sábado, 13 de novembro de 2021

Sl 37.23 O Princípio da Estabilidade

 





“O Senhor firma os passos do homem bom”.


 

 

 

 

 

Introdução

 

 

 

 

Quando os candidatos se apresentavam ao monastério, candidatando-se ao sacerdócio, se aprovados, deveriam fazer quatro votos:

Pobreza voluntária

Castidade

Obediência

Estabilidade

 

Este último voto eu só tomei conhecimento algum tempo atrás num livro do Eugene Peterson, que fala de vocação. Achei muito curioso, porque uma das coisas mais complicadas na vida da igreja e de um pastor é a falta de estabilidade. Algumas pessoas tem perguntado porque nossa igreja tem crescido tanto, qual o segredo, e minha resposta tem sido sempre sobre a graça de Deus em nos abençoar. É graça, apenas graça! As pessoas tem conhecido a Cristo, tem conhecido a Bíblia e tem ficado em nossa comunidade. Mas há um aspecto que está muito claro em minha mente: O fato da nossa igreja estar em harmonia. Entre os pastores e colegiado; entre lideranças, entre ministérios. Esta estabilidade é fundamental. Ninguém consegue viver em uma comunidade cheia de sobressaltos e conflitos, uma igreja que está sempre variando de um polo para outro, seja em seus programas, liturgia ou teologia.

 

É necessário estabilidade para avançar. Tente fazer um carro desenvolver bem sua velocidade sem estabilidade. Tente andar com um carro com pneu sem estar calibrado, ou com a suspensão desalinhada. Um carro numa pista molhada, quando perde sua estabilidade pode ser fatal para a vida dos passageiros.

 

Da mesma forma, a vida precisa de previsibilidade, estabilidade, ordem. Por isto “O Senhor firma os passos do homem bom.” Precisamos de firmeza, estabilidade. A indecisão e a inconstância, desorientam. A instabilidade emocional é uma das maiores tragédias na vida de um ser humano.

 

§  Ela destrói a pessoa em si. Pense numa pessoa descontrolada emocionalmente. O nível de sofrimento e ansiedade que ela experimenta. A insegurança e a incerteza. Uns dias muito alegre outros dias de muita tristeza. Isto gera um profundo desequilíbrio na existência em si. Deus precisa “firmar nossos passos” para que não andemos com bêbados, desorientados e desequilibrados.

§  Ela destrói os relacionamentos. Pais e mães precisam dar segurança aos filhos para que a vida floresça sem sobressaltos. É preciso ter equilíbrio na liturgia da vida doméstica, no uso ponderado do dinheiro, na forma de viver. As reações intempestivas causam desequilíbrio, insegurança e fragilidade.

§  Igrejas. Toda instituição precisa de certo ritmo e coerência para sua sobrevivência. Pastores desequilibrados desorientam a comunidade, líderes desatinados, sem temperança, ameaçam a estabilidade da comunidade. A Bíblia afirma que o “domínio próprio” é um dos frutos do Espírito. “Ora, é necessário que o servo de Deus não viva a contender, e sim deve ser brando para com todos, apto para instruir, paciente, disciplinando com mansidão os que se opõem.” (2 Tm 2.24-25). Todas estas palavras apontam para a necessidade de estabilidade, moderação, equilíbrio, mansidão. Líderes desequilibrados causam danos quase irreparáveis à instituição.

 

Por esta razão, este princípio apresentado no Sl 37.23 é tão importante: “O Senhor firma os passos do homem bom.” Precisamos de pessoas com passos firmes. O contrário disto são passos instáveis, inseguros, trôpegos. A Bíblia afirma que o “homem de ânimo dobre (literalmente, duas almas), inconstante em todos os seus caminhos não deve supor que “alcançará do Senhor alguma coisa” (Tg 1.6,7).

 

Precisamos de estabilidade. A vida precisa de estabilidade. Famílias precisam de estabilidade,  igrejas precisam de estabilidade.

 

1. Estabilidade estrutura a vida

 

Estabilidade gera consistência, coerência, integridade. Palavra esta sugestiva, porque fala de uma pessoa íntegra, não fragmentada. Dentre as características bíblicas descritas para um líder cristão, encontra-se a sobriedade e temperança. “é necessário, portanto, que o bispo seja irrepreensível, esposo de uma só mulher, temperante, sóbrio, modesto, hospitaleiro, apto para ensinar” (1 Tm 3.2). observe quantos termos aqui apontam para a estabilidade.

 

-Irrepreensível

-Temperante

-Sóbrio

-Modesto

 

Tudo isto tem a ver com estabilidade.

 

O contrário da temperança é o destempero. O contrário da sobriedade é o desequilíbrio. Aliás, a ausência de sobriedade está diretamente ligada a pessoas que bebem muito e perdem o bom senso, dizem coisas irrefletidamente, falam sem prudência. Vejam como a modéstia se aplica também a isto. Um líder extravagante, falastrão, com purpurina em demasia, perde a tonalidade e a cor certa.

 

A estabilidade está relacionada ainda a algumas áreas:

 

-Aos afetos – Pessoas que não sabem o que querem na sua vida afetiva, se apaixonam (e desapaixonam) com facilidade, não geram confiança nos outros e em seus relacionamentos. Gabriel García Márquez disse que “o mais importante num bom casamento não é a felicidade e sim a estabilidade.” A estabilidade da alma deve ser algo desejado e buscado. Não há dinheiro no mundo que compre a paz de uma vida centrada e organizada. Em muitas pessoas, o emocional tem a consistência de uma gelatina. Filhos anseiam pela estabilidade dos pais, porque isto se torna porto seguro para suas vidas.

 

-Ao uso do dinheiro – É fundamental que saibamos usar bem os recursos. Por mais que você ganhe bem, seus recursos não são ilimitados. Um antigo presbítero de Formoso-GO afirmava que o importante não é o quanto você ganha, mas o quanto você economiza. É óbvio, também, que o excesso de economia nos transforma em pessoas avarentas e apegadas ao dinheiro, que não sabem desfrutar daquilo que tem. É necessário ter estabilidade financeira para qualquer planejamento que se deseja executar.

 

É de Abraham Lincoln a seguinte afirmação:

Não criarás prosperidade se desestimulares a poupança.
Não criarás estabilidade permanente baseada em dinheiro emprestado.
Não evitarás dificuldades financeiras se gastares mais do que ganhas.
Não poderás ajudar os homens de maneira permanente se fizeres por eles aquilo que eles podem e devem fazer por si próprios.

 

-Uso do tempo – Uma outra área na qual precisamos de estabilidade tem a ver com o uso do tempo. Pessoas desregradas quanto ao tempo, o desperdiçam usando-o de forma inadequada. Ou trabalhando demais (hiperatividade) ou de menos (displicência). É necessário equilíbrio adequado.

 

A estabilidade estrutura a vida. Pessoas inconstantes de auto destroem assim como destroem aqueles que estão ao seu lado.

 

2. Estabilidade glorifica a Deus

 

Crentes instáveis dão péssimo testemunho e desautorizam o evangelho. Não é sem razão que a estabilidade é tão exigida dos líderes cristãos. Na lista de características de um líder, várias delas estão relacionadas à estabilidade e ao equilíbrio emocionalcomo ser temperante, isto é, não exagerado, “não dado ao vinho”, sóbrio ou “cheio de bom senso”, não violento, “Não briguento”. Modesto, simples no vestir e no estilo de vida.

 

O objetivo supremo de nossa vida é trazer glória a Deus e levar outras pessoas a darem glória a Deus. O domínio próprio é essencial. Quando uma pessoa não é mestre dos seus impulsos ela perde a eficácia de seu testemunho cristão e deixa de glorificar a Deus. “Líderes espirituais devem rastrear maus hábitos impiedosamente, e quebrá-los pelo poder do Espírito.” (John Piper)

 

O comentarista William Barclay tece uma longa e profunda consideração sobre o assunto:

 

“O líder cristão deve ser temperante (sofron) e sóbrio (kosmios).” A palavra sofron pode também ser traduzido por prudente, cabal, discreto, controlado, casto, que tem domínio completo sobre os desejos sensuais. Os gregos a derivaram de duas palavras que significam manter um juízo firme e seguro. O substantivo que lhe corresponde é sofrosune, e os gregos escreveram e pensaram muito a respeito dela. É o oposto da intemperança e falta de domínio próprio. Platão a definiu como "o domínio do prazer e do desejo". Aristóteles como "o poder por meio do qual os prazeres do corpo se utilizam como mandatos da lei". Trench descreve a sofrosune como "a condição de domínio total sobre as paixões e os desejos, de modo que estes não recebam mais concessões que as permitidas e aprovadas pela lei e a razão correta. O homem que é sofron é aquele que tem cada parte de sua natureza sob um perfeito domínio,  em cujo coração Cristo reina de maneira suprema.

 

Continua Barclay:

Kosmios(sóbrio) se traduz como decoroso. O homem só é sóbrio em sua conduta exterior se for temperante em sua vida interior. Esta palavra kosmios significa ordenado, honesto, decoroso. Em grego tem dois usos muito especiais. E é muito comum para descrever ao homem que num bom cidadão. Platão define o homem que é kosmios como "o cidadão que age com tranquilidade, que ocupa seu lugar devidamente, e ordena os deveres que lhe incumbem como tal". Esta palavra implica mais que simplesmente um bom comportamento. Descreve o homem cuja vida é formosa e em cujo caráter se combinam e integram todas as coisas harmoniosamente. É o homem em que se unem a força e a beleza. O líder da Igreja deve ser um temperante, um homem que controle todos seus instintos, paixões e desejos; também deve ser sóbrio, cujo controle interno se transforme em beleza externa; o líder deve ser um homem em cujo coração reine o poder de Cristo, e em cuja vida resplandeça a beleza de Cristo.”

 

3. Estabilidade é graça de Deus

 

 

Este é o terceiro ponto que queria colocar, e parece ser a mensagem central do texto. O foco da estabilidade aqui não está no que o homem pode fazer, mas no Deus que faz. “O Senhor firma os passos do homem bom e no seu caminho se compraz. Se cair, não ficará prostrado, porque o Senhor o segura pela mão”. (Sl 37.23,24)

 

Veja como a estabilidade é uma graça de Deus:

 

A. Primeiro, quem firma os passos é o Senhor. “O Senhor firma os passos do homem bom e no seu caminho se compraz.” A estabilidade não é uma virtude centrada no homem, mas em Deus. Nossos passos podem estar firmes, por causa da absoluta graça de Deus. Ela nos protege, traz equilíbrio, sensatez, modéstia.

 

B. Segundo, por mais que um homem seja coerente e estável, isto não o impede da queda. Por isto o texto afirma: “Se cair, não ficará prostrado, porque o Senhor o segura pela mão”. O texto não diz que o homem estável não cairá, mas que, se cair, não ficará prostrado.” Mesmo tendo seus pés firmados por Deus, isto não nos impede de desequilibrarmos, falharmos. Homens e mulheres que são amados (as) de Deus podem cair. Mas o texto faz questão de dizer que não ficarão prostrados.

 

Mais uma vez temos aqui o triunfo da graça de Deus. É Deus fazendo em nós, mesmo quando caímos, não precisamos ficar prostrados, o Senhor pode nos reerguer, restaurar nossa honra e dignidade, nos fazer assentar novamente entre os príncipes, ter nossa reputação restaurada pela cruz.

 

A habilidade de se levantar não é por causa da habilidade humana em se reerguer, mas porque o Senhor o segura pela mão. Sua força e equilíbrio vem de Deus. “Porque sete vezes cai o justo, e se levanta; mas os ímpios são derribados pela calamidade.” (Pv 24.16).

 

O justo não ficará prostrado por causa da graça de Deus em reerguê-lo. “Se cair, não ficará prostrado, porque o Senhor o segura pela mão.” O perdão e a graça de Deus é poderoso para nos restaurar. Esta é uma promessa maravilhosa de Deus para aqueles que estão lamentando sua queda e seu fracasso. A palavra de Jesus para a mulher adúltera foi uma clara mensagem do que Deus pode fazer: “Nem eu te condeno, vá e não peques mais!” A graça de Deus firma nossos passos, traz estabilidade, restaura a dignidade.

 

Estabilidade e temperança é graça de Deus. Lembrem-se que “domínio próprio” é um dos frutos do Espírito. Não é gerado pelo homem, mas por Deus. É obra do Espírito Santo. Um dos sinais de que Deus está agindo na vida de alguém é que isto lhe traz moderação, equilíbrio, temperança, sobriedade, todas estas palavras estão relacionadas à estabilidade. Tem a ver com a promessa que lemos hoje: “O Senhor firma os passos do homem bom e no seu caminho se compraz.

 

Paulo afirma: “Mas, pela graça de Deus, sou o que sou; e a sua graça, que me foi concedida, não se tornou vã; antes, trabalhei muito mais do que todos eles; todavia, não eu, mas a graça de Deus comigo.” (1 Co 15.10). Ele entendia claramente quem o sustentava, a fonte da estabilidade em sua vida.

 

Precisamos ter esta clara percepção de quem faz. Somente a graça de Deus pode nos levar em segurança e estabilidade. Não confie na sua capacidade espiritual. Ultimamente temos sido bombardeados por conceitos que nos levam a crer que o homem consegue ter e fazer tudo o que quiser, de acordo com sua força. Estes conceitos de auto ajuda, estão centrados no que o homem é capaz de fazer, mas ao lermos a Palavra de Deus percebemos que a ênfase nunca está naquilo que somos capazes de fazer, mas naquilo que Deus faz “em nós, através de nós, e a despeito de nós”. A auto suficiência nos torna vaidosos, presunçosos, e nos esquecemos da graça de Deus.

 

Admitir que tudo é pela graça de Deus, destrói toda pretensão e destrona o orgulho. o Evangelho liberta-nos das ilusões pretensiosas de que somos o máximo e de que podemos fazer alguma coisa. Tudo vem da graça de Deus, maravilhosa, restauradora, eficaz.


Equilíbrio e estabilidade vem da graça de Deus. É o seu milagre operando em nós. A graça de Deus nos liberta da tirania e ilusão de que somos nós que fazemos. Nossa  vida é uma dádiva e só Deus pode nos capacitar para ser o que ele gostaria que fossemos.

 

 

 

 

 

 

 

 


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