“Mas longe esteja de mim gloriar-me, senão na
cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pelo qual o mundo está crucificado para mim,
e eu, para o mundo”.
Paulo
faz uma afirmação muito estranha neste texto: “eu me glorio na cruz”.
Que estranho
paradoxo!
Como
alguém pode se orgulhar em algo tão infame e cruel?
A
lei afirma “maldito todo aquele que for
pendurado em madeiro” (Gl 3.13), pois é exatamente nisto que Paulo afirma
estar a sua glória.
Geralmente
nos gloriamos nos grandes feitos e conquistas.
O
que nos deixa orgulhosos?
O
emprego que temos, a faculdade que estudamos, o ambiente que frequentamos.
Temos
orgulho ainda do sucesso, da popularidade, da aclamação publica.
Nos
orgulhamos ainda de nossa reputação, honra, saúde, ética.
Talvez
da família que temos, das conquistas dos filhos.
Glênio
Paranaguá afirma: “A história do pecado é basicamente uma questão de glória
pessoal. A plataforma da distinção, o destaque da coluna social, a necessidade
do elogio, a busca da aprovação, os degraus do poder, os emblemas do
fardamento, os títulos nobiliários, os graus acadêmicos, as insígnias festivais
(...) Quanto menor, maior o salto do sapato”.
Paulo,
afirma que se glória na cruz.
Convenhamos...
a cruz não é assim tão glamorosa.
A
sexta feira da paixão é chamada em inglês de “Good Friday” (boa sexta), é
possível alguma coisa como esta? O dia da morte de nosso Senhor ser chamado de
boa?
A
cruz se parece muito mais um instrumento e declaração de fracasso que de honra
e orgulho.
Temos
aqui, o paradoxo da cruz.
Paulo
a coloca no primeiro plano. Ela é a fonte de seu orgulho. Ele bate no peito e
se firma neste lugar de horror e morte.
Como
Paulo chegou a esta conclusão?
Paulo
descobriu o poder que jorra da cruz, e quando ele descobriu isto, ele percebeu
que somente na cruz, poderia verdadeiramente firmar a sua glória.
A
experiência de Paulo
O Orgulho do currículo e da reputação
A
vida de Paulo sofreu uma reviravolta quando, em nome de sua religião, decidiu
perseguir, prender e até mesmo condenar cristãos à morte, mas teve um
inesperado encontro com Jesus de Nazaré. Sua experiência está detalhadamente
registrada em Atos 9. Ele tinha orgulho de sua religião, do seu povo e de suas
conquistas, e, em nome de Deus, queria defender suas tradições.
O que
aconteceu depois deste encontro foi transformador. Ele descobriu uma nova fonte
de vida, e fala detalhadamente de sua experiência em Fp 3.4-7. Ali ele relata
todas as coisas que um dia lhe fizeram se orgulhar. Sete referências do seu
currículo lhe davam muito orgulho: “circuncidado ao oitavo dia, da linhagem de
Israel, da tribo de Benjamin, hebreu de hebreus; quanto à lei, fariseu, quanto
ao zelo, perseguidor da igreja; quanto à justiça que há na lei, irrepreensível”
(Fp 3.4-6). Não é assim que fazemos? Começamos a enumerar coisas que nos torna
respeitáveis perante os homens, e, quem sabe, até diante de Deus.
Paulo
se orgulhava na tradição, na ética, na sua espiritualidade.
Muitos
lutam por isto: reputação, reconhecimento.
O
que Paulo descobriu que foi tão transformador? “Mas o que, para mim, era lucro, isto considerei perda por causa de
Cristo” (Fp 3.7).
Paulo
percebe quão pobre era seu currículo espiritual diante da obra de Cristo. “Sim, deveras considero tudo como perda, por
causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor” (Fp 3.8).
Ele
afirma que considerava estas coisas, outrora tão importantes, como refugo,
lixo, esterco. Nada mais.
O
encontro com Cristo e a descoberta da obra de Cristo transformou radicalmente
sua perspectiva. Seu orgulho agora era outro: Paulo queria “ser achado em Cristo, não tendo justiça
própria, senão a que é mediante a fé em Cristo, a justiça que procede de Deus,
baseada na fé” (Fp 3.9). Seu currículo não mais interessa, mas o currículo
de Jesus. O que ele fez agora era lixo, e sua justiça insuficiente. Ele queria
a justiça de Cristo.
O orgulho da competência
Este
aspecto, envolveu um duro aprendizado para Paulo.
Logo
após a sua conversão, agora com uma visão diferente acerca de Cristo com quem
ele se encontrou no caminho de Damasco, Paulo volta a Jerusalém para se unir a
igreja. Ele estava certo de que todos ficariam impressionados com sua história
e que seria fácil encontrar um lugar na comunidade cristã.
A
suspeita
Apesar
de toda sua disposição, o que ele encontra são as portas fechadas na sua cara.
A igreja de Jerusalém não o recebeu, nem o acolheu. “Tendo chegado a Jerusalém, procurou juntar-se com os discípulos, todos,
porém, o temiam, não acreditando que ele fosse discípulo” (At 9.26) Motivos
havia de sobra.
Ele
fora responsável pela acusação formal diante do Sinédrio, que resultou no
primeiro mártir cristão. Estevão foi apedrejado em praça pública, por seguir a
Jesus, e suas vestes foram deixadas aos pés de um jovem chamado Saulo (AT
7.58). Estudiosos afirmam que isto era uma referência direta de que Paulo foi
seu promotor. Ele defendeu a pena de morte de Estevão e, ao que parece, seus
argumentos foram bem aceitos pelos anciãos de Israel.
Não
seria natural que a igreja agora o temesse?
Paulo
foi o primeiro convertido na história da igreja a ser rejeitado pela própria
igreja. Muitas vezes ouvimos pessoas falando que não frequentam mais a igreja
porque não foram bem recebidas. Paulo, na verdade, foi hostilizado. Portanto,
se você alguma vez se sentiu rejeitado na igreja, é bom lembrar que a conversão
mais radical da igreja primitiva foi objeto de suspeita da parte da igreja. Não
desista!
Garoto,
volte para sua casa!
O
que acontece em seguida, é também bem conhecido.
Paulo
é agregado à igreja, não sem suspeita, por um misericordioso cristão chamado
Barnabé. Foi o mais corajoso, que se atreveu a se aproximar deste ameaçador
judeu.
Em
seguida, já encontramos Saulo testemunhando de Jesus.
Talentoso,
grande conhecedor da lei, Saulo começou a confrontar e a discutir com os
helenistas, que eram judeus da dispersão ou prosélitos que vinham a jerusalem
adorar Yahweh. Ele “pregava ousadamente”, mas os embates sempre terminavam em
discussões acaloradas, que se tornaram ameaça para sua vida. Os helenistas
decidiram tirar-lhe a vida (At 9.29). A Igreja que contava com a simpatia de
todo povo (At 2.47), agora se vê numa situação de instabilidade provocada por
um ousado e imaturo pregador, que instigava as pessoas com seu discursos duro e
implacável.
O
que a igreja primitiva faz?
“Tendo, porém, isto chegado ao conhecimento
dos irmãos, levaram-no até Cesareia e dali o enviaram para Tarso” (At
9.30). A Igreja toma uma decisão radical. Mandar embora o jovem pastor que
estava causando confusão.
Paulo,
portanto, é o primeiro pastor da história, a ser demitido pela igreja.
Se
você alguma vez já se sentiu ferido por ter sido rejeitado e “expulso” de sua
igreja, deve lembrar que Paulo, o maior de todos os missionários que a igreja
cristã já possuiu, também sofreu este trauma. De uma hora para outra, é mandado
embora. Os irmãos até fazem uma “vaquinha”, para comprar sua passagem num navio
que estava ancorado em Cesareia de Filipe.
A
Igreja disse: “você está muito imaturo, vai para sua casa repensar o que está
fazendo e a forma como as coisas estão sendo feitas”.
Sabe
o que aconteceu depois de sua partida?
“E assim, a igreja na verdade tinha paz por
toda a Judeia, Galileia e Samaria, edificando-se e caminhando no temor do
Senhor, e, no conforto do Espirito Santo, crescia em número” (At 9.31).
Observe a primeira afirmação: “E assim...”, isto é, depois que mandam embora o
pastor briguento, a igreja pode caminhar em paz e crescer.
Dura
realidade: Algumas igrejas, para experimentar paz e crescimento, só conseguem
depois que manda o pastor encrenqueiro embora...
Por
outro lado...
Se
você já foi alguma vez rejeitado, lembre-se de Paulo.
Volte
novamente, para fazer aquilo que Deus o chamou a fazer. Sem amargura, sem
raiva, sem ressentimento. Você não está nas mãos dos homens, mas de Deus.
Nenhum concilio, presbitério, ou conselho de igreja tem o poder de dispor da
sua vida. Você está nas mãos de Deus. A experiência de rejeição pode se
transformar em grande, ainda que dolorido, processo de crescimento.
Paulo
vai para os desertos da Arábia, e desaparece do cenário apostólico (Gl
2.18-24). Até que Barnabé, novamente, sai em sua procura, já que seu paradeiro
era ignorado, o encontra e o traz para ser professor do Instituto Bíblico recém
estabelecido em Antioquia da Siria (At 11.25-26). Ali, no silêncio, no estudo
da palavra e na oração, aprendeu de Deus, até que o Espirito Santo o traz
novamente para o ministério.
Paulo
aprendeu algo que só o silêncio e a contemplação podem ensinar.
Mas
surge então, o outro brilho.
A
descoberta do Cristo crucificado.
Em
At 9.29, ele “falava e discutia” com os helenistas. Linguagem de argumentação,
teologia, filosofia. Mas quando ele foi pregar em Corinto, ele afirma: “E foi
em fraqueza, temor e grande tremor, que estive entre vós. A minha palavra e a
minha pregação não consistiram em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em
demonstração do Espirito e de poder” (1
Co 2.3-4). Que mudança de estilo... Na primeira, fala e discute, na segunda
prega com humildade e “demonstrando” o poder de Deus na sua pregação.
Será
que isto faz diferença?
Que
Deus possa fazer o mesmo conosco, arrogantes e pretenciosos pregadores...
Paulo
estava aprendendo a linguagem da cruz...
Ele
começa agora a se gloriar em outra coisa: “Porque
decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado” (1
Co 2.2).
O
orgulho da competência caíra por terra...
Por
isto Paulo insiste na glória da cruz.
“A fim de que ninguém se vanglorie na
presença de Deus”.
Fora
da cruz há uma glória, mas ela é vã.
Quando
Paulo expõe o evangelho à igreja de Roma ele afirma: “Onde está a jactância? Foi de todo excluída” (Rm 3.23).
Que
pretensão, que arrogância, que orgulho podemos ter em outra coisa, quando
olhamos para a obra de Cristo. Todos pecaram e estão destituídos da glória de
Deus (Rm 3.23), então, Deus propõe que, o sangue de Cristo, seja a nossa
propiciação (substituição) diante de Deus.
A
glória do Cristo está na infame cruz.
Este
lugar de morte é o lugar de vida. Este é o paradoxo. Tudo invertido.
O
lugar mais horrível é o lugar da graça.
O juiz de toda a terra agora é
julgado
O castigo que nos traz a
paz estava sobre ele...
O
justo morrendo pelos injustos.
O
homem que é absolvido pela lei: “não vejo nele pecado algum”, é condenado e
executado.
Conclusão:
Certa
mulher tinha as mãos muito feias por causa de queimaduras do passado. Sua
filha, de apenas 5 anos, certo dia lhe disse: “Mamãe, eu gosto de tudo na
senhora. A senhora é linda, carinhosa, amorosa, mas não gosto de suas mãos!
Elas são feias...”
A
mãe, pacientemente lhe disse: “filha, ja está na hora de você saber a razão de
minhas mãos serem assim. Quando você tinha apenas 2 meses de vida, a casa onde
morávamos, pegou fogo, e quando olhei, seu bercinho estava em chamas, e eu não
hesitei, agarrei você fortemente e a tirei de lá, mas o colchão tinha um
revestimento de plástico e o plástico em chamas, grudou nas minhas mãos, e por
esta razão elas são tão profundamente marcadas”.
A
filhinha, olhando para sua querida mãe lhe disse: “Mamãe, de agora em diante,
suas mãos serão as mãos mais lindas do mundo”.
Assim
é a cruz. Lugar de infâmia, desprezo, horror, maldição.
Mas
lugar de glória.
Nela
o apóstolo viu toda sua vergonha sendo transformado, sua condenação sendo absolvida.
A
cruz se tornou sua glória.
Como
você vê a cruz de Cristo?
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