quinta-feira, 14 de julho de 2016

Mc 14.3-9 Maria fez o que pode!



Você já escolheu seu epitáfio?

Bem... deixe-me explicar o significado deste termo antes de continuar, pois sei que metade das pessoas que leem este texto podem não conhece-lo.
Epitáfio é a frase que lemos nos túmulos das pessoas. É uma tentativa de definir aquilo que as pessoas foram ou dar uma síntese de sua vida.
Certa vez, Ruth Graham, esposa do conhecido evangelista Billy Graham estava com ele numa estrada em reformas. Depois de passarem por trechos acidentados e algumas paradas, o Departamento de Estradas colocou a seguinte frase no final: “Fim das obras. Obrigado pela paciência!”. Naquela hora, Dona Ruth disse ao seu esposo: “Esta é a frase que gostaria estivesse no meu túmulo”. E quando ela morreu e foi sepultada na Carolina do Norte, esta frase foi colocada no seu tumulo.

Veja alguns famosos epitáfios:
Cardeal Richilieu: “Aqui jaz o grande cardeal que fez na vida o bem e o mal. O bem que fez, fez muito mal; o mal que fez, fez muito bem”.

Marques de Sade: “Se eu não vivi mais, foi porque não deu tempo”.

Miguel de Unamuno: “Só peço a Deus que tenha piedade com a alma deste ateu”.

Spike Milligan: “Eu disse que estava doente...”

Não sei se este assunto é o melhor para um sermão, porque algumas pessoas nunca pensaram na sua própria morte, e nem querem falar sobre isto, mas o meu epitáfio eu já escolhi, e espero que sintetize minha curta história sobre a terra. Foi o que Jesus disse sobre Maria: “Samuel fez o que pode!”
Esta é a afirmação de Jesus sobre Maria, esta mulher que se aproxima dele, na casa de Simão, quebra um caro vaso de alabastro com preciosíssimo perfume de nardo puro e derrama o balsamo sobre sua cabeça.

Que cena estranha...
O cheiro enche a casa.
O burburinho surge entre as pessoas que falam baixinho. Muitos não entendem o gesto da mulher. Os discípulos revelam sua irritação: “Para que este desperdício?”(Mt 26.8), e as pessoas presentes também. “Este perfume poderia ser vendido por mais de trezentos denários, e dar-se aos pobres. E murmuravam contra ela” (Mc 14.4). A lógica da pragmaticidade atinge em cheio o coração daquelas pessoas. Alguns até mesmo bem intencionados reagem. Outros nem tanto como Judas, que sendo o tesoureiro, preferia ter o dinheiro em mãos – e a Bíblia afirma que ele não era honesto com o uso daquilo que entrava. “Isto disse ele, não porque tivesse cuidado dos pobres, mas porque era ladrão e, tendo a bolsa, tirava o que nela se lançava” (Jo 12.6). Era tesoureiro infiel.

E você. Se estivesse lá, qual seria sua reação?
Este texto desafia, ainda hoje, meu pragmatismo, e certamente muitos dos meus leitores. Achamos que devemos dar para as pessoas, mas não nos sentimos felizes em dar para Deus. Achamos que isto não é tão importante. Não queremos adorar a Deus com nossos bens, nem servir a Deus com o dinheiro. É fácil comprar um carro caro, fazer viagens caras, comprar finas roupas, relógios e bolsas com preços que só realezas podem pagar, mas não temos liberalidade em adorar a Deus com nossos bens, nem trazer ofertas extravagantes como fez Maria.
Você já fez alguma doação extravagante e generosa?

Eu gostaria de ouvir de Jesus o que ele disse sobre Maria: “Ela fez o que pode”. Nem mais nem menos...

Duas razões são óbvias: Deus não quer o que não posso, mas Deus não quer que eu deixe de fazer o que posso. As duas declarações são importantes.

Primeiro, Não posso deixar de fazer o que posso...

Deus não vai exigir o que não sou capaz de fazer.
Existe muita demanda hoje em dia dos nossos talentos, recursos e tempo, e isto gera em nós muito sentimento confuso: raiva, impotência, culpa, indiferença.
Quando Deus retorna para ajustar as contas com aqueles a quem foram entregues os talentos, Deus não espera receber daquele que tinha apenas um, cinco talentos multiplicados, mas ele tinha a expectativa de que aquele que recebeu um, lhe retornasse com a proporcionalidade necessária.
Não é assim que nos ensina a Palavra: “A quem muito foi dado, muito será exigido?

Na medida em que Deus me abençoa, ele espera que eu use aquilo que ele me deu, proporcionalmente, para abençoar seu reino. Deus não vai exigir de nós aquilo que ele sabe que não somos capazes de fazer.
Você acha que a igreja é sustentada por ofertas de quem ganha muito? Na grande maioria das vezes, infelizmente, não é. A igreja é sustentada por aqueles que são fiéis. Existem aqueles que ganham muito, mas infelizmente não investem na obra. Não fazem o que poderiam fazer. Ficam aquém daquilo que recebeu. Por isto, a melhor medida da fidelidade não é o quanto você recebe, mas o quanto você dá proporcionalmente.  Não fazem o que deveriam fazer.
Outro exemplo: Muitos cristãos são pessoas com enormes recursos técnicos, grandes talentos na área administrativa, social e jurídica e que poderiam colocar seus dons e serviços a favor do reino, mas não sabem aproveitar de sua influência, expertise e conhecimento para promover o reino de Deus.
Não fazem o que podem...

Há grandes riscos quando consideramos isto. O maior deles: fazer pouco e achar que é bastante. Fazemos mediocramente, limitadamente, damos pouco do nosso tempo e achamos que é demais. Falsa avaliação dos recursos. Deus quer o que você pode fazer, então não faça menos do que aquilo que você pode fazer. Não podemos ser omissos nem passivos. Podemos fazer mais, com excelência. Não podemos chegar no final e ouvir a declaração de Deus: “Servo mau e negligente”.
Muitos aqui devem ter assistido o filme “A lista de Schindler”. O Nazismo estava mandando para o campo de concentração milhares de judeus para serem exterminados, e Schindler, um empresário, a pretexto de precisar de mão de obra qualificada e técnica, começou a contratar pessoas porque assim elas seriam poupadas da morte. Como resultado, mais de mil pessoas foram salvas. Muitas vezes ele usava dos recursos financeiros para dar favores às autoridades nazistas que cediam os homens para suas fábricas.
Quando o pesadelo do nazismo encerrou, seus funcionários sabiam que só estavam vivos por causa de sua intervenção direta e o uso de seu prestigio para protegê-los, e lhe fizeram uma homenagem. No entanto, ele começou a se culpar, olhando para seu caro relógio e seu lindo carro e dizendo: “eu poderia ter vendido meu carro e contratado mais cinco funcionários”. Ele se sentia triste por não ter feito mais...
É muito arriscado chegarmos ao final da vida, com a sensação de que poderíamos ter feito mais, que nossa saúde, talento e recursos poderiam ter abençoado mais vidas.
Estava no funeral de um colega, quando um pastor fez o seguinte e dolorido discurso na hora do sepultamento “Este meu irmão, estava sempre me cobrando que o visitasse. Várias vezes disse que viria, e não o fiz. Lamentavelmente só cheguei para seu funeral. Poderia ter vindo antes, mas infelizmente não o fiz.”
A preguiça, a desculpa, o descaso, o conforto e a indolência são inimigos letais da operosidade.

Maria fez o que pode...
Gostaria de ouvir Deus dizendo a mesma coisa a meu respeito: “Samuel fez o que pode!”
Não deixe de fazer aquilo que Deus lhe deu condições de fazer.

Segundo, Não posso fazer o que não posso...

Este é o outro lado da moeda.
Se na primeira premissa aprendemos que Deus não quer que deixemos de fazer o que podemos, vemos agora, que Deus não quer o que não podemos dar.
Tenho um colega a quem aprecio muito. Ele é um genial professor de hebraico, um grande mestre, editor de livros. No entanto, percebeu, que não tem vocação para ser pregador. As pessoas, contudo, cobravam dele uma performance nesta área para a qual ele não se sentia adequado, até que um dia ouviu uma frase libertadora: “quando eu sei que não sei, não dói”.
Esta é a vantagem de envelhecer. Começamos a perceber que existem certas coisas que Deus não nos chamou para fazer, e podemos lidar com as limitações sem nos sentirmos culpados.
Estou absolutamente certo de que quando vier outro pastor, no futuro, e me substituir na igreja onde pastoreio, ele vai ficar impressionado com a quantidade de falhas que deixei no ministério. A verdade é que, eu só posso fazer o que posso... mas não quero deixar de fazer o que posso...
Na medida que envelhecemos, algumas coisas que fazíamos não conseguimos fazer mais. Isto pode gerar em nós sentimento de inadequação e vazio. Quando meu sogro aposentou do pastorado aos 65 anos, ele continuou ministrando em salas de escola dominical, dirigindo reuniões de oração, fazendo visitas (que sempre foi o ponto forte de seu ministério), e sustentando o pastor de sua igreja em oração e amizade. Suas forças diminuíram, mas ele ia encontrando novas formas de realizar seu ministério e produziu frutos, dentro de suas limitações de idade e saúde, até o último dia em que conseguiu trabalhar.
Ao envelhecermos, podemos continuar fazendo: orando, aconselhando, cuidando, ligando, encorajando os jovens.
Muitas vezes sinto que poderia fazer mais e me sinto culpado de não fazer tanto quanto é necessário, diante de tão pouco que tenho feito.
Há muita necessidade no mundo. Jesus afirmou que “os pobres sempre estariam conosco”, citando um texto de Deuteronômio que acrescentava: “E sempre que quiserdes, podereis fazer-lhes o bem”. Faça aquilo que você tem condições de fazer. Use sua empresa, seus dons, sua criatividade, seus recursos, seu dinheiro, para promover a vida e glorificar a Deus.
Tudo quanto vier à mão para fazer, faze-o conforme as tuas forças, porque no além, para onde vais, não há obra, nem projetos, nem conhecimento, nem sabedoria” (Ec 9.10).
Paulo afirmou no final de sua vida: “Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé. Já agora a coroa da justiça me está guardada, a qual, o Senhor, o justo juiz me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos quantos amam a sua vinda” (2 Tm 4.7-8). Que testemunho positivo!

Conclusão:
Maria fez o que pode...
E não nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo ceifaremos, se não desfalecermos. Por isto, enquanto tivermos oportunidade, façamos o bem a todos, principalmente aos domésticos da fé” (Gl 6.9-10).

Não faça menos do que Deus lhe deu capacidade para fazer.

Mas antes de encerrar, preciso falar de duas coisas a mais:
Primeiro, toda vez que falamos de coisas que precisamos fazer e "devemos fazer", os resultados podem ser desastrosos, na perspectiva do Evangelho. A Lei, que foi a primeira aliança, falha e ineficaz trabalha neste "modus operandi". Tudo que se concentra no EU, na capacidade humana de fazer, no que eu posso fazer. O resultado é duplo: Orgulho e fracasso. Se eu consigo fazer aquilo que acho de deveria fazer, torno-me um fariseu, achando que Deus me deve algo, que estou conseguindo, e que o segredo é a minha carne, isto é, aquilo que eu posso fazer. Se não consigo fazer, sinto-me culpado e deprimido, deixo de olhar para a suficiência da cruz de Cristo e concentro-me, em demasia, em mim mesmo. desta forma perco a compreensão de que minha conquista não deve ser para minha auto promoção e sim para a glória de Deus.

Segundo, a realidade é que nunca faremos o suficiente. Porque? Por causa da natureza pecaminosa, da vida auto centrada, da timidez narcisista, da capacidade de nos justificarmos sem razão. Precisamos da obra de Cristo para nos capacitar.
Paulo pergunta na segunda carta aos Coríntios: “Quem, porém, é suficiente para estas coisas?” (2 Co 2.17), para em seguida responder: “A nossa suficiência vem de Deus, que nos habilitou para sermos ministros de uma nova aliança”(2 Co 3.5).
Por ser tão incompleto, tão carente, precisamos da obra de Cristo em nossa vida.
A Bíblia diz que Deus imputou a justiça de Cristo em nós. Isto significa que nossa justiça é insuficiente. Mas ele fez ainda mais. Ele colocou o seu Espirito de poder em nós para realizar sua obra. “Deus é poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou pensamos, conforme o seu poder que opera em nós”.
Esta é uma promessa maravilhosa.
Não quero deixar de ser operante, mas preciso de sua graça em mim...
Não quero deixar de fazer aquilo que Deus espera de mim, mas preciso de seu poder para fazer isto através de mim.


É isto que nos ensina o Evangelho.

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