“O justo se compadece e dá”.
Introdução
Você é uma pessoa generosa?
Uma pesquisa feita pelo Child Fund apontou que o Brasil é considerado apenas o 76o país do mundo em termos de empatia. O brasileiro é muito pronto para socorrer em tempos de tragédias e calamidades, fazer campanhas de solidariedade e se envolver em momentos de comoção pública, mas não é geralmente solidário e empático. Não faz parte da cultura brasileira a doação, o envolvimento em causas públicas que exijam maior entrega e consagração, nem o envolvimento em trabalhos voluntários que o leve a sair de sua zona de conforto. Yago Martins, um conhecido pesquisador evangélico chega a afirmar que muito do que fazemos em termos de ação social é entretenimento moral.
A falta de empatia reflete muito na vida da igreja local e nas ações concernentes ao reino de Deus. Quando não investimos financeiramente em um determinado projeto, ele fica sempre deficitário por falta de recursos. Certa vez fiz um comentário sobre um membro de minha igreja que era generoso, com muitos recursos financeiros, e que de repente, deixou de contribuir para a igreja. Sua falta de contribuição impediu que a igreja sustentasse a parceria de três missionários naquele ano, porque seus recursos eram importantes na vida da igreja e nos projetos que ela desenvolvia. Portanto, dinheiro gera vida, quando colocado a serviço do reino de Deus.
Quando a Bíblia falta do dízimo, ela não está preocupada com uma abordagem legalista de que devemos dar 10% do que ganhamos, mas cria uma referência que nos leva a considerar a questão da proporcionalidade. “como está escrito: O que muito colheu não teve demais e o que pouco, não teve falta” (2 Co 8.15). Portanto, “assim como revelastes prontidão no querer, assim a leveis a termos, segundo as vossas posses” (2 Co 8.11). Generosidade faz parte do discipulado cristão.
O texto que lemos diz: “O justo se compadece e dá.” Pessoas que amam o reino de Deus precisam aprender a desenvolver generosidade. Aprender a doar, a contribuir, a abençoar vidas. Precisamos entender que o dinheiro tem levado pessoas a matarem e a destruírem, mas pode ser usado para promoção de vidas e trazer benção para muitos.
Uma citação de John Wesley diz: “Ganhe tudo o que você puder […] economize tudo o que puder […] oferte tudo o que puder.” O fato é que aquilo que você está disposto a renunciar e a forma como administra ou distribui os recursos que Deus deposita em suas mãos revelam suas prioridades e quem está no controle de sua vida: Jesus ou os ídolos deste mundo.
Na multiplicação dos pães podemos ver como o pensamento da terra pode estar presente entre os discípulos de Cristo. Quando ele sugere que dessem de comer às pessoas que estavam acompanhando seu ministério, os discípulos pensaram: “Temos recursos? A tesouraria do colegiado que está nas mãos de Judas é capaz de sustentar este projeto?” A preocupação dos discípulos estava centrada na poupança e no dinheiro que tinham, e no fato de que, do ponto de vista financeiro, eles realmente não tinham como resolver o problema. Mas a visão a partir de Jesus era outra: “O que temos é suficiente! Mande as pessoas se assentarem (planejamento), vamos orar pedindo a benção de Deus, (dependência) vamos distribuir o que temos (generosidade) e vamos recolher o que sobra (não desperdiçar).” Então com 5 pães e dois peixes, alimentou cinco mil pessoas e ainda sobraram 12 cestos cheios. Quando há generosidade e dependência de Deus, experimentamos milagres. No reino não há escassez, porque há doação e partilha.
Por que devemos ser generosos?
- Antes de mais nada porque este é um princípio divino – Muitas pessoas ficam perplexas com a questão do dízimo, sem observar que a Bíblia ensina, no Antigo e Novo Testamento, de forma clara, este princípio.
No Antigo Testamento encontramos a palavra “dízimo” 32 vezes localizada em 25 versículos. A primeira vez em Gênesis 14.18-20, quando Abraão entrega o dízimo ao sacerdote Melquisedeque, bem antes da Lei. Isto é um ponto importante de reflexão para aqueles que insistem em afirmar que dízimo é coisa da lei. “Abrão deu-lhe o dízimo de tudo.”
No Novo Testamento a palavra dízimo aparece oito vezes. No livro dos Hebreus aparece 7 vezes. Jesus fala da entrega do dízimo criticando pessoas se vangloriavam da sua fidelidade como na parábola do publicano e fariseu. (Lc 18.10-14). Noutro texto diz: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e tendes negligenciado os preceitos mais importantes da Lei: a justiça, a misericórdia e a fé; devíeis, fazer estas coisas, sem omitir aquelas.” (Mt 23.23). Neste texto Jesus não está criticando a entrega do dízimo como alguns equivocadamente podem pensar. O que ele criticou foi a atitude dos religiosos, tão cuidadosos em dar o dízimo, mas que não eram justos no tratamento que davam às outras pessoas, nem misericordioso nos seus relacionamentos. Jesus não deixa duvida sobre o que ele crê: “Devíeis, fazer estas coisas, (isto é, dar o dízimo de tudo), sem omitir aquelas.” Jesus não condena a entrega dos dízimos, mas ratifica a entrega dos dízimos.
Alguns podem dizer: “Ah, mas este é o único texto da Bíblia no qual Jesus abertamente fala do assunto.” Minha resposta é: Isto não é suficiente? Quantos textos são necessários para confirmar uma ideia? Um só não é o bastante? Jesus só falou duas vezes sobre igreja, mas nenhum estudioso sério das Escrituras tem dúvida sobre a visão de igreja que estava na mente de Jesus. Não é a quantidade de vezes que valida um princípio, mas a clareza do texto.
Portanto, entregar ou devolver o dízimo, é um princípio divino, ratificado nos ensinos de Jesus. Os judeus aprenderam a fazer isto e os cristãos em toda história do cristianismo assim tem procedido. O povo americano, com forte tradição no puritanismo e na Reforma Protestante é considerado o país mais generoso do mundo, porque suas bases éticas foram firmadas nas Escrituras Sagradas. O distanciamento da Palavra de Deus que vem acontecendo de forma rápida na América, infelizmente esvaziará os recursos missionários que foram desenvolvidos pelos fieis cristãos da América do Norte. Através de seus esforços, milhares de obras sociais foram construídas no mundo, obras missionarias foram desenvolvidas no mundo inteiro, e boa parte das igrejas presbiterianas na nossa região Centro Oeste do Brasil, onde está a nossa igreja, foi construída com recursos missionários. Pessoas generosas doaram dos seus recursos para plantação de igrejas, estabelecimento de escolas e hospitais. Quando você dá, você está apenas cumprindo um princípio divino.
- Porque a generosidade tem impacto em vidas – Richard Foster, no seu clássico livro “Dinheiro, Sexo e Poder”, afirma que quando Jesus chama dinheiro de Mamon, ele o fez porque este era um dos deuses pagãos, e Jesus estava afirmando que existe um poder espiritual presente na forma como administramos nossos recursos. Dinheiro é uma entidade espiritual.
O avarento não se importa com as coisas do Reino de Deus. Não é sem razão que Paulo afirma que a avareza é idolatria. “Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena: prostituição, impureza, paixão lasciva, desejo maligno e a avareza, que é idolatria” (Cl 3.5).
Quando você usa o dinheiro para abençoar o reino de Deus, a igreja local e vidas, você está quebrando o domínio e o controle que o dinheiro tem exercido na sua vida. Muitas pessoas afirmam que não dão porque ganham pouco, mas por outro lado, muitos não dão porque ganham muito. Dinheiro não é uma questão de bolso, é uma questão de coração.
Por isto a Palavra de Deus nos encoraja a “praticar o bem, sermos ricos em boas obras, generosos em dar e prontos a repartir” (2 Tm 1.18).
- Porque a matemática de Deus tem uma lógica diferente. No mundo empresarial e financeiro, precisamos guardar para ter, mas no mundo espiritual, Deus constantemente afirma que a generosidade faz os recursos multiplicarem. A Bíblia é o único livro de finanças que afirma que 100% não é suficiente para seu equilíbrio financeiro, mas que 90% é. Esta lógica é um contrassenso.
No Salmo 37, que é o texto de referência para esta reflexão, lemos adiante: “Fui moço e já, agora, sou velho, porém jamais vi o justo desamparado e a sua descendência a mendigar o pão” (Sl 37.25). Este texto é constantemente citado nos meios cristãos, para trazer tranquilidade para pessoas que estão com medo do amanhã, pensando se terão o suficiente ou não para sua sobrevivência, mas não podemos nos esquecer de ler o texto seguinte, que define o justo. “É sempre compassivo e empresta, e a sua descendência será uma benção” (Sl 37.26).
O texto mostra que sua generosidade o protege. Quando você é fiel, Deus vai cuidar de você e vai te amparar. Agora, olhemos com mais atenção o texto e veremos que existe uma outra benção que o texto descreve: “Sua descendência será uma benção.” Generosidade atinge seus filhos e netos, trazendo bençãos sobre suas vidas. São efeitos espirituais que todos nós ansiamos ver em nossos filhos. Faz parte de todo cristão genuíno, ver sua descendência sendo uma benção para a humanidade.
Portanto, aprenda a cultivar generosidade, por ser um princípio divino, guardado por judeus e cristãos fieis; porque ela é transformadora da realidade social e uma força motriz no processo de humanização social, abençoando vidas e trazendo bençãos.
Só uma alerta: Preste atenção na dialética deste princípio: Não dê para ser abençoado, mas dê sabendo que isto traz benção para sua vida, sabendo que você já é abençoado. Este é o princípio da graça: Não fazemos para sermos aceitos para Deus (barganha, troca), mas fazemos por já sermos aceitos por Deus (isto é gratidão). Veja só esta promessa de Deus: “Ora, aquele que dá semente ao que semeia e pão para alimento também suprira e aumentara a vossa sementeira e multiplicará os frutos da vossa justiça”(2 Co 9.10). Deus dá pão para alimento. Coma o pão!!! Mas dá semente ao que semeia. Não coma a semente!!! Tem muita gente comendo a semente e querendo colheita depois, sem semear. Isto não vai dar certo. Esta é uma das leis da semeadura: “Aquele que semeia pouco, pouco também ceifará; e o que semeia com fartura com abundancia também ceifará.” (2 Co 9.6)
- O motivo da nossa generosidade deve ser duplo: compaixão pelos homens e a glória de Deus.
O texto inicial de nossa reflexão diz: “O justo se compadece e dá”. Por que ele dá? Por causa de sua compaixão. Precisamos entender o que significa compaixão.
O dicionário traduz a palavra compaixão por “Sentimento de pesar, de tristeza causado pela tragédia alheia e que desperta a vontade de ajudar, de confortar”, e “sentimento piedoso de simpatia para com a tragédia pessoal de outrem, acompanhado do desejo de minorá-la; participação espiritual na infelicidade alheia que suscita um impulso altruísta de ternura para com o sofredor.”
Alguém já afirmou que quem tem pena é galinha. A pena é um sentimento adoecido, depressivo. Você pode ter dó de alguém e não fazer nada por esta pessoa. O dó não nos motiva em direção ao outro, apenas nos faz sentir triste e culpado pela situação que vemos. Não nos transforma, não nos torna participativos da dor do outro. Compaixão é diferente, ela tem poder transformador. O texto diz: “O justo se compadece e dá”. Não diz que ele olha a situação e não faz nada, mas que ele vê o que está acontecendo e ativamente se mobiliza em direção ao sofrimento. Ele é generoso. Ele dá.
Então, o primeiro motivo da generosidade é a compaixão.
Mas existe um outro motivo para a generosidade: A glória de Deus. A Bíblia afirma: “Quer comais ou bebais, ou fazeis qualquer coisa, fazei tudo para a glória de Deus.” (1 Co 10.31) Quando Paulo escreve sobre a generosidade ele afirma: “porque o serviço desta assistência (financeira), não só supre a necessidade dos santos, mas também redunda em muitas graças a Deus.” (2 Co 9.12) Portanto, a benção é dupla: Você abençoa vidas, e traz glória ao nome de Deus.
O nome de Deus é glorificado através da generosidade. Quando damos, estamos glorificando a Deus através de nossos recursos. Deus não precisa do dinheiro que você dá, da generosidade que você expressa, para ele mesmo, mas a atitude dos discípulos de Cristo quanto à generosidade, além de aliviar o sofrimento humano, traz glória para seu nome.
Conclusão
Iniciei este sermão perguntando: “você é generoso?”
Deixe-me concluir dizendo algumas coisas.
Primeiro, indague ao seu coração porque você não tem conseguido dispor parte do que você recebe para o reino de Deus. Por que você tem tanta dificuldade com dinheiro? Não venha me dizer que você ganha pouco. As pessoas mais fieis em todas as comunidades em que eu fui pastor, são pessoas que ganham pouco, mas espontaneamente servem a Deus com seus recursos. A melhor medida da fidelidade não é o que você dá, é o que você retém.
Segundo, não desanime se você acha que não está valendo a pena ser generoso. Lembre-se do princípio da generosidade: o motivo é gratidão, não barganha ou troca. O motivo é o coração que reconhece a graça de Deus sobre sua vida. “Portanto, meus amados irmãos, sede firmes e inabaláveis, sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso trabalho não é vão.” (1 Co 15.58)
Terceiro, considere a obra de Cristo na generosidade. “Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico se fez pobre por amor de vós, para que, pela sua pobreza vos tornásseis ricos.” (2 Co 8.9)
O que nos motiva a ser generoso, não apenas com nossos bens, mas até mesmo com nossa vida, é a compreensão da obra de Cristo. Ele é o nosso modelo. Porque Jesus foi tão generoso conosco? Sua graça! “Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo”. O seu motivo foi a sua compaixão por nós, ao ver nossa condição de miséria, e ele nos amou. Só ama Jesus e seu reino, quem já se sentiu amado por Jesus. João afirma: “Nós amamos porque ele nos amou primeiro.” (1 Jo 4.19). Ele nos amou porque viu nossa situação tão angustiante, de pessoas perdidas, desorientadas, e assim nos amou. Só é capaz de dar, que já recebeu de Deus, e quem recebeu de Deus, será sempre generoso. A forma como lidamos com nossos recursos revela nossa gratidão a Deus pelo que ele fez por nós.
Sua generosidade desembocou no seu sacrifício. Ele se entregou por nós. Sua generosidade não foi financeira, ele derramou sua vida por nós. O motivo nosso de gratidão é a compreensão do amor de Cristo por nossas vidas.
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