sábado, 5 de janeiro de 2019

Lc 2.41-52 Perdendo Jesus no templo


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Introdução:

Frei Carlos Mesters escreveu um sugestivo livro com o nome de "Deus onde estás?" Este foi também o lema da SAF da  IPB em 1989: "O teu Deus onde está?"

Há uma preocupação atual com a apostasia, preocupação aliás, justificada. Existe sempre uma estatística para dizer quantos entraram, mas não para dizer quantos saíram.

Muitas igrejas não tem apontado crescimento numérico em seu rol, apesar de terem recebido significativo número de novos membros, porque muitos infelizmente tem se afastado da igreja. O desafio não é apenas ter a porta da frente aberta para acolher e receber os visitantes e novos membros, mas também para fechar a porta de trás. Considere quantos filhos da igreja encontram-se fora da comunidade. Tome as páginas de catálogo de membros e veja quantos permanecem na Igreja. Enumere os amigos, que já comungaram conosco e que se foram ou simplesmente se afastaram da comunidade cristã.

Contexto:
O texto de Lucas é narrativo, mas queremos dar-lhe uma ênfase alegórica, que pode ser um discurso didático, ainda que perigoso porque alegoricamente é fácil deturpar e manipular o sentido original. Muitos pregadores modernos tem usado este recursos com resultados desastrosos.

Na Bíblia encontramos pelo menos um texto no qual o Apóstolo Paulo lança deste recurso ao falar de Sara e Hagar como figura de duas alianças (Gl 4.21-31), numa interpretação bem complexa, mas certamente aceita por tratar-se de um texto inspirado da Bíblia Sagrada. Nenhum expositor sério da Bíblia faria isto hoje em dia, mas nós cremos sem dificuldade que Paulo era inspirado por Deus ao fazer tal leitura.

O texto de Lucas descreve a embaraçosa situação de José e Maria que perdem Jesus nos dias agitados e turbulentos da Páscoa na cidade de Jerusalém, a festa mais importante para os judeus. Pessoas vinham de todos os lados e superlotavam a cidade, fazendo-a mais parecida com um mercado persa ou Rio de Janeiro em dias de carnaval.

O que é mais assustador: Jesus se perdeu no templo.
O menino Jesus foi esquecido dentro das estruturas religiosas. Ele nunca saiu dali, conversando com os mestres, mas seus pais não tinham mais a capacidade de saber onde ele se encontrava, apesar de Jesus nunca sair do perímetro dos imensos corredores e inúmeras salas e compartimentos no maravilhoso e ostensivo templo de Herodes.

Não é difícil imaginar como Cristo se perdeu nos círculos religiosos.
Podemos perder a Jesus dentro dos templos, participando das atividades diárias da casa do Senhor, servindo a Deus.  Não são poucos os que perderam a Jesus servindo a Jesus, porque ignoraram alguns elementos essenciais para andar em comunhão com Jesus, o senhor da obra.

Em 2 Rs 22.1-13 vemos o relato de uma época em que os textos sagrados não exerciam grande papel na vida das pessoas, e se perdeu nos dias do rei Josias, um dos piedosos reis de Judá. Ele derrubou o altar do bezerro de ouro, que há 300 anos estivera de pé, e promoveu uma restauração física no templo e nesta reforma encontraram, no meio dos escombros, o Livro da Lei, que estava perdido por aproximadamente cinquenta anos. Aquele livro estava perdido dentro do templo. Cinquenta anos perdido na casa de Deus!

Podemos perder a Jesus dentro do templo! Muitos perderam o temor e a reverência para com Deus apesar de estarem na liderança da obra, e talvez por estarem na liderança. Podemos perder a Bíblia em nossas igrejas, particularmente na vida de muitos cristãos e muitas vezes até mesmo nos púlpitos!

As circunstâncias que levaram a perda de Jesus, são as mesmas que nos levam a afastar-se dele em nossos dias:

Como Jesus se perdeu?

A.   Distração ou desatenção- Maria e José se descuidaram...No lufa-lufa da viagem e da festa, perderam o menino.

É fácil perder a Jesus na páscoa, quando embrulhamos a maravilhosa mensagem da redenção nos enormes ovos de chocolate; ou na festa de Natal, embalados pelo simpático velhinho de roupa vermelha, carregado de presentes e cercado de ostentosos e caros banquetes regados a vinho e champagne, nas festas que promovemos ou nas quais somos convidados a participar.

É fácil perder a Jesus dentro do templo.
Nos perdemos na festa, na burocracia, no maquinário, na eclesiologia, nos planejamentos, na programação, sem pararmos para perguntar: Onde está o dedo de Deus nisto tudo? Nos tornamos desatentos com aquilo que é essencial. As estruturas não são podem ser maiores que Deus.

B.    Ativismo – Maria e José tinham muitas coisas com que se preocupar nesta viagem. 

Eles não tinham reservas em hotéis como em nossos dias, nem poderiam contratar os serviços da Trivago, ou da Paula Turismo. Eles tinham que levar comida, fazer suas refeições, preparar o almoço nos improvisados lugares onde descansavam, se acomodavam e dormiam. Havia inúmeros detalhes e envolvimentos da viagem. Podemos ver Maria, como uma mãe atarefada nos preparativos para a longa viagem.
Além do mais, muitas pessoas para encontrar, quantas novidades...
Deus facilmente se torna um adereço da festa, como sempre acontece nas nossas festas religiosas. Se o programa é bom, se há uma boa participação, uma boa música, boa comida, bom pregador, não paramos para considerar: Onde está o dedo de Deus?

Às vezes temos um bom organograma, boa programação, mas não perguntamos onde está Deus. Eventualmente precisamos fazer como Isaque, sendo levado pelo seu pai Abraão para ser sacrificado e pergunta de forma displicente mas relevante: “Temos aqui lenha e fogo, mas onde está o cordeiro?” Isaque era uma criança, mas estava percebendo que alguma coisa estava faltando naquele ato de culto que seu pai estava preparando. “Onde está o cordeiro?”

Precisamos perguntar em nossas atividades e tarefas: O que tem Deus a ver com tudo isto que fazemos? Onde está Deus neste projeto? Ele realmente está engajado nisto ou fazemos apenas para cumprir uma agenda de programas? Afinal de contas, Deus não está interessado em ungir métodos, mas vidas.

C.    Familiaridade com o Sagrado - "Quando ele atingiu os doze anos, subiram a Jerusalém, segundo o costume da festa" (Lc 2.42).

A expressão “segundo o costume”, transmite a ideia de que isto fazia parte do calendário anual da família. Estava no programa, fazia parte da normalidade da vida.

Rotinas são importantes na vida.
Precisamos de rituais, regularidade, mas o problema é que, com o passar do tempo, é fácil perder a inspiração. Rotinas são mestras em tirar o senso de admiração e sacralidade.

Pessoas religiosas são facilmente vitimadas por este problema. Deixam de ver o sagrado como algo importante, e tudo se torna apenas algo que precisa ser feito. A Bíblia passa a ser lida, mas não necessariamente como Palavra de Deus para nos corrigir e educar na justiça. Ir à igreja é necessário, mas nem sempre estamos conscientes do porque vamos à igreja, por isto, qualquer programa interessante pode nos distrair. Perdemos a dimensão da grandeza do ato e nos acomodamos com o constante lidar com o sagrado. As coisas sagradas deixam de ser relevantes para nossas vidas, apesar de ainda continuarem a ser feitas, como hábito e rotina.

O conhecido versículo da Bíblia “Eis que estou à porta e bato", é dito por Jesus a uma de sua igrejas..
Já pararam para refletir em quão estranha é a sua afirmação? Ele está dizendo que encontra-se do lado de fora e deseja entrar nela. Ele não está dentro da igreja, mas excluído, batendo à porta e pedindo para entrar. A familiaridade com o sagrado facilmente gera monotonia e tédio.

Os judeus no deserto sentiram "fastio do maná". Aquele evento era maravilhoso. Todos os dias, Deus na sua providencia mandava alimento dos céus. Eles não precisavam plantar para colher, apenas recolhiam e preparavam as receitas. Aquele evento era extraordinário, mas os judeus disseram a Moisés que estavam com saudades do Egito, onde haviam sido explorados e escravizados e sentiam “fastio do maná”. O mesmo acontece quando nossa espiritualidade é meramente um ato rotineiro, quando temos gestos espirituais apenas pelos costumes. Ficamos enfastiados com o banquete que desce dos céus!

D.   Estrutura organizacional - O templo de Jerusalém era um elefante branco, enorme. Havia compartimentos reservados aos quase 4 mil levitas. Além disto havia os músicos, que cantavam ou oficiavam. O lugar preparado para os sacerdotes encarregados dos sacrifícios. Havia o pátio dos gentios, o lugar dos santos, o santo dos santos, sala para objetos sagrados, sala para vestes, tudo isto no superlativo.

As estruturas são imprecindíveis e necessárias, mas profundamente eficientes também para roubar a nossa alma.
Por isto não podem ser a essência do nosso culto nem o alvo de nossa vida cristã. Muitos tem perdido a Cristo por isto.
Confundem essência com acidente,
organização com organismo,
histórico com revelado,
temporal com o eterno.
Por isto vemos tantos teólogos apostatando?  Pastores céticos? Oficiais descrentes, porque conheciam apenas a obra, mas não o Senhor da Obra. A isto soma-se o número de pessoas se afastando da graça. Concílios que não conciliam nada, reuniões que não nos abençoam em nada.
O que fazer quando você se sente esgotado espiritualmente?  Quando sentimos nosso valor espiritual se esvaindo, quando começamos a ter aquela sensação de vazio espiritual. O que você faz quando percebe que Jesus se perdeu no meio da festa?

Como nós, os pais de Jesus, tentaram resolver o problema.
Infelizmente, eles, como nós, primeiramente fizeram algumas suposições equivocadas. Levantaram algumas teorias sobre o problema.

Consequências:
1.     Seguir normalmente a vida, sem pressupor que algo esteja realmente errado-  Pensando, porém, estar ele entre os companheiros de viagem, foram, caminho de um dia” (Lc 2.44). O versículo anterior afirma que Jesus fica no templo, “sem que seus pais o soubessem” (Lc 2.43).

Os pais de Jesus equivocada se firmaram em ideias erradas sobre o menino Jesus. "Pensando estar". Por causa desta equivocada maneira de analisar o problema, eles foram caminho de um dia. Viajaram cerca de 30 kms, a pé, sem o menino, e acham que está tudo certo!

É fácil continuar caminhando, sem ter ideia exata de onde Jesus se encontra. Caminhamos sem ele e achamos que está tudo normal. É possível caminharmos com Jesus acreditando que Jesus está conosco, mas ele se encontra a uma longa distancia de nós.

Existe um raciocínio complicado quando perdemos o sentido da direção. Quantos quilômetros eles terão que corrigir nesta caminhada? Supondo que andaram 30kms, isto significa que terão que andar 60kms, para corrigir a rota. São 30 kms para ir e 30 kms para voltar. Ao mesmo ponto de onde saíram.

A diferença é que, quando voltarem, terão o menino com eles.
Então, se você percebe que Jesus está longe, volte. O caminho de volta pode ser cansativo, mas não dá para continuar a jornada quando se sabe que ele ficou para trás. Precisamos reencontrar, nem que seja três dias depois.

2.     Buscar resposta entre os companheiros de viagem, parentes e conhecidos – “Pensando, porém, estar ele entre os companheiros de viagem, foram, caminho de um dia e, então, passaram a procurá-lo entre os parentes e conhecidos” (Lc 2.44).

Ao perceberem que perderam Jesus, tentaram encontrar entre companheiros, parentes e conhecidos. Inútil e infrutífera busca! Os amigos também não sabem onde se encontra o menino. É um cego guiando outro cego. José e Maria agora precisam fazer uma viagem de 30 kms, ou três dias de caminhada, em completa desorientação. As pessoas sabem tanto quanto eles e o resultado só poderia ser: "Não o encontraram" (Lc 2.44). Ninguém sabe.

A desorientação espiritual deixa-nos fragmentando, mas se Jesus é perdido no coração, na sua vida, só existe um caminho: Procurá-lo a partir de onde você o perdeu. “E não o tendo encontrado, voltaram a Jerusalém à sua procura” (Lc 2.45).

Normalmente Jesus se perde por descuido ou negligência espiritual, como aconteceu no caso dos pais Aqui se encontra um forte ponto de tensão da vida cristã. Os pais de Jesus se distraíram e o perderam.
Quantas coisas podem distrair o nosso coração hoje em dia. Quanto entretenimento... Quando temos uma prática equilibrada da oração, estudo da Bíblia, compromisso com o reino e com sua comunidade, dificilmente o perdemos. Quem não fala com Deus se desorienta. Quem não fica perto do filho em dia de festa, pode perder o menino. Mesmo estando profundamente comprometido com estruturas, programas e atividades comunitárias.
Por isto vale a pena a recomendação bíblica: "Lembra-te de onde caístes e arrepende-te".

Onde Jesus pode ser encontrado?

Apesar de toda procura e da ansiedade no coração de Maria e José, como pais perdendo seus filhos em ambientes repleto de pessoas, Jesus será encontrado no mesmo lugar onde sempre esteve, isto é, na casa do Pai.

três dias depois, o acharam no templo, assentado no meio dos doutores, ouvindo-os e interrogando-os” (Lc 2.46).

É necessário retorno.

"A crise de integridade", foi um livro escrito por Warren Wiersbe. O autor começa dizendo que a Igreja pode ser comparado a arca de Noé, lugar de salvação, lugar de vida, mas também onde animais diferentes precisam conviver harmoniosamente e repartir o espaço reservado para cada um, onde tantas vezes cheira mal. Wiersbe Conclui que, apesar de não ser nada cheiroso estar dentro da arca, os que se encontram dentro, jamais gostariam de sair, porque é o único lugar no mundo onde existe vida. Lá fora está a morte...

As vezes buscamos Jesus em muitas outras experiências, ao passo que Jesus nunca esteve longe.
Ele estava no lugar onde sempre esteve: Na casa do Pai.
É no convívio dos crentes que Jesus se manifesta,
            Na comunhão com o povo de Deus que encontramos graça,
                        Na oração sincera que encontramos a Cristo,
                                    Na leitura devocional da Palavra que encontramos direção
                                                E no rasgar de corações que é possível achar vida.

É necessário dar um passo atrás, buscar o ponto de partida.
Maria e José precisam voltar para o templo para se encontrar com o menino.



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Paz.



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Gávea, Rio de Janeiro, 13.01.90
Boston, 27 de outubro de 96
Igreja de Anapolis, Janeiro 2019

6 comentários:

  1. Graça e paz gostei muito dessa mensagem pois as igrejas estão lotadas de pessoas que estão perdidas longe de Jesus que Deus continue te inspirando cada dia mais

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  2. Deus continue te abençoando sempre. Muito gratificante. Estou abastecido com estás palavras.

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  3. Excelente sermão, Deus falou comigo!

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  4. Tremendo abriu a minha mente, que Deus seja louvado!

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