segunda-feira, 10 de maio de 2021

Plantação de Igrejas: Formação e estruturação do Grupo Base



 

Introdução

 

Um dos grandes desafios quando se pretende plantar igrejas é a formação de um grupo de apoio inicial, aquelas pessoas com as quais poderemos contar no projeto que ora iniciamos. Nem sempre é fácil formar este grupo, e muitas vezes é desafiador este processo. Identificar, atrair, envolver, encorajar, apoiar, inspirar, são tarefas fundamentais para o plantador de igrejas. Sem estes elementos as pessoas não estarão dispostas a se envolver numa tarefa tão desafiadora.

 

Além de estar treinado, equipado e mentoreado, o plantador de igrejas precisa formar uma equipe, e não apenas isto, mas encorajá-la a tal ponto que ela não disperse nos embates e desafios iniciais. Esta equipe será fundamental já que ninguém consegue a tarefa de plantar uma igreja sem encontrar pessoas que o apoiem. Então, a primeira tarefa, certamente será de reunir pessoas em torno de uma ideia e equipá-los para a tarefa.

 

O ministério de Cristo com o seu grande desafio de implantar reino de Deus, nunca foi feito de forma solitária. Ele investiu em alguns homens a quem ele mesmo escolheu e os capacitou para continuarem a obra. Deu-lhes orientação, treinamento, autoridade e poder para realizarem a desafiadora obra. Jesus, ele formou uma base, a quem delegou a tarefa de continuar a sua obra. O ministério de Cristo não foi solitário assim como não deve ser a tarefa de pastorear.

 

Quando Barnabé e Saulo saíram para a primeira viagem missionária, eles formaram uma equipe base. Nunca veremos na Bíblia um ministério sendo desenvolvido de forma solitária, e uma das primeiras preocupações no projeto de plantação de igrejas era o estabelecimento de uma liderança local. Veja a recomendação de Paulo a Tito:  “Por esta causa te deixei em creta, para que pusesses em ordem as coisas restantes” (Tt 1.4) O plantador de igrejas, fazendo um ministério sem mobilizar pessoas em torno da visão, não tem a mínima condição de alcançar seu objetivo. Ele precisa de uma equipe, porque uma igreja requer trabalho de equipe.

 

Ele precisa providenciar pessoas que orem a favor de seu projeto, mas precisa ainda identificar pessoas que acreditem e se envolvem no projeto, pessoas que sentem o desejo de participar da

plantação de uma nova igreja. Ele precisará de pessoas ajudando no louvor, discipulado, recepção, cuidado com as crianças, e outras necessidades que forem surgindo, como ministérios específicos, grupo evangelístico, etc.

 

 

O que é um grupo base?

Um grupo base é aquela equipe inicial que decide apoiar o plantador de igreja. Eventualmente alguns pessoas se dispõem para cooperar por determinado tempo, o que não é uma situação ideal, mas ao mesmo tempo, pode ser a condição com a qual o plantador de igrejas poderá plantar, mas o importante mesmo são aquelas pessoas que vestem sua camisa, e estarão dispostas a pagar o preço por aquele projeto. Tais pessoas serão incansáveis no seu investimento, seja ele em termos de talento, tempo, e recursos financeiros. 

 

Como formar um grupo base?

 

Existem várias situações possíveis.

 

1.     Trabalhar com o grupo pré-existente – Boa parte dos modelos que temos hoje de plantação de igrejas, parte deste ponto de vista. O presbitério (ou a convenção), designa um obreiro que vai para o campo, onde já existe um grupo se reunindo.

 

A vantagem deste modelo é que o plantador de igrejas não precisa começar o projeto sem ter uma base. Já existe um número de pessoas se reunindo naquele lugar, motivadas a alcançar o alvo. Isto traz alguns benefícios. mas isto pode trazer complicações.

 

Quando o pastor se junta àquele grupo, já existe uma liderança formada, e eventualmente tal liderança pode se sentir enciumada ou não concordar com o modelo de ação que tentam construir. Eventualmente pode haver até competição pela liderança porque, todo grupo já tem um determinado líder, e nem sempre ele está disposto a abrir mão de sua primazia, com a chegada de um novo obreiro. Em alguns casos mais graves, pode haver rupturas graves. Nos Estados Unidos há uma estatística que afirma que 80% de um grupo se dispersa, no período de dois anos, com a chegada do pastor.

 

O pastor designado precisa se encaixar, ou cair na simpatia da comunidade, o que nem sempre acontece. Muitas vezes a química, os métodos, a forma de pregar, não se identifica com o grupo já existente.

 

No meu primeiro pastorado foi designado pelo presbitério de Anápolis, para pastorear a igreja de Formoso-GO, que tinha uma congregação em Minacú e um ponto de pregação em Palmeirópolis. Ao me apresentar em Minacú, foi acolhido por uma família de um homem muito simples, íntegro e severo na forma de avaliar a igreja. Eu era um pastor ordenado com apenas 21 anos de idade. Meu pai, que era um presbítero de Gurupí-TO, estava me acompanhando neste primeiro encontro.

 

Na apresentação à igreja, aquele homem foi direto, curto e grosso: “Pastorzinho, o senhor está chegando aqui agora, mas queremos informar que o senhor veio aqui para trabalhar. Há muita coisa a ser feita, e esperamos que o Senhor possa corresponder às necessidades da igreja”. Eu pesava menos de 60kgs, e ainda era muito jovem. O recado estava claro: “O senhor precisa provar que realmente tem competência para esta tarefa”. Eu passei a me hospedar na casa deste homem quando ia pregar naquela igreja. Sua esposa fazia uma deliciosa carne de panela, e era uma companheira inestimável na obra da evangelização. Aos poucos fui conquistando a confiança e aceito no grupo. No final do ano, aquela igreja se emancipou e foi organizada. Este é um bom exemplo do que podemos esperar quando nos aproximamos de um grupo já existente.

 

2.     Iniciar um trabalho sem grupo pré-existente

 

Muitos pastores são enviados para determinados campos onde não há nenhum crente, com a tarefa de plantar uma igreja. É um trabalho missionário, na sua definição mais simples.

 

Ao chegar àquele lugar, ele precisa fazer amizades, contatar as pessoas, se envolver com determinadas ações que o tornem conhecido, na esperança de que o coração de alguns deles sejam alcançados pela graça. Boa parte dos pastores enfrentam muitas dificuldades com isto porque possuem um histórico de pessoas igrejadas demais, e alguns não possuem treinamento nem os dons necessários para a tarefa de evangelizar e gerar filhos na fé. O resultado pode ser angustiante.

 

Ao mesmo tempo, pode ser desafiador, se o plantador de igrejas possui uma linguagem apropriada e sabe se aproximar do não crente, criar networks e comunica de forma eficiente a salvação por meio de Cristo. a vantagem neste processo é que, as pessoas que se envolverem com este ministério, terão uma profunda identificação com o plantador de igreja, se não houvesse isto, certamente não se aproximariam deste pequeno grupo. É necessário que a pessoa se identifique, confie, e se relacione com o grupo e com a família pastoral de forma direta.

 

Os pontos de contato podem ser através de atividades esportivas, lazer, hobbie, inserção cultural, amizade da esposa e filhos. Muitas vezes o pastor possui um veio artístico que o identifica com outras pessoas, como música ou arte, outras vezes ele é um professor, ou tem habilidades esportivas que possam estabelecer a ponte entre as pessoas e a igreja.

 

Quando o plantador de igrejas inicia, ele mesmo, um determinado grupo base, ele tem a vantagem de atrair pessoas que já se identificam com ele. Há um princípio em plantação de igrejas que diz: “você não atrai as pessoas que você quer, você atrai as pessoas que se parecem contigo”. Por esta razão, a igreja se parece com o seu pastor, se ele plantou a igreja ou se se encontra ali por muito tempo. Nós só conseguimos atrair as pessoas que aceitam nossa liderança e reconhecem o nosso ministério.

 

Nos Estados Unidos, plantando igrejas na região de Newark, comecei a receber a visita de um casal que eu queria muito que somasse ao nosso ministério. Eles eram simpáticos, e achei que eles poderiam ser uma benção no nosso meio, eles estavam fora de igreja, tinham sofrido decepção com o antigo pastor, e todos os domingos, após o culto, sorridente, sua esposa me dizia que estava me “avaliando”. Inicialmente pensei que fosse uma brincadeira, mas posteriormente descobri que isto era verdade. Na avaliação deles eu não passei no teste, e eles então, que nunca criaram vínculos reais com a comunidade, passou a vir cada vez mais esporadicamente, até que finalmente deixou de participar de nossa comunidade. Não houve empatia suficiente para que eles permanecessem na igreja.

 

A desvantagem de iniciar um projeto sem um grupo existente é que isto exige uma quantidade imensa de dons e esforço da família do plantador de igrejas. É necessário criar relacionamentos, considerar que o projeto levará um tempo bem maior, porque está começando do zero. E se for um projeto numa cultura diferente, então podemos considerar um tempo ainda maior. Mesmo no Brasil, encontramos regiões que apresentam peculiaridades e distinções enorme de outras. Imagine um gaúcho num relacionamento com o Nordeste?

 

3.     Grupo que já apoia o projeto

 

Neste terceiro grupo temos a benção de vermos uma igreja nascendo com um grupo já identificado com o plantador. Eles participaram da visão e muitas vezes construíram a visão juntos. Em alguns casos já eram amigos, ou discípulos, ou ovelhas, e decidiram sair para formar uma nova comunidade. Este é o cenário ideal.

 

As vantagens neste caso são imensas. O grupo já nasce com uma profunda identificação com o obreiro. Por esta razão, não há suspeição, não é necessário ganhar a confiança pois ela já foi conquistada, e as pessoas que se envolvem estão realmente dispostas  a caminhar juntas.

 

O desafio inicial é clarificar o projeto com tais pessoas. Muitos estão juntos mas ainda não entenderam a grandeza do projeto nem os custos envolvidos. Eles precisam entender que plantar igrejas não é uma tarefa social, nem será realizado a curto prazo, e que não é um pic-nic. Então, a tarefa fundamental aqui do plantador é escrever o projeto, dar uma cópia dos alvos, propósitos, motivos, a cada um, e desafiá-los a um envolvimento mais profundo.

 

Já vi várias igrejas surgindo assim e considero este o modelo ideal e mais fácil de ser atingido. Uma coisa é você estar liderando um grupo sem envolvimento, outro é trabalhar com pessoas com a qual você já tem identificação. Mas elas precisam entender os desafios e compromissos que terão que assumir. Quando este grupo sai de uma igreja grande, é possível que algumas pessoas ninguém tiveram compromisso, nem liderança, ou quem sabe, nem mesmo contribuíam financeiramente com a igreja mãe, mas agora, num pequeno grupo, elas serão observadas e exigidas quanto a estes pontos. O que acontecerá quando entenderem o nível do compromisso? Continuarão firmes ou se afastarão?

 

É necessário levar as pessoas a assumirem o projeto. Elas terão tarefas, não serão mais servidas na igreja, mas estarão no front para servir e receber outros. Precisarão ainda contribuir. Um princípio simples: Se a pessoa não está envolvida ainda com seus recursos financeiros, você pode estar certo de que ela não vestiu a camisa da equipe. Ela ainda é uma expectadora, não agente.

 

Há um classe exemplo sobre os diferentes níveis de compromisso. Para isto, ilustra-se com a participação da galinha e do porco no café da manhã. Quem está mais envolvido: aquela que dá o ovo ou aquele que entra com o bacon? O porco, certamente possui um compromisso total, sacrificial, porque ele precisa dar sua vida. Os comprometidos, compram os problemas e ajudam a resolvê-los. Comprometer-se é assumir responsabilidade. O envolvido toma espaço,  o comprometido constrói seu espaço.

 

Embora a fábula tenha suas limitações, existem momentos em que as galinhas são necessárias, mas precisamos saber se elas estão comprometidas.

 

O que fazer depois do estabelecimento do grupo base?

 

Alguns pontos podem ser importantes para o bom andamento deste grupo:

 

A.   Tenha um projeto escrito.

 

Escreva uma filosofia de ministério. Fale dos motivos bíblicos e práticos do projeto. Descreva tanto quanto possível, sem ser exaustivo, a dinâmica do trabalho, as estratégias, as bases teológicas e litúrgicas. A pessoa que adere ao projeto precisa saber o que ela pode esperar, e ao mesmo tempo, isto permite que você possa trazer o grupo de volta, para a ideia inicial, se algum deles quiser seguir uma direção diferente ou discordante.

 

B.    Assinar o projeto?

 

Alguns experts, recomendam inclusive que as pessoas assumam um termo de compromisso, assinando que concordam e desejam participar deste projeto. Não sei se na nossa cultura isto seria facilmente compreensível. Em outras culturas, como a americana, isto faz enorme sentido.

 

C.    Dê tarefas

 

O Pr. José Pereira, de Brasília, gostava de afirmar que “igreja grande e covil de malandro”. Se você está com uma pequena comunidade, a pessoa não poderá se “esconder”, pois um grupo assim, precisa do esforço e participação de todos. Tarefas demonstram o vinculo, e servem para avaliar o nível de compromisso.

 

Quando plantava igrejas no EUA, tínhamos uma salão onde podíamos nos reunir mas precisávamos montar e desmontar o som, em todos os cultos, colocar as cadeiras no lugar, preparar o espaço para o culto público. Para isto fizemos uma pequena escala, mas havia pessoas que sempre atrasavam e comprometiam o encontro. Um determinado dia, decidimos que não sairíamos desesperados para corrigir a negligência de alguém. Obviamente isto gerou um caos, porque num domingo não pudemos usar os instrumentos e o som, tivemos que tocar apenas um violão, as pessoas responsáveis quiseram montar em cima da hora mas não dava tempo. Isto gerou uma reação neles e nas outras pessoas, e dai para a frente as coisas foram corrigidas.

 

Tarefas empoderam e demonstram compromisso. Portanto, evidencia dois resultados positivos imediatos.

 

D.   Avalie as contribuições

 

O princípio é: “Quem ama se compromete”. Afinal, “dinheiro é uma questão espiritual”, como revela Richard Foster. Por isto, “o bolso é o último a se converter e o primeiro a esfriar”(Bispo Paulo Aires). Dinheiro revela o coração. Mostra se realmente podemos contar com determinadas pessoas, afinal “Onde estiver teu tesouro, ai estará o seu coração”.

 

E.    Avalie sugestões

 

Para empoderar o grupo é fundamental que as ideias sejam valorizadas e avaliadas. Isto não significa que serão sempre aceitas, mas elas demonstram respeito pela pessoa que deseja contribuir.

 

Eu tenho adotado um princípio que tem me ajudado muito: “quem tem a visão tem o dom”. Normalmente quando a pessoa traz uma ideia, e que eventualmente é interessante, eu delego a tarefa para ela mesma, afinal, ninguém poderá fazer melhor do que ela, que teve a visão. Isto normalmente leva a pessoa a considerar se ela realmente acha interessante o projeto ou se está querendo dar tarefas às demais pessoas, sem assumir diretamente. Em muitos casos, o projeto morre ai, porque a pessoa que trouxe a ideia não quer ter o compromisso de assumir.

 

F.     A necessidade de sair de um grupo informal para uma liderança compartilhada

 

Quando estamos ainda em um pequeno grupo, reunindo sem maiores formalidades, as pessoas não possuem compromissos. Elas desfrutam da comunhão, da simpatia e alegria do grupo, mas isto não quer dizer que quando um projeto maior for desafiado, que poderemos contar com elas.

 

Isto se torna perceptível quando saímos de um pequeno grupo familiar, para construir um projeto de plantação de igrejas, é natural que algumas pessoas se afastem do grupo, não porque necessariamente descreem da igreja, mas porque elas serão exigidas em outro nível de compromisso.

 

Este é, eventualmente, um momento muito sensível para o grupo, acostumado a se reunir sem maiores alvos e sem nenhum objetivo maior a não ser desfrutar da comunhão daquele pequeno grupo caseiro, e da atenção particular que pode receber do pastor (particular) daquele grupo. Na hora em que são desafiados, nem sempre estarão dispostos a um envolvimento mais significativo, de serviço, generosidade e doação.

 

G.   Desenvolva liderança baseada não em cargos, mas nos dons espirituais.

 

Este é um aspecto importante a ser considerado. Muitas vezes damos “ofícios”, sem que as pessoas tenham “dons”. Ofício pode se transformar numa espécie de cargo, com uma postura meramente institucional, e nem sempre identificada com as características necessárias para a função.

 

Hoje é possível encontrar na internet, muitos modelos para avaliar os dons dos membros da igreja, talvez isto possa se transformar numa excelente ferramentas para que possamos colocar “pessoas certas nos lugares certos”. Na Bíblia vemos que os diáconos surgiram por causa da necessidade da igreja (Atos 6). A Igreja Primitiva foi sensível em analisar a realidade de sua comunidade e mudar a estrutura com os dons específicos para a função. O mesmo princípio deve ser adotado ainda hoje em nossas comunidades.

 

H.   Um teste para aferir o compromisso.

 

Três aspectos devem ser considerados quando estamos recebendo pessoas em nosso grupo e transmitindo a visão:

 

TEMPO

A pessoa está disposta a investir seu tempo?

Ela se sacrifica pelos projetos?

As atividades da igreja se tornam realmente importantes para sua vida?

 

TALENTO

As pessoas estão colocando seu expertise a serviço do reino?

Qual o efeito de uma comunidade quando os dons são exercidos adequadamente?

Uma das grandes bençãos de uma comunidade é ter “pessoas certas nos lugares certos”.

 

TESOURO

Toda pessoa que estiver realmente pronta para o serviço, terá disposição de investir seus recursos. Afinal, “dinheiro segue visão”.

A falta de generosidade revela, não apenas um distanciamento da pessoa, mas uma falta de compreensão da mordomia cristã e de uma compreensão bíblica de finança.

Ensina os membros do grupo a serem comprometidos financeiramente desde o nascimento da igreja. Isto forma o DNA da igreja, e a seguirá para sempre. Igrejas generosas aprenderam isto no momento em que estavam sendo plantadas.

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