É muito importante aprender a
orar, e uma das formas de se fazer isto é observando as orações dos homens de Deus
na história. Gosto muito dos “Book of prayer” dos anglicanos ingleses. Que
sensibilidade e profundidade havia em suas orações. Quando comparo suas orações
com as minhas confesso que me sinto envergonhado da superficialidade das
orações que faço.
Ler as orações de Paulo é um
grande estimulo para a oração. Apenas na carta aos Efésios vemos duas de suas
orações. Em Ef 1.15-19 ele descreve os temas de suas orações, e novamente o
vemos orando em Ef 3.14-19. “Por esta
causa me ponho de joelhos diante do Pai”. Havia uma causa, um objeto, um
conteúdo das suas orações, e quando lemos estes textos vemos quão distante
nossas orações encontram-se das orações bíblicas.
Paulo ora pelo “fortalecimento
espiritual” do povo de Deus. Ele sabe que o grande problema espiritual não é o
que fazem conosco, mas o que fazemos com aquilo que nos fazem. O problema não
são os vírus e bactérias que povoam o ar que respiramos, mas se o sistema
imunológico está em condições de lutar contra tais ameaças. O problema não é a
circunstância, mas o coração; não como as coisas estão do lado de fora, mas
como estão dentro. Por isto, Jesus antes de ordenar a tempestade que se acalme,
dirige-se aos discípulos, fragilizados e temerosos, para dizer: “Não temas, crê somente!”
O centro da oração de Paulo não era
a transformação política para que se tornasse mais favorável à igreja, mas para
que a igreja pudesse estar forte diante da perseguição e oposição.
A verdade é que culpamos o que
nos acontece, mas não consideramos quão frágil está o nosso coração para
resistir. Os infectologistas tem se debruçado por séculos em busca de uma
vacina para a malária, um mal que aflige tanto a raça humana. No dia em que
encontrarem a solução, esta vacina permitirá que o próprio corpo crie os
reagentes para combater esta devastadora enfermidade. Se o corpo tiver
condições de reagir, a enfermidade perderá seu poder. Da mesma forma, se o coração
estiver bem, seremos capazes de reagir às condições externas adversas.
O autor da música “sou feliz com Jesus”,
a escreveu depois de perder toda sua família num naufrágio. Originalmente a música
diz: “Está tudo bem com minha alma”. As circunstâncias não eram favoráveis, ele
estava num momento de luto e dor, mas o coração estava seguro. Paulo ora para
que o povo de Deus pudesse ser fortalecido mediante o Espirito no homem
interior. Quando o ser interior está desordenado e confuso, qualquer vento
externo nos ameaça.
Depois de orar por
fortalecimento, ele diz: “E assim habite Cristo
no vosso coração, pela fé” (Ef 3.17). Preste atenção no encadeamento das
ideias. Ele ora por fortalecimento, para em seguida afirmar: “E assim...” Ele
usa uma conjunção aditiva “e”, para demonstrar que as ideias estão
interligadas. Quando o homem interior é fortalecido, Cristo passa a habitar,
desta forma, em nosso coração.
O termo “habitar”, em grego e em
português, abriga diversas ideias. Originalmente a palavra que Paulo usa é habitar,
mas que poderia ser acrescentado o termo “ricamente”, fala de alguém que permite
que Jesus tenha liberdade, soberania e controle de sua casa, que tem a chave e
pode fazer as alterações e mudanças necessárias para o bom andamento da mesma.
É muito fácil permitirmos que
jesus habite em nossa casa, de outra forma.
Primeiro, pense na pessoa que é
um Visitante
numa determinada casa. Ela encontra-se ali por um breve
tempo, seus movimentos são bem limitados. Ainda que seja bem recebida e
tratada, possui quase nenhuma liberdade na casa. Sua estada é curta, e logo ela
vai em embora. Em muitas vidas Cristo habita desta forma. Ele está ali, por um
tempo, mas não tem liberdade de mudar os hábitos, a ordem dos móveis, os
movimentos familiares.
Em segundo lugar podemos pensar
no Roommate.
Esta é uma expressão inglesa para pessoas que compartilham o mesmo espaço,
pagam as contas de água, luz, internet, mas cada um vive na sua. Existem
regras, limites, mas não necessariamente intimidade. É um tipo de república, na
qual uma casa é alugada, mas a vida particular de cada um segue do jeito que se
quiser. Há uma área e regras comuns, mas nada além disto.
Terceiro, podemos falar de um Convidado,
ele é alguém que está passando uma temporada, eventualmente em razão de
estudos ou trabalho. Um quarto é disponibilizado para ele, mas ele raramente
toma refeição com a família, o tempo quase todo é gasto em trabalho ou estudo,
e eventualmente sequer será encontrado. Ele tem a chave da casa, mas sabe que
seu espaço é seu quarto. É apenas um convidado que amanhã volta para sua
origem.
Em quarto lugar, podemos falar de
alguém que recebe o outro por um tempo maior, a casa se torna disponível, mas
existem alguns espaços não permitidos, sem acesso. Comparo isto a pessoas que
compartimentalizam sua casa. Muitos recebem a Cristo desta forma, deixam claro
até onde ele pode ir, existem áreas com reserva de domínio, nas quais Cristo
não tem acesso.
Certa vez ouvi falar de um
pastor, que amargurado contra a liderança de sua igreja local dizia: “Na minha
casa tem um quarto no qual crio uma onça para comer presbíteros”. Não é muito difícil
termos quartos nos quais guardamos desafetos, mágoas e dores são muito comuns e
noutros onde cultivamos pecados de estimação.
Imagine o quarto da luxúria e da
lasciva. Não queremos que Jesus tenha acesso a este lugar de “privacidade”. Alguns
mantém o quarto da amargura e do ressentimento, nos quais abriga as tristezas e
ódios contra ofensores e feridas abertas. São as “reservas” onde Cristo não
pode penetrar. Outros ainda possuem o quarto da avareza, da forma como lida com
dinheiro, existe ainda o quarto da duplicidade, vida esquizofrenizada, do tipo
médico e monstro. As opções para este tipo de quartos de despejo, penumbras, mentira
e desonestidade são quase ilimitados.
No entanto, a adoração no NT
impõe alguns princípios:
A. Cristo,
sem reserva – Nada de exclusão, nem de discipulado sem senhorio. Muitos
querem seguir a Cristo mas acreditando que podem impor as regras do
discipulado. Acham que podem dizer para Deus como querem ser discípulos.
Neste caso, a regra é simples: Deixe
Cristo entrar onde você não quer que ele entre! Quando você não quiser perdoar,
por se sentir muito ofendido, diga a Jesus. “Estou temeroso de que você entre
neste canto escuro da minha residência, mas o Senhor precisa lançar luz neste
porão. Não quero perdoar, mas preciso querer perdoar”. Quando fazemos isto,
deixamos que Cristo tenha liberdade de fazer as reformas e mudanças
necessárias, liberdade de trocar os móveis,
de abrir novas janelas, fazer novos jardins, derrubar paredes.
Imagine uma pessoa com o quarto
da luxúria, e que no seu mais profundo intimo, não quer abandonar suas
tentações, mas é decide ser discípulo de Cristo, e agora o convida para
intervir neste espaço arriscado de sua existência, pede a Jesus para que
intervenha nesta área de sua vida. Afinal, Deus tanto executar em nós, tanto o
querer (vontade), como pode realizar (ação) Ef 2.13), se ele pode trabalhar
minha vontade, preciso urgentemente dele agindo em mim.
Desta forma, Cristo passa a
habitar ricamente. Não como transeunte, nem visitante incômodo, ou hóspede. Ele
mora na casa com todos os direitos.
B. Cristo,
sem fragmentação – Este é outro desafio. Ele pode agir em todas as
áreas da casa, não em apenas algumas.
Existe uma distorção complicada
na nossa teologia, que separa sagrado e profano, secular e espiritual. Achamos
que algumas coisas tem a ver com Deus, mas outras, não necessariamente. Isto é
um problema. Em quais áreas Deus deve agir?
Paulo afirma: “Quer comais, ou bebais, ou façais qualquer
coisa, fazei tudo para a glória de Deus” (1 Co 10.31). Tudo deve ser feito
para a glória de Deus! Até coisas simples como comer e beber. Desta forma, tudo
se torna englobado: Namorar, ganhar dinheiro, desenvolver amizades, brincar,
divertir, tudo deve ser sagrado, tudo tangenciado por Cristo.
Sempre corremos o grande risco de
eleger determinadas áreas onde queremos dar acesso a Deus e outras onde
acreditamos ser possível esconder.
Nada de deixar quartos fechados e
escuros, que não permitam o acesso de Cristo. Talvez nestes lugares, mais
obscuros, trancados, lugar da bagunça e caos, estejam as áreas mais urgentes de
uma intervenção. Convide Jesus, mostre a confusão e vergonha, ore para que ele
invada e jogue fora o lixo. Nada de espaços vedados à Cristo, nem quartos aos
quais ele não tenha acesso, mesmo as gavetas mais bagunçadas, onde você guarda
parafusos, elásticos, metais... deixe Jesus habitar os porões sombrios, as
despensas desordenadas e mal iluminadas.
C.
Cristo, sem cosméticos – O Evangelho
destrói as frágeis defesas que criamos para nos proteger da falsa integridade
que precisamos diante de Deus. É a tola tentativa de costurar folhas de
figueira para ocultar a nudez. Isto é próprio da raça humana. É adâmico.
No entanto, diante de Deus não se
esconde nada de bom ou de ruim. Representações e teatralizações, em última instância,
só enganam a nós mesmos. Deus não embarca nas tolas argumentações filosóficas que
fazemos para nos justificar, como Adão, tolamente tentou diante de Deus. A
mentira, ocultamento, duplicidade, não substituem a confissão e o
quebrantamento.
Não há quartos secretos ou
escuros demais nos quais possamos dizer a Deus: “No trespassing!”, nem há “reservas
de domínio”. A Bíblia afirma que já chegou a hora, em que os verdadeiros
adoradores do Pai o adorarão em espirito
e em verdade. Maquiagem não resolve o problema, apenas a sinceridade vale.
Já viram aquela tola tentativa
humana das pessoas dizerem às visitas: “Não reparem na bagunça da casa?” Será
que isto realmente funciona? Para Deus, seria melhor se disséssemos: “Senhor,
veja a bagunça e desordem desta casa, me ajude a organizar. Socorre-me!”
Quando meu filho era ainda
adolescente, ao voltar para casa depois de um casamento afirmou: “Pai, não dá
para começar namoro com uma garota em dia de festa”. Ele estava se referindo a
amigas de escola que ficavam deslumbrantes quando passavam por uma boa
maquiagem e uma boa boutique de roupas. Mas Deus não se impressiona com as
roupas que usamos. Quando Moisés subiu ao monte para se encontrar com Deus, ao
regressar, viu que seu rosto estava brilhando, e para conversar com os filhos
de Israel, decidiu usar um véu. Os dias se passaram e o brilho esmaeceu, mas
ele, ainda assim, continuou mantendo o véu por muitos anos, para que o povo de Deus
ainda acreditasse que ele tinha o seu rosto brilhando. Paulo afirma que “não somos
como Moisés”, pelo contrário, “onde está o espirito do Senhor, aí há liberdade”
(2 Co 3.17). Esta liberdade é para sermos autênticos, transparentes, sem
quartos secretos, sem lugares reservados em nossa casa onde Jesus é proibido de
entrar.
Conclusão:
Jesus disse à Igreja de
Laodicéia: “Eis que estou à porta e bato”
(Ap 3.20). Este texto não é evangelístico como normalmente o pregamos, mas
é o dono da igreja, Jesus, pedindo aos membros da igreja para poder entrar. A
Igreja de Jesus pode facilmente rejeitá-lo e impedi-lo de entrar. Jesus está do
lado de fora pedindo para entrar.
Não é muito difícil mantermos uma
relação ambígua e ambivalente em relação ao Evangelho. Por isto Paulo ora para
que a igreja de Éfeso fosse fortalecida de poder no ser interior, e assim, Cristo
pudesse habitar ricamente em seus
corações. Não mais como roommate, nem visitante, nem hóspede, mas tendo as
chaves da casa na mão, e com liberdade de andar em cada compartimento, fazendo
as necessárias mudanças e adequações, e assim transformando o ambiente em um
local que glorificasse seu nome.
Que Deus nos abençoe!
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