segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Ex 20.8 Quarto Mandamento: “Lembra-te do dia de sábado, para o santificar”.






Introdução

Um dos mandamentos que tem causado mais discussão é a questão do sábado, isto porque os homens historicamente fizeram uma significativa inversão de valores no seu sentido. Jesus teve que enfrentar a ira dos religiosos de seus dias, que o acusavam de profanar o sábado e Jesus os censurou tentando colocar o sábado na perspectiva correta:




E acrescentou: O sábado foi estabelecido por causa do homem,
e não o homem por causa do sábado; de sorte que o
Filho do Homem é senhor também do sábado”
(Mc 4.27,28).

Os religiosos transformaram o sábado num jugo e perderam o significado maior do sábado: a celebração, a adoração, o descanso. Ainda hoje, por causa de uma estrita observação do sábado requerida pelos judeus ortodoxos em Jerusalém, eles na cozinham, nem apertam o botão do elevador no dia do sábado. No Brasil, os sabatistas condicionam a salvação eterna, à guarda do sábado. Não basta crer em Cristo, se você não guardar o sábado, você será condenado no dia do juízo final.

O sábado, portanto, continua escravizando e subjugando as pessoas.
Paulo percebeu esta atitude equivocada com o sábado na Igreja da Galácia: “Guardais dias, e meses, e tempos, e anos. Receio de vós tenha eu trabalhado em vão para convosco” (Gl 4.10,11). Qual era o problema na visão de Paulo? Os irmãos da Galácia estavam voltando aos “rudimentos fracos e pobres”, que novamente os escravizava (Gl 4.9).

O shabath era um dia de adoração e descanso para o povo judeu. Este termo significado literalmente “descanso”. Dia de assumir outras atividades. Descanso, nada mais é, que mudança de ritmo e atividades. Para o trabalhador braçal, o descanso deve ser, dar folga ao seu corpo; para aqueles que vivem dentro do escritório, o descanso pode ser cuidar do jardim, fazer exercício, praticar esportes e lazer. Mas acima de tudo, o sábado (ou shabath), era uma forma de voltar o olhar para a bondade de Deus e expressar a gratidão com atos de culto e adoração.

Para entender melhor o lugar do sábado, precisamos observar as grandes mudanças que ocorreram entre o Antigo e Novo Testamento, em relação à adoração. Sem esta compreensão, torna-se difícil ter toda a visão do novo “lençol das mudanças” (At 10) que Deus estava trazendo com a dispensação do Evangelho de Cristo.

Russel Shedd afirma que, no Antigo Testamento existiam quatro áreas de adoração bem definidas:
Templo
Tempo
Sacerdócio
Sacrifício.

Entender estas coisas é fundamental para a adoração na perspectiva neo-testamentária. Quando entendermos estes aspectos centrais da adoração, torna-se fácil entender o significado do Sábado.

Vamos por parte:

  1. Templo – No Antigo Testamento, o culto a Deus era centralizado em Jerusalém, Deus era adorado no lugar Santo. O templo era o local para o qual as pessoas afluíam para adorar a Deus. Daí a significativa questão levantada pela mulher Samaritana: “Nossos pais adoravam neste monte; vós, entretanto, dizeis que em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar” (Jo 4.20). Esta questão teológica estava presente entre os contemporâneos de Jesus. Deus habita uma determinada geografia? Onde realmente devemos adorar?

Jesus esvazia esta idéia de um local sagrado:
“Disse-lhes Jesus: Mulher, podes crer-me que a hora vem, quando nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai... Mas vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque são estes que o pai procura para seus adoradores” (Jo 4.21,23).

Para Jesus, o local deixa de ter caráter sacral. O sagrado são os adoradores e não o local.

Infelizmente esta idéia vétero testamentária não saiu da mente do cristianismo. Ainda hoje existem milhares de pessoas que fazem romarias para lugares sagrados, onde acreditam que Deus está presente.

Para o Novo Testamento, o local da habitação de Deus não é mais um espaço, mas seres humanos,  não mais um local, mas pessoas. Por isto, o templo do Espírito Santo somos nós: ”Acaso não sabeis que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo que está em vós, o qual tendes da parte de Deus, e que não sois de vós mesmos?” (1 Co 6.19). A vida da pessoa, e não um local sagrado é que interessa para Deus. Deus habita em seres humanos que pela fé receberam a salvação oferecida por Jesus e que hoje se tornaram a habitação do Espírito Santo. Por isto o corpo, assume esta dimensão sagrada.

  1. Sacerdócio – No Antigo Testamento as pessoas viam um grupo de pessoas como privilegiada diante de Deus. Os sacerdotes tinham a tarefa de levar os pecados e problemas da comunidade a Deus. A adoração estava centrada em algumas pessoas especiais.

Uma destas pessoas era o Sumo Sacerdote, que entrava apenas uma vez por ano no Santo dos Santos, o local mais sagrado para fazer expiação pelos pecados do povo de Israel. Este homem tinha um papel muito importante na espiritualidade judaica.

No Novo Testamento, a idéia de pessoas ungidas também é desmistificada. Deus suscita não apenas um grupo de foro privilegiado, mas por meio de Jesus rasga o véu do templo e destrói esta diferença entre sacerdotes e não sacerdotes. Todos temos acesso ao Pai por meio de Jesus, não dependemos mais da mediação de ninguém para irmos ao Pai. Por esta razão temos “intrepidez para entrar no Santo dos Santos, pelo sangue de Jesus” (Hb 10.19), e podemos nos achegar “confiadamente junto ao trono da graça, a fim de recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna” (Hb 4.16).

Deus fez agora uma nação de sacerdotes (1 Pe 2.9). Não apenas um grupo, mas toda uma comunidade que tem a grande benção levar os pecados da cidade e das pessoas a Deus e clamar por elas.

  1. Sacrifício – A terceira área de adoração a ser considerada. No Antigo Testamento as pessoas ofereciam sacrifícios para expiar pecados.

Milhares de animais, bodes e touros, foram derramados para expiar pecados. “Sem derramamento de sangue não há expiação de pecados” (Hb 9.22), mas todos estes sacrifícios, eram “sombra dos bens vindouros, não a imagem real das coisas” (Hb 10.1), por isto jamais poderiam tornar perfeitos os ofertantes. “É impossível que sangue de touros e bodes remova pecados” (Hb 10.4). O sangue derramado apenas apontava para o sacrifício perfeito e pleno que o Filho de Deus haveria de ofertar à humanidade. Qualquer tentativa de fazer sacrifícios hoje para tentar agradar a Deus, não apenas é algo tolo e vazio, como agride a Deus, já que quem assim procede está rejeitando o sacrifício pleno de seu Filho.

O Antigo Testamento apontava para o grande sacrifício que seria consumado no Calvário. E isto foi muito difícil para os contemporâneos de Jesus entenderem. Deus preparou um povo para entender a obra de Cristo. Todas as oferendas e holocaustos apontavam para o perfeito Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.

Por isto, agora, cessa a centralidade de sacrifícios de animais. Jesus é o nosso Cordeiro Pascal (1 Co 5.7).

  1. Tempo – A Quarta área de atuação é o tempo. Os judeus acreditavam em dias sagrados, épocas sagradas, tempos sagrados. Dentre estas datas estavam as festas anuais e o sábado.

O Novo Testamento tenta desmistificar esta ideia de um tempo sagrado: “Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de festa, ou lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das coisas que haviam de vir; porém o corpo é de Cristo” (Col 2.16-17). No Novo Testamento a adoração não está centralizada em um tempo, mas envolve toda a vida do adorador, em todo lugar e em todo tempo.

Então, Qual o significado do Sábado?
O Sábado possui um significado maior

A Dimensão Social
O povo de Israel foi escravizado por 430 anos, durante este tempo não teve direito a lazer, realizava trabalho forçado e sofreu violenta humilhação no desempenho de suas atividades. Não é sem razão que este mandamento possua uma forte recomendação social: “não farás obra alguma nesse dia, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o peregrino que viver das tuas portas para dentro, porque o senhor fez em seis dias o céu, a terra e o mar, e tudo o que neles há, e descansou ao sétimo dia; por isso o senhor abençoou o sétimo dia e o santificou” (Ex 20.10-11). Deus estava preocupado com o ser humano e com a própria natureza que se tornara vítima da ganância e da exploração do excesso de trabalho.

Jesus teve profundos conflitos com religiosos de seu tempo por causa da questão do sábado. Qual era o problema? Os homens transformaram o sábado num instrumento de opressão religiosa, ao invés de reconhecerem sua dimensão libertadora e humanitária. Jesus sintetiza isto numa discussão com os fariseus, que eram os xiitas de seu tempo afirmando: “O sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado” (Mc 2.27). Esta inversão na interpretação tem sido fatal na história do cristianismo.

A Dimensão Pessoal
Qual é o objetivo então do sábado? Este termo vem do hebraico “shabath” que significa “descanso”. Deus deseja que os homens entendam a importância de parar suas atividades, e para fazer isto, ele mesmo deu o exemplo.

Será que Deus estava preocupado consigo mesmo? Estava com excesso de horas extras? Naturalmente não. Seu objetivo era dar exemplo para que entendêssemos que precisamos aprender a descansar, a tirar tempo para repor nossas forças físicas, para repensar nossas atividades. Quando não descansamos é porque intimamente sofremos um complexo de onipotência e achamos que somos mais imprescindíveis que Deus. No entanto, é bom lembrar que o cemitério está cheio de gente insubstituível. Guardar o dia de sábado é reconhecer que temos direito ao descanso e perceber-se como um ser livre para viver. O que trabalha sem descanso é escravo! Além do mais, deve manifestar esta preocupação com seus funcionários, empregados, parentes e até mesmo animais. Todos devem e tem o direito ao descanso.

Quando ainda plantava igreja no sul de New Jersey, tinha uma rotina de muita atividade. Um dia, três casais de liderança da igreja me procuraram e perguntaram qual era o dia de meu descanso. Respondi evasivamente e eles foram enfáticos comigo: “O senhor precisa tirar um dia de folga, porque não tirando o descanso o senhor quebra um princípio de Deus. Não pretenda ser mais importante que Deus”.

É isto que a palavra quer nos mostrar. Deus não parou suas atividades por causa dele mesmo, mas a criação aponta para o projeto grandioso de Deus: Seu shabath. Ele nos convida para o descanso. Para confiarmos na sua provisão, sabermos que ele vai fazer quando não estivermos fazendo. Tirar um dia de descanso semanal é uma forma de demonstrar confiança em Deus e no seu cuidado por nós. Nós somos apenas instrumentos dele, Ele é que faz.

A Dimensão cúltica
Além de refazer nossas forças e encontrar descanso, este tempo também é um convite para olharmos para o céu, e este é um objetivo muito claro para o shabath: Tirar um dia de adoração, agradecer a Deus a libertação e lembrar que Deus também tem ouvido nosso clamor. Este é o dia que separamos para prestar culto a Deus, ler sua palavra, orar, refletir sobre seus valores, colocar nossa vida a seu serviço para libertar outros que ainda vivem na opressão e na escravidão.
No Novo Testamento não existe mais a idéia de um “um dia de adoração”, mas todos os dias são feitos para adoração a Deus. Mas no dia que reservamos para ele é uma forma de lembrarmos a nós mesmos de seu cuidado e adoração.
“Ao nos dar um dia como tal, Deus destaca a nossa humanidade, nos lembra que devemos ser tratados como pessoas e que não fomos feitos para o trabalho, mas para Ele”.

Conclusão
A guarda do sábado é importantíssima para o louvor ao Senhor, para diminuir a ganância do homem, para proteger os funcionários e até mesmo os animais. A guarda do sábado deve acontecer.

Para alguns, como os profissionais da área de saúde e segurança, o sábado pode acontecer no meio de semana. Até mesmo os pastores, que estão trabalhando arduamente no domingo, pregando sermões, atendendo pessoas, dando aulas em escolas dominicais, visitando pessoas enfermas, precisam tirar o seu “sábado”. Este é um momento de repor as energias, mudar as atividades, descansar.

Mas acima de tudo, precisamos entender o sábado como um tempo de maior consagração a Deus. Por isto recomendamos as pessoas para que concentrem suas atividades de lazer no sábado e reservem o dia de domingo para se consagrar mais ao Senhor. Muitas pessoas, trocam facilmente o domingo para outras atividades.

Samuel Vieira

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