sábado, 25 de maio de 2019

Ester - Missionária do cotidiano (Et 4.12)


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Missionários do cotidiano                      
Ester 4:14 "Quem sabe se para tal conjuntura como  esta  é  que  foste
elevada a rainha ?"







As formas estranhas de Deus agir...

O grande projeto de Deus para o universo sempre foi o da infiltração e encarnação.
Quando Deus quis transformar a história, ele enviou Jesus para viver entre os homens, caminhar com eles, andar pela sua geografia, comer com eles. Da mesma forma, quando Deus deseja fazer mudanças históricas, ele usa seus servos, e por meio deles atinge os seus propósitos.

O contexto do livro se Ester se dá no apogeu do império dos Medos e Persas (atual Irã), na Cidadela de Susã. A mesma na qual  Neemias se sente chamado para a reconstrução dos muros de Jerusalém.  Ali era o centro de uma das maiores potências militares daqueles dias, que foi capaz de destronar o poderoso império babilônico. Parte destes relatos estão narrados em Daniel, Esdras, Neemias, que passam por alguns destes poderosos imperadores. Daniel chegou a ser conselheiro tanto da Babilônia quando dos Medos e Persas, quando Dario I, destronou Belsazar (Dn 5).

A Cidadela de Susã, era na verdade uma cidade em torno do palácio. Ali Assuero decidiu morar. Era sua residência oficial nos dias de inverno,  pelo  seu  excelente clima. O rei Assuero tinha sobre seu comando 127 províncias (Et 1.4). Seu domínio era vastíssimo, indo da Índia até a Etiópia, portanto de controle geográfico inimaginável.

Assuero era um rei folclórico e festeiro, e decidiu fazer uma festa  para seus assessores que durou 6 meses. É bom lembrar que alguns destes governantes que estavam com ele gastaram cerca de três meses para chegar ali, portanto, era algo realmente magistral, e para o seu próprio povo a festa  durou sete dias durante os quais os  súditos  deveriam  beber  e  comer  "sem constrangimento" (Et 1.8).

Um incidente, porém, causou um mal estar violento. A rainha Vasti frontalmente se recusa a comparecer perante  o rei quando este solicita. Para um homem tão  poderoso como Assuero, aquela afronta foi imperdoável. Na verdade, foi “o primeiro movimento  feminista” registrado na história, e por isto Vasti foi deposta da sua posição de rainha, e decidiram procurar uma nova rainha.

Este evento aparentemente tolo e corriqueiro, torna-se a possibilidade de Deus para libertar seu povo oprimido, escravizado e massacrado numa terra estrangeira. Ao escolherem uma nova rainha, chegaram à conclusão de que nenhuma era tão bela e com tanto conhecimento e desenvoltura quanto Ester, uma garota judia, órfã de guerra e exilada que foi criada pelos seu tio Mordecai (ou Mardoqueu). Seu nome judeu era Hadassa, mas agora em terra e língua estrangeira, adotara um novo nome.

Talvez a necessidade de sobrevivência em tempos tempestuosos tenha sido o método de Deus para que Ester se tornasse tão simpática e agradável. Passou num concurso de beleza com nota dez (deveria ser de uma beleza estupenda), mas muitas outras jovens eram igualmente bonitas, e certamente o que impressionou a comissão de procura de uma rainha, foi seu temperamento e sua inteligência.

O que sabemos de Ester além deste fato é bem pouco,  era  ela  de  boa aparência e formosura (Et 2.7) e muito simpática, caia na simpatia das pessoas por onde passava, desde as jovens que a preparavam até Hegai, o Eunuco de confiança do rei (Et 2.15), não basta ter rosto e corpo bonito, é preciso ter charme e personalidade para ser rainha. O fato é que ela impressionou desde o Eunuco  chefe e todos os demais observadores.  Com sabedoria, não  fêz exigências nem demandas, e isto marcou tremendamente os conselheiros (Et 1.15).

Enquanto isto...

Enquanto isto, outra narrativa caminha paralela a esta. Enquanto o rei procura uma nova rainha, e os conselheiros se afadigam na busca pela “mulher nota dez”, para a função de rainha; Hamã, um respeitado conselheiro do rei, e segundo no trono de Assuero, aos poucos vai criando uma obsessão com a atitude afrontosa de um judeuzinho empertigado, que se  recusava a se curvar diante de Hamã, quando este passava na porta do palácio. As razões de Mordecai, podem ir de questões de foro íntimo ou religiosas, até mesmo à uma estranha atitude de desafio. A escravidão do povo judeu, da qual ele fazia parte, não o intimidava.

Hamã  se indignava por isto, pois lhe parecia uma afronta destinada a aborrecê-lo. De fato a atitude de Mordecai era desafiadora, mas Hamã começa a adoecer com isto. Ele podia ignorar sua atitude ostensiva, mas não conseguia. Em um determinado momento, estas duas histórias se mesclarão de forma providencial, Na verdade, só a ação de um Deus que controla todos os eventos, poderia fazer com que estas duas histórias se tocassem.

O livro de Ester vai nos ensinar algumas princípios bíblicos, e por serem princípios, precisam nos orientar. As verdades contidas neste livro nos revelam como Deus age na história.

Primeiro, Ele tem um plano para a história (Et 4.14)

Os eventos aparentemente despropositais, e alguns deles estranhos, fazem parte de um projeto maior.

Por que a rainha Vasti decide afrontar o rei de forma tão direta, num momento especial de um rei tão poderoso? Por que desafiar seu marido diante de todos os nobres e princípes que vieram participar desta festa composta de gente tão importante? “os nobres e príncipes das províncias esavam perante ele” (Et 1.3).

Por que o rei decide fazer uma “loteria” para procurar uma rainha? Por que um voto “popular” deixando nas mãos dos conselheiros a decisão de providenciar uma esposa para si? Homens gostam de conquistar, e certamente não faltariam princesas dispostas a se casar com alguém tão poderoso.

Como estes conselheiros chegaram àquela menina pobre, periférica, de um povo estranho, e a escolheram?  O que havia nela que a tornou tão simpática aos olhos de todos? Não parece isto um “conto de fadas”?

M. L. Jones, no seu livro, Do Temor à razão, faz as seguintes declarações sobre Deus:

  1. A história está sob controle divino – As pessoas fazem aquilo que Deus quer. Deus em nenhum momento, deixou de ter controle da história. A história “humana” é história de Deus. Os homens fazem as coisas, mas Deus está no controle divino, e vai realizar aquilo que Deus deseja através dos agentes que ele mesmo interpõe na história, mesmo quando os homens não tem consciência desta verdade.

  1. A história segue um plano divino:  As coisas não acontecem por acaso. Os incidentes não são acidentais. Há um plano definido para a história.  Deus vê o fim desde o princípio.

  1. A história segue um horário divino – Este é um dos dilemas mais pesados para nós. Muitas vezes achamos a intervenção de Deus demorada. Veja o que Pedro nos diz: "Não retarda o Senhor a sua promessa, como alguns a julgam demorada; pelo contrario, ele é longânimo para convosco, não querendo que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento" (2 Pe 3.9). A razão da aparente demora de Deus é porque ele ainda está dando tempo para que nos voltemos para ele, e sejamos salvos.


Segundo, Ele usa agentes incomuns e inesperados.

Depois desta agitação social nos arraiais do grande Assuero, Ester finalmente é coroada rainha. Aquela garota excluída é agora colocada em destaque. Mas para que? O propósito de Deus era apenas resgatar do anonimato e da exclusão a vida de uma garota com tantos traumas? Certamente esta já seria, em si, uma razão para não ser menosprezada, mas Deus estava com projetos muito maiores. Ester, sem imaginar, seria colocada no centro de uma disputa política, que seria catastrófica para o povo judeu, se ela não estivesse na posição de rainha.

Hamã, aproveitando do respeito junto ao rei, resolve jogar toda sua cartada, e ardilosamente conspira contra o povo judeu, que para o rei era apenas um grupo de uma província distante e insignificante, que segundo Hamã estava causando mau estar no reino. Ele prometeu ao rei exterminar aquele povo e ainda trazer fundos para os cofres reais.  Na verdade, o povo judeu era politicamente sem influência, pois salvo alguns que se destacaram na política, tinham o status de escravo e de povo exilado, sem qualquer organização política e social.

Hamã consegue a aprovação do rei, e desta forma tinha agora a autorização real para atingir Mordecai, seu desafeto. O Edito real tinha uma grande abrangência, e autorizava os súditos a matarem e ficarem com a propriedade dos judeus. O esquema estava montado...a notícia foi pavorosa para os judeus. A condenação era certa: tinha dia e hora para ser executada e com a chancela real.

Mordecai decide entrar em contato com Ester e manda-lhe um mensageiro. Ester reage de forma defensiva:

Primeiro, manda roupas Mordecai que estava vestido de pano de saco e cinza, em forma de dor e protesto.

Segundo, se defende dando a entender que nada podia ser feito: “Todos os servos do rei, e o povo das províncias do rei, bem sabem que todo o homem ou mulher que chegar ao rei no pátio interior, sem ser chamado, não há senão uma sentença, a de morte, salvo se o rei estender para ele o cetro de ouro, para que viva; e eu nestes trinta dias não tenho sido chamada para ir ao rei”(Et 4.11).

Entendendo o meu lugar na história

Quando Ester se esquiva da responsabilidade, Mordecai lhe mostra que a omissão e o silêncio, não eram opções. Ela não podia ficar em silêncio diante da tragédia iminente.

Então Mardoqueu mandou que respondessem a Ester: Não imagines no teu íntimo que, por estares na casa do rei, escaparás só tu entre todos os judeus. Porque, se de todo te calares neste tempo, socorro e livramento de outra parte sairá para os judeus, mas tu e a casa de teu pai perecereis; e quem sabe se para tal tempo como este chegaste a este reino?”(Et 4.13,14).

Mordecai mostra que Deus nos proibe fechar os olhos e ficar em silêncio. "se de todo te calares neste tempo..." Ester teve o impulso de se servir do cargo para benefício próprio mas Mordecai tenta colocar sua perspectiva na direção certa. Será que Ester estava conseguindo ter a visão de todo cenário? A vida do palácio a isolara da solidariedade e luta. A ascensão social pode nos tornar insensíveis e apáticos.

Certa vez, M.L.King Jr. declarou:  "A história terá que registrar que  a  maior  tragédia  deste período de transição social não foram as palavras e atos  violentos  de gente ruim, mas o silêncio e a indiferença de gente boa. Nossa geração terá que se arrepender, não só das palavras e atos dos filhos das trevas mas também dos receios e apatias dos filhos  da  luz". Uma paráfrase disto é: “Deus vai julgar não apenas a maldade dos homens maus, mas o silêncio dos bons”.

Ester entende que lutar por direitos, pode por em risco sua integridade física, mas quando percebe seu lugar, não mais se omite. Por isto toma uma posição corajosa: decide procurar o rei e interceder pelo seu povo.
Vários fatores representavam riscos:
Ela não havia sido chamado pelo rei para comparecer diante dele por trinta dias, e ir sem ser chamada poderia ser perigoso; ele não conhecia sua história, e quem era seu povo.
Por ter sido uma menina criada naquela cultura, ela se vestia como qualquer outra jovem, não tinha sotaques de outra língua, e assimilara perfeitamente a cultura dos Medos e Persas, por isto o rei não fazia ideia do que ela já havia vivido, seu abandono e sofrimento. Mas ainda assim, ela vai, ousadamente.

Para fazer isto ela toma algumas decisões:
  1.  “Ela pede para que as pessoas orem – Vai, ajunta a todos os judeus que se acharem em Susã, e jejuai por mim, e não comais nem bebais por três dias, nem de dia nem de noite” (Et 4.16). Decisões radicais exigem atitudes radicais. Não é possível ação efetiva sem posicionamento firme diante de Deus.
Talvez seja isto que precisemos neste momento da nação. Nenhuma decisão será eficaz sem engajamento comunitário.

Não temos orado como povo, intencionalmente, pela situação de nosso país. “muito pode, por sua súplica, a oração do justo”.

  1. Ela ora – “Vai... jejuai por mim... e eu e as minhas servas também assim jejuaremos” (Et 4.16). Não apenas os outros deveriam orar, mas ela também deveria se comprometer.
Creio que oramos tão pouco, por crermos muito pouco no poder da oração.
Temos dificuldade de crer que, de fato, Deus “galardoa aqueles que o buscam”. Somos incrédulos quando o assunto é oração.

Conclusão:

Três dias de jejum, mudaram a história já tida por certa. Apenas três dias de intensa oração. Se crêssemos que Deus poderia nos dar alguma coisa se nos consagrássemos à oração, será que não nos disporíamos e sacrificiariamos por isto?

Quais foram os efeitos da oração? A sorte do povo judeu mudou.
A Bíblia mostra que os judeus, de vítima, tornam-se executores. “Porque Hamã, filho de Hamedata, o agagita, inimigo de todos os judeus, tinha intentado destruir os judeus, e tinha lançado Pur, isto é, a sorte, para os assolar e destruir. Mas, vindo isto perante o rei, mandou ele por cartas que o mau intento que Hamã formara contra os judeus, se tornasse sobre a sua cabeça; pelo que penduraram a ele e a seus filhos numa forca. Por isso àqueles dias chamam Purim, do nome Pur; assim também por causa de todas as palavras daquela carta, e do que viram sobre isso, e do que lhes tinha sucedido” (Et 9.24-26).

Deus muda os rumos históricos quando seu povo ora. Compare Et 8.5 com Et 9.22-24. Como o cenário muda, de uma hora para outra, quando o povo de Deus clama ao Senhor. De "Pur", cujo significado é “sorte”(Et 9.24), para "purim", libertação (Et 9.32).

"Quando oramos movemos os céus, o inferno treme, e alguma coisa acontece na terra" (Jeremias Silva).

A oração de Ester e do povo teve um efeito poderoso no rei, que tendo insônia, pede para que leiam uma das crônicas sobre sua vida. Sua insônia gerou nostalgia, e quando leem o texto, cai exatamente sobre o livramento que teve o rei pela intervenção direta de Mordecai. Como é tremenda a providência de Deus: A insônia, a página em que é aberto o livro diário do rei, o seu desejo de homenagear Mordecai. Isto tudo se deu depois da oração do povo. Deus estava agindo poderosamente.

A obra de Cristo
Deus transforma Ester numa missionária do cotidiano.
Assim Deus deseja fazer conosco.
O lugar onde ele nos coloca, a função e o cargo que ele nos dá, as atividades profissionais que exercemos, as orações que fazemos. Deus quer nos usar para sua glória. Ele nos coloca em posições para nos usar no seu reino. Deus está escrevendo sua história, e decidiu fazer isto, usando seus instrumentos.
Você sabe o que Deus deseja que você faça, na função que você exerce? Por que você está vivendo em sua cidade (e não em outra), fazendo o que você faz (e não outra coisa)? A pergunta que Mordecai, em certa medida, se aplica a todos nós: “Quem sabe se para tal conjuntura como esta, foste elevada à rainha?”. Estamos neste lugar, porque Deus quer que estejamos aqui para sermos seus instrumentos.
Somos, portanto, missionários do cotidiano.

Mas o maior projeto de Deus na história se daria na cruz.
Ali, naquele lugar de condenação e morte, seu Filho Jesus foi entregue à morte. As trevas aparentemente foram vitoriosas. Jesus é humilhado e morre.
Aquele mesmo Jesus, a quem Deus o inseriu na história, agora parece fracassar ao ser levantado numa tosca cruz. Vitória das trevas, vitória de Satanás. Os poderes históricos aliados ao diabo.

O que aconteceu, porém, foi extraordinário:
Naquela cruz, Deus mudou nosso status de condenado, para justificado. De escravo para livre, de sentenciado a resgatado. Ali na cruz, a nossa sorte que estava lançada, com o veredicto da condenação, o nosso pur, se transforma em purim. Ali na cruz, Deus decretou nossa redenção, não mais condenados à execução e à morte eterna, mas libertados para seus propósitos e para sermos filhos amados. 

A cruz revela, mais uma vez, que Deus tem o controle da história. Que os estratagemas do inferno não são eficientes para decretar os rumos de nossa vida. A cruz, lugar de maldição, torna-se, lugar de resgate.

Em Cristo, nossa sorte foi mudada. “Quando ele subiu às alturas, levou cativo o cativeiro e concedeu dons aos homens” (Ef 4.8). Não mais cativos, mas livres. Não mais escravos, mas reis; não mais condenados, mas libertos; não mais pur, mas purim.

Aleluia!!!

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