sábado, 31 de julho de 2021

Ap 5.1-14 Jesus, a Hermenêutica da História



 

Introdução

 

Freqüentemente ouvimos pessoas dizendo: “Aonde é que este mundo vai parar?” Este questionamento reflete a perplexidade de algumas pessoas diante de certos acontecimentos ou situações. Muitas coisas nos deixam perplexos: Bioenergia, clonagem, internet, rede mundial de computadores, viagens espaciais, teorias conspiratórias, pandemia, ideologia do gênero, pesquisas na área de medicina com incríveis avanços, o avanço interminável da ciência e da tecnologia, as aberrações morais dos casamentos homossexuais, milhões de abortos praticados anualmente, a violência sexual e da guerra, seitas cada vez mais exóticas e estranhas.

 

Diante de tudo isto, a tendência nossa é do catastrofismo, ficarmos imaginando um mundo cada vez mais caótico e desgovernado. É preciso ter calma, mais ainda, é preciso entender que a história não segue uma tendência caótica, Deus não perdeu o rumo da história e o livro de Apocalipse, em especial nos ensina sobre isto. Cremos num Deus que é soberano sobre tudo e que dirige a história. Nada de histeria ou fanatismo. A visão deste capítulo reflete exatamente isto e serve de consolo, conforto e esperança para o povo de Deus.

 

Recordando alguns princípios de interpretação do Apocalipse

 

O livro de Apocalipse é uma revelação feita pelo próprio Senhor Jesus a João, na Ilha de Patmos. Cristo está revelando a Igreja o plano de Deus para a história. A mensagem básica de Apocalipse é esta: Deus governa a história e trará sua consumação em Cristo. O coração da mensagem de Apocalipse pode ser encontrado nos capítulos 4 e 5.

 

No cap. 4, como vimos, João tem a visão de Deus sentando em seu trono. Aqui vemos Deus como Rei do Universo, ele não é um monarca local, mas o Soberano Senhor de todos os impérios e governos. Por sua autoridade, vontade e palavra, foram criados o universo, muitos anos atrás. (Ap 4.11), e sua vontade é que agora, todo o universo se junte para glorificar o Cordeiro de Deus e este dia está chegando! (Ap 5.11-14)

 

É do trono que a história terá seu desfecho final e será completamente entendida, naquele dia cantaremos:

Aleluia! Pois reina Senhor, alegremo-nos e exultemos, pois são chegadas as núpcias do Cordeiro, cuja esposa a si mesma se ataviou” (Ap 19.6-7).

 

Este livro revela como Deus controla a história, quão poderoso ele é e o que o futuro poderá nos trazer. Em Apocalipse vemos revelado o fato que as promessas de Deus são verdadeiras e fiéis e que seu poder é invencível. A partir do capítulo 4 já podemos glorificar o nome do Senhor e dizer: Santo, Santo, Santo é o Senhor todo Poderoso. Aquele que era, que é. E que há de vir.” (Ap 4.8) Será que já somos capazes de perceber quão tremendo e desafiador é o livro de Apocalipse?

 

Nos primeiros versículos deste livro Deus mostra aos seus servos “as coisas que em breve devem acontecer”. (Ap 1.1) As coisas vão acontecer, porque Deus é Senhor da história e consumará seus desígnios e propósitos para que sua palavra se cumpra. Em Ap 1.4 Deus afirma que ele é o “que era, que é, e que há de vir.” Deus é! Ele é auto sustentado e todo suficiente. Deus era e tem sido desde a eternidade. Ele é o criador e dono de todas as coisas. O futuro que virá já está definido por Deus. Jesus voltará! E não há força que possa deter sua vinda. Deus vai se manifestar e executar o curso da história como ele deseja.

 

O livro de apocalipse é um livro centralizado em Deus. É um livro escrito para provocar nossa imaginação. Neste livro vemos algumas figuras indeléveis da verdade que nós precisamos trazer para o nosso coração: Deus é o Rei, Ele governa! Ele faz tudo quanto lhe apraz. Ninguém pode voltar e dizer, o que você tem feito? (Dn 4.35)  De sua bondade, autoridade e poder é que surgem todas as bênçãos. (Ap 22.1; 4.2). O clímax da história se dará quando “O reino deste mundo torna-se o reino do Senhor e do seu Cristo.” (Ap 11.15) Todos os inimigos serão postos debaixo de seus pés, porque Jesus é o rei dos Reis e Senhor dos senhores. (Ap 19.16; 1 Co 15.24-25)

 

O mistério do livro.

O capítulo 5 nos fala de um livro, este livro está na mão direita do Pai e representa o plano eterno de Deus. Este livro simboliza o propósito de Deus para todo universo e a toda as sus criaturas. Relaciona-se com o plano de intervenção de Deus na história humana, revelado nos capítulos subseqüentes à abertura dos setes selos. Este livro é “livro da história do homem”.[1]

 

É importante entender que este livro não é a Bíblia. Trata-se de um manuscrito, de algo muito maior que nosso livro sagrado. Este livro é a própria interpretação da história e da humanidade. Deus tem este livro na mão. A história dos homens é a história de Deus. Jesus está no centro de tudo isto. A redenção, consumada na cruz, é o centro de todo sentido da humanidade. Na cruz se revela o significado maior de Deus para a humanidade.

 

Ellul acrescenta:

É o livro dos segredos e do sentido da história humana, simultaneamente acabado, certificado, mas incompreensível, ilegível, que, por outro lado, se revela como uma sucessão de tempo que na verdade deve realizar-se continuamente. Este livro contém, portanto, o segredo da história dos homens, da humanidade, mas este segredo é forçosamente a revelação das forças profundas da história e mais ainda da ação de Deus na história dos homens”.[2]

 

Por isso se fala do trono, (o lugar onde Deus reina e pronuncia a sua decisão), e somente o Cordeiro imolado pode abri-lo, porque sendo perfeitamente obediente, realizou a vontade do Pai. Todo julgamento recai sobre Jesus. Só o Cordeiro pode abrir o sentido da história. O sentido da história não é fruto de casualidade, de acasos, de automatismos, mas fruto da soberania de Deus e um certo número de forças abstratas que serão reveladas na abertura do selo destes livros.

 

Há sete selos, mas apenas seis dão os componentes da História; o sétimo desemboca nas trombetas. Os seis primeiros selos nos fornecem o sentido e a matéria profunda da história; o sétimo, o segredo último. Este texto descreve alguns detalhes que são profundamente significativos em seu simbolismo, eis alguns deles:

 

(i)             O Livro está nas mãos de Deus

 

Isto diz respeito à sua ação. Deus ele é o que “está assentado no Trono”. Refere-se a sua soberania. Quem planeja, escreve e executa o plano da história é Deus. A correta teologia da história pode resgatar em nós a integralidade da mensagem que pregamos. O Livro da história não está nas mãos de qualquer outro ser, seja ele espiritual ou histórico. Deus não transfere sua glória e não negocia sua soberania. Ele não apenas controla a história, mas acima de tudo faz a história, é dono da história. Todos os eventos procedem de sua escolha autônoma. O livro que descreve o plano eterno e final de todas as coisas está nas suas mãos, porque foi escrito por ele.

 

A história da humanidade, individual e coletiva está nas mãos de Deus. Ele tem o controle integral, domina sobre o universo, família, nações, igreja. Nunca perde o controle. Se cremos nisto ele reina, se não cremos ele reina da mesma forma.

 

Na década de 1950, uma frágil inglesa, Ruth Stam teve um forte chamado de pregar aos tibetanos. Apresentou-se ao Conselho missionário da sua denominação e foi recusada três vezes por ser fisicamente frágil e intelectualmente despreparada para entrar neste pais fechado. Ela queria ir para o Tibet, mas a China se fechou e expulsou todos os missionários de lá.

 

Ela então foi enviada para Missuini, que fica na divisa da Índia com o Tibet, para abrir uma escola de inglês e assim testemunhar Jesus aos nativos. Uma guerra civil expulsa 500 famílias tibetanas que se mudam às pressas para a índia. O governo resolve mandar estas famílias para Missuini, pedindo a missionária que desse aulas de inglês para estas pessoas, e colocaram-na para cuidar de um palácio abandonado que existia na cidade. Tudo isto pago pela China. Ela jamais foi ao Tibet, mas Deus trouxe o Tibet a ela. E desta forma ela pode evangelizar centenas de tibetanos.

 

(ii)           O Livro está escrito por dentro e por fora!

 

É completo e acabado, não se pode acrescentar nada ao seu conteúdo. Ao mesmo também revela, porém, que existe uma leitura que precisa ser feita. O sentido do livro está oculto e é necessário abrir o livro, selado com sete selos. Por outro lado, demonstra que se foi escrito é necessário que alguém o leia. Portanto, não é um ato de Deus para si mesmo, nem um segredo que Deus quer guardar, pelo contrário, é uma revelação.

 

(iii)          Este livro está selado

 

Demostra o plano não revelado e cumprido por Deus. Selo significa um fechamento radical, não pode ser invadido nem violado. Se os selos continuam fechados, os propósitos de Deus não serão conhecidos nem realizados. Abrir o rolo e desatar-lhe os selos significa não somente revelar o plano de Deus, mas realizá-lo. Por isso, um forte anjo clama: “Quem é digno de abrir o livro de desatar os selos?” (Ap 5.2)

 

Que livro é este?

 

Talvez esta questão já precisasse ter sido respondido anteriormente. Qual é o seu conteúdo, de que se trata? Quem poderá abrir e desatar o selo? Quem pode consumar a obra que é necessária? O Livro tem muitas coisas escritas, mas encontra-se selado. Não está acessível ao público. É escrito, mas não é aberto. Ninguém, em todo o universo, nem no céu, nem na terra, nem debaixo da terra podia abrir o rolo e ver o seu conteúdo. O livro tem códigos e tem chaves, é selado. Por causa disto João chora, e chora muito. Ele percebe a crise que o anjo suscita sobre esta paradoxal idéia de um livro escrito, mas que não pode ser lido porque não existe quem o possa abrir.

 

Por que João chora tanto?

 

Você entenderá o significado destas lágrimas se entender que abrir este rolo significa o cumprimento do plano divino para a história. Quando se abre este rolo e são desatados os selos, compreendemos que o universo é governado a favor do Reino de Deus e da sua igreja, pois é o glorioso propósito de Deus que está se realizando, seu plano está sendo executado.

 

O livro está nas mãos daquele que está assentado no trono, do rei. Nenhuma outra pessoa tem acesso a ele. Só uma pessoa tem pleno conhecimento do que nele está contido: o rei!

 

Quem é digno?

 

Existe uma crise no céu: quem pode abrir o livro? (Ap 5.2-5). O livro é fechado. História sem solução. Problema sem solução. Ninguém é digno (não fala de força, mas de dignidade).

Os poderosos não podem, seja este poder político ou financeiro.

Os grandes líderes religiosos não podem.

Os sistemas econômicos não podem.

Os intelectuais, sábios e mágicos, não podem.

 

João chora porque ninguém pode abrir desatar os selos.

 

O choro de João reflete a triste situação das comunidades cristãs perseguidas e não tendo aparentemente ninguém para protegê-las. Hoje também somos tentados a pensar que Deus não controla mais a história. Não temos a mesma perseguição daqueles dias, mas temos tantos outros fatores que nos levam a pensar que a história está sem rumo.

 

O livro de apocalipse mostra o contrário de tal pensamento fatalista.

Jesus recebe o livro da mão de Deus (Ap 5.7). Ele é o Senhor da História (Ap 5.13), “é ele quem vai assumir o controle dos acontecimentos e executar o plano de Deus.”[3] Os acontecimentos do mundo se desenrolam sob a absoluta soberania do Senhor dos senhores. “O pessimismo cristão é historicamente infundado e também, teologicamente absurdo”.[4]

 

Um ancião começa a falar (Ap 5.5), não é um forte e poderoso anjo que fala, mas um ancião, alguém que experimentou em sua vida os efeitos da redenção. Ele começa a falar a João sobre a maravilhosa mensagem da redenção. “Não chores; eis que o Leao da tribo de Judá, a Raiz de Davi, venceu para abrir o livro e os seus sete selos”.

 

Aqui vemos um paradoxo não muito raro em Apocalipse, a combinação de símbolos, inclusive opostos entre si como leão e cordeiro. Aquele que abre o livro é ao mesmo tempo um leão, forte, corajoso, destemido, e um cordeiro, frágil, indefeso. Figuras opostas. Este cordeiro tem sete chifres (símbolo de autoridade, força e poder). Os sete chifres representam a plenitude do poder de Cristo. E sete olhos (símbolo de absoluta compreensão de tudo, nada foge ao seu olhar, tudo está sob seu controle (Zc 4.10).

 

Ray Summers afirma:

“O Cordeiro tem sete chifres, o número perfeito. Está ele, portanto, perfeitamente aparelhado para destruir a oposição que fazem ao seu Reino. Tem sete olhos (…) isto, sem dúvida, representa a vigilância incessante e perfeita a favor de seu povo”.[5]

 

Na cruz, Jesus venceu o pecado, a morte e Satanás. É importante notar os nomes dados a Cristo: “O Leão da tribo de Judá”, uma referência clara a Gn 49.9,10. Venceu o diabo e conquistou o direito de governar o universo de acordo com o plano de Deus. Mas quem abre o livro é o Cordeiro que pela sua autoridade pode ter acesso ao livro que se encontra na mão direita do rei. (Ap 5.5)

 

Neste texto encontramos um paradoxo interessante. O ancião aponta para o leão. “O Leão da tribo de Judá, a Raiz de Davi, venceu para abrir o livro e os seus sete selos” Leão é símbolo de autoridade, força e poder. O Ancião aponta para a realeza, para a majestade do Leão. Esta é a visão da igreja glorifica, esta é a percepção dos céus acerca de Jesus, Mas o que João vê? “Então, vi, no meio do trono e dos quatro seres viventes, e entre os anciãos, de pé, um Cordeiro, como tendo sido morto” (Ap 5.6). João não vê um leão, mas o Cordeiro. Esta é a visão da igreja. Nosso olhar precisa estar na compreensão do sacrifício e da obra de Cristo.

 

Este texto demonstra que Deus executará seus planos por meio da cruz. Deus governa a história e trará sua culminação em Cristo. O Livro de Apocalipse é como uma sinfonia visual acerca do sábio julgamento de Deus e suas recompensas.

 

Apocalipse: um livro de louvor.

 

Canta-se muito em Apocalipse.

 

O livro traz a letra de vários hinos e aclamações. O vs. 7 registra o momento em que o Cordeiro  toma o livro e quando isto acontece, vs. 8 surge uma grande celebração e exaltação ao Cordeiro.

 

Existem aqui três hinos, vindos de diferentes adoradores:

 

Primeiro hino: Ap 5.9,10 

Entoado pelos quatros seres viventes com os 24 anciãos. É a igreja do Antigo e Novo Testamento. 12 tribos, 12 apóstolos. E se dirige ao Cordeiro aclamando sua dignidade para receber o livro e abrir o selo.

 

Segundo hino: Ap 5.11,12  Proclamado em grande voz por “milhões de anjos”. Reconhece ser o Cordeiro digno de todos os atributos possíveis. São 7 atributos (7 é número de totalidade e perfeição): Poder, riqueza, sabedoria, força, honra, glória e louvor. Os grandes senhores daquele tempo exigiam para si todas estas coisas. O coral afirma que só o Cordeiro merece isso.

 

Digno é o Cordeiro de receber. Quem vai dar estas virtudes ao Cordeiro? Ronaldo Lidório observa que se lermos atentamente veremos que três virtudes são teocráticas:

 

Poder

Honra

Glória.

 

Estas virtudes só Deus pode dar ao Cordeiro.

 

Mas quatro são antropomórficas: a igreja precisa dar.

  1. Riqueza – dinheiro (riqueza real). Faz parte da missão da igreja

 

  1. Sabedoria – (Sofia)  inteligência, capacidade de raciocionio. Deus lhe deu uma mente brilhante para servir ao Cordeiro

 

  1. Força - raiz (energeia) força humana, muscular. Força física. Deus lhe deu um corpo para suar a camisa por Jesus e não apenas para colocar uma roupa cara e jogar futebol.
  2. Louvor – não litúrgico, mas tudo que sai de sua boca.

 

Terceiro hino:  Ap 5.13 Abrange o mundo inteiro e se dirigem a Deus e ao Cordeiro, atribuindo-lhe quatro coisas. (Quatro é símbolo de totalidade, englobando tudo): Louvor, honra, glória e poder A festa de louvor termina com o amém dos quatros seres viventes. Jesus é adorado. O Cordeiro é exaltado por causa de sua obra redentora. Ray Summers descreve esta obra redentora com quatro qualidades específicas:

 

i.    É para Deus, primariamente - compraste para Deus”.

ii.  É pelo sangue de Cristo - “foste morto… e com teu sangue compraste”. Esta referência é direta à morte sacrificial de Jesus na cruz;

iii. É ilimitada -  “homens de toda tribo, raças, língua, povo e nação”. A graça de Deus é para todos.

iv. Faz dos remidos um reino - “Os fizeste um reino de sacerdotes e reinarão sobre a terra”. Tornam-se sacerdotes para servi-lo aqui neste mundo.[6]

 

Conclusão

 

No livro de Apocalipse, em pelo menos quatro capítulos, (4-7) a idéia do “trono” é central, e tudo mais se relaciona com este conceito da soberania de Deus sobre a história humana. Jesus é descrito como alguém que se encontra “no meio do trono…de pé” (Ap 5.6). Ele se encontra, portanto, no centro do trono. Ele abre o livro selado, o livro da história e do destino humano e por ter triunfado é digno de louvor. Todos os eventos que surgem como consequência da abertura deste selo (guerra, fome, pragas, martírios, terremotos) estão sob o controle do Cordeiro, que já reina, esperando apenas que o perfeito reino venha logo e ocorra a consumação (Ap 11.15-18).

 

No Novo Testamento é fundamental a perspectiva de que estamos vivendo entre dois tempos: Já e ainda não. Entre o passado e o futuro, entre a primeira e a segunda vinda de Cristo.

 

Como afirma John Stott:

“Fisicamente falando, é impossível olhar em direções opostas ao mesmo tempo, mas espiritualmente falando, é essencial fazer isto. Olhando no passado para a encarnação e tudo que se relaciona a este fato e olhando para o futuro para a parousia e tudo quanto virá…Nós temos a redenção, embora o dia da redenção é ainda futuro. Somos já adotados como filhos de Deus, embora ainda aguardemos sua adoção final…Já temos uma nova criação, embora Deus ainda não tenha feito ainda tudo novo…Jesus já está reinando, embora seus inimigos ainda não estejam debaixo de seus pés[7]”.

 

O livro da história da humanidade está nas mãos de Jesus, e só é possível desvendar-lhe seu sentido quando Jesus é situado no centro de sua história. Retirar Jesus da história dos homens é ocultar a razão humana das coisas últimas. No Cordeiro de Deus que foi morto, a história encontra seu eixo e assume sentido que de outra forma não poderia ser encontrado. Jesus está no centro do trono, ele é a hermenêutica para entendermos a complicada textura das ações humanas e encontrarmos a razão última de todas as coisas. Por isto ele é o primeiro e o último, o alfa e o ômega.

 

Não podemos compreender plenamente a história sem a pessoa de Cristo. Apenas ele pode dar sentido à história e trazer o pleno significado.

 

Apenas Jesus pode dar sentido à sua história. Muitas vezes estamos buscando significado em reputacao pública, aclamação, conquista e poder, fama, sucesso, riqueza, mas nada disso trará sentido à sua história. Ela só tem sentido quando olhada pelo prisma de Cristo. quando Jesus desvenda a sua confusa história, incapaz de trazer sentido e compreensão. Quando Jesus entra na nossa história.

 

Não é sem motivo que Jesus disse ao povo que o seguia: “Eu vim para que tenham vida, e vida em abundância.” O sentido, propósito, significado da história particular de qualquer pessoa encontra-se em Cristo, assim como o sentido da humanidade, da história de todas as nações, encontra-se em Cristo. Jesus está tecendo a trama da história. Nele encontraremos sentido maior.


Observação: 

Este texto é parte do meu livro (Tudo Sob Controle, 2a Edição). Caso você queira adquiri-lo, entre em contacto com o whats-up 62.984099816 e ele poderá ser adquirido.

 

 

 

 



[1] Ellul, Jacques - Apocalipse: Arquitetura em movimento, São Paulo, Ed. Paulinas, 1979, pg. 161

[2] Idem, pg. 161

[3] Mesters, Carlos - Esperança de um povo que luta,  Petrópolis, Vozes

[4] Sttot. J. R. W. – A mentalidade cristã, São Paulo, Abec, 4a. impressão, 1994 – pg. 90

[5] Summers, Ray . A mensagem do Apocalipse: Digno é o Cordeiro. 3a. edição, Rio de janeiro, JUERP, 1978.

Summers, Ray . Idem  1978,  pg. 133.

 

[7] R. W. – The contemporary Christian, Illinois, Intervarsity press, 1992, pg. 379, 381

quinta-feira, 8 de julho de 2021

Mc 6.24-32 Vinde, repousar

 



 

 

Introdução

 

Embora não sejamos uma máquina, precisamos admitir que nosso corpo é uma máquina. Bem ajustada, flui muito bem; mal ajustada traz danos e entra em pane. Sou grato a Deus pela máquina que ele me deu, tem dado alguns sinais de desgaste, mas nunca fiz uma cirurgia, a não ser de menisco. É uma benção nesta idade não ter nenhuma doença crônica.

 

Mas tenho que admitir que cada vez precisa  de mais manutenção. Muitas vezes temos mais cuidado com nosso carro que com nosso corpo. Temos mais cuidado em fazer sua revisão e de forma mais frequente do que da nossa saúde. Assim também temos mais preocupação com as finanças que com nossa saúde. Não paramos para considerar que se tivermos boa saúde o que adianta ter muito dinheiro?

 

A famosa citação de origem latina: “Mens sana in corpore sano”, (uma mente sã num corpo são), procura nos lembrar que é necessário encontrar o equilíbrio entre corpo e mente. Quando o corpo dá sinais de que alguma coisa não está indo bem, é hora de pensar em novas atividades que nos ajude a encontrar esta homeostase. O equilíbrio entre corpo e mente é fundamental pra atingir os objetivos e estar com a saúde em dia.

 

Somos uma geração forjada para o estresse. As exigências e demandas da vida presente são enormes, não apenas para viver, mas amontoar, ter conforto, por isto temos dificuldade em lidar sabiamente com o tempo. Vivemos como ratos de laboratório, desesperadamente tentando encontrar uma saída para o labirinto no qual fomos colocados.

 

Contexto


O texto citado acima de onde extraímos nossa reflexão relata o angustiante momento que Jesus e seus discípulos tiveram que enfrentar com a morte de João Batista. O incidente relacionado a esta tragédia foram cuidadosamente descritos nos Evangelhos (Mc 6.14-29). A decapitação de João Batista foi absolutamente leviana e cruel. Revela o quanto as pessoas desvalorizam a vida.

 

Podemos dizer três coisas sobre a morte de João Batista


A.   Ela foi assustadora. Ele estava preso, mas ninguém esperava um desfecho tão devastador. Ele era considerado um profeta e tinha o respeito da opinião pública.


B.    Ela foi ameaçadora. A lógica é simples. Se Herodes fez isto com João, o que podemos esperar de nós? Depois deste incidente entenderam que ninguém estava seguro.


C.    Ela  foi desestabilizadora. Emocionalmente todos ficaram esfacelados. Jesus e seus discípulos estavam devastados e angustiados.

 

Neste contexto Jesus convida seus discípulos para fazer um retiro espiritual. Era necessário organizar a mente, as emoções. “Vinde repousar um pouco, à parte, num lugar deserto” (Mc 6.31).

 

Este convite de Jesus é importantíssimo para nossas vidas, por vários motivos.


1.     Precisamos de descanso para equilibrar nosso corpo.

 

Wayne Cordeiro, conferencista havaiano, escreveu um livro de auto ajuda cujo titulo é “Andando com o tanque vazio? Encha o tanque e renove a paixão”. Ele conta sua experiência de passar três anos por um período de esgotamento extremo, sentindo-se esmagado pelas demandas. Um dia, fazendo uma corrida leve no parque da cidade, assentou-se desolado, chorando no meio fio e teve que ser levado às pressas para o hospital mais próximo. Ele foi diagnosticado com burnout”, um estresse muito forte, e levou cerca de seis meses até conseguir restabelecer o equilíbrio de seu corpo e voltar plenamente às atividades. Neste livro ele dá alguns conselhos sobre como evitar o esgotamento emocional. Na sua palestra disponível no youtube, “Líderes correndo, porém mortos” ele conta detalhes da sua dolorida experiência.

 

Para Wayne, precisamos identificar aquilo que enche o nosso tanque emocional e aquilo que drena o nosso tanque. Ele nos leva a imaginar a vida emocional, como um recipiente que você pode encher com aquilo que dá equilíbrio e energia, ou esvaziar com atitudes que roubam energia. E nos encoraja a fazer uma lista de coisas que nos enchem de alegria e aquilo que nos esvazia. É um exercício interessante.

 

Pegue uma folha de papel e escreva de um lado: “O que enche meu tanque?” E de outro, “O que esvazia meu tanque?”. É uma dinâmica rápida, mas altamente produtiva. Eu descobri algumas coisas interessantes para minha vida.

 

Nosso corpo possui os chamados hormônios da felicidade, neurotransmissores capazes de gerar sensações como alegria, recompensa e bem-estar. Todos eles são produzidos pelo próprio corpo e liberados em situações específicas, como a prática esportiva, a meditação, a oração, o lazer . Entre os hormônios da felicidade mais importantes estão a serotonina, a endorfina, a dopamina e a ocitocina. Por outro lado, a adrenalina, um hormônio produzido pelas glândulas supra renais, prepara o organismo para realizar atividades físicas e esforços físicos, e gera estresse no organismo. Se tivermos carga constante de adrenalina, o corpo entra em colapso. É necessário equilibrar estes hormônios.

 

Eu descobri algumas coisas que me fazem bem emocionalmente. Acordar sem ter uma agenda para cumprir, ler um bom livro, sem pressa, conversar com amigos ao redor de um churrasco ou tomando café com leite e comendo pão de queijo, viajar e especialmente pescar. Estas coisas me “energizam”.

 

Aprendi também que atividades como uma boa caminhada, um tempo para cuidar da minha alma, como ir à igreja e exercitar minhas práticas devocionais, orar (falar com Deus) e meditar (refletir de forma serena sobre minha vida) me ajudam a caminhar.

 

É preciso encher o tanque emocional. Quando Jesus passou pela dura experiência da notícia de seu amigo João Batista, brutalmente decapitado pelo rei Herodes, ele chamou seus discípulos e lhes disse: ”Vinde repousar um pouco, à parte, num lugar deserto” (Mc 6.31). Era importante ajustar as emoções. Recarregar as baterias. Se não ajustarmos a pressão, podemos explodir, como uma panela de pressão.

 

Foi exatamente isto que Jesus fez ao dizer aos seus discípulos: Vinde repousar um pouco, à parte, num lugar deserto”. Precisamos de descanso para equilibrar nossos corpos.

 

2.     Precisamos de descanso para concentrar nosso foco em coisas essenciais.

 

Numa entrevista recente (Junho 2021) do Dr. Tim Keller analisa os efeitos da pandemia na vida das pessoas e das igrejas. Ele afirma que temos sido exposto a uma forte situação de esgotamento, não apenas pelo isolamento social, mas pela necessidade de mudar a rotina de trabalho, e as adaptações que tivemos que fazer. O estresse atingiu famílias, crianças, adolescentes e idosos. Uma vez que somos seres relacionais, precisamos de contato face a face, precisamos de abraços e toques, e não apenas de uma telinha que nos transmita um punhado de informações. 


Estudiosos tem analisado isto na questão educacional. O distanciamento de crianças e adolescentes das aulas presenciais. A escola não fornece apenas conteúdo curricular, mas experiência e vivência comunitária. Ninguém sabe ao certo quais os efeitos do isolamento social na vida das pessoas. Os idosos precisam de abraços e toques. Quais são os efeitos do distanciamento destes dias de pandemia? 

 

Esta tem sido minha experiência. Já vi várias pessoas chorando ao retornar ao culto, no domingo passado (04 de Julho,2021), uma irmã que teve recentemente um câncer, ficou um ano e meio sem frequentar a igreja. Naturalmente ela estava chorando ao participar da ceia do Senhor.

 

O descanso nos faz restaurar as energias e concentrar naquilo que é essencial. Muitas vezes ficamos dispersos por causa do excesso de trabalho, cansaço e esgotamento. Precisamos reorientar nosso coração e retomar o foco de nossa alma. Tenho refletido sobre o redirecionamento que Deus deseja dar a cada um de nós. Um texto que me levado muito à reflexão encontra-se em Atos 16, quando os discípulos quiseram ir para Bitinia e depois para a Ásia, mas nos dois relatos eles foram impedidos, curiosamente, pelo Espírito Santo, de irem para o campo missionário. É estranho ver o Deus que tem o coração missionário impedir avanços missionários. Entretanto, naqueles dias de espera, em Trôade, Deus lhes dá a visão de irem para a Macedônia. 


Em Troade nao há nenhum relato do trabalho missionário dos discípulos, contudo, foi ali que Deus lhes deu a visão de irem para a Europa. Tempos de descanso, reflexão e espera, além de serem restauradores física e emocionalmente, se tornam muitas vezes o tempo para recuperar a visão, para vermos as coisas com os olhos de Deus. Precisamos de descanso para concentrar o nosso foco naquilo que é essencial, e o que é essencial vem do coração de Deus.  

 

Não é sem motivo, portanto, que Jesus convide seus discípulos a se retirarem, para repousar. Ele os convida a irem a um lugar deserto, para que as tensões que estavam experimentando não tirassem deles o foco necessário.

 

3.     Precisamos do descanso, porque este é um princípio divino.

 

Pouco refletimos sobre o significado do sábado, o motivo dele estar nos Dez Mandamentos, e quando o fazemos, o transformamos numa lei opressora como os contemporâneos de Jesus fizeram. Jesus colocou o sábado no lugar certo: “O homem não foi feito por causa do sábado, mas o sábado por causa do homem”.

 

O sábado não é uma questão religiosa, uma forma de opressão humana, mas um princípio de Deus para regular nossas vidas. A Confissão de Fé de Westminster (Cap 21 & VII,VIII) afirma que “Deus designou particularmente um dia em sete para ser um sábado (descanso) santificado por ele” (...) Este sábado é santificado ao Senhor quando os homens, tendo devidamente preparado os seus corações e de antemão ordenado os seus negócios ordinários, não só guardam, durante todo o dia, um santo descanso de suas obras, palavras e pensamentos a respeito de seus empregos seculares e de suas recreações, mas também ocupam todo o tempo em exercícios públicos e particulares de culto e nos deveres de necessidades e de misericórdia.”

 

O sábado deve ser visto como instituição divina, como uma ordenação da criação. O sábado, portanto, não é uma  ordenança estritamente mosaica. Sua origem está enraizada na própria criação. Por que Deus fez o sábado? Qual era o objetivo? Porventura Deus estava cansado e precisava descansar? Não! A instituição do sábado é pedagógica e didática. Deus estava pensando em nós. Suas bênçãos temporais podem ser apreciadas por toda a humanidade, pertencem à ordem das coisas como elas foram desde o início antes da queda do homem no pecado. Por esta razão Deus descansou no sétimo dia.

 

Já refletiram sobre a importância do sábado para o equilíbrio da humanidade? O sábado era parte integrante da vida do povo judaico. Foi criado para proteger o povo de Deus, mas também possuía uma dimensão social, era uma forma de defender o fraco. Nem o servo poderia trabalhar neste dia. Possuía ainda uma dimensão ecológica: Nem o animal poderia trabalhar, e mesmo a terra deveria ser poupada no sétimo ano. Sábado estava ligado ao ciclo da natureza. Proteção ao homem, aos servos, aos animais, e mesmo à terra.

 

A compreensão de Jesus sobre o sábado é maravilhosa. Tratava-se de um tempo de adoração, reservado a Deus, tinha a ver com a experiência de viver: tempo de recuperar as forças. Os discípulos de Cristo precisam colocar a ideia do sábado no lugar certo. O descanso é um princípio divino, para nos proteger, abençoar os trabalhadores, cuidar dos animais e da natureza. Portanto, a falta de descanso na nossa vida é uma quebra do projeto de Deus para nossa vida, e o preço da desobediência em não descansarmos pode ser bem caro para nossas vidas.

 

Conclusão

 

Por esta razão, o convite de Jesus aos seus discípulos se torna tão relevante: "Vinde repousar um pouco, à parte, num lugar deserto”. Jesus estava respeitando sua humanidade e dor. Estava cuidando para que seus discípulos também não ficassem esgotados. Jesus se mostra cuidadoso com o desgaste emocional que eles deveriam estar vivenciando naquele momento de dor.

 

Jesus convida seus discípulos a repousar: Organizar a dor, colocar em ordem as emoções e a mente. Refletir sobre perdas. Não passar pela dor sem reflexão. Jesus não quer que os discípulos apenas produzam, cumpram tarefas e responsabilidades, mas deseja que eles aprofundem seu significado nas experiências que atravessam. Jesus sabe das demandas. Os discípulos não tinham tempo nem para conversar, mas ainda assim, Jesus os retira do burburinho e os leva a um lugar solitário. Deixar a alma encontrar com o corpo. Há um lugar de descanso ao lado do criador.

 

O conselho de pastores de Anápolis, se reunia durante a semana, e eu sempre estive presente participando das reuniões. Um dia, porém, mudaram para o sábado, e desde então eu não mais participei. O presidente que é meu amigo, me convida para participar e eu digo que não vou, porque sábado é o único dia da semana em que posso acordar mais tarde, fazer uma caminhada despreocupada longe das exigências e tarefas. Não gosto de marcar reuniões também com minha liderança neste dia da semana, excepcionalmente até faço isto, mas eu sei que este é o único dia em que estão realmente livres. Se eles tem compromisso com a igreja, certamente estarão no domingo na igreja, e por outro lado, trabalham todos os dias da semana. Então, entendo que o sábado é um dia para fazerem suas atividades extras, não teremos compromissos a não se com seu descanso.

 

Mas existe um descanso maior que Jesus promete aos seus discípulos. Talvez seja este o seu caso pessoal. Veja o convite de Jesus: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma” (Mt 11.28-29).

 

Muitas vezes o nosso cansaço é decorrente da infidelidade. Podemos estar cansados por causa de nossos pecados (culpa), e por causa da ansiedade (que é também pecaminosa), porque não conseguimos descansar por não crer no cuidado dele pela nossa vida.


O pecado gera cansaço.

Eu sei um bocado sobre depressão, pois já lidei e estudei bem sobre o assunto. Sabemos que a depressão tem causas endógenas e exógenas. Ela pode ser gerada por causa de uma disfunção hormonal, problemas físicas, e pode ser gerada por um fator emocional: perda significativa nos afetos, traumas, etc. Mas tenho aprendido que o que muitas vezes chamamos de depressão, tem a ver com pecado não confessado. Davi afirmou: "Enquanto calei os meus pecados, envelheceram os meus ossos. Porque a tua mão pesava sobre mim e o meu vigor se tornou em sequidão de estio". Ele está afirmando que sua alma secou, porque ele não havia lidado bem com o pecado. Ele ainda não tinha se arrependido.


Por esta razão, muitas vezes vemos pessoas viajando, tirando férias, descansando e continuam cansadas. Seu problema não resolve. Ela precisa ser perdoada para que ocorra a cura.


Estamos precisando descansar espiritualmente. Encontrar o descanso que a presença de Cristo nos traz. Conhecer o descanso e o convite dele para cada um de nós, para experimentar a plenitude que existe nele. aprender a colocar nele a nossa ansiedade, nossos temores, nossas dores. Aprender que através de seu sangue somos sarados. Temos vivido afadigados, agitados, não temos sido capazes de descansar na provisão de Deus quanto ao alimento, o sustento, a saúde. Por isto ele está nos convidando para entrarmos no seu descanso. "Vinde a mim, todos". Estamos precisando de descanso para nossa alma.


Diante de Jesus talvez precisemos dizer como o Salmista: "Por que estás abatida, oh minha alma? Por que te perturbas dentro em mim. Espera em Deus pois ainda o louvarei. A ele, meu auxílio e Deus meu". 

 

Você está cansado? Precisando de repouso?

Jesus está nos convidando: Vinde repousar um pouco, à parte, num lugar deserto

"vinde a mim todos... e achareis descanso para a vossa alma"

 

Gosto muito da experiência dos carregadores africanos, que ao serem pressionados disseram: “Precisamos ir mais devagar, porque ontem corremos demais, e precisamos dar um tempo para que nossa alma alcance nossos corpos. Nossa alma está agitada demais. Estamos demasiadamente tensos... precisamos do descanso de Deus.