terça-feira, 22 de maio de 2012
Mc 10.46-52 QUE QUERES QUE EU TE FACA?
Introdução:
Uma numerosa quantidade de pessoas seguia Jesus. Em algumas ocasiões, chegava a 5000 homens, sem contar mulheres, já que elas não entravam nas estatísticas. Um dia, ao passar por Jericó, a cidade das palmeiras, uma das cidades mais antigas do mundo, com cerca de 13 mil anos, um homem chamado Bartimeu, começou a gritar desesperadamente: Jesus, Filho de Davi, tem misericórdia de mim". Normalmente, os leprosos, cegos, pedintes e prostitutas ficavam na porta da cidade. O texto nos afirma que ele encontrava-se “assentado à beira do caminho” (Mc 10.46), uma descrição característica de gente que vive na periferia e na margem da vida.
Bartimeu tinha nome, sua família era conhecida, mas sua tragédia pessoal o colocou à margem. Sua situação era irreversível: ele era cego! Sua cegueira aliou-se à falta de oportunidades e à necessidade de sobrevivência, levando-o a uma vida de dependência e mendicância, como outros tantos que viviam marginalizados. Sua vida de abandono e seus parcos recursos o levaram a viver muito aquém da linha da esperança.
O nome de Jesus cria expectativa, gera fé. Esta fé o capacita a “ver o invisível”, faz renascer nele uma nova esperança, a despeito das circunstâncias adversas, passa a “crer contra a esperança”. Bartimeu é tomado por uma convicção de que esta oportunidade não podia ser perdida. Ele não conhece a Jesus, mas já ouvira falar dele e de seus milagres. Quando Jesus se aproxima dele, ele começa a gritar com todas as forças da alma: "Jesus, Filho de Davi, tem misericórdia de mim", a ponto de incomodar os outros.
Nem sempre consideramos a dramaticidade deste texto. Bartimeu clama! O seu clamor é um brado, um gemido, um grito inquietante e sua resposta aos que o impediam de gritar foi a de clamar ainda mais (Mc 10.48). Tentam sufocar sua alma, colocá-la em silêncio, mas ele grita ainda mais.. Só ele sabe quanto dói a sua angústia. Clamor é o gemido da alma. Quem clama e ora é porque percebe que precisa fazer isto. O salmista parece entender isto ao afirmar: "À tarde, pela manhã, e ao meu dia, farei as minhas queixas ao Senhor e lamentarei, e ele ouvirá minha voz" (Sl 55.17).
Ele não deixa de clamar porque os outros querem que ele se cale. "Muitos o repreendiam" (vs. 48). mas ele que sofre, sabe a sua própria dor, sabe o que é ser cego e estar vivendo à beira do caminho. Viver sem viver, viver pela metade, viver sem sentido. Viver sem perceber a vida.
Jesus então interrompe sua caminhada e o chama para perto de si. O chamado de Jesus o reanima, e ele assume uma atitude simbólica muito interessante, "lançando de si a capa". Capa era sua proteção, no frio e na chuva. Ele não precisava mais dela. A capa era sua defesa, mas ela agora nada mais significa. Algumas das coisas mais significativas do passado em nossa vida, se a gente insistir em manter serão nada mais do que peso. Dependência de coisas do passado são pesos mortos, valores e princípios que não mais servem. Bartimeu joga fora aquilo que era seu bem mais precioso para sua cegueira e pobreza que o havia acompanhado a vida inteira. Paulo diz: "Deixando as coisas que para trás ficam, prossigo para o alvo..." mas a mulher de Ló não conseguiu superar a perda de coisas que ficaram para trás, pois estava amarrado a suas lembranças e experiências. Não conseguiu lançar de si sua capa.
Seu encontro com Jesus foi, digamos, frustrante, pois Jesus, ao se aproximar dele faz uma estranha pergunta: "Que queres que eu te faça?" (10.51). Jesus encontra-se com um homem cego e lhe pergunta o que você quer? Não era óbvio demais? O que um cego pode querer? Esta pergunta não parece estranha?
Por que Jesus faz esta pergunta?
A. Jesus faz esta pergunta, porque nem sempre doentes querem ser curados. Nossas enfermidades, muitas vezes se transformam numa desculpa e justificativa para o doentio estilo de vida que temos. Nossa doença torna-se o nosso álibi. Já ouviram falar em hipocondria? Determinados fracassos e doenças podem ser a forma que usamos para manipular e chamar a atenção dos outros. Existe uma doença terrível que usamos mais costumeiramente que acreditamos: O vitimismo! Será que realmente queremos a solução de nossos problemas ou encontramos prazer secreto na nossa dor? Falar e articular nossos desejos nos leva de encontro aos nossos medos, nos ajuda a refletir sobre nosso ponto de tensão, nossa dor, mensurá-la, a entendê-la, a não criar subterfúgios. É exatamente isto que Jesus faz, ao perguntar-lhe: "Que queres que eu te faça?"
Nem sempre as pessoas querem cura para seus problemas ou resolver seus problemas. O hipocondríaco está interessado em cura ou na manutenção da doença? A doença é o seu mecanismo de fuga! A pessoa que se acha vitima do sistema, da vida e de Deus encontra sentido nesta existêencia patológica de auto comiseração e auto piedade. Existem muitos relacionamentos truncados, nos quais a pessoa não deseja se libertar, pois de alguma forma patológica, a enfermidade (neste caso, o relacionamento), pode ser interessante. A pessoa passa a encontrar significado no outro, ainda que doentiamente. Erich Fromm analisou casos como estes em psiquiatria chamando-os de “simbiose incestuosa”, na qual duas pessoas continuar a viver juntas para se matar, mas de alguma forma este relacionamento ainda faz sentido.
Certa vez lidamos com uma jovem que vinha do satanismo, mas quando foi confrontada com o custo do discipulado cristão preferiu não abrir mão da vida de promiscuidade e coisas que a satisfaziam no satanismo. Ela sabia que ela iria morrer se continuasse seguindo aquele caminho, mas não queria abandonar as coisas que o diabo lhe oferecia. Outro jovem, que cresceu na igreja, ao ser confrontado com a necessidade de abandonar seu pecado para seguir a Jesus, afirmou que não queria, porque gostava do pecado e queria viver daquela forma, mesmo entendendo as conseqüências de virar as costas para Jesus e rejeitar o convite do discipulado. Certo pastor foi orar com uma pessoa possessa de espírito maligno, e ao chegar àquela casa, se recusou a orar por aquele rapaz, porque percebeu que ele queria apenas fugir dos sintomas da perturbação, mas não queria lidar com as causas de sua perturbação e não queria deixar a macumba.
B. Jesus também fez esta pergunta porque ele quer que elaboremos nossa dor e desejo, caso contrário, não haveria sentido em orar. Para que orar, se Deus já conhece nossas palavras antes mesmo que a profiramos? Oração não é para que Deus saiba, Ele já conhece nossas palavras, mas é a demonstração de nossa dependência e confiança na sua provisão. Oração é uma palavra dita com desejo. Nós não oramos para que Deus saiba de nossos problemas, mas para estabelecermos comunhão. Oração não é um pé de cabra para forçar Deus a tomar uma ação diferente da que ele gostaria de tomar. Perguntaram a Madre Tereza de Calcutá: “O que você fala quando ora?” E ela disse, “Nada, eu apenas escuto”. E então tornaram a perguntá-la: “E o que Deus fala?”. Ela respondeu: -“Nada, ele apenas ouve!”. Oração é uma oportunidade de clarear nosso próprio desejo e lançar luz na nossa confusão, ajudando-nos a discernir nossas reais necessidades. Quando oramos definimos melhor nossos alvos e objetivos. Ao orarmos, temos a oportunidade de aprofundar e distinguir o que realmente queremos. Muitas vezes pensamos que queremos um bem material, quando na verdade estamos atrás de coisas que possam preencher mais significativamente nosso coração. Desejo excessivo por coisas revela o anseio de nossa alma que ainda não encontrou sentido e procura preencher o vazio comprando objetos mais caros e mais sofisticados. Oração nos ajuda a discernir nossos reais desejos.
Se lhe fosse dado chance de dizer a Deus qual é o seu ponto de desequilíbrio, a deficiência de sua visão, o que você diria? O cego disse: que eu torne a ver! Nossas palavras substancializam nossos desejos, tornando-os reais. Por isto, depois de ouvir o desejo de Bartimeu, Jesus lhe disse: “Vai, a tua fé te salvou” (Mc 10.52). .
Na hora de nosso clamor, porém, muitos se inquietarão com nosso clamor. O texto afirma que muitos o repreendiam para que se calasse. Existem sempre os que se sentem incomodados com nossa dor. Qual é a reação do cego? “mas ele gritava cada vez mais” (Mc 10.48). Ninguém conhece a nossa dor e o valor daquilo que nosso coração busca, e Jesus restaura a visão daquele cego.
Visão tem algumas dimensões interessantes:
Visão tem a ver com perspectiva – Muitas vezes perdemos a perspectiva e sonhos, a capacidade de enxergar oportunidades. Barna define a visão como a “antecipação do futuro”. Muitos perderam a capacidade de esperar algo bom da vida. Transformaram a vida em mera repetição de eventos, sem um significado e valor maior. Perderam a capacidade de expectativa.
Steve Jobs falava aos acionistas da Apple sobre a necessidade de “imputar grandeza” àquilo que faziam. Acho que é exatamente isto que faz a grande diferença entre vitoriosos e fracassados. Alguns possuem perspectivas, e vivem dentro desta disposição, outros não.
Visão tem a ver com luminosidade. Nossa capacidade de ver traz cores ao nosso mundo não permitindo que nosso universo seja sombrio e escuro. Quando vemos, criamos senso estético, vemos as formas, contemplamos de longe. Com a visão somos capazes de perceber sombras e contrastes, distinguir entre luz e trevas: Ver as cores, tonalidades.
Visão revela movimento – traz noção de que as coisas não estão estagnadas, mas em processo. Com a visão discernimos a velocidade e a marcha lenta, a vida torna-se ativa, revela sua dinâmica. Quem enxerga vê a vida em constante mudança.
O texto paralelo de Mt 20.29-34 nos diz que Jesus, condoído, toca-lhe os olhos (Mt 20.34). A sua situação provoca compaixão em Deus, Jesus se move em direção a este moço. Jesus ministra cura: "Vai, a tua fé te salvou?". Pessoas carregadas de fé acessam os canais de bênçãos de Deus. Fé é uma moeda de grande valor no mundo espiritual.
Conclusão:
Normalmente nos apegamos muito à cura física esquecendo o maior milagre que Deus quer fazer em nossa vida, que é o de nos transformar em seus discípulos e seguidores. A Bíblia não faz qualquer outro registro acerca de Bartimeu a não ser neste texto e nos outros evangelhos sinóticos, mas este texto nos afirma que depois da cura, ele "seguia Jesus estrada fora" (10.52).
O grande desejo de Jesus é que tendo restaurado nossa visão, sejamos capazes de enxergar a coisa mais bela de nossa vida que é o processo de discipulado. O texto afirma que assim que passou a ver, começou a seguir Jesus. Este é o grande milagre que Jesus pode fazer em nós, iluminar os olhos do nosso coração para nos tornarmos seus seguidores.
A maior visão é aquela que nos capacita a crer em Jesus e a segui-lo e a recobrar nossos sentidos espirituais. Nenhum projeto é mais importante que este. A maior cegueira da vida é nossa incapacidade de seguir a Jesus. A sua nova visão gera um novo estilo de vida. Bartimeu quer seguir a Jesus. O contacto com Jesus cria nele uma nova experiência de viver.
El Rancho
14.6.2003
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O que acha de deixar o texto separado por paragráfos? Do jeito que está cansa a leitura e nem dá vontade de ler.
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