segunda-feira, 11 de maio de 2015

Pequenos detalhes, grandes diferenças


Introdução: 

Em geral prefiro pregar sermões expositivos, porque na medida em que estudo a Bíblia com a igreja, ajudo as pessoas a pensarem a partir da Bíblia e a extraírem lições dos textos. No entanto, esta não é a única forma de nos aproximarmos dela. É possível ainda estuda-la tematicamente, escolher um assunto e considerar a visão das Escrituras em vários textos estudando o tema proposto. Hoje farei uma abordagem de alguns pequenos pontos da Bíblia, que eventualmente são distorcidos ou não percebidos, pequenos detalhes que fazem uma grande diferença na nossa vida.
O grande projeto da Bíblia é nos apresentar o plano da salvação, o mistério de Deus oculto em Cristo. Toda Escritura possui este fio condutor que integra um tema específico, a vinda do Messias, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Jesus é o centro da Bíblia. É impossível entendê-la sem a percepção do seu ministério. Não faz sentido algum, estudar o livro da Lei, com todas as suas considerações sobre o sacrifício judaico, se não o associarmos ao sacrifício e morte de cristo. A Carta aos Hebreus, um dos livros da Bíblia, faz esta hermenêutica de forma muito apropriada.

Fora da centralidade de Cristo, os demais temas são periféricos, correlatos e incidentais.

Por ser a verdade de Deus, a Bíblia é um livro de princípios, e muitos deles contraculturais em sua natureza, porque fazem declarações e sustentam conceitos que são paradoxais e eventualmente parecem não fazer sentido e ferir o senso comum.
O Livro Contracultura Cristã, escrito pelo Dr. John Stott, analisa o Sermão do Monte, exposto por Jesus a partir desta compreensão. O que Jesus ensinava era uma forma diferente de ler a vida e interpretar a história.

No sermão de hoje, gostaria de refletir sobre quatro pontos.
Pequenos detalhes que fazem grande diferença.

1. Ore, como se...

Jesus faz a seguinte afirmação aos seus discípulos: “Por isso vos digo que tudo quanto pedirdes, crede que recebestes, e assim será convosco” (Mc 11.24). Ele os ensina a orarem crendo que a resposta à oração já tivesse sido respondida. Ele encoraja seus discípulos a se apropriarem da resposta “como se” ela já fosse uma realidade.
Hope MacDonald Afirma: “Aprender a crer em Deus é colocar a fé em ação. Imaginar ver a resposta da oração como se já tivesse sido respondida”. O grande problema da oração é que quando lemos as maravilhosas promessas de Jesus temos tendência de racionalizar, justificar e explicar o texto que nos encoraja a radicalizar na fé, e crer... simplesmente.
Leia novamente este texto.
Não é desafiador orar da forma como Jesus nos ensinou a orar? Vendo pela fé a resposta de Deus, como se tal resposta já tivesse acontecido?
Jesus ensina que, ao orarmos, devemos crer que já recebemos. “Creia como se”. Assenhoreie-se da resposta como se ela já tivesse sido dada.
Você tem esta postura em relação à oração?
Certo pastor desabafou com o Rev. Antonio Elias, que apesar de orar anos seguidos por sua mãe, ela nunca havia se convertido. O sábio e idoso pastor lhe perguntou: “Você crê que sua mãe realmente vai se converter? Você está certo da resposta à esta oração?”. Ele admitiu que, às vezes sim, às vezes não. O pastor então sugeriu que ele parasse de orar e pedisse à sua igreja que orasse. E ele fez o que lhe foi dito. Sua igreja começou a orar e um mês depois sua mãe fazia uma entrega pessoal de sua vida a Cristo.
Ore, como se...

2. Ame, como se...

Este é o segundo ponto a ser considerado. “Ame, como se...” Esta é a visão de Paulo sobre relacionamentos. “Se teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer, se tiver sede, dá lhe de beber, porque fazendo assim amontoarás brasas vivas sobre sua cabeça” (Rm 12.20).
C. S. Lewis no clássico, “Cristianismo puro e simples”, afirma que devemos amar da seguinte forma: “Love as if (ame, como se)”. Para ele o pensamento de Deus é que devemos amar, não porque sentimos ou temos afetos naturais, mas porque devemos amar sempre, mesmo aqueles que não são amáveis. Muitas pessoas acham que devem amar apenas porque possuem determinados sentimentos. Na prática, porém, o sentimento por si só pode não ser capaz de nos levar a uma atitude de amor. Se somos indiferentes a alguém, ainda que sintamos algo por ela, na verdade não a amamos. Amor não é uma questão de sentimento, mas atitude, assim como o perdão é um mandamento e não é uma emoção. Então, ame!
Temos a tendência de maltratar ou ser indiferente aos inimigos, a tal ponto que, se tiverem sede, e se depender de nós, morrerão de fome. Não nos parece uma atitude natural da vida? A Bíblia, porém, ensina a cuidar de pessoas que não são por natureza amadas, cuidando delas e protegendo-as. Não parece hipocrisia tal atitude? Não seria mais lógico e natural que simplesmente a deixássemos morrer de inanição? Afinal, não fizemos nada para matá-las, trata-se de uma realidade espontânea, elas são adversárias e opositoras.
“A regra comum a todos nós é perfeitamente simples. Não perca tempo perguntando-se se você ama o próximo ou não; aja como se amasse. Assim que colocamos isso em prática, descobrimos um dos maiores segredos. Quando você se comporta como se tivesse amor por alguém, logo começa a gostar dessa pessoa. Quando faz mal a alguém de quem não gosta, passa a desgostar ainda mais dessa pessoa. Já se, por outro lado, lhe fizer um bem, verá que a aversão diminui” (C. S. Lewis)

Portanto, Ame, como se...

3. Confie, ainda que…

Esta proposição é feita pelo profeta Habacuque.
Ele viveu num período caótico de Israel, nos dias que antecediam a invasão de Jerusalém pelos Assírios. O poderio bélico deles era desproporcional à pequena nação de Israel. Eles eram violentos e cruéis, faziam um arrastão devastando os pequenos povos, levando cativos as crianças para serem escravos, as meninas sofriam abuso, e os soldados eram impiedosamente executados. Ele ora para que Deus os livre, mas Deus afirma que a invasão deste povo fazia parte da disciplina sobre Israel que o havia abandonado e seguido outros deuses.
No meio do caos e da falta de esperança histórica, o profeta faz a seguinte afirmação:
Ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide; o produto da oliveira minta, e os campos não produzam mantimento; as ovelhas sejam arrebatadas do aprisco, e nos currais não haja gado, todavia eu me alegro no Senhor, exulto no Deus da minha salvação” (Hb 3.17-18). No meio da dor, ele decidiu continuar confiando a despeito de qualquer circunstância. Esta é a fé do “ainda que”.
Posteriormente, o apóstolo Paulo, faria de uma das afirmações do profeta Habacuque, o pilar de sua teologia. “O justo viverá pela fé” (Rm 1.16). Esta também será a base de Lutero para a formulação inicial da teologia reformada, e esta mesma afirmação impactaria posteriormente o movimento Wesleyano na Inglaterra.
O homem de Deus não pelo que vê, nem por ter a circunstância sob controle, mas sua fé se baseia no caráter do Deus que se move na história, está acima da história e tem a história sob seu controle, portanto, vamos continuar confiando... ainda que...
Mesmo quando a vida não traz mais esperança, mesmo quando a história é confusa ou caótica. ...todavia eu me alegro no Senhor, exulto no Deus da minha salvação” (Hb 3.17-18). O cristão vive pela fé. Sua fonte de alegria e entusiasmo é o próprio Deus.
A Bíblia nos conta a história de Davi, nos dias em que vivia perseguido pelo rei Saul. A vida era muito instável e insegura, e alguns homens também perseguidos politicamente se agregaram a ele, vivendo no inóspito deserto da Judeia. Um dia, ao voltarem para Ziclague, onde moravam, a cidade havia sido devastada por um bando de filisteus, e além dos bens, suas esposas e filhos foram levados cativos. O ambiente ficou tenso, além de ter perdido duas esposas e filhos, os companheiros de Davi ainda conspiravam contra ele, ameaçando-o de morte. Entretanto, o texto afirma que “Davi se reanimou no Senhor” (1 Sm 31.6). Onde você pode colocar sua confiança nestas horas? Com o ambiente hostil e a vida desmoronando?
Davi se reanimou em Deus...Ele confiava “Ainda que”.
Esta é a fé genuína, que não se baseia em circunstâncias. Esta é também a história do profeta Habacuque, apesar da desordem, ele continuava confiando em Deus e no seu caráter Eterno. Será que ainda assim creríamos?
Assim devemos viver, na teologia do “ainda que”. Isto é, não se abater quando todas as perspectivas forem ruins, e quando a história se desmoronar. Continuar se alegrando, reanimando-se e exultando no Deus da nossa salvação.

4. Espere, contra a esperança

Este é o quarto e último aspecto de pequenos detalhes que se, e quando adotados por nós, fazem grande diferença no exercício da fé. Esta última afirmação considera a vida de Abraão.
Abraão, esperando contra a esperança, creu… E, sem enfraquecer na fé, embora levasse em conta o seu próprio corpo amortecido, sem já de cem anos, e a idade avançada de Sara, não duvidou, por incredulidade, da promessa de Deus; mas, pela fé se fortaleceu dando glória a Deus” (Rm 4.18-20). Esperar quando o prognóstico é positivo é bom, mas esperar quando tudo diz não, assume outra dimensão.
Esta foi a experiência de Abraão.
Quando Deus afirmou que ele teria um filho aos 100 anos de idade, com sua esposa Sara, que tinha 90. Abraão sabia dos limites biológicos, já que Sara “tinha cessado o costume das mulheres” (Gn 18.11), e Abraão era alguém com um “corpo amortecido” (Rm 4.19). No entanto, ele, embora levando em conta toda a realidade de seu corpo, não duvidou e pela fé se fortaleceu. Deus estava falando, e isto era o que importava para ele. Ele não ignorava a realidade, mas valorizou mais o poder de Deus que a situação antagônica. Ele levou em conta o seu corpo adormecido, mas acima de tudo, levou em conta o poder do Deus que ele servia.

Ele esperou contra a esperança...
Esta é uma forma absolutamente revolucionária de viver e exercitar a fé. Este pequeno detalhe, faz grande diferença na vida.

Conclusão:
Grande Detalhe, Grande Diferença. 

Certamente muitos outros detalhes, paradoxais, existem na Bíblia. Mas estes aspectos considerados acima, fazem grande diferença na atitude que teremos em relação aos confrontos e crises que surgirão. Nossa espiritualidade será absurdamente potencializada, se estes pequenos detalhes forem incorporados à nossa vivência, afinal de contas, eles fazem grandes diferenças.
Antes de concluir este texto, porém, não posso deixar de falar de alguns fatos bíblicos, que são grandes em sua natureza, e causam grandes efeitos em nossa vida. São grandes porque relacionados à pessoa de Jesus Cristo. Geram grandes efeitos em nós, porque tangenciam nossa condição diante de Deus e causam impactos eternos.

O Grande detalhe, é a obra de Cristo realizada na cruz.

A. Sua morte gerou vida – “Ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades. O castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados” (Is 53.5). A morte de Jesus lhe causou grande sofrimento, mas o seu sacrifício nos expiou diante de Deus, e nos trouxe cura.

B. A Maldição transformou-se em benção – “Cristo nos resgatou da maldição da lei, tornando-se ele mesmo, maldição em nosso lugar...para que a benção de Abraão chegasse aos gentios, em Jesus Cristo, a fim de que recebêssemos, pela fé, o Espirito prometido” (Gl 3.13-14). Ele se tornou maldito, Para que, a benção chegasse até nós.

C. A derrota tornou-se vitória – O que vemos na cruz, um homem derrotado? Esta era a visão dos soldados: “Salvou os outros, a si mesmo não pode salvar-se. É rei de Israel! Desça da cruz, e creremos nele” (Mt 27.42). Que fracasso. O Messias na cruz! No entanto, a declaração apostólica diz: “tendo cancelado o escrito da dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz; e, despojando os principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz” (Col 2.14-15).

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