Introdução
Não é difícil encontrar pessoas com boa formação teológica, que enfrentam grandes dificuldades de equacionar uma fórmula simples na fé: “Por que coisas ruins acontecem a pessoas boas?” Ou, colocando em outras palavras, “Por que pessoas que amam a Deus enfrentam situações complexas e insolúveis? Por que Deus permite que isto aconteça?”
Existem três mistérios que o homem jamais conseguiu responder: O Problema do mal, o problema da dor e o problema da morte. Neste texto encontramos o problema do sofrimento. Ele descreve um homem que apesar de ser temente a Deus, não conseguia pagar suas dívidas, teve que contrair dívidas, morreu sem deixar reservas para a sua esposa e filhos e endividada, e os credores vem atrás para receber e ela sofre a ameaça de ver seus filhos sendo levados como escravos para trabalhar a pagar a conta do pai que morreu.
O texto afirma que este homem que morreu devendo era temente a Deus. Não era um homem ímpio, indiferente, mas crente, contudo, isto não impediu que ele passasse por grandes privações, escassez, enfermidades e morte. Este texto desmascara os falsos fundamentos da teologia da prosperidade.
O que observamos no texto?
A. O temor do Senhor não impede tragédias – A situação desta família é catastrófica. Ela era esposa de um “discípulo de profeta”. Naqueles dias existiam muitas escolas com esta configuração em Israel ((2 Rs 2.3,5)
Este rapaz era um aspirante ao ofício, seminarista, que hoje em dia ironicamente alguns chamam de “filhote de pastor”. Com o dinheiro curto este rapaz foi assumindo dívidas, e não foi capaz de resgatá-las, lamentavelmente adoeceu e morreu devendo. Como a esposa não podia pagar, os filhos estavam sendo exigidos em pagamento. Ela não apenas era viúva, mas herdara o débito do marido. Era um lar crente, mas vivendo debaixo de grandes perdas.
B. O temor do Senhor não impede escassez – Esta mulher não tinha nada em casa, e não apenas não tinha como sobreviver, mas ainda tinha o saldo devedor. Uma coisa é você não ter, outra pior é ter ainda um saldo negativo. Sua situação era de carência em todas as direções.
C. O temor do Senhor não impede que nos sobrevenham questões insolúveis – Isto pode ser percebido pela resposta que Eliseu dá àquela mulher quando ela narra sua situação: “Que te hei de fazer?”
Identifico-me completamente com o profeta Eliseu. Muitas vezes ouço lamentos e dores, e fico com um nó na garganta, perguntando: “O que pode ser feito?”, e eu, simplesmente não sei o que fazer. As contas não fecham, os recursos são limitados, e os desafios imensos, os problemas acumulam-se. É fácil fazer perguntas, mas muito difícil resolver as equações da privação, da doença e do luto. Nem sempre é possível ter respostas às duras questões da vida. É fácil trazer questionamentos, mas são poucos os que são capazes de trazer as soluções.
Muitas vezes as questões da própria fé não parecem resolver os dilemas. A vida torna-se meio incoerente, sem sentido, e não conseguimos juntar as contradições da vida, com a realidade de um Deus amoroso e providente. Quando isto acontece, ficamos filosoficamente divididos entre a certeza inabalável de um Deus que existe e é bom, e as condições reais da dor e das perguntas dialéticas e paradoxais que a vida nos apresenta.
Como aplicar a fé quando enfrentamos questões que não sabemos responder. Por isto muitos vivem tentam viver a fé de forma compartimentalizada: Um mundo no qual possuem uma espiritualidade que professa a convicção em um Deus que cuida, e outro mundo que tem a ver com o dia a dia, e estes mundos parecem incomunicáveis. Sejamos honestos, você realmente acredita que a vida cristã influencia seu dia a dia? Que Deus tangencia a sua história, que existe um Deus que interfere neste mundo caído?
Este texto nos mostra que o fato de pertencer a Deus não nos imuniza. O marido era discípulo, temente a Deus, entrno entanto, passa por grandes lutas e morre na pobreza. Nosso erro teológico é pensar que tribulação diminui a Deus. Entretanto, pertencemos a Deus, não porque as coisas estão boas ou ruins, mas porque ele governa todas as coisas, tanto de fartura quanto escassez, tanto de dor quanto de alegria.
Este texto de crise é t um texto com lições preciosas e inspiradoras para a nossa fé. Crises muitas vezes alargam nossos horizontes para compreender verdades e construir significados que vão muito além de nossa vida cotidiana. Nas crises podemos aprender que Deus pode surpreender, como fez a esta mulher.
O milagre acontece quando:
1. Milagres acontecem quando corremos em direção a Deus e não para longe de Deus.
Esta mulher tem todos os motivos para se queixar de Deus e negar sua fé. Deus permitiu que lhe sobreviesse escassez, pobreza, luto e agora a possibilidade de seus filhos se tornarem escravos. No entanto, o que ela faz? Dirige-se a Eliseu, respeitado por ser um servo de Deus. Ela não tem as respostas, mas busca resposta. Ela “clamou a Eliseu” (2 Rs 4.1), contou sua situação. Ela vai em direção a Deus.
Já observou como reagimos quando enfrentamos lutas?
Já vi muitas pessoas entrarem numa espécie de conspiração e revolta contra Deus ao passarem por angústias e provações. Fogem da igreja, não buscam a Deus, viram o rosto, não oram, se distanciam da comunhão. Entram num movimento cíclico, tolo e inútil de questionar e até mesmo blasfemar contra o Senhor.
Esta mulher, assimilou a grande promessa da Palavra de Deus: “Deus é nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente nas tribulações”. Refúgio é este lugar para onde corremos quando a tempestade sopra furiosamente. Fortaleza é este lugar de abrigo para onde a alma cansada pode se proteger.
É isto que ela faz. Ela se dirige ao profeta. Ela corre para Deus. Ela precisa de solução. Hoje não precisamos mais de profetas para nos aproximarmos de Deus, porque Jesus é o nosso sacerdote, e por meio do seu sangue, temos intrepidez para entrar no santo dos santos, como aprendemos na carta aos hebreus. (Hb 4.14-16)
2. Milagres acontecem quando descobrimos que coisas insignificantes, podem ser potencializadas por Deus. “Dize-me, o que tens em casa?” (2 Rs 4.2).
Muitas vezes Deus opera a partir daquilo que a pessoa tem, embora ele não precise de nada do que possamos oferecer. Eliseu vê neste pouco de azeite a solução para o problema daquela viúva. Moisés tinha apenas uma vara, e com ela ele abriu o mar vermelho para o povo hebreu passar.
Talvez nunca saibamos porque Deus decide fazer a partir do que temos se ele pode fazer as coisas acontecerem do nada. Deus não precisa do que temos, principalmente quando os recursos são limitados. O profeta perguntou à viúva sobre o que ela tinha em casa, a resposta da mulher vem em um tom desanimador: “Tua serva não tem nada em casa, senão uma botija de azeite”. Deus resolve instrumentalizar essa botija de azeite para abençoar aquela casa. Deus usou o que ela possuía para multiplicar os recursos e realizar o milagre.
Ele pode usar o pouco que temos e transformá-lo em muito. Até mesmo uma botija de azeite. Deus potencializa nossos limitados recursos, transformando-os em instrumentos poderosos para sua glória.
Ouvi algum tempo atrás uma declaração que me tem feito pensar muito: “Deus vai usar o seu currículo!”. O pouco que temos, quando o trazemos e apresentamos a Deus, pode ser tornar um grande instrumento nas mãos do Senhor, que não precisa nem de nós, nem do que temos, mas resolve usar nossos parcos recursos. Muitas vezes penso nisto quando falamos de recursos financeiros. Vejo muitas pessoas enfrentando grandes batalhas espirituais, tornam-se infiéis no dízimo, e eu fico pensando que grande oportunidade tal pessoa tem de experimentar o milagre da multiplicação na sua vida.
Quando Jesus realizou o milagre da multiplicação dos pães, havia ali um rapazinho providente que havia trazido de casa, cinco pães e dois peixes. Seus recursos foram grandemente multiplicados e cinco mil pessoas puderam ser alimentadas naquele dia. Poucas coisas nas mãos de Deus podem ter grandes efeitos exponenciais. Já viu isto acontecer na sua vida?
3. Milagres acontecem quando nos ajuntamos, como família para experimentar milagres
A ordem de Eliseu é clara: “Entra, e fecha a porta sobre ti e sobre seus filhos.” (2 Rs 4.5)
O ato de reunir como família para clamar a Deus, para buscar e depender de Deus, é uma das forças mais poderosas da terra.
Existem momentos em que a família precisa fechar a porta para os outros, para ter a grandiosa experiência do quarto fechado da qual Jesus falou em Mateus 6.6. Famílias reunidas em torno da palavra e oração, especialmente em tempos de crises, experimentam a maravilhosa benção do milagre dentro de casa. Eventualmente são famílias quebradas, divididas, por pecados, passando por crises, enfermidades, quem sabe má administração financeira, e que precisam de arrependimento e transformação.
Nesta semana tive o privilégio de estar com o Rev. Hernandes Dias Lopes em Campinas. Ele me convidou para participar de um programa de mentoria para 80 pastores de diversas denominações de diferentes regiões do Brasil. Em sua palestra ele nos falou de quando se encontrava nos EUA, para fazer seu programa de doutorado, e tinha que acordar as 4 hs da manhã, para limpar o banheiro da escola para equilibrar suas finanças. Quando os recursos secaram, ele ficou dividido entre continuar ou voltar para o Brasil. Então, ele e sua esposa ajoelharam na sala, seus filhos vieram para perto deles, e eles oraram. Terminada a oração, o telefone tocou, era uma igreja convidando-o para pregar num evento. Ele foi e eles lhe deram U$ 2.500,00 dólares que era o suficiente para equilibrar, naquele momento, suas finanças.
Que efeito tem um pai e uma mãe quando quebrantados e moídos pela dor, confessam suas necessidades aos filhos e a esposa e juntos oram a Deus pedindo um milagre.
Quando pastoreava a igreja de Vila Nova em Goiânia, acompanhei a situação de um funcionário de carreira de um banco privado, que foi demitido depois de 17 anos na empresa. Ele não sabia fazer outra coisa. Ele era um bancário, vida organizada, dívidas pagas, vida simples. E agora, tinha que dar a notícia à sua família de que estava desempregado. Sua filha caçula estava prestes a completar 5 anos e estavam planejando uma festa com os amigos. Quando ele contou a situação, seus três filhos juntos ouvindo e vendo a realidade do pai, que era o provedor, ali mesmo, resolveram orar e colocar suas vidas nas mãos do Senhor, pedindo a provisão de Deus. Foi quando, de forma surpreendente, sua pequena filha Wanessa virou e disse: “Pai, não precisa mais fazer a festa pra mim porque agora a gente não tem mais dinheiro. Eu não vou ficar triste”. Eventualmente este homem se preparou, foi aprovado num excelente concurso como fiscal do INSS, onde se aposentou.
Como é maravilhosa a experiência de uma família que na angústia corre para casa, fecha as portas, e busca o milagre de Deus. Muitas mudanças perenes aconteceriam se famílias cristãs, diante das crises, apresentassem seus pequenos e limitados recursos a Deus, e confiassem realmente na grande possibilidade do ilimitado poder de Deus, e não na capacidade pessoal.
4. Milagres acontecem quando confiamos e nos firmamos nas suas promessas
Logo após o conselho de Eliseu, ela tratou imediatamente de providenciar o que era necessário. Ela foi obediente. Além de declarar-lhe o que tinha em casa, ela obedeceu. Foi até seus vizinhos e juntou todos os vasos vazios possíveis. Com isso ela estava exercitando sua fé. De nada adianta dizer que temos fé, se não a exercitamos. O segredo está na obediência que nos leva a ação. Para encher os vasos primeiramente pediram vasilhas emprestadas, porque nem isto tinham em casa, e não foram poucos. Chamou seus filhos, foi para o quarto e de forma obediente, cheia de expectativa, os vasos enchiam.
Portanto, leve a palavra de Deus para casa. Feche a porta, ali onde se encontram os segredos de família, onde as máscaras não funcionam, onde a dor é visível. O milagre acontece dentro de casa, família reunida. Veja a recomendação de Jesus: "Tu, porém, quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, orarás em secreto, e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará." (Mt 6.6)
Outra grande lição do texto é que o milagre só acaba quando acabam as vasilhas. Deus tem mais para dar que a família para receber. Fé é exercício para dentro de casa. Depois de enchidas as vasilhas, o azeite parou porque não havia mais vasilhas vazias. O azeite não acabou porque a graça e o poder de Deus foram limitados, pois enquanto existiam vasilhas vazias ele estava jorrando. A mulher recebeu tanto azeite quanto havia disponibilidade de vasilhas.
A mulher procurou o profeta e contou tudo o que aconteceu ao que ele lhe disse: “Vai, vende o azeite e pague a tua dívida, e tu e teus filhos, vivei do resto” (v.7).
Conclusão
Deus se revela como o Deus da provisão. Jeová-Jire. Um Deus que dá ampla suficiência e sempre nos surpreende com sua graça e poder. O problema desta mulher era muito sério, mas a graça de Deus se manifesta enchendo sua casa e suprindo suas necessidades.
É maravilhoso ver o azeite se multiplicando, as vasilhas se enchendo, até que não houve mais espaço nem vasilhas. Ela deve agora vender o azeite e pagar sua dívida. O dinheiro seria suficiente não apenas para pagar a dívida, mas para sua manutenção.
Este texto aponta para algo ainda maior que Deus pode fazer, e cuja benção não é material, mas espiritual. Jesus afirma: “Se vós que sois maus, saber dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais o pai celeste dará o Espírito Santo àqueles que lho pediram.” Pode ser que seu problema não seja material, mas tenha uma dimensão muito mais profunda que só Jesus pode resolver. Sua dor, angústia, insegurança, temores. Jesus pode nos encher de sua graça e salvação. Foi isto que ele fez na cruz, quando deliberadamente se dirigiu para o calvário para morrer em nosso lugar e suprir nossa necessidade mais profunda: Nossa dívida impagável pelos nossos pecados. A morte de Cristo providenciou tudo que era necessário, para que nossa dívida fosse resgatada. Ele supriu nossa escassez, nossas perguntas sem respostas, nossa angústia para nos livrarmos dos débitos assumidos pela nossa inconsequência e gerados pelos nossos pecados. A cruz, satisfaz a justiça de Deus, e resolve a questão da nossa impotência e incapacidade de gerar nossa própria história. Jesus enche nossa botija de azeite, derramando sobre nós sua graça e seu Espírito Santo.
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