segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Gn 11 Babel: Confusão e caos





Introdução:

Um dos textos mais conhecidos da Bíblia encontra-se em Gn 11.1-9, no relato da torre de Babel. Curiosamente não me recordo de ter ouvido algum sermão falando deste assunto.
Babel é simbólica, paradigma de toda cidade, sociedade e sistema sem Deus, de um povo que perdeu a referencia do sagrado. Secularismo.

Afinal, que lições podemos aprender desta narrativa bíblica?

1. Uma sociedade sem Deus é auto-glorificada -
Neste texto vemos um povo buscando grandeza: “Vinde, edifiquemos para nós uma cidade e uma torre cujo tope chegue até os céus e tornemos célebre o nosso nome para que não sejamos espalhados por toda a terra” (Gn 11.4). O que vemos, porém, é que este esforço se tornou um retumbante fracasso. “Ali confundiu o Senhor a linguagem de toda a a terra e dali o Senhor os dispersou por toda superfície dela” (Gn 11.9). A busca da grandeza e glória, de chegar aos céus, revelou-se trágica. O homem perdeu o senso de direção, porque quis “chegar até os céus”. Não querem trazer os céus para suas vidas, mas querem penetrar os céus para controlá-lo.
No entanto, até hoje o que vemos são seres humanos “playing God”, brincando de Deus, querendo assumir o lugar e bancar a divindade. No filme Jurassic Park temos uma cena em que um cientista afirma: “Nós não podemos querer brincar de Deus, se a natureza extinguiu os dinossauros, é porque era necessário que assim acontecesse”.
Nos tempos de Galileu, quando o homem descobriu que não era a terra o centro do universo (Geocentrismo), e sim o sol (Heliocentrismo), o homem achou que agora ele poderia assumir o lugar da divindade, mas assim tem sido desde o inicio da criação. Homens tentam ser Deus. Homens pensam que são Deus, e alguns tem certeza de que são Deus.
Babel representa todo esforço da humanidade para excluir Deus. É o que Henry Nowen chamou de “Teomania”. Esta tentativa luciférica e adâmica do homem em querer assumir o lugar de Deus. Ser Deus. Certa pessoa chegou cúmulo de afirmar: “Não gosto deste negócio de Deus ser Deus”. Eu repliquei dizendo-lhe que só existe um que pode ter a prerrogativa da divindade, e este Ser é o próprio Deus.

2. Uma sociedade sob o pecado, dá espaço para a arrogância, excesso de trabalho e cansaço.
A primeira torre (um prédio), construído na história, pretende claramente desafiar os céus e mostrar sua independência do sagrado. Hoje, como sempre foi, a ciência, a tecnologia e a educação, pressiona para a busca da excelência, mas lamentavelmente torna o homem mais arrogante. Isto traz a rebelião: “tornemos célebre o nosso nome para que não sejamos espalhados por toda a terra” (Gn 11.4).
Historicamente podemos afirmar que existem alguns núcleos centrais que dominam o pensamento humano, pelo menos 4 blocos da ciência podem aqui ser citados.

a. Na ciência Social: O Marxismo – A visão marxista, com seu inevitável totalitarismo, traz na raiz o materialismo dialético”, com a negação explicita de Deus. Deus nada mais é que “o ópio do povo”, e a religião seria assim instrumentalizada para manter os homens debaixo do controle das oligarquias. A história seria movida, não por ação divina, mas por lutas de classes.  Toda a leitura crítica que fazemos no campo social, usa o instrumental marxista.

b. Na Filosofia: O Existencialismo – Sartre, Nietzsche e Camus afirmam que “A existência precede a essência”. Você tem que viver o “aqui e agora”, porque o que importa é viver, não o ser. Esteja feliz com sua vida, e isto basta! Não existe ideia de eternidade. Nem conceito de sacralidade.

c. No campo da Biologia e genética: O Evolucionismo – Mais que o problema do evolucionismo,  temos o problema filosófico da “Geração espontânea “. A vida seria uma mera sucessão de acasos, coincidências naturais. Deus é subtraído dos bastidores da história. Não há Deus! Seu expoente máximo foi Charles Darwin.

d. No Universo da Psicologia e Psiquiatria. Toda a base da psicologia é humanista. A psicoterapia secular exclui Deus. A Psicanálise, com uma das suas linhas mais conhecidas, procurou desde o princípio, dinamitar Deus. Freud se torna um crítico acirrado  de toda concepção teológica e manifesta claramente seu pensamento em livros como “Totem e Tabu”, “O mal estar da civilização” e “Moisés e o Monoteísmo”. Religião nada mais é que “uma neurose obsessivo-compulsiva.

Em todos estes movimentos filosóficos, temos o mesmo pensamento de Babel: Ter o domínio, assumir o poder, controlar, ser igual a Deus e se possível, ser Deus. Como Lúcifer decidiu fazer. A grande tentação para Adão foi a de que não mais haveria barreiras para seu conhecimento, e “como Deus”, seria conhecedor do bem e do mal. A sugestão da serpente é que Deus estava escondendo o jogo, sendo mal intencionado. Babel. A tentação aliada ao seu orgulho levou-o fatalmente à queda.

No Budismo, uma das religiões que atualmente tem uma enorme penetração no mundo de intelectuais e artista, Deus é um completo ausente. Para o budismo, a divindade está dentro de você. Busque a Deus através da meditação, você vai encontrar aí, dentro de você, sua plena potencialidade através do Nirvana, o encontro com o nada. Ausência de conflitos e dor: Sua divindade interna.

3. A situação espiritual da sociedade sob o pecado, a transforma em um celeiro para cultos pagãos e falsas crenças.
Quase todas as cidades são dedicadas a entidades, mesmo em se tratando de cidades absolutamente seculares.
A cidade onde moramos, Anápolis, é uma “polis” de “Ana”, que na tradição católica, seria mãe de Maria. Mas as cidades secularizadas também constroem seus ídolos e erguem suas catedrais, para exaltação de seus deuses.

Veja o exemplo americano:
A cidade Boston possui mais de 207 universidades, num universo de 4 milhões de habitantes (Grande Boston).
New York está fundamentada no mundo das finanças. O coração financeiro do mundo passa pelos escritórios luxuosos da Wall Street, onde são movimentadas diariamente bilhões de dolares.
Las Vegas construiu seus “templos”, através de obras monumentais, transformando-se numa cidade de jogatinas e apostas e jogos de azar.
Washington DC construiu seus altares para os deuses do glamour político, valorizando o poder e as decisões que regem a nação americana, influenciando a político em quase todos governos ao redor do mundo.
Los Angeles ergueu suas capelas para celebrar a luxúria, a arte, a fantasia, transformando-se num campo para adoração e veneração de celebridades do mundo artístico.

A mesma linha de pensamento pode ser observado no Brasil:
Rio de Janeiro exala sensualidade em todos os lugares, quer seja nos sambódromos, com mulheres que decidiram tirar completamente a roupa, optando agora por apliques; quer nas praias onde celebra-se os fios dentais, que nunca foram “dentais”, e são cada vez mais “fios”.
São Paulo tornou-se a meca do poder financeiro, para onde acorrem as grandes empresas, celebradas e veneradas por seus adoradores, trazendo riqueza, celebridade, poder;
Em Brasília encontramos o panteão do poder e do centro das decisões de nossa nação, que por sua vez afeta diretamente milhares de pessoas ao redor de nossa nação.

4. Cidade é o lugar de gente sem esperança e cansada.
Babel constrói seus mega projetos, e seus habitantes são cobrados nos resultados esperados. A cidade se agita, assim como é dito que “São Paulo não dorme”. O resultado da cidade secular, porém, é a solidão, alienação, correria, distanciamento, anonimato. O resultado é confusão interior: Angústia, desordem, caos, desespero, bipolaridade, transtornos obsessivos, síndrome de pânico. Facilmente vem o cansaço, o stress, a exaustão. Parece que foi este sentimento que Jesus teve ao ver as multidões. “Vendo ele as multidões, compadeceu-se delas, porque estavam aflitas e exaustas, como ovelhas que não tem pastor”(Mt 9.36).
No entanto, Jesus não se distancia da cidade, pelo contrário, e para ela que se dirige.
Sempre me fascina o relato de Mc 5 sobre o endemoninhado gadareno. Jesus saiu da Galileia, atravessou todo o lago de Genesaré, para libertar um homem que vivia atormentado por espírito malignos, andando nu pelos sepulcros e preso a correntes. Jesus não conseguiu penetrar naquela sociedade que o repeliu assim que ele mexeu com o chiqueiro deles. No entanto, Jesus deixou ali uma testemunha do seu poder e graça libertadores, transformando aquele que antes era um louco e possesso em alguém são, que será daqui em diante, um missionário.

5. Esta cidade rica e confusa, apaixonada pela ciência e pela tecnologia, precisa ser alcançada.
Como igreja, temos o grande desafio de sermos uma igreja para a cidade. A presença da igreja traz esperança, cura e acolhimento. Babel se perdeu na sua arrogância como tantas outras cidades também estão vivendo.
Em At 8.8 há o registro da chegada do Evangelho a Samaria. Deus usava poderosamente a vida de Filipe, e muitas pessoas foram libertadas de espíritos malignos e outras foram curadas. Ao verem a manifestação da presença de Deus, os moradores passaram a celebrar a graça de Deus, “E houve grande alegria naquela cidade” (At 8.8). Que grande nota nos é descrita neste texto. A presença da igreja trouxe grande alegria à cidade.

Babel e Pentecostes

A Bíblia mostra uma unidade de pensamento. Todas as suas partes estão interligadas. Existe um texto, no Novo Testamento, que nos fala de um aspecto completamente diferente de Babel, sua narrativa correlata encontra-se em Atos 2, no evento do Pentecostes. “Estavam, pois, atônitos e se admiravam dizendo: Vede! Não são, porventura, galileus todos esses que ai estão falando? E como os ouvimos falar, cada um em nossa própria língua materna”(At 2.8). Ocorre aqui o inverso de Babel. Pessoas com linguagens diferentes compreendem o que ouvem.  O caos e a confusão são desfeitos e a comunhão se estabelece.
A ordem começa com Deus, no derramamento do seu Espírito Santo, (Pentecostes), e não no esforço humano da supremacia. Babel gera confusão, caos e competição.
No Pentecostes, Deus reveste os homens de poder, é uma operação que desce “do alto”. A raça humana não consegue se entender sem Deus. Fala idioma distinto. Temos a mesma língua mas não sabemos nos comunicar. Se você acha que você se comunica bem, pergunte à sua esposa. Os lares encontram enormes dificuldades para se entenderem. Só é possível falar a mesma linguagem que o Espírito Santo gera esta identificação.
Nossa comunicação se torna confusa por causa da auto exaltação e auto-glorificação. Paulo exorta a duas irmãs de Filipos que pensem concordemente no Senhor (Fp 4.2); exorta também a comunidade de Corinto, para que seja inteiramente unida, na mesma disposição mental e no mesmo parecer. Isto só é possível quando o Espírito Santo media o diálogo.
Quando buscamos auto-glorificacão, o investimento será em indústrias e armas bélicas. Nos armamos. A tentativa de deificação do homem, de alcançar os céus, precipita o homem na confusão e no desamor. 
Babel mostra o homem perdendo o ponto de referência com o semelhante. No Pentecoste vemos a raça humana reencontrando a capacidade do diálogo. Se seu casamento, sua igreja, sua família não fala a mesma linguagem, certamente a luta de poder e controle está em jogo, e só Deus poderá ajudar a entender o outro. Em Babel vemos divergência, em Pentecoste, convergência; em Babel confronto, no Pentecoste, encontro.

Conclusão:
Somos sempre exortados na Palavra de Deus a termos um coração quebrantado. Deus já ensinava através dos profetas que Deus não se agradava de sacrifícios, mas de um coração quebrantado, isto é demonstrado claramente no Sl 51.16-17. A religiosidade mecânica em torno de ritos não é o que Deus deseja de seu povo, e sim um coração sensível. O caminho passa pela rendição. “ Deus resiste aos soberbos, contudo aos humildes concede a sua graça”.
Babel é o oposto do Evangelho. Babel é auto-afirmação, controle, domínio, supremacia, arrogância e orgulho. Evangelho é rendição, quebrantamento, retorno a Deus, dependência. Transfiro meus direitos, destrono meu eu.
Certamente não há nada tão “politicamente errado” quanto isto. Não existe mensagem secular que fale da gente morrer para o EU, mas Jesus foi enfático ao afirmar: “Se o grão de trigo não morrer, fica ele só; mas se morrer, produz muitos frutos”.
O modelo de Jesus é sua entrega a nosso favor. Olhando para Jesus vemos sua humildade, sua dependência do Pai, e seu desejo de servir. Tudo isto é oposto a Babel. 

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