”.

Quarta, A essência da mensagem: Sua multiforme sabedoria.
O que Deus quer comunicar? “Para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida...” Sua sabedoria com tonalidades distintas é o que ele deseja revelar ao mundo, através de seu povo.
A palavra “multiforme” no original, literalmente é “policromia”. Deus deseja comunicar, pela igreja, seu projeto aos poderes temporais e eternos, e ironicamente escolhe sua igreja. O fato da responsabilidade estar nas mãos da igreja, não parece frágil demais?
Quando Jesus designa seus discípulos para o projeto evangelístico ele diz o seguinte: “Ide, eis que vos envio como ovelhas para o meio de lobos” (Lc 10.3).
Sejamos honestos, esta figura não é alguma coisa tão promissora... Lobos são vorazes, ovelhas frágeis. Se ele dissesse, “eis que vos envio como lobos para o meio de ovelhas”, certamente nos sentiríamos mais confortáveis. Mas ele nos coloca como o grupo mais frágil neste ecossistema e nos envia para uma alcateia. Qual a possibilidade de sucesso? Como estas ovelhas poderão sobreviver, a não ser que o pastor suprema, esteja empenhada em defendê-las? Com o pastor na frente, estas ovelhas podem seguir seguras, porque “as portas do inferno” não prevalecerão contra elas.
Neste texto Deus escolhe a igreja para manifestar sua policromia, sua “multiforme cor”, e a envia a declarar seu mistério aos poderosos. Deus quer que sua “policromia”, seu mosaico se revele na história e confronte principados e potestades. A grande benção é saber da promessa que Jesus fez: “Eu edificarei a minha igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16.18). Se olharmos para a suficiência da igreja, nos assustamos; mas se olharmos para Cristo, nos tornamos ousados. Por isto Paulo afirma que tal proclamação é feita, “segundo a força operante do seu poder” (Ef 3.7). O que poderia fazer a igreja sem o poder capacitador de Deus?

Para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida”.
Que sabedoria é esta?
O texto está falando de Cristo. A igreja é vocacionada por Deus para proclamar a glória de Cristo, colocar Jesus, o mistério de Deus, no lugar certo, no eixo central da história. O “mistério” de Deus estava oculto em Cristo, e se revelou num tempo específico, numa geografia conhecida, com uma ambientação política, caminhando pelas estradas poeirentas da Galileia e da Judeia.
Jesus é o “Alfa e o Ômega”, o princípio e o fim. Deus preparou o seu povo para revelar ao mundo as “insondáveis riqueza de Cristo”. A Igreja de Cristo testemunha o projeto de Deus na história, embora nem sempre seja ouvida, e muitas vezes sofrendo rejeição e oposição. Ainda assim, este é o papel da igreja: “proclamar as virtudes daquele que nos chamou das trevas para sua maravilhosa luz”, de anunciar o mistério de Deus que se revela em Cristo.

Conclusão:
A igreja é o método de Deus para evidenciar sua sabedoria ao mundo. Deus usa formas diferenciadas para alcançar determinadas culturas. Usa diferentes formas (estratégias, abordagens) para espalhar a sua sabedoria. Deus usa um mosaico, diferentes pedras, tamanhos, cores. A diversidade é a forma de Deus abençoar.

Mosaico pressupõe alguns elementos:

A.   Uma igreja para diferentes classes sociais – Não sonhamos e nem queremos uma igreja que fique em torno de si mesma, mas uma igreja mesclada por diferentes classes que revelem o amor de Cristo ao mundo. A Igreja é a única instituição que não existe para si mesma, mas para servir. Se quisermos um mosaico, precisamos pensar no Anaville, Bairro Sto Antonio, Novo Leblon, Summerville, e assim por diante. Mosaico pressupõe diversidade. A primeira a ser enumerada é a social.

B.     Uma igreja que transcende a barreira da idade – Não é igreja para classe média e pessoas de meia idade. Mas uma comunidade que se preocupa com seus filhos, crianças, jovens e adolescentes. Mosaico pressupõe uma comunidade onde jovens e velhos se encontram.

Na CHBC, em Washington DC, o conselho proibiu grupos homogêneos, mas encorajou grupos com diversidade. Não queriam White-americans se reunindo de um lado e black do outro. Queriam que pessoas diferentes estivessem juntas expressando a beleza do evangelho que reconcilia todas as coisas e desfaz as diferenças. Da mesma forma, os grupos foram encorajados a terem jovens e velhos mesclados, ricos e pobres juntos, para que aprendessem o significado do evangelho.

C.    Pelo fato dos mosaicos serem feitos de pedra, o tempo pode fazer ruir a ordem e a beleza da arte original, mas um bom arqueólogo, com criatividade e pesquisa, com paciência e cuidado, saberá recolocar as obras no lugar, de forma artesanal é possível restaurá-lo. Assim Deus deseja fazer conosco. Muitas vezes intrigas e controvérsias pessoais, vaidade e controle, poderão tentar desmontar este mosaico divino, mas com perdão, bom senso e graça, as pedras poderão se recolocadas no seu local e trazer novamente a vitalidade e beleza.

D.   Já assistiram Discovery Channel? Certamente você já se impressionou com a criatividade e diversidade da natureza. Em alguns momentos chegando à bizarrice. Com toda esta diversidade policrômica, a natureza se estabelece.

O que é feio para você?
Eu particularmente não gosto de cobra nem na TV, e acho o sapo feio, asqueroso e deformado. Mas Deus criou todos estes seres. Ele fez a natureza em forma de mosaico. Se você acha o sapo feio, deve admitir que ele tem seu peculiar modelito. Na linguagem de um famoso fenomenologista, Heidegger, toda criatura possui seu próprio “eidos”, sua particular beleza na diversidade. Se você acha que o sapo não tem nada de bonito, pergunte para a “sapa”, o que ela acha disto? Certamente ela o acha lindo! Por isto ela não se apaixona por outras espécies, mas por um belo e atlético sapo que cruza o seu caminho. Ou vocês já foram um sapo se apaixonando por um grilo?

E.    Por último, fundamental e imprescindível: Mosaico, é diverso, multiforme, multicolorido, mas precisa de um fundamento sobre o qual ele será moldado e desenhado. Este fundamento é o próprio Senhor da igreja, Cristo, a pedra angular. Deus usa não apenas uma cor e um tom, para alcançar diferentes pessoas, culturas, temperamentos, nível social e classes, mas o fundamento não poderá ser removido. “Porque ninguém pode pôr outro fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo”  (1 Cor. 3:11). 

Neste texto de Efésios 3.10, a Bíblia está se referindo a Cristo, o mistério de Deus outrora oculto, e que agora se revela em Jesus de Nazaré.
O mosaico tem que estar alicerçado em Cristo. Seu fundamento dá firmeza ao projeto. Diferentes cores, formas variadas, heterogeneidade, diversidade, mas um único fundamento.

sexta-feira, 29 de junho de 2018

At 9.20-31 Sou convertido, e agora?





Introdução:

Este texto nos descreve a vida de Paulo logo após sua conversão. O que aconteceu com ele nos primeiros dias de sua vida como cristão, depois de ter uma conversão tão radical?
Este texto ajuda a orientar aqueles que recentemente foram alcançados pela graça de Cristo. Quais devem ser seus primeiros passos? O que deve ser feito? Como Paulo agiu depois do encontro de Cristo? Sua experiência pode nos ajudar na caminhada dos novos cristãos?

1.     Envolvimento comunitário  E, depois de ter-se alimentado, sentiu-se fortalecido. Então, permaneceu em Damasco alguns dias com os discípulos” (At 9.19).

Novo convertido precisa de igreja.
Precisa encontrar uma comunidade na qual possa ser discipulado, receba nutrição e cuidado. Ele é um bebê e como tal precisa de cuidados especiais. Quem tem uma experiência com Cristo e não se cerca da comunidade, corre o risco de não receber a alimentação adequada e os cuidados necessários.
Vemos neste texto o apóstolo Paulo sendo acolhido na igreja. Pelo menos três ideias são facilmente percebidas:

a.     Ele é reconhecido como irmão. Ananias se dirige amorosamente e lhe dá o senso de pertencer a uma comunidade “Saulo, irmão” (At 9.17). Esta declaração é fortíssima para alguém que apenas três dias atrás perseguia duramente os cristãos. As pessoas precisam saber que você faz parte do grupo e você precisa saber que faz parte de um grupo, possui uma identidade comunitária.

b.     Ele é batizado. Batismo é uma declaração pública de fé. Estabelece o vinculo formal na igreja. Seu batismo acontece três dias depois de convertido. Você precisa ser batizado em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, obedecendo ao mandato de Cristo (Mt 28.18-20). Batismo é um mandamento de Cristo aos seus discípulos e não uma opção aos novos convertidos. Saulo foi batizado três dias depois de sua conversão.

Por que as igrejas de hoje não batizam imediatamente os novos convertidos?

Certamente aqui surge uma pergunta teológica: Por que não batizamos as pessoas imediatamente após a conversão já que no Novo Testamento as pessoas eram imediatamente batizadas?
Quando lemos Atos 2, no Dia de Pentecoste, vemos que 3000 pessoas foram batizadas logo após a pregação de Pedro. Assim veremos no decorrer de todo livro de Atos. O Ministro da rainha de Candace, é batizado logo após sua declaração de fé; o carcereiro de Filipos é batizado logo após sua conversão, o mesmo se dá com Saulo. Por que a igreja de hoje, não segue o mesmo procedimento da igreja primitiva?

Um pouco de história nos ajuda a entender.
Batizar imediatamente os convertidos seguiu por um bom tempo na história, até que os lideres apostólicos perceberem que muitas decisões eram meramente emocionais, e não tinham profundidade. Por isto, no ano 120, a igreja primitiva publicou o conhecido texto chamado Didaquê (literalmente: ensino), no qual instruía as igrejas a fazerem uma iniciação, chamada de catecúmenos, antes do batismo. Era uma forma de evitar o batismo sem discipulado e compromisso que começou a florescer na igreja. Desde então, as igrejas mais sérias e preocupadas com o discipulado, fazem uma preparação para o batismo.

c.     Ele cria senso de comunidade vivendo com os irmãos – “Então, permaneceu em Damasco alguns dias com os discípulos” (At 9.19). Ele passa a ter convivência com o povo de Deus. Certamente faz perguntas, observa o estilo de vida da comunidade, acompanha os líderes. Saulo demonstra ser ensinável, aberto à direção da igreja, apesar de ser uma pessoa com profundo conhecimento do Antigo Testamento e ter um status de rabino. Isto é fundamental para o novo convertido. Ele precisa aprender como é o proceder de um cristão, como deve tratar sua família, lidar com a vida e qual é a visão da bíblia sobre vários temas, por isto o novo convertido precisa da comunidade.

2.     Pregação a partir do testemunho – “E logo pregava nas sinagogas, a Jesus, afirmando que este é o Filho de Deus” (At 9.20).

Novo convertido precisa compartilhar sua experiência com Cristo.
Alguns dias depois de convertido, Saulo começa a compartilhar sua fé. O texto nos mostra como ele fez?

a.     Sua mensagem era assertiva – “pregava... afirmando que este é o Filho de Deus” – Ele não usava uma linguagem dúbia sobre a identidade de Cristo, mas “afirmava” ser ele o Filho de Deus. Se conhecemos um pouco da objetividade de Paulo, podemos imaginar que ele passava o dia estudando os textos do Antigo Testamento, já conhecidos por ele, para checar as profecias messiânicas relativas a Jesus.

Ao compartilharem sua fé, muitos se tornam ambíguos, inseguros e duvidosos quanto à mensagem. O fato de não serem assertivos, dá a impressão de que não  estão convencidos da mensagem que comunicam. A falta de convicção e clareza pode deixar em dúvida os ouvintes. Saulo “afirmava” ser Jesus o Filho de Deus. Ele não tinha dúvidas do que falava.

b.     Sua mensagem levava em conta o público – Logo pregava nas sinagogas”. Ananias ouviu de Deus que Saulo seria um instrumento escolhido para levar seu nome aos gentios, reis e aos filhos e Israel (At 9.15), e os primeiros a ouvir a mensagem foram os judeus.

Quem frequentava as sinagogas eram os judeus e Saulo tinha uma conexão histórica, cultura e linguística com aquele que era o seu povo. A linguagem falada nas sinagogas era hebraica. Esta seria uma estratégia adotada pela igreja em todo livro de Atos. Para onde iam, começavam a pregar inicialmente nas sinagogas, até serem expulsos por ela.
Isto nos leva a considerar a importância da conexão da mensagem com os ouvintes. Obviamente devemos pregar a todos, mas a mensagem se torna mais relevante e eficiente quando levamos em consideração o público.

c.     Sua mensagem apoiava-se na sua experiência pessoal – “Ora, todos os que o ouviam estavam atônitos e diziam: Não é este o que exterminavam em Jerusalém os que invocavam o nome de Jesus e para aqui veio precisamente com o fim de os levar amarrados aos principais sacerdotes?” (At 9.21).

As pessoas o ouviam chocadas, afinal, sua vida parecia uma contradição. Veio para Damasco para prender os cristãos e agora alia-se aos cristãos. Só um fato novo, inteiramente fora do script, poderia ter gerado uma transformação tão radical em sua vida.
A mensagem sempre se torna mais eficaz, efetiva e impactante, quando sustentada pelo testemunho do que a anuncia. Por isto, quando um novo convertido compartilha sua experiência pessoal de fé isto torna-se um instrumento poderoso para trazer convencimento e mudança no coração daquele que ouve a mensagem.

Muitos afirmam que o novo convertido não deve pregar enquanto não tiver fundamento sólido e bom conhecimento da doutrina. Esta é uma mentira do inferno. Naturalmente precisamos aprofundar nossa fé, mas independente do tempo de conversão, aquele que encontrou-se com Cristo precisa compartilhar a obra de Cristo aos outros. O nosso testemunho pode ser impactante e transformador na vida de muitos. Foi o que Saulo fez logo após sua conversão.
Algumas das pessoas mais eficientes que conheci no processo de pregação da palavra foram novos convertidos.

Em 1992, na Gávea, Rio de Janeiro, converteu-se um rapaz da Zona Sul, surfista sarado e de classe alta. Ele tinha uma namorada e viviam uma vida mundana, sem nenhum compromisso com Deus. Sua conversão teve ares dramáticos, porque sua namorada estava possessa de espíritos malignos. E eles começaram imediatamente o processo de discipulado e busca espiritual.
Eles tinham uma casa numa conhecida praia de Niterói, onde os amigos iam para tomar cerveja, fazer sexo e fumar maconha. Depois da sua conversão, ele convidou um dos pastores da igreja, chamou seus amigos, fez um churrasco e testemunhou a obra de Jesus em sua vida. Este rapaz, teve a benção de levar 19 amigos a Cristo, apenas no primeiro ano de sua conversão. Aqueles amigos também estavam cansados de viver naquele estilo de vida sem propósito, com sexo e maconha e aquilo não preenchia os seus corações sedentos de Deus e anelavam por conhecer alguma coisa espiritual que trouxesse sentido às suas vidas.
Sua história, assim como a de Paulo, foi transformadora.

d.     Ele não apenas pregava a mensagem, mas demonstrava a mensagem – Saulo, porém, mais e mais se fortalecia e confundia os judeus que moravam em Damasco, demonstrando que Jesus é o Cristo” (At 9.22).

Há uma pequena diferença no conteúdo da mensagem em At 9.20 “afirmava que Jesus era o Filho de Deus”, e At 9.22 “demonstrando que Jesus é o Cristo”. Na primeira, Saulo fala da relação de Jesus com Deus. Ele era o Filho de Deus, seu caráter era excepcional. Ele era diferente dos demais homens porque ser o Filho de Deus, não era filho de Deus como gostamos de dizer acerca de nós mesmos que somos filhos de Deus. Ele era especial. Em At 9.22, ele não fala, mas demonstra, certamente com textos do Antigo Testamento, que Jesus era o Cristo, o Messias esperado dos judeus e acima de tudo por sua vida transformada.

A demonstração é diferente do anúncio, porque nesta, se proclama e verbaliza a fé, mas na demonstração, a fé é percebida. As pessoas são impactadas diante das evidências. Com palavras podemos argumentar, e isto pode ser refutado e questionado; mas com demonstração, evidencia-se o irrefutável.

3.     Fortalecimento espiritual   Saulo, porém, mais e mais se fortalecia e confundia os judeus que moravam em Damasco” (At 9.22).

Novo convertido precisa de se fortalecer espiritual.
É muito comum encontramos igrejas fracas e apáticas, porque os membros não se nutrem da palavra e da experiência comunitária. Igrejas são notórias por produzirem crentes anêmicos e medíocres, com compromisso superficial com a fé e com o reino de Deus.
São poucos os que avançam e crescem na fé. Alguns, “apodrecem mas não amadurecem”. Quando alguém é convertido e não recebe alimento espiritual adequado, ele não cresce na fé.
Precisamos de fortalecimento espiritual.

Gosto de citar a resposta dada por John Stott quando esteve no Brasil em 1984, no congresso da Vinde, ao ser perguntado sobre qual era o segredo de sua vitalidade espiritual. Ele deu quatro respostas extremamente simples:
a.     Leio a Bíblia devocionalmente todos os dias;
b.     Oro todos os dias.
c.     Procuro nunca me ausentar das atividades de minha
d.     E não me afasto da eucaristia (Santa Ceia).

Após a sua conversão, Saulo se fortalece espiritualmente.
Sua vida tem sido marcada pelo fortalecimento espiritual? Você tem procurado exercitar sua fé? Crescer em maturidade espiritual?

4.     Paulo assume seu lugar no corpo  ...Mas os seus discípulos tomaram-no de noite e, colocando-o num cesto, desceram-no pela muralha” (At 9.25).

Novo convertido precisa assumir funções no corpo de Cristo.
O que vemos neste texto é surpreendente.

Depois dos embates de Saulo em Damasco com os judeus, sua vida corria risco. Afinal, ele confundia os judeus e demonstrava com acuracidade quem era Jesus. Isto despertou ira no coração dos oponentes e eles decidiram tirar-lhe a vida. Isto chegou ao conhecimento da igreja e souberam ainda que os inimigos estavam com um plantão na porta da cidade para matá-lo, caso planejasse sair da cidade. Sua vida corria risco.

A igreja protege Saulo e o tira da cidade, de noite, colocando-o num cesto e descendo-o pela muralha (At 9.25).

Um detalhe sutil, mas interessante é narrado no texto: “os seus discípulos tomaram-no de noite” (At 9.25). Você percebeu o que fala este texto? Saulo era novo na fé, mas já estava liderando outras pessoas e ensinando-lhes a Palavra. Ele já tinha discípulos. Ele não ficou na retaguarda, mas foi para a vanguarda. Ele passou a exercer influência com poucos dias de convertido.
John Maxwell escreveu um interessante livro sobre liderança. “O líder 360 graus”, no qual ele fala de pessoas que acham que só podem liderar se forem chamadas ou se estiverem no topo da instituição. Contrariando esta ideia equivocada, ele encoraja as pessoas a exercerem sua liderança a partir de qualquer ponto da instituição. Independente da empresa ou do lugar em que você estiver, comece a liderar deste ponto. Lidere os colegas, influencie os que se encontrem acima, e lidere os subalternos. Por isto é que muitos não são promovidos nas suas empresas, porque eles não percebem que quando as oportunidades surgirem não haverá tempo para se preparar mas a pessoa será lembrada se já estiver assumindo determinada função.
O mesmo se dá na igreja. Como alguém se torna líder na igreja? É necessário se apresentar. Você será lembrado se você estiver servindo.

O conselho de nossa igreja tem alguns critérios para convidar novos líderes:

(a)- Tal pessoa tem envolvimento com a comunidade? Sua família está presente na igreja? Muitos querem liderança mas não se esforçam e não se envolvem com a igreja. Como querem liderar se não se aproximam?

(b)- Esta pessoa tem o coração na obra? Ela é fiel nos seus dízimos e ofertas? Se a pessoa não contribui com liberalidade não tem o coração no ministério, pois Jesus afirmou que “onde estiver o teu tesouro, estará o teu coração”;

(c)- Se é candidato a presbítero, precisa ser apto para ensinar de acordo com 1 Tm 3? Ela está liderando algum pequeno grupo? Ela tem discipulado alguém?

Saulo não tem cargo algum, é novo na igreja, recém convertido, mas já tem discípulos. As pessoas o seguem. Já formou um grupo para aprender de Cristo. Ele inspira pessoas a seguirem a Cristo. Ele as encoraja e compartilha o que sabe, ele já formou um grupo em torno de si. Esta é a melhor definição de liderança: “Líder é aquele que tem seguidores”.

Tais critérios, entretanto, levam em conta apenas aptidão para o presbiterato, mas obviamente caráter é fundamental e prioritário. As características acima estão mais ligadas a aspectos práticos. Não adianta ter estas características acima se não tem caráter.

O novo convertido precisa assumir seus dons e seu lugar no corpo de Cristo.

Advertências
Quando continuamos o texto, percebemos que alguns perigos podem surgir para o novo convertido.

Primeiro, entrar em crise com Deus porque, apesar de estar fazendo a sua vontade, surge a perseguição. “Decorridos muitos dias, os judeus deliberaram entre si tirar-lhe a vida”.
Ao contar a parábola do semeador, Jesus antevê esta situação. “O que foi semeado em solo rochoso, esse é que ouve a palavra e a recebe logo, com alegria, mas não tem raiz em si mesmo, sendo, antes, de pouca duração; em lhe chegando a angústia ou perseguição por causa da palavra, logo se escandaliza (Mt 9.19-20).
Um novo convertido pode se assustar com a angústia e a perseguição decorrente do compromisso com a palavra de Deus. A ironia, zombaria, desprezo dos familiares e amigos, pode levá-lo a desanimar da vida cristã.
Saulo foi atingido imediatamente pela perseguição. Ele era o legítimo representante da religião judaica, com fórum garantido no sinédrio em Jerusalém. Seu zelo e tenacidade fariam dele um líder respeitado. Agora, depois da conversão, deixa de ser um exemplo a ser seguido e torna-se um traidor a ser exterminado.
Muitos se escandalizam quando surge a perseguição e angústia por causa da palavra. O compromisso com Deus pode trazer dores e mesmo transformá-lo num ser exótico ou estranho aos olhos dos colegas e familiares, trazendo incompreensão e rejeição. Você está preparado para isto?

Segundo, entrar em crise com Deus, porque, apesar de ser discípulo de Cristo, nem sempre a igreja o aceita.
Ao chegar em Jerusalém, Saulo procurou juntar-se aos discípulos, mas todos queriam distância dele. Ele está diante dos apóstolos, dos líderes da igreja nascente e isto não o livra da rejeição e descaso. Se você alguma vez já se sentiu rejeitado ou ignorado pela igreja, lembre-se que o maior apóstolo cristão encontrou oposição quando se juntou à ela. Não fosse a intervenção de Barnabé, talvez nunca saberíamos de Saulo (At 9.26).
Muitos novos convertidos encontram dificuldade quando tentam se aliar à igreja. Às vezes a cultura da igreja é fechada, estranha, ou marcada por legalismo, elitismo, exclusivismo ou até mesmo mundanismo e isto dificulta a inserção na comunidade. Você já se deparou com situação semelhante?

Terceiro, entrar em crise institucional – Apesar do esforço de Saulo em pregar, e ter um ministério eficaz, a igreja decide tirá-lo. A igreja interrompe seu ministério e o tiram da cidade. “Tendo, porém, isto chegado ao conhecimento dos irmãos, levaram-no até Cesareia e dali o enviaram para Tarso” (At 9.30). Saulo estava no início do seu ministério, pregando, indo para as ruas, confrontando, evangelizando, muitos se convertendo, mas de repente, a liderança decide que ele precisa sair da cidade.

Os líderes da igreja decidiram isto.
Eles chegam, conversam com Saulo e o levam para fora da cidade.
Já viu este cenário antes?

O pastor vai relativamente bem, fazendo até um bom ministério, mas eventualmente se depara com uma ou outra dificuldade relacional ou alguma atitude que a comunidade não aceita e sua permanência se torna insustentável. Ele precisa sair, e é retirado. Muitas vezes isto é dramático, principalmente se for um jovem pregador.
Isto aconteceu com Saulo. Levaram-no à Cesareia, onde ficava o porto mais próximo de Jerusalém e dali o enviaram para sua cidade de origem. Pagaram sua passagem no navio para ele desaparecer de Jerusalém. E há um interessante. detalhe descrito logo após sua saída.

O texto afirma: “A igreja na verdade tinha paz” (At 9.31). Uma versão mais antiga afirma literalmente “E assim, a igreja na verdade tinha paz” (RC). Assim como?

A retirada do obreiro, traz paz. Saulo estava causando inquietação na vida da igreja e tudo voltou à normalidade quando ele saiu. O fato foi tão traumático que Ray Stedman afirma que Paulo ficará, a partir deste fracasso ministerial de 12-14 anos, no deserto da Arábia, fora do ministério, até que Barnabé novamente sai em sua busca para reintegrá-lo ao pastorado (At 11.25). Ninguém tinha mais notícia do pastor problemático e de seu paradeiro até que Barnabé o reencontra o insere bem longe de Jerusalém, num novo campo, novo ministério, em Antioquia.

Saulo teve que administrar a crise. Tão cheio de si, tão conhecedor, uma profunda formação teológica, e agora fracassado no ministério. Coisas como chamado, vocação, ministério tudo isto agora se tornam ponto de interrogação. E a crise só não é maior porque ele não é casado.

Quando se trata de um obreiro casado sua família sofre junto. Por que sair agora? Estamos bem... Tudo parece estar bem... E ainda podemos falar de outra frustração possível. Sua saída não enfraquece o trabalho. Ele vai embora e a igreja continua a crescer. “A igreja, na verdade, tinha paz por toda Judeia, Galileia e Samaria, edificando-se e caminhando no temor do Senhor, e, no conforto do Espírito Santo, crescia em numero” (At 9.31). Sua saída não fez falta, pelo contrário, antes parece ter feito bem à igreja. O pastor estava desestruturando a ordem da comunidade. Sua saída foi uma benção!

Você já sentiu presenciou uma realidade assim ou já sentiu na pele este tipo de rejeição? Se isto servir de consolo, saiba que Saulo, um dos maiores de todos os missionários que a igreja cristã já teve, enfrentou sua crise ministerial, oposição, e foi expulso da igreja no seu primeiro pastoreio.