segunda-feira, 7 de abril de 2014

Gn 37 Providência ou acaso?




Introdução:

O maior desafio da vocação cristã é o próprio discipulado. Termo este que acho mais que apropriado no meio de tantas confusões e nomenclaturas atuais. Quando me pergunto o que faço e digo que sou pastor, eu sei de quantos questionamentos brotam na mente das pessoas quando eu revelo a minha função/vocação/trabalho. Pastor é uma figura suspeita no cenário evangélico brasileiro.
Trinta anos atrás, quando dizíamos que éramos evangélicos, em geral o simbólico do evangélico era um uma pessoa engravatada, mulheres de longos cabelos, e gente esquisita, que vivia propalando juízos eternos e falando do inferno e julgamento, mas, apesar de serem “esquisitas”, eram pessoas honestas, trabalhadoras e íntegras. O perfil hoje mudou radicalmente. Evangélico deixou de ser visto como uma sub-cultura, e tornou-se relativamente bem aceito, mas o grande problema é que infelizmente perdeu também o status de integridade. Ser evangélico hoje, em termos de caráter e reputação, não significa nada positivo.
Definir-se como um protestante, é algo complexo: Protesta contra o que? Qual a origem e significado desta definição.
Definir-se como Reformado, um termo que me agrada relativamente, ou calvinista, é ainda mais complexo. As pessoas não conseguem entender o significado deste termo. E se disser que é presbiteriano, ai fica ainda mais confuso. Até prá falar. Já ouvi de tudo: Presteriano, prasteriano, presbisteriano... etc...é um termo quase impronunciável.
Como crente, acho muito pobre. Crente é o que crê. Crê em que, ou em quem? Por conceituação, até o diabo é crente. Isto é o que afirma o apóstolo Tiago: “Crês tu que Deus é um só, fazes bem; até o diabo crê e treme” (Tg 2.13). Isto demonstra que satanás, crê de forma mais profunda que muito crente, que apenas admite a idéia de Deus, mas que não treme na presença de Deus.
Então, só me resta ser discípulo. Quando me perguntam sobre minhas convicções afirmo que sou um discípulo de Cristo. Esta definição traz algumas implicações. Jesus afirmou: “Se permanecerdes nas minhas palavras, sereis verdadeiramente meus discípulos” (Jo 8.31). O discípulo é o aluno, aquele que deseja aprender de Cristo, e cuja mente se prepara para seguir os ensinamentos que ele nos deixou. O discípulo é um seguidor de Cristo. Ele deixa que sua mente seja moldada por Cristo.

Situando-se no texto:
Ao lermos o texto bíblico, devemos perguntar o que este texto tem a ver com nossa vida. Este texto está distanciado de nós, no tempo, cultura e geografia – por cerca de 4 mil anos. Os princípios de Deus estão aí presentes, e para desfrutar da bíblia, precisamos aprender a tirar lições para nossas vidas.
Eis algumas perguntas apropriadas:
                è Há um novo ensinamento que devo considerar?
                è Há algum pecado a abandonar?
                èPreciso orar para praticar algum princípio deste texto lido?
                è Como discípulo, como devo responder a estas interpelações bíblicas?
                è Existe alguma promessa de Deus para ser recebida?

Através da leitura cuidadosa da bíblia, vamos aprendendo pelos ensinamentos contidos, pelos exemplos percebidos – sejam eles bons ou maus, e pelas promessas que nos são dadas. Este texto é repleto de ensinamentos assim.

  1. Sua história pessoal pode ser o turning point da sua família – olhe como o texto descreve isto. “Esta é a história de Jacó. Tinha José dezessete anos...” (Gn 37.2)
A história é de Jacó ou de José? O texto se propõe a falar de Jacó, mas o relato foca em José. Porquê?
Tenho chegado à compreensão de que, muitas vezes, a vida de uma determinada pessoa torna-se a referência para a história dos pais e da família inteira. A história de José é a referência de Jacó.  Se prestarmos atenção, não é difícil perceber isto. Eventualmente vemos pessoas vindo de lares destruídos, mas que são alcançadas pela graça de Deus, e a história familiar começa a mudar a partir desta pessoa, e todos são abençoados. Ele é a primeira pessoa a se encontrar com Deus, mas o Espírito de Deus, através de sua vida, vai fazendo as transformações que precisam acontecer, e aos poucos percebemos como aquela vida traz enorme diferença na história dos outros.
Recentemente o país ficou admirado da performance do presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, homem negro e de pulso firme, que conseguiu condenar, no meio de muita oposição, o ex-presidente da casa civil do governo Lula, José Dirceu, um dos homens mais fortes da República. De onde vem este homem? Ele é filho de uma mulher negra, assembleiana, crente fiel. Ali na sua casa, os princípios de virtudes e morais foram inoculados na sua mente e consciência. Aquela mulher transformou a história deste país com seu zelo e piedade.

  1. Nem todo sonho é vazio – precisamos tomar muito cuidado com o papel dos sonhos na espiritualidade cristã. A bíblia está repleta de eventos transformadores quando Deus se revelou aos homens através de seus sonhos. Deus falou muitas vezes e de muitas maneiras, o sonho foi um destes meios que Deus usou.
José se revela um sonhador. Ele tem algumas memórias oníricas complicadas. Numa delas, seus irmãos todos se curvavam diante dele. Na outra, até o pai e a mãe se curvavam. O próprio Jacó o censurou porque estava indo longe demais...
Por isto, ao lidar com os sonhos, precisamos de uma série de cuidados especiais.

  1. Podemos atribuir a Deus, sonhos que são meros frutos de nossas preocupações e do inconsciente – são os famosos “sonhos de barriga cheia”. Se você passou o dia ou tem vivido dias de muito stress, sua angústia pode extravasar-se em formas de sonhos. Dá para atribuir a Deus o significado destes sonhos?
Em 2013 tive um sonho perturbador. Tão perturbador e desafiador, que ao acordar, coloquei meu joelho em terra e orei pedindo a Deus para que, se aquilo fosse algo vindo dele, se confirmasse. Até hoje nada aconteceu. Eu não pude relatar este sonho às pessoas, a não ser gente que faz parte do meu vinculo restrito. Mas ainda o trago no peito como uma esperança. Eu o escrevi e o guardei. O que Deus vai fazer com isto? Não faço a mínima idéia. Não sei se isto veio de Deus ou de mim, apesar de ter me incomodado tanto.
Alguns anos atrás aconselhei uma jovem que estava muito frustrada com Deus. Ela era solteirona e queria se casar. Esta idéia era tão forte na sua vida, que para ela, tratava-se de uma promessa de Deus, mas os anos se passaram e a promessa não se cumprira. Agora, indignada com Deus, ela me disse que aquele sonho lhe havia sido dado por Deus. E quando eu lhe perguntei se o sonho fora mesmo dado por Deus ou fazia parte do seu desejo, diga-se de passagem, legitimo, de ter um marido, ela não soube responder.

  1. Irrealidade – Sempre há o perigo da fantasia se confundir com a verdade. Deus adverte o povo de Israel, através do profeta Jeremias, de que homens, que se entendiam profetas, estavam confundindo as coisas. Veja como o texto é duro, com estas pessoas.
Tenho ouvido o que dizem aqueles profetas, proclamando mentiras em meu nome, dizendo: sonhei, sonhei. Até quando sucederá isso no coração dos profetas que proclamam só o engano do próprio coração? O profeta que tem sonho conte-o como apenas sonho; mas aquele em quem está a minha palavra fale a minha palavra com verdade. Que tem a palha com o trigo – diz o Senhor” (Jr 23.25,26,28). Sublinhe a frase: “proclamam só o engano do próprio coração”. Isto é auto engano. Eles supõem que é Deus falando, mas estão tendo falsas impressões e falam em nome de Deus. O sonho pode ser fruto de uma irrealidade, e não de Deus. Atribuir coisas do coração a Deus é um grave risco.

  1. Sonhos, se não forem bem comunicados, tornam-se fonte de grandes antagonismos – José é um adolescente afoito. Ele tem 17 anos. Sua arrogância é visível e trouxe a censura até dos pais.
Em geral, sonhadores são megalomaníacos. Não apenas no sentido de que podem ser vitimas de coisas irreais, mas também porque as coisas são muito utópicas. Walt Disney, teve rejeitado  o seu sonho por três grandes companhias de entretenimento da sua época. Sua visão de possibilidades parece fantasia. Pessoas que sonham alto precisam se preparar para lidar com as críticas – e assume de tudo. Precisa aprender a comunicar com sabedoria seus sonhos.

  1. Predileção por filhos é um laço para a unidade da família – Veja quantas vezes a idéia de que os irmãos de José o odiaram por causa da manifesta predileção de seu pai. José se tornou objeto do ódio, e tudo isto foi provocado pela falta de sabedoria de seu pai. Jacó comete a tolice de comprar uma roupa de festas, uma túnica sofisticada, só para José. Como vocês acham que os irmãos reagiriam?
José perdeu a amizade e apoio de seus irmãos por causa da predileção explicita que seu pai demonstrou. Se você deseja manter sua família em ordem, tome cuidado com predileções. Você pode até se identificar mais com o temperamento de um determinado filho, mas não permita que isto se torne uma razão de divisão e uma provocação para os demais filhos. Filhos prediletos sempre se tornam o pivô de hostilidade e oposição em suas casas.

  1. A providência de Deus – Apesar de todas as considerações anteriores, certamente o foco central deste texto está na forma como Deus conduz misteriosamente a história. A vida de José revela como Deus se move misteriosamente em nossas vidas.
Minha esposa me perguntou algum tempo atrás, como eu distinguia Deus na minha vida, e eu, depois de uma reflexão mais demorada, pude afirmar que para mim, a melhor forma se encontra quando eu olho no meu passado e vejo como Deus se moveu na minha vida.
O profeta Naum afirma que Deus tem “o seu caminho na tormenta e na tempestade”. O profeta Isaias afirma que “Deus é um ser misterioso”.
Eventualmente não conseguimos distinguir Deus nos eventos ordinários.
Imagine-se no lugar de José. Você seria capaz de perceber Deus se movendo na sua vida?
Tinha uma confortável casa, amparado pelo pai que o mimava, e agora, inescrupulosamente e de forma violenta é vendido como escravo. O escravo não tem nome, não tem direitos, nada pode reivindicar. Vai para um país de uma língua desconhecida, é exposto num mercado como gado e adquirido por preço por um homem rico e poderoso na hierarquia egípcia. Ali a bíblia diz que “o Senhor era com José”. Seria que ele percebia isto quando teve que se ver como servidor numa casa estranha?
Por causa de suas convicções pessoais e valores, manteve-se íntegro em cada função, e por isto foi reconhecido. Seu caráter, no entanto, torna-se seu obstáculo, uma vez que sua patroa lhe coloca os olhos e o deseja. Ele se esquiva dela e vai parar na cadeia. Provavelmente apanhou muito, chegou naquela prisão humilhado e foi jogado num canto escuro para comer o resto do resto. Alguns anos se passam ali. Depois do encontro com o copeiro e o padeiro de Faraó, ainda se passam dois anos. “O Senhor era com José”. Nós sabemos isto porque a Bíblia afirma que sim, mas José, naquela condição de prisioneiro, era capaz de perceber Deus na sua história?
A verdade é que Deus está se movendo entre nós.
Os eventos aparentemente desconectados estão todos interligados pela soberania de Deus. Os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis, e nenhum dos seus planos pode ser frustrado. Deus é Deus, e conduz a história, no decorrer dos anos, de acordo com seu plano.
Eventualmente nos vemos como um mero acidente, mas a verdade é que precisamos aprender definitivamente que somos conduzidos não pela força do determinismo cego, do maktub, da coincidência e do acaso, mas pela amorosa e sábia providência de Deus que faz, a seu tempo, tudo quanto lhe apraz.
Os eventos trágicos e inexplicáveis. O mistério e a dor do tempo presente, as angústias e crises pessoais de hoje, estão sendo trabalhados por um Deus que fez todas as coisas para seu determinado fim. Sua vida está nas mãos de um Deus sábio. Deus não joga dados. Ele não brinca com sua vida. Você não está à mercê das circunstâncias, dos eventos desconectados, das pessoas perversas. Você está nas mãos de um Deus gracioso e bom.
A história de José nos revela esta grande verdade. Deus se manifesta nos eventos históricos. Deus quebranta Jose para que seu projeto se execute na sua vida. O próprio José reconhece isto. “Vós intentastes o mal, mas Deus transformou o mal em bem, como hoje vedes” (Gn 50.20). a intenção dos irmãos foi maligna e perversa - Deus usou isto para seus propósitos. A atitude da mulher de Potifar foi leviana – José é envolvido numa trama que permite que ele entre em contacto com o primeiro escalão do governo e futuramente com Faraó. Deus faz todas as coisas perfeitas, até mesmo o mal. Sua história não é acidental, e nem a nossa.
Sua história hoje está sendo trabalhado por um grande artista. Somos seguidores de um carpinteiro judeu que pode pegar madeiras tortas e transformá-las em obra prima. Sua história não é determinada pelo acaso.

Conclusão:
Na Copa do Mundo, realizada na França, o técnico do Brasil naquela ocasião foi Parreira. Numa entrevista ele afirmou que a música da seleção seria a música dos titãs, cuja estrofe afirma: “O Acaso vai, me proteger, enquanto eu andar distraído”. A música é linda! Esta afirmação é péssima. Nas mãos de quem você estará quando estiver distraído. Do acaso? Das coincidências? Dos atos fortuitos?
O resultado é conhecido por todos nós.
Zidane cruzou a bola na medida para Thierry Henry, que mandou a bola para o fundo das redes do Brasil e ganhou o jogo de 1 x 0, eliminando o nosso time. É fácil perceber o que acontece quando somos dirigidos pelo acaso.

Sua vida não está nas mãos do acaso, de forças cegas, de coincidências – sua vida está nas mãos de um Deus, que tem o controle de toda história. Você não sabe o que vai lhe acontecer no futuro, mas pode estar certo de quem vai estar no seu futuro. O que interessa não é o que, mas quem.



























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