sexta-feira, 26 de março de 2021

Tempo de recuperar a visão

 


 

O ministério de Paulo é marcado por ação, dinamismo e uma agenda carregada de compromissos, viagens e planos. A não ser no período que ficou na prisão, podemos encontrá-lo sempre exercendo atividades, discipulando, treinando missionários, plantando igrejas e fazendo viagens missionárias. Era um ministério de entrega total de si mesmo, tempo e talentos.

 

Sua liderança pode bem ser definida como “task driven”, isto é, orientado por tarefas: pregar, pastorear, evangelizar, mentoriar, discipular, analisar estratégias, colocar o pé na estrada, descobrir métodos efetivos na comunicação do evangelho, criar pontos de contatos nas novas culturas às quais ele pregava o Evangelho e nos novos campos que eram sistematicamente abertos.

 

Depois de evangelizar a região da Capadócia, o plano era dirigir-se para a Ásia, conforme o relato de Atos 16. Entretanto, o Espírito Santo os impediu. Reformularam novas estratégias tentando ir para Bitínia, mas é relatado que novamente, o Espírito não permitiu. Seus planos e projetos foram abortados, não por força política, nem pelo diabo, mas pelo próprio Deus. Não é isto surpreendente?

 

Diante da negativa de Deus, nada poderia ser feito. Eles simplesmente ficaram parados, já que nenhum dos planos deu certo. O que se pode fazer quando o próprio Deus diz não? Nada mais resta senão parar. Deus, o autor e iniciador das missões, interrompe os planos missionários. Como reagir nestas circunstâncias?

 

Em Atos 16 eles tiveram um tempo de não fazer nada em Trôade. Nada deu certo! Seus projetos não foram executados já que o próprio Deus disse que não. Entretanto, neste tempo e lugar de incerteza e indecisão, foi exatamente a hora de Deus dar a visão, apontar novas perspectivas. Se lermos atentamente o texto, veremos que nada fizeram em Trôade. Não há registro de obra evangelística, de pregação, milagre, plantação de igrejas, nada! Naquele momento Deus estava alinhando a visão dos apóstolos para a execução de seus planos. Era tempo de espera. Tempo de redirecionar a visão.

 

Não tem sido assim conosco? Durante esta pandemia quantos planos foram abortados e se tornaram inexequíveis. Recentemente fizemos planos de retornar as atividades do ministério infantil, estávamos empolgados depois de quase um ano parado. Todos os protocolos de segurança foram criados. De repente, veio a segunda onda, e literalmente, tivemos vontade de chorar... nada poderia ser feito! Planejamos uma atividade drive in, levantamos os custos, fizemos os planejamentos, nada! Estamos com um grupo de pessoas para serem batizadas, estávamos planejando e, nada! Deus simplesmente tem fechado as portas e impedido a execução dos planos e projetos da igreja, da forma como queríamos fazer.

 

Durante a pandemia eu estava com várias viagens marcadas, inclusive conferências internacionais, congressos, treinamento, viagens. Tantas ações a serem executadas, mas nada pôde ser feito. De repente me senti como um profeta sem voz (Quando voltaram os cultos presenciais não podia pregar por fazer parte do grupo de risco), e fui colocado num silêncio obsequioso; e era também um pastor sem rebanho, já que estava distanciado fisicamente da comunidade, quando adoeciam eu não podia visita-los, e mesmo em tempos de luto não era possível chorar com os que choram.

 

O que fazer quando nada pode ser feito? Quando o próprio Deus diz não aos planos e estratégias? O relato de Atos é enfático: “O Espírito os impediu” de irem para a Ásia, e novamente “não permitiu” que fossem para Bitinia. (At 16.6,7). Diante desta realidade, o que se pode fazer?

 

Apenas uma coisa: aguardar a orientação do próprio Deus.

 

E foi exatamente isto que aconteceu. Em Trôade Deus reorienta a visão. Ali Paulo recebe a visão do próprio Deus para seguir na orientação que ele mesmo tinha para sua igreja. “À noite, sobreveio a Paulo uma visão na qual um varão macedônio estava em pé e lhe rogava, dizendo: Passa a Macedônia e ajuda-nos” (At 16.6).

 

Não será que Deus quer fazer o mesmo nestes dias de “lockdowns” e isolamento social? Será que ele não está nos convidando a repensar, resignificar, nos dando perspectivas novas para um novo tempo e uma nova realidade que não seriam considerados se não fossemos colocados na situação em que estamos? Talvez Deus queira dar um novo sentido e uma nova agenda para maior efetividade ministerial, e para que o evangelho seja pregado a todos os povos, cumprindo assim a Grande Comissão? Parar não é de todo ruim, se é o próprio Deus quem nos obriga a parar.

 

Estou no ministério há quarenta anos e sei que muitos colegas meus tem sofrido bastante neste período de pandemia, alguns de forma mais intensa outros mais amena. Eu também tenho sentido fortemente tais efeitos. Durante todo este período ministerial, nunca tive um sabático, não parei minhas atividades e, graças a Deus, nunca tive problemas de saúde. Os levitas e sacerdotes no Antigo Testamento ficavam no oficio por 20 anos... eu já estou há quarenta... é certo que a expectativa de vida era muito menor, mas agora, neste momento em que somos colocados na expectativa, vem uma pergunta na minha mente: Que nova visão Deus deseja comunicar a mim particularmente, e ao seu povo, de forma geral? Há alguma coisa que preciso mudar?

 

Andrés Garza, Diretor da City to City America Latina, afirma que nestes tempos de pandemia precisamos fazer quatro perguntas que podem orientar e mudar nossa perspectiva.

 

 O que estamos fazendo e o que precisamos parar de fazer?

 O que fazemos e devemos continuar a fazer?

 O que estamos fazendo e precisamos continuar a fazer de novas maneiras?

 O que não estamos fazendo e precisamos começar a fazer?

 

Nem sempre Deus nos quer em movimento, eventualmente ele nos coloca na espera, nos convidando à reflexão, à oração. Nosso chamado essencial não é para fazer, mas ser. A estratégia de guerra quem traça não é o soldado raso, mas o general, o Senhor dos Exércitos, em última instância a guerra não é nossa, mas de Deus.

 

Quando Deus interrompe nossos planos e agendas ele pode querer nos comunicar uma visão que só entenderemos se pararmos para ouvi-lo.  

 

É tempo de estar atento à esta nova visão. Não do nosso coração, nem de nossas agendas ou planos, mas do próprio Deus que deseja orientar sua igreja. Talvez neste tempo de isolamento Deus queira levantar nossos olhos para entender qual direção nos quer dar. Talvez seja tempo de orar e aguardar, até que o Senhor nos diga: “Passa à Macedônia e ajuda-nos”.

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