Introdução
A fé cristã enfrenta desafios complexos no mundo contemporâneo, que exigem reflexão e resposta dos fiéis. Entre os desafios estão o secularismo e relativismo. Com a crescente secularização da sociedade, e a diminuição da influência da religião na vida pública e privada. O relativismo moral, que questiona a existência de verdades absolutas e valores universais, colocando em xeque os princípios éticos do cristianismo. A ciência, que constantemente apresenta explicações para fenômenos antes atribuídos à fé, gerando questionamentos sobre a relação entre ciência e religião. As tecnologias digitais, com novas formas de comunicação e informação e disseminação de informações falsas. O pluralismo religioso e cultural, que tenta fazer com que tudo seja igual, sem diferenciação. As questões sociais e éticas, como aborto, casamento entre pessoas do mesmo sexo, eutanásia e identidade de gênero, que exigem posicionamentos claros da fé cristã em relação a questões complexas e a luta por justiça social e igualdade, que desafia os cristãos a colocar em prática os princípios do amor ao próximo e da solidariedade.
Nossa tem sido constantemente desafiada.
Este texto nos mostra como é complexo se relacionar com um mundo pagão dando respostas cristãs. Como ser crente num mundo secular, idolatra, ideologizado. Estes três rapazes do texto: Hananias, Mizael e Azarias, eram articulados e inteligentes. Por esta razão foram trazidos para “Ensinar a língua e a cultura dos caldeus”, aos caldeus (Dn 1.4). Não é impressionante! Rapazes de outro país são convidados para dar curso de pós-graduação sobre a cultura do país opressor?
Este texto nos traz pelo menos quatro lições.
1. A Prova extrema – (Dn 1.15) Ajoelha ou morre! Muitas vezes somos desafiados a continuar crendo em Deus, correndo sério risco de perder popularidade, aceitação, reconhecimento, posições, dinheiro e até mesmo a vida.
Estes jovens foram desafiados a afirmar suas convicções diante da ameaça. Eles foram aprovados. Será que seriamos? Em alguns lugares, afirmar suas convicções pode significar a perda do trabalho. O mundo universitário sempre defende a liberdade de ideias, mas se você expressa suas convicções em determinados espaços, as portas vão se fechar.
Existe hoje uma ideologia de ideias. Uma tirania de conceitos. Se você defende uma linha de pensamento contrário ao pensamento marxista numa universidade secular, você nunca será aprovado num curso de mestrado ou doutorado. As pessoas que se afirmam como livres para pensar, criaram uma estrutura de pensamento que não admite questionamentos de suas ideologias. Ou você se ajoelha, ou morre!
Encontramos esta mesma prova em quesitos de popularidade. Se você não faz o jogo em determinados grupos na escola, ou no trabalho, você não é aceito, você será cancelado. Você precisa ser ideologicamente correto. E isto significa aceitar as normas e ética.
Se Misael, Azarias e Hananias negociassem, eles não correriam risco. Mas ao mesmo tempo Deus não poderia revelar sua glória. A atitude deles vai gerar um descompasso no meio daqueles homens pagãos, e um hiato na história idolátrica da Babilônia. Existem aspectos a serem considerados naquela cultura, que estavam até então desconhecidos. Aquele quarto homem que aparece na fornalha não era dos filhos dos deuses, mas era o filho de Deus.
A única coisa que a fornalha pode queimar foram as cordas os prendia e os amarrava. “Só quem sofreu pode avaliar quem sofre”. (Sérgio Pimenta) Aqueles homens pagãos começam a entender que Deus conhecia o povo de Israel.
Aqueles jovens não negociam suas convicções, caráter e valor. Não vendem sua alma. É fácil barganhar, quando privilégios estão sendo dados. Vivemos na cultura das negociações. Não estariam “prejudicando ninguém” e só precisavam se curvar. É muito difícil ser fiel quando você tem aquilo que o mundo deseja: beleza, inteligência, charme. O mundo procura homens e mulheres assim. Não foi esta a mesma proposta a Jesus? “tudo isto te darei se prostrado me adorares?”.
Eles não ficam exigindo prova de Deus para serem fiéis. (Dn 3.15-18). Não era fidelidade “condicionada” a determinadas exigências de adoradores. Não pediam um “sinal”. Muitos na história foram fiéis e morreram por Jesus. Deus estava no centro, e isto era o que importava.
Mas nem sempre o povo de Deus agiu desta forma. A Bíblia afirma que o povo de Deus “tentou a Deus no deserto e morreu” (Sl 78.18). como se tenta a Deus? Jesus fugiu desta tentação. “Não tentarás ao Senhor teu Deus”. Deus está no centro de suas decisões – antes de tudo ele é Deus... para aqueles jovens a equação era simples: “somos de Deus, ele tem poder para nos livrar, se quiser, mas se ele não quiser, estamos prontos para morrer!” Esta é a prova extrema (Dn 1.15): “Ajoelha ou morre!”
2. A confiança inabalável – “E quem é o Deus que vos poderá livrar de minhas mãos?” (Dn 3.15)
Eles serviam a um Deus que exigia total fidelidade. A resposta deles revela como seguir a Deus era algo claro nas suas mentes: “Se o Deus aquém servimos quer nos livrar, ele nos livrará; senão, fica sabendo, ó rei, que não ajoelharemos.” A posição que eles assumem era indiscutível. Não dependiam do que Deus iria fazer para que se submetesse ao princípio essencial que aprenderam em casa, que fazia parte do Shemah hebraico: “Ouve Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amaras, pois, o senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda tua alma e de toda a tua força.” (Dt 6.4-5) Eles não iriam discutir os mandamentos de Deus, eles apenas precisam obedecer. Não precisavam explicar, apenas se render. Se Deus quer livrar, ele fará, se não, eles simplesmente morreriam.
Diante das provações ficamos muitas vezes cheios de crise por causa das aflições. Deus nos ama?
Pare um pouquinho. Dê uma olhada no seu pé... Você já parou pra considerar que está com pé na cova? O negócio não é morrer, mas o que você faz entre o dia em que nasceu e sua partida. Seus amigos morrerão, seus queridos, seus inimigos, seus parentes. É só uma questão de quando. A morte é a mais democrática de todas as coisas. Todos morreremos.
A questão não é a morte em si, mas se você “estará firme diante do Senhor” na hora que tiver que se apresentar diante dele. “Estará firme o teu coração? Estarão fortes as tuas, nos dias em que eu tratarei contigo? Eu, o Senhor, o disse e farei.” (Ez 22.14). Esta é a pergunta que Deus faz ao povo através do profeta Ezequiel.
Liberdade!
No dia 10 de Fevereiro de 1614, a Igreja Católica autorizou a publicação de uma biografia de Edmund Genninges (1567-1591), escrita pelo seu irmão, John Genninges. Edmund foi um padre cruelmente martirizado durante o reinado da Rainha Elizabeth I. Uma das mais comoventes passagens desta biografia é encontrada numa carta escrita por Swithune Welles, outro sacerdote que esteve preso com Edmund e foi executado junto com ele. Nesta carta, Welles discute a questão da liberdade, o significado que seu sofrimento e prisão teve em sua vida. Esta passagem ecoa nos sentimentos de muitos outros cristãos aprisionados por sua fé em muitas épocas, de Paulo a João Bunyan, de Alexander Solzhenitsyn a Jean Jaques Lê Balleur, que foi executado no Brasil numa expedição missionária Calvinista, no início da colonização brasileira, na Ilha de Villegaignon, no Rio de Janeiro.
Sua carta diz:
“Eu não tenho razão para reclamar da brutalidade da prisão, considerando os seus efeitos, porque eu não tenho depositado meus afetos neste mundo vão. Eu renunciei ao mundo antes de ter sido aprisionado, quando tomei a minha decisão de seguir a Cristo e me batizar. Portanto, não me interessa em que lugar eu esteja, porque eu fiz um voto de nunca pertencer a este mundo. Minha expectativa no tempo que se aproxima, é que Deus me assista com sua graça para realizar minha missão, para continuar a viver até o final de minha existência. Finalmente, eu recuso todas as comodidades, prazeres, deleites, para me dedicar à prazerosa tarefa de servir ao Senhor, onde se encontram toda a perfeição e todos verdadeiros prazeres. Além do mais, na minha forma de avaliar, é melhor ter o corpo preso que nossa alma escravizada”.
3. O livramento incomum
Incomum porque nem sempre Deus livra. Hebreus 11 fala da galeria de heróis bíblicos que morreram por causa de sua fé. A história está repleta de mártires. Pessoas que morreram por causa do seu testemunho e da sua fé. Sempre surgem doidos como Nabucodonozor, e eles não tem piedade contra o povo de Deus. Tem gente que nunca vai para a fornalha, nem para a cova dos leões, porque é capaz de negociar, mas milhões de pessoas fieis que mantiveram sua fé em Deus diante das ameaças, tortura e perseguição, e se recusaram a negá-lo foram mortos. Tais pessoas não consideram “salvar a pele”, nem serem aceitos ou terem uma promoção, mais importante que a fidelidade. Jesus foi claro: “Quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á, mas quem perder a sua vida por causa de mim, será salvo”.
Hebreus 11 nos relata os heróis da Bíblia, descreve o time de pessoas que fizeram de sua fé em Deus sua única agenda e morreram pela sua fidelidade. (Hb 11.35-38) neste texto de Daniel 3, estes três homens foram salvos da fornalha, mas milhares morreram nela. Eles enfrentam o rei, porque sabem que ser fiel a Deus é uma boa razão para morrer. Muitos possuem uma fé light, flexível, que se move entre a verdade e a mentira. Só a fornalha diz se nossa fé é incondicional, que não se escandaliza com a dor. A fornalha revela se estamos atrás de Deus ou atrás dos benefícios que ele pode nos dar. A fé capacita a verdade revelada de Deus ao invés da verdade oculta. Fornalha diz se eu quero pagar o preço ou não. A fornalha não está preocupada se a coisa “dá certo”, ou não, mas se glorifica a Deus ou não.
Depois de jogarem estes três homens na fornalha, Nabucodonosor “se espantou e levantou depressa.” (Dn 3.24) Em hebraico, literalmente, ele “estremeceu”. O que acontece é surpreendente. Jogaram três homens na fornalha, mas agora veem quatro homens andando. Tem um quarto homem “Vejo quatro homens soltos, que andam passeando dentro do fogo, sem dano algum; e o aspecto do quarto é semelhante a um filho dos deuses.” (Dn 4.25)
Uma pergunta que pode surgir na mente do leitor é a seguinte: “Onde está Daniel?” Certamente ele não estava junto, mas foi ele quem narrou este texto e deixou este relato escrito para nós. Isto nos leva a entender outro aspecto importante: “Nem todo servo de Deus tem a mesma prova.” Provação é parte do currículo de viver. A casa só descobre se mantem em pé, na crise. A prova extrema é quando permanece na fé ou morre, mas cada um de nós tem crises, dores, experiências diferentes. Cada um de nós é provado de forma diferente.
A verdade é que somos um povo fraco. É comum encontrarmos pessoas paradas no tempo porque acham que não tiveram oportunidade na vida, ou que passaram por experiência traumática na infância, ou porque não são inteligentes. Meus irmãos, a pergunta é a seguinte: Quem não tem trauma? Viver é traumático. Nascer é trauma: depois de viver 9 meses na barriga, chega a hora que a mulher. Espreme para o beber sair. No hospital o médico diz: “aperta! Força!” se você não sair, tiram à força. Quando sai, chora, se não chorar, apanha.
É muito comum encontrar pessoas justificamos suas atitudes pelas suas doenças. Pare de colocar a culpa no seu borderline, na sua depressão, no seu TDH. Você se justifica desta forma, mas sua família, seus colegas de trabalho, a vida não vai facilitar para você quando você tem limitações. É preciso lutar para superar nossas deficiências e não transformar nossas doenças numa muleta e nos justificarmos.
A fornalha revela qualidade e o quilate da fé. Revela se a soberania de Deus é algo que faz sentido quando a vida traz o absurdo. A fornalha nos mostra qual é o meu preço para salvar minha pele, quando eu minto, traio ou nego a minha fé. Até onde a verdade do Evangelho realmente faz parte da vi
A fornalha assume sua expressão mais violenta nas igrejas perseguidas por ideologias, governos ditatoriais, marxistas ou por religiões.
Um grupo de nossa igreja teve a oportunidade de visitar a Igreja presbiteriana de Cairo, no Egito. Uma igreja fiel, com 7.000 membros, que precisa ser protegida pelos soldados do exército, dia e noite, que formam barricada nas ruas para protegê-la de grupos radicais. Eles continuam ali na cidade, vendo pessoas senso salvas através de sonhos e visões com o Cristo ressurreto. Nós tivemos um tempo de adoração naquele lugar e ficamos profundamente abalados. Como conseguem continuar firmes? Demonstrando a graça de Deus no meio daquela nação muçulmana? Deus vai dando livramentos e aquela igreja tem crescido em meio às ameaças.
4. Convicção inabalável. Este é o último aspecto que queremos destacar. Aqueles homens estavam nas mãos de um Deus santo, senhor de suas vidas, que tem a liberdade de fazer o que deseja fazer. A presença de Cristo não elimina o sofrimento, mas ilumina o sofrimento. Deus tem liberdade para fazer de nossas vidas o que bem desejar. Esta é a prerrogativa deles. Não servimos para sermos libertos. Libertação é coisa que Deus decide ou não conceder.
Lamentavelmente hoje em nossas igrejas a Bíblia não é regra de fé e prática: é coaching. Igrejas uso luzes e sons que viciam o cérebro e transformam os cultos em ambientes hipnóticos. Perdemos a compreensão de que aconselhamento espiritual é bíblia e oração, não ficar arranhando os traumas de ninguém. Precisamos desenvolver uma cosmovisão bíblica, ler com profundidade a palavra de Deus, estudar teologia. Se não sabe nada é porque não estudou, há muita chance para crescer, e estudar, em todo lugar. Dr. Elon Goncalves, que foi presbitério de nossa igreja em Anápolis gostava de repetir: “Basta aprender a ler. O resto tá tudo ai!”
Toda justificativa apenas mascara a incompetência. Leia grandes porções da bíblia, estude. Se Deus não quer me dar, não quero. Não precisamos temer poderes transitórios porque o nosso temor deve ser o de ferir a Deus. “Responderam Sadraque, Mesaque e Abede-Nego ao rei: Ó Nabucodonosor, quanto a isto não necessitamos de te responder.17 Se o nosso Deus, a quem servimos, quer livrar-nos, ele nos livrará da fornalha de fogo ardente e das tuas mãos, ó rei.18 Se não, fica sabendo, ó rei, que não serviremos a teus deuses, nem adoraremos a imagem de ouro que levantaste.”(Dn 4.16-18). Se Deus quer... fará... se não... não serviremos a outros deuses...
Quando Paulo aconselhava seu discípulo Timóteo, que estava enfrentando uma igreja difícil e complicada, ele exortou: “Lembra-te de jesus ressuscitado entre os mortos.”
Aplicação:
A. Sua vida só muda se decidir e fizer, porque se decidir e não fizer não muda.
B. Temos que sair da relação de um povo mimado, para um povo obediente.
C. Eu não sei o que Deus fará de minha vida, mas eu devo, de forma obediente, ser fiel. A fidelidade de José o levou para a prisão, pela segunda vez, mas a prisão era o caminho para o palácio. Ela não sabia que sua fidelidade o levaria ao palácio, ele simplesmente decidiu ser fiel.
D. A fidelidade de Cristo não o livrou da morte, mas foi a razão de sua morte. Ele não morreu por ser infiel, mas por ser fiel.
Aqui está o centro do Evangelho. A morte de Cristo era o caminho de Deus para resgate de seu povo. O lugar mais assustador e o destino mais cruel, tornou-se no lugar onde a graça mais preciosa de Deus se revelou.
A fidelidade destes rapazes o levou à fornalha. Mas sua fidelidade foi também o meio de Deus se manifestar no meio de um povo pagão, e se tornar conhecido daquele império. O texto não diz que Nabucodonosor se converteu, mas que ele ordenou a todos que seguissem o Deus de israel, “porque não há outro Deus que possa livrar como este.” (Dn 3.33)
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