Introdução: Nosso moderno mundo sofre crise de autoridade. A autoridade precisa de uma força por detrás de si, para que possa exercer seu ofício. Respeitamos os policiais, porque suas fardas os identificam como tal. Sua autoridade imposta pelo governo exige nossa submissão; há um pressuposto por detrás da autoridade. O Estado, fonte de autoridade, nomeia pessoas para exercerem ofícios sobre os cidadãos pela autoridade que lhes foi outorgada.
Relendo o Evangelho de Marcos, fiquei deslumbrado com o número de vezes que este Evangelista tenta demonstrar a exousia (autoridade) de Cristo. Este tema de sua autoridade é muito comum nas cartas paulinas, mas assume uma nota marcante nos escritos de Marcos. Existe uma discussão muito clara em Marcos sobre a fonte da autoridade de Jesus, no cap. 11.27-33 Jesus não tenta responder a pergunta que os sacerdotes, escribas e anciãos lhe fizeram. Pelo contrário, força-os a refletir sobre a autoridade de João Batista, colocando-os numa situação de neutralidade condenatória. Jesus responde da mesma forma que eles, sem demonstrar interesse em discursar sobre a fonte de sua autoridade.
Estes homens eram todos sacerdotes, que criam o cargo que possuíam determinava a autoridade que tinham diante de Deus. Este texto vai nos falar sobre Jesus e sua fonte de autoridade.
De onde Jesus recebia sua Autoridade?Em Marcos vemos seis fontes:
1. Sua coerência de vida – Não há ruptura entre Palavra e Ação. Sua mensagem se autenticava na experiência. Quando João Batista se encontra em dúvida, envia mensageiros para perguntar a Jesus se ele era o Cristo ou deveriam esperar outro. Sua resposta foi: “Ide e anunciai a João o que vedes. Os cegos vêem, os paralíticos andam e aos pobres lhes é anunciado o Reino de Deus”. Jesus não argumenta, mas demonstra.
Sua autoridade evidencia sua coerência de vida, ao ensinar, não como os escribas. (Mc 1.22).
2. Sua intimidade com Deus – Outro fator que dá a Jesus esta intrigante autoridade, que leva os principais lideres a indagá-lo, era seu relacionamento com Deus. Seu caráter era forjado junto ao Pai Celestial. A Bíblia afirma que saia "alta madrugada" para orar (Mc 1.35), e sua intimidade com Deus se revelava na sua palavra que incomodava e consolava os ouvintes. Sua autoridade vinha de seus "retiros espirituais" (Mc 6.30). Jesus não sofria a tirania do urgente, antes reservava tempo para reflexão.
Perguntaram ao Rev. Antonio Elias, já falecido avivalista da Igreja Presbiteriana do Brasil, o que era unção, e ele respondeu com naturalidade: “Uns são, outros não são”. Assim era a autoridade de Cristo que brotava do relacionamento com Deus, assim como os lideres do Sinédrio teriam posteriormente a mesma reação com os discípulos, quando lhes ordenaram que se calassem, mas sabiam que “haviam estado com Cristo” ressurreto (At 4.13).
Pastores e líderes facilmente evocam sua autoridade a partir da delegação de concílios e pelos títulos recebidos. Em Mc 11.27-33, vemos esta mesma disposição nos principais sacerdotes. “Com que autoridade fazes estas coisas?”. Qual foi o órgão ou a convenção que te ordenou a fazer isto?
3. Sua consciência vocacional – Outro elemento que gera autoridade em Cristo para que exerça seu ministério de forma tão efetiva é a consciência do porquê estava naquele lugar, fazendo aquilo que fazia. Creio que muitos pastores encontram-se em cidades, ou nas obras missionárias, sem saber de fato que estão ali, sem terem uma clara consciência da vocação divina. Isto faz toda diferença na efetividade da obra.
Marcos procura revelar quão profundo era o sentimento de Jesus em relação ao seu ministério. Jesus não titubeia quando sua vocação está em evidência. "Para isto vim..." (Mc 1.38). Sua palavra evidencia sentido e propósito. Pastores e líderes barganham sua vocação quando não sabem qual é o seu chamado.
4. Sua identidade - relação com o Pai. Outra fonte de autoridade era a clara compreensão de sua identidade. No incidente que demonstra de forma mais veemente sua autoridade, expulsando cambistas e jogando as mesas dos mercadores no chão, bastava que quatro comerciantes daquele se reunissem, para dar-lhe uma surra e tirá-lo dali, mas ninguém tocou em Jesus, porque a forma como se portava evidenciava sua comunhão com o Pai. "A casa de meu Pai será chamada casa de oração..." (Mc 11.15-19). Noutro incidente, quando envia os discípulos para buscarem o jumentinho, ele apenas declara "O Senhor precisa dele". Jesus se percebe Senhor. Esta era a sua identidade (Mc 11.1-11).
Ao ser questionado sobre sua fonte de autoridade, não se preocupa em responder. A parábola dos lavradores maus de Mc 12, revela sua identidade e consciência que tinha de ser herdeiro e filho legítimo da vinha.
Jesus queria muito que seus discípulos firmassem também sua autoridade nesta relação de amor com o Pai. Quando os mesmos retornam da missão realizada de 2 em 2, de acordo com a narrativa de Lucas, voltam radiantes e dizendo: “Até os demônios se nos submetem em teu nome”, e Jesus afirma: “Alegrai-vos não porque os demônios se submetem, mas porque os vossos nomes estão escritos no livro da vida” (Lc 10.20). Jesus acentua não a vocação de poder e de guerreiros, mas de filhos amados do Pai, e isto tem a ver com identidade.
5. Sua absoluta liberdade em ser gente, ser humano, com aqueles que eram desumanizados – Por mais paradoxal que possa parecer, sua autoridade brotava do seu despojamento da natureza divina e por assumir sua humanidade. Aquilo que já foi dito sobre Jesus é verdade. Ele era “sobrenaturalmente humano”. Jesus estava livre para ser humano, e por isto não temia censuras e questionamentos. Seu compromisso era com Deus, não com leis e estruturas humanas. Quando você não teme o julgamento dos homens, encontra uma grande liberdade. Em Mc 2.15-17 ele se assenta-se com publicanos (traidores da nação), e gente de caráter reconhecidamente refutável. Em Mc 14.3-9, aceita estranha adoração de uma mulher cujos convidados murmuravam pelo simples fato de tê-la presente. Em Mc 14.17-21, convida para assentar à mesa o homem que haveria de traí-lo, mesmo sabendo de suas intenções malignas.
6. Sua vitória sobre a morte – Mas nada, absolutamente, demonstra mais sua autoridade que a vitória que obteve sobre a morte. Ali os discípulos, que antes já percebiam a autoridade de Deus sobre sua vida, se rendem e passam a chamá-lo de “Meu Senhor e Deus meu” (Jo 20.28). A expressão do anjo, no final do livro de Marcos, revela “Não vos atemorizeis; buscais a Jesus, o Nazareno que foi crucificado; ele ressuscitou, não está mais aqui; Vede o lugar onde o puseram”(Mc 16.6).
Apocalipse é um livro repleto de adoração ao Cordeiro que foi morto, mas vive, e está assentado ä direita do Pai, de onde há de vir para julgar vivos e mortos.
Sua autoridade, irrefutável e perene, pousa sobre seu poder de não ver corrupção em seu corpo, mas levantar-se de entre os mortos.
Cambridge, MA Quarta-feira, janeiro 07, 1998 - -4 graus celsius.
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