segunda-feira, 28 de outubro de 2019

Ex 20.13 “Não matarás”.




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Introdução:


De todos os mandamentos, um dos mais cruciais em todas as culturas é o sexto mandamento. Principalmente porque ele coloca na perspectiva correta a vida e tenta garantir a sobrevivência da raça humana. Uma sociedade que não respeita a vida, se torna bárbara. A história está repleta de culturas nas quais o valor da vida não era considerado algo sagrado. A fé cristã, sempre mudou esta perspectiva. Os dez mandamentos tornaram-se um ponto de partida essencial toda vez que a questão da vida torna-se objeto de estudo.

A sacralidade da existência:

Este mandamento aprecia a vida e a coloca na correta perspectiva. Nele aprendemos a sacralidade da existência, reconhecemos que a vida é um dom de Deus. Não pode ser banalizada, manipulada, nem explorada como um objeto comercial. Não se pode desconsiderar seu precioso valor.

O verbo “viver” em inglês é “to live”. Se invertermos este termo “live”, teremos outra palavra sugestiva: “evil” (mal). Assim como na língua inglesa precisamos considerar que o mal é oposto à vida. Matar é desprezar o valor e significado da existência e desconsiderar que Deus é o Senhor da vida. Onde encontramos pessoas e estruturas que desvalorizam a vida, teremos ali a expressão do mal, seja qual for a explicação que se dê a esta atitude, ela será sempre maligna. O bem exalta a vida. Deus valoriza a vida!

Por isto não temos o direito de tirar a vida do outro, uma vez que a vida é doação divina. Apenas Deus, que a dá, pode tirá-la, no seu tempo, da sua forma, dentro de seus propósitos. Dar e tirar a vida são prerrogativas divinas.

Nossa sociedade tende a relativizar o valor da vida e a banalizá-la. Acostumamos facilmente com a morte, nos tornamos apáticos. Apatia (a-pathos) é uma fuga do sentir. Ela opera como o instinto da morte de Freud. Assim é que estatísticas como o assassinato de mais de 60 mil pessoas no Brasil em 2017 não nos assusta mais, nem os outros 38 mil que mortos nas estradas brasileiras vítimas de um trânsito caótico e violento. Isto demonstra quão pouco a vida é valorizada em nosso país.

Centenas de pessoas morrem de igual forma de fome, guerras vazias, prepotência de ditadores em outras partes do mundo. Não seria esta uma forma de co-participação no projeto da anti-vida? Não seria isto uma forma de matar?

A Igreja de Cristo precisa se manifestar contra qualquer forma de anti-vida, seja ela pessoal ou social. A vida é o bem mais precioso que temos, e a única coisa que não se pode recuperar na vida. Existem muitas formas de matar. Por exemplo, decretar leis injustas que impedem a vida é uma destas formas.

Este texto, levanta questões para considerarmos, e que infelizmente não poderão ser tratados aqui, mas quero pelo menos citá-los.

A questão da vida:

Lutero é bem abrangente acerca do significado deste mandamento. Para ele, tudo que respira vida deve ser tratado com dignidade: os animais, a  natureza, as florestas, os rios, os oceanos, o ar que respiramos. “O objetivo deste mandamento é, consequentemente, não fazer mal a nada por meio de uma ação perversa”. Não é sem razão que Jesus afirma que peca contra este mandamento não apenas o que mata fisicamente, mas todo coração que pensou mal e se deixou levar por sentimentos de vingança e ódio.

A questão do aborto:

Este mandamento também lida com a trágica situação do infanticídio que acontece nas clínicas de abortos clandestinas cujos números chegam aos milhares. O discurso feminista atual para justificar o aborto é que a mulher é dona do seu corpo e por isto pode fazer o que bem entender com ele.

Este argumentação é verdadeira, mas falaciosa, porque parte de uma premissa errada. Toda mulher tem direito sobre seu próprio corpo, por isto pode amputar uma de suas pernas, se assim desejar; ou arrancar um órgão de seu corpo, mas a criança, que está no seu útero, é outro ser dentro do seu corpo. Não faz parte do corpo da mulher. Possui existência individual e separada. Portanto, a prática do aborto é também uma quebra do sexto mandamento.

Jesus dá uma dimensão ainda mais profunda a este mandamento, ensinando que o ódio nutrido e expressões de desprezo, desconsideração e descaso dentro de nossos corações são formas subjetivas de matar o irmão, e quem faz isto incorre no julgamento de Deus (Mt 5.21-26). Matamos com indiferença, apatia, ira e maledicência.

A questão do idoso e do deficiente:

Matamos também idosos e deficientes, quando encontramos neles um valor meramente utilitarista. Nossa sociedade focalizada apenas no sucesso, lucro e conquista tende a destruir aqueles que não são mais úteis. Muitas culturas bárbaras enxergavam o velho como um peso e um estorvo. No Império Romano, o parricídio e o matricídio eram admitidos e praticados, quando a pessoa se tornava idosa demais e onerava financeiramente a família. 

Pena de morte, eutanásia e legitima defesa:

Teria o Estado direito para executar alguém?

Alguns acreditam que a melhor tradução para este texto seria “não assassinarás”. Já que Deus mesmo, ordenava no AT que determinados crimes fossem passiveis de julgamento e execução.

Teria a pessoa direito sobre a vida de outrem quando esta se encontra incapaz de reação pelos meios naturais de responder por si mesma ou clinicamente incapaz?

Seria legitimo que alguém usasse do seu direito de defesa para tirar a vida de outra pessoa?

Seria possível matar alguém na guerra? Um direito civil?
Parece-nos que o texto de fato se refere ao assassinato. No Antigo e no Novo Testamento, uma pessoa podia ser condenada pelo Estado e ser executada, como fizeram com Jesus. O problema mais grave aqui não é se o Estado ou uma corte tem poder de condenar a morte um ser humano. Parece que esta questão teológica não é muito complicada na Bíblia. O grande desafio que se nos impõe é o desafio da correta aplicação da justiça.

Paulo afirma em 1 Tm 1.8: “Sabemos que a lei é boa, se alguém se utiliza dela de forma legítima”. O grande problema na aplicação da pena de morte, ou de matar alguém na guerra, é que, muitas vezes, em nome da lei, se manipula e condena pessoas inocentes. Poderes ditatoriais sempre se utilizaram deste argumento e tiraram a vida de pessoas inocentes, condenando-as por razões de intrigas políticas. Os sistemas judiciais também são falhos e cometem injustiça. O pobre e o fraco sempre sofrem nas mãos do Estado ou de uma justiça corrupta ou manipuladora.

A questão do assassinato:

Este texto nos alerta a não conspirarmos contra qualquer irmão, nem contra nossa própria vida. Alerta-nos também contra o suicídio. Uma vez que você não é o autor da vida, não pode dispor dela para a auto-destruição. A vida é um dom!


A questão do suicídio:

Este texto nos alerta a não conspirarmos contra nossa própria vida. Muitos me perguntam sobre o fato de se um suicida pode ser salvo. Isto tem a ver com uma forma de pensamento dominante em nossa sociedade que afirma que o suicida não pode encontrar a salvação.

Na verdade, a questão deveria ser colocada de forma diferente.
Quando eu penso em dar cabo a minha vida, eu declaro estar contrário ao propósito de Deus em me criar. Eu perdi a capacidade de ver Deus no centro de minha existência para me dar propósito e razão de viver. O suicídio tira de nós a capacidade de pensar no valor que eu tenho diante de Deus. Deus me criou com propósito e com missão. Tirar a minha própria vida significa que eu perdi a capacidade de encontrar propósito na minha própria existência.

Entretanto, precisamos considerar que muitas vezes o suicídio transcende a mera angústia humana, sendo causada por graves enfermidades e patologias. Uma esquizofrenia pode levar ao suicídio, um grave distúrbio psiquiátrico, uma depressão profunda, podem ser a causa do suicídio. Creio que devemos olhar o suicídio com mais compaixão e misericórdia, antes de estabelecer julgamento.

Todavia, é bom considerar que não temos o direito ao suicídio. Porque ele quebra o sexto mandamento que diz: “Não matarás!”

Conclusão:

Uma visão positiva da vida pode alterar nossa visão de universo e de valor próprio, afinal, ideologias são antropologias. É isto que este mandamento pede de nós. Que valorizemos o ser humano uma vez que ele foi criado à imagem e semelhança de Deus.

Jesus não considerou o assassinato como o simples fato de pegar uma arma e disparar contra outra pessoa. Jesus deu um sentido muito mais profundo a este mandamento: 

"Vocês ouviram o que foi dito aos seus antepassados: ‘Não matarás’, e ‘quem matar estará sujeito a julgamento’. Mas eu lhes digo que qualquer que se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento. Também, qualquer que disser a seu irmão: ‘Racá’ (tolo), será levado ao tribunal. E qualquer que disser: ‘Louco! ’, corre o risco de ir para o fogo do inferno" (Mt 5.21,22).

Para Jesus, não matamos alguém apenas quando agredimos fisicamente. Podemos matar alguém em nosso coração, ou quando agimos de forma insensível e indiferente, quando o desprezamos ou menosprezamos. Para Jesus, matar alguém possui uma dimensão muito mais profunda.

Talvez seja aqui que precisamos analisar nosso coração:
Provavelmente meus leitores nunca mataram alguém intencionalmente (acidentes de carro também podem matar), mas certamente, todos nós já tivemos a tentação de eliminar alguém de forma rude, com xingamentos, ou  ignorando e tratando com indiferença alguém que nos machucou ou nos feriu. 

Jesus deu um sentido mais profundo a esta tema.
Não podemos tratar a questão de "não matarás", de forma superficial.
Precisamos analisar se, em nosso coração, não temos matado pessoas, destruído vidas, causando mortes em nossas relações pessoais. O caminho do evangelho não é o descaso, mas o perdão, restauração e reconciliação. 

Por definição, o evangelho é pró-vida!
Onde os sinais da morte permeiam, a igreja deve entrar com uma ação de resgate e valor à dignidade humana e à vida. 
Numa sociedade que sempre optou pela anti-vida, precisamos reafirmar que a vida é um dom de Deus, e precisamos sempre lutar de forma intencional e intensa, para que a vida possa florescer em sua plenitude.


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