domingo, 13 de abril de 2014

Sl 90.12 Envelhecendo com graça




Introdução:

Em 1997, recebi um tape (naquela época era o sistema usado para se gravar coisas), de John Maxwell, com o sugestivo titulo: “I´m 50, reflecting” (sou cinqüentão, refletindo...) Achei muito sugestivo o sermão deste conhecido preletor, no qual descrevia as mudanças que estavam acontecendo em seu coração, e como ele estava fazendo planos para os próximos anos de sua vida. Creio que toda vez que zeramos o velocímetro mudança de idade isto gera reflexão no nosso coração. A idade, geralmente tem o poder de nos transformar e nos incomodar.
Não é fácil envelhecer...
Jorge Amado, com sua forma amarga e crua, certa veza afirmou numa entrevista que “a velhice é uma porcaria!” Bem, o termo “porcaria” não foi exatamente o que ele usou, mas deixemos assim mesmo...
Existe um belíssimo filme estrelado por Jane Fonda e Henry Fonda, “num lago dourado”, no qual há um homem idoso, mau humorado e chato, que todos tentam tratar bem, mas que é intragável. No dia em que ele completa 80 anos, o genro, querendo ser simpático lhe perguntou como se sentia fazendo 80 anos, e ele respondeu: “Duas vezes pior que quarenta”. Tive uma ovelha muito especial, Sr. Jorge Sahium, que aos 96 anos afirmou em tom de brincadeira: “Morro de medo de ficar velho”.
Na verdade, só existe uma forma de não envelhecer – morrer cedo! O Salmista, percebendo as dificuldades naturais de sua idade ora ao Senhor: “Não me rejeites na minha velhice; quando me faltarem as forcas, não me desampares” (Sl 71.9) e no texto acima lemos: “Ensina-nos a contar os nossos dias de maneira que alcancemos corações sábios”.
Para envelhecer com graça e maturidade precisamos considerar cinco pilares significativos, que em inglês começa sempre com “F”: Friends, family, finances, fellowship e faith (o copyright é meu). É importante considerar cada um, embora seja possível envelhecer sem uma ou outra, mas sem qualquer um, estamos mancos.

  1. Família

Família ocupa um lugar essencial na vida do ser humano. Uma das coisas mais fortes na vida são laços familiares. Não consigo imaginar alguém que seja pleno na vida, sem a convivência da família. Se eu não estou errado na minha interpretação, creio que foi exatamente esta a idéia do escritor cristão no Salmo 128, quando afirma:

“Bem aventurado é o homem que teme ao Senhor e anda nos seus caminhos,
Do trabalho de suas mãos comerás, feliz serás, e tudo te irá bem.
Tua esposa, ao redor da tua mesa será como a videira frutífera,
Teus filhos, como rebentos da oliveira.
Eis como será abençoado o homem que teme ao Senhor”.

O que o texto sugere é que, o homem bem aventurado, termo este que sugere bem mais que ser feliz, que traz a ideia de plenitude, é o homem que tem o privilégio de assentar-se à mesa e compartilhar do que tem com seus filhos e netos, tendo sua prole ao redor da mesa. A Bíblia afirma, “eis como” será abençoado o homem que teme ao Senhor.
Por mais rico e independente que sejamos, não interessa quanto dinheiro ganhamos, nem a quantidade de bens que acumulamos, sem compartilhar a vida com a família, filhos e netos, somos pobres.
Todos sabemos das complexidades que uma família comum experimenta. Nelson Rodrigues, dramaturgo brasileiro afirmou que: “Família, na melhor das hipóteses, só serve para dar emprego aos psiquiatras e enriquecer a indústria farmacêutica”. Certamente há muitas dores na convivência familiar, mas é ali também o lugar onde a cura e a restauração acontece, e por mais complicada que sejam as relações, o lugar onde encontramos apoio e encorajamento nos dias maus. Laços consangüíneos tem um poder muito forte sobre nossas vidas. Envelhecer sem família é uma viagem ruim.
Certa vez fui visitar um homem rico que havia rompido com toda sua família e cujos herdeiros brigavam com ele pela herança. Quando tentei mediar o diálogo, disse-lhe que para mim, o dinheiro era coisa de somenos importância, mas a relação dele com a família importava muito. Ele retrucou dizendo que sempre esteve afastado da família e que a vida era assim mesmo. Ele não teve oportunidade de conhecer seus netos, de caminhar com seus filhos, de partilhar da história de seus descendentes. Ao me deparar com aquele quadro, considerei como era pobre existencialmente.
A Bíblia afirma que é feliz o homem que tem o privilégio de ter esposa, filhos e netos ao redor da sua mesa. De comer com seus filhos, de partilhar a mesa, de acompanhar o nascimento de um neto, de assentar à mesa com os filhos. Este é o processo natural e saudável do envelhecimento.
João Alexandre afirma na belíssima poesia da música Paz e comunhão:
Faz tua nova casa na varanda do velho chão,
Convida o teu irmão pra vir morar contigo,
Planta paredes novas, feitas para servir de lar e abrigo.
Faz um café gostoso, põe a mesa no teu jardim,
Deixa que assim as plantas tenham paz contigo,
Convida o universo, faz a vida ganhar maior sentido.
Cuida da tua morada, cuida do pequeno mundo,
Deixa teu irmão bem perto, livre, livre...
                                   
  1. Amizade – Este é o segundo pilar que aprofunda o significado da alma humana e do envelhecimento. Precisamos ter relacionamentos duradouros, longos e significativos.

O homem que não cultiva relacionamentos de amizade fica só na velhice. Quem é que anda contigo hoje que estará contigo na velhice? Você pode envelhecer com esta pessoa? Acha que esta amizade romperá a tendência da solidão e isolamento próprios da velhice?
Existem diferentes tipos de amigos, e precisamos aprender a cultivar cada um deles, para circunstâncias diferentes.
Existe o amigo festivo, que anda conosco na hora da farra, gosta de pescar, comer churrasco, almoçar, fazer jantares, repartir pratos, gente alegre e festeira, mas cuja amizade passa rapidamente. Não há problema nenhum em ter estes amigos, aliás, até precisamos deles. Muitas vezes somos assim para determinado grupo de pessoas. É uma amizade superficial, que tem o caráter transitório, do tipo “vale enquanto dura”.
Existem amigos sazonais, agem em nossas vidas por temporadas. De repente aparecem, como uma febre ou uma gripe, trazem muita alegria ao nosso coração, faz muitos anos que já os conhecemos, mas da mesma forma que aparecem, desaparecem. São amigos de temporadas, que eventualmente nos ligam e encontram um jeito de fazerem um programa juntos, sempre trazendo alegria e contentamento, mas somem como nuvem, passam os meses ou mesmo anos, e depois retornam em outras épocas mais festivas ou casuais. Eles se encontram no rol de nossas amizades.

Existem os amigos duradouros, vieram para ficar na sua vida. Estes estarão sempre por perto, seja qual for a situação. Alguns afirmam que estes são os verdadeiros amigos. Que sempre aparecem quando todos os demais somem. Você pode contar com eles no dia a dia e a longo prazo. Eventualmente falam de suas angústias e medos, não se sentem julgados, nem tem necessidade de justificar atitudes pessoais. Eles conhecem nossas variações de humor, altos e baixos e ainda assim gostam de andar conosco. São amizades cultivadas, regadas, aprofundadas.
No processo de envelhecimento, precisamos muito deste último grupo de amigos. Gente da mesma idade ou não, mas que insiste em permanecer ao nosso lado. Cada fase da vida apresenta dilemas diferentes e é bom ter gente que entende nossos conflitos porque também os experimenta em certo nível.
Ouvi a seguinte comparação: Quando estamos na fase dos 20 anos, nossas conversas são mais ou menos assim: “Rapaz, encontrei uma garota fascinante e gostaria de apresentá-la. Ela é sensacional, e estou amarrado”. Quando entramos na fase dos 40 anos, o discurso muda: “Fui nesta semana a um restaurante e comi uma comida deliciosa. Quero levá-lo comigo, o ambiente é delicioso e a comida é fantástico!” Quando chegamos aos 60, a temática é: ‘Estive num médico esta semana que é excelente, você também precisa ir lá para conversar com ele, vai lhe ajudar muito”.
Precisamos de amigos, que estarão conosco não por causa de títulos e cargos, nem que possuam conosco uma relação de poder, não pela posição que ocupamos ou o cargo para o qual fomos designados, mas que estarão conosco mesmo se não tivermos nada a oferecê-los, a não ser nós mesmos. Cultive estes amigos, como jóias raras, pois “há amigos que são mais chegados que irmãos”.

  1. Comunidade – Para envelhecer com graça, precisamos ainda de encontrar uma comunidade. Um grupo com quem partilhamos nossas experiências, hobbies, fé, objetivos.

Existem várias comunidades ou grupos, e são muito positivas para nossas vidas. Fico observando nas grandes cidades, velhos amigos assentados e jogando dominós em praças públicas. Na igreja que atualmente pastoreio temos grupos de jipeiros, ciclismo, motociclismo, pescaria, futebol e aeromodelismo. Todos estes grupos ajudam muito na caminhada.
Existem grupos de filantropia: Rotary Club, Lions Club e outras agremiações e associações, nos quais as pessoas desenvolvem relacionamentos por afinidades. Alguns destes grupos são filantrópicos, outros religiosos ou assistenciais. Um dos grupos mais significativos, sem dúvida, é a igreja. Independente de qual seja a sua comunidade, para envelhecer com graça é muito positivo para a saúde emocional, este senso de pertencimento.
Agradeço muito a Deus o cuidado que ele tem tido com meus pais, ao providenciar-lhes uma comunidade acolhedora como a que eles tem participado. Fica num bairro de periferia e meus pais, por terem uma situação financeira um pouco melhor, tornaram-se arrimos para aquele grupo. Levam presentes para as crianças, ajudam nas festas, se envolvem com as pessoas. A vida deles encontra sentido neste senso de pertencimento. Louvo a Deus pela vida do evangelista Jussiê em Gurupí-TO, que cuida de meus pais como se fossem os seus. A presença dele na vida dos meus pais, os telefonemas, tem sido uma fonte inesgotável de alegria para suas vidas. Eu nem sequer consigo imaginar suas vidas sem esta comunidade rica em amor, que os trata de forma tão carinhosa e amorosa. De vez em quando, meu pai os convida para irem à fazenda, ali eles pescam, brincam, compartilham alimentos, dão risadas, fazem culto e comilança, num clima de muita descontração e simplicidade. Meus pais, pessoas simples também, amam esta experiência e caminhada.
Na comunidade experimenta-se senso de pertencimento, tem-se possibilidade de servir com os dons e recursos. Esta troca, doação, aceitação e partilha, faz um bem imenso para a vida de um homem, principalmente quando se torna mais idoso. O Sl 133 afirma: “Oh, como é bom e agradável viverem unidos os irmãos”. Isto é uma verdade ainda mais percebida, na medida que envelhecemos.

  1. Finanças – Em quarto lugar, diria que para se envelhecer bem, precisamos de certa independência financeira. Não estou falando de ser rico, mas de não depender dos outros, nem de filhos – e principalmente de genro e nora.

Envelhecer com bens e poder abençoar filhos e netos, é uma experiência preciosa. Minha mãe sempre foi generosa com seus bens, mas na medida em que foi envelhecendo, eu particularmente tenho tomado cuidado com o que falo porque ela imediatamente quer ajudar. Quando fomos comprar o vestido de noiva da minha filha, ela insistiu em mandar uma oferta em torno de 500 dólares. Quando minha casa foi arrombada e os ladrões roubaram até panela de pressão de nossa casa, ela foi uma das poucas pessoas que voluntariamente se preocupou conosco e nos deu uma quantia em torno de 500 dólares também. Não estava em jogo a quantidade, mas sua disposição em nos abençoar nos fez muito bem. Achei muito bonito sua mobilização para nos ajudar e abençoar.
Não interessa o padrão, se alto ou baixo, mas a Bíblia faz uma afirmação curiosa: “Não são os filhos que entesouram para os pais, mas os pais que entesouram para os filhos”. Ter para dar na velhice é um grande privilégio. Deixar bens e herança para os filhos, outro grande privilégio. Provérbios afirma que “o homem de bem deixa herança aos filhos de seus filhos” (Pv 13.22). eu agradeço a Deus o sistema social que temos, apesar de eventuais injustiças, mas na realidade brasileira, este pouco se torna significativo. São muitos os avôs que hoje estão pagando escolas de netos, ajudando filhos a construir suas casas, com a aposentadoria que recebem do sistema social. Esta conquista tem livrado milhares de idosos do ostracismo e abandono. Portanto, tente organizar sua vida, de tal forma que você não dependa de filhos e netos.

  1. – O último aspecto a ser considerado como pilar do envelhecimento é a busca por significado e sentido. Convicções claras sobre as questões eternas é uma das grandes bênçãos na velhice.

Carl Gustav Jung afirma no livro “The man in search of a soul”, que não conhece ninguém, com mais de 40 anos, cujo problema essencial não seja a questão da espiritualidade. É a fase da busca do sentido, quando chegamos à conclusão de que coisas, cargos, posições, realmente não ocupam mais nossa alma e não nos alimentam mais. Buscamos sentido: “para onde vamos?”, ou, “O que é a vida?”, “qual o sentido em viver?”. “De onde viemos, o que estamos fazendo aqui e para onde vamos?”.
É muito triste envelhecer sem a idéia de sacralidade, sem um conceito apropriado de Deus, porque se a vida termina num túmulo vazio, com todas as contradições, ambiguidades e paradoxos,  estamos vivendo num cenário do absurdo, como pontuou Jean Paul Sartre. A vida sem Deus, sem um senso de justiça, destino ee harmonia é um grande problema filosófico.
Numa entrevista à Veja, um conhecido matemático declaradamente ateu, tentava de todas as formas justificar sua atitude de descrença e na medida em que lia o texto, fiquei triste por ele. Tentei imaginar o que seria daquele homem quando estivesse perto da morte. Que sentimentos e conceitos encontraria na sua alma? Pensei na sua surpresa diante do trono do juízo de Deus, deparando-se com a verdade da eternidade. Como tal homem pode viver, e como era a morte de um homem completamente destituído de esperança?
A vida exige uma espécie de coerência para explicar as contradições que ela traz em si mesma. Por que prosperam os ímpios? Por que acontecem coisas boas a pessoas ruins e o contrário? A percepção superficial nos aponta para um universo repleto de contradições. Sem Deus, esta vida é absolutamente sem sentido.
Albert Camus é um escritor existencialista Argelino que cresceu na França e durante muito tempo defendeu os conceitos do agnosticismo. Um de seus livros mais conhecidos é O Mito de Sísifo. Na mitologia grega, Zeus decide punir Sísifo, dando-lhe a incumbência de levar uma pedra para o pico de uma montanha, pelo resto da vida. Logo na introdução deste livro ele declara que diante de tanto sofrimento e dor, uma das hipóteses filosóficas mais razoáveis é a do suicídio. Se Deus não existe, e a vida consiste em levar uma pedra para o topo de uma montanha, como eterno castigo de Deus, não faz sentido viver.
Precisamos de algo que dê sentido, não apenas para envelhecer, mas para viver, caso contrário, a vida nada mais é que um amontoado de acontecimentos díspares, sem significado para o viver.
Por isto, envelhecer com fé em Deus e esperança, é uma das grandes, se não a mais profícua de todas as bênçãos. A Bíblia afirma que “Tudo fez Deus formoso no seu devido tempo; também pôs a eternidade no coração do homem” (Ec 3.11). Nós temos necessidade de espiritualidade, de resolver o dilema da nossa existência e a razão para a qual somos e existimos. Envelhecer sem esperança é uma grande tragédia.
O processo de envelhecimento exige de nós um aprofundamento nas reflexões, somos convidados a adentrar espaços da alma que sempre negamos e a contemplar a vida na perspectiva do sagrado. Somos chamados para um encontro com o Eterno.

Conclusão:
Por esta razão o salmista está afirmando: “Ensina-nos a contar os nossos dias de maneira que alcancemos corações sábios” (Sl 90.12).

Precisamos aprender com Deus a importância de nossa vida, para que tenhamos sentido no viver e para envelhecer com graça diante de Deus.

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