quinta-feira, 20 de setembro de 2018

At 13.1-4 A Igreja Missionária.Um olhar para o mundo






Introdução:

A Igreja de Antioquia é a primeira igreja realmente missionária na Bíblia. A Igreja de Jerusalém fez missões, mas de forma contingencial. Foi uma resposta a uma situação de perseguição, e não fruto de uma visão do seu colegiado. Na verdade, mesmo quando toda a igreja se dispersou por causa da perseguição dos líderes judaicos, uma observação da Bíblia chama a atenção: “Todos foram dispersos, exceto os apóstolos”.

Por que a liderança ainda continuou em Jerusalém?
Várias respostas podem ser dadas, entre elas a de que estavam numa confortável situação de uma igreja que crescia, e não tinham colocado sua visão nos confins da terra, como Jesus designara (At 1.8). A visão de mundo ainda não estava no DNA, da igreja. Pedro foi duramente questionado por ter se atrevido a entrar na casa de um gentio. A luta de Pedro em Atos 10, tinha uma razão clara, além do próprio bloqueio que sua cultura e religiosidade impunha. Ele sabia que teria que enfrentar o julgamento dos irmãos que ficaram em Jerusalém e que faziam parte da liderança. Não sem razão, Pedro levou consigo seis testemunhas citadas por ele quando faz sua defesa.

A igreja de Antioquia, portanto, se torna o protótipo da igreja missionária moderna. Este movimento se deu em torno do ano 46 d.C., já que a morte de Herodes Agripa I (At 12), se deu no ano 44 d.C.
Ela nasce de um avivamento, e se lermos atentamente o texto veremos que boa parte disto se deu por causa da visão e envolvimento dos irmãos que já estavam vivendo fora da Judeia, pois eles vieram de Chipre e de Cirene. Diante das manifestações e conversões, a igreja de Jerusalém resolve enviar Barnabé, o mais despreconceituoso de todos e que tinha mais facilidade de se aproximar de pessoas diferentes (At 9.26-30). Ao chegar ali, ele se alegrava ao entrar em contato com os novos convertidos, exortando-os a que permanecessem firmes na graça de Deus.

Como aquela igreja se tornou missionária?
Antes de mais nada, ela estava numa confortável situação:

a.     Uma igreja em franco crescimento. O texto fala de “muitos convertidos”(At 11.21) e seu crescimento era exponencial já que “numerosa multidão” estava sendo alcançada (At 11.26).

b.     Uma igreja com um refinado padrão de pastores – “Havia na igreja pastores e mestres” (At 13.1) e a educação religiosa desta igreja era intensa e por “todo um ano” (At 11.26) tiveram oportunidade de aprender de Barnabé e Paulo. Isto é que era beber na fonte. Tinham na igreja uma verdadeira academia bíblica, com aprendizado intensivo.

c.     Uma comunidade com um belíssimo mosaico de diversidade cultural
                                                i.     O líder, Barnabé. Companheiro, sensível, filho da consolação, missionário enviado pela igreja mãe para ser o sênior pastor, por causa de seus dons.

                                               ii.     Saulo, um dos rabinos mais preparados dos seus dias, recebendo instrução acurada de Hillel, escola conservadora do judaísmo. Antes de se converter, Saulo tornou-se muito respeitado pelos judeus, por causa de seu conhecimento e zelo. Não sem razão, se tornou um dos maiores apóstolos do cristianismo.

                                              iii.     Simeão, “por sobrenome níger” – Ele recebeu um sobrenome que poderia ser ofensivo para alguns, mas que no contexto bíblico parece apontar mais para algo afetivo. “Negão”. Era africano, provavelmente oriundo da Etiópia. Se isto lhe causa arrepios, quero dizer para vocês que um dos pastores de nossa igreja, o Rev. Edson, é chamado pela maioria da igreja de “Black”, e até onde sei, ele não parece achar isto preconceituoso e ofensivo.

                                              iv.     Lúcio, de Cirene – Este também era oriundo do Norte da África, provavelmente da Líbia. Durante o período da construção do Segundo Templo, muitos judeus viviam fora de Israel, e Cirene, ao Norte da África, foi um dos principais centros da Diáspora. Acredita-se que Cirene esteja situada na vizinhança da moderna Shahhat, na Líbia. 

                                               v.     Manaém, colaço de Herodes – Este parece proceder de uma ascendência mais nobre, fazendo parte da burguesia palaciana, já que foi irmão de leite de Herodes. Provavelmente foi amigo de infância de Herodes Antipas, que foi o tetrarca da Galileia, que estava no governo da Judeia durante o ministério de Jesus.

Igrejas com diversidade cultural tendem a se tornar mais criativas e expressam de forma teológica, a melhor visão do evangelho. É bom considerar que “o prato colorido é sempre mais saudável”. Igrejas com unidades homogêneas parecem ser a tendência, mas aqui está uma igreja cujos relacionamentos eram formados de pessoas com matizes distintas, culturas, nível social e línguas diferentes, e que trouxe muita glória ao nome de Jesus.


Uma igreja jamais pode ser refém de seu conforto.

O que caracteriza uma igreja missionária?

Primeiramente, sua vida de piedade e devoção. A relação entre igreja e missões é colocada de forma bem clara. “Servindo eles e jejuando, disse o Senhor: Separai-me a Barnabé e a Saulo para a obra missionária a que tenho chamado” (At 13.3). A liderança estava preocupada em ter intimidade com Deus. A verdade é que não precisamos de mais programas e estratégias, mas precisamos de mais devoção e santidade.

Em segundo lugar, Uma liderança comprometida – “Estes servindo e jejuando” (At 13.3). Eram os líderes mas estavam empenhados no projeto de adorar e servir ao Senhor com fidelidade. Tinham vida piedosa, de oração e serviço.

É muito importante considerar isto, porque nenhuma igreja vai além de sua liderança. Se quisermos envolvimento da igreja, os líderes precisam estar pagando o preço do compromisso com a comunidade. Muitas igrejas não são generosas com seus recursos, e muitas vezes, a razão encontra-se na falta de modelos e exemplos daqueles que lideram as comunidades.

Todos estes fatores nos levam a imaginar que esta não seria uma igreja com visão missionária. Igrejas consolidadas, com estabilidade na liderança, podem bastar-se a si mesmas e se tornarem um fim em si mesmas. Os recursos tendem a serem empregados intramuros, e para construções e reformas locais, perdendo a capacidade de olhar adiante, para além de si mesmas, cumprindo assim o imperativo de Cristo. Mas esta igreja surpreende.


Em terceiro lugar, a capacidade de discernir a voz de Deus. Sua vida de oração os capacita a ouvirem a Deus. Eles não apenas discernem, mas obedecem. Eles teriam que ceder dois de seus melhores líderes, mas não passaram por crise neste processo. Era Deus quem mandava, e Deus supriria a necessidade do rebanho.
Era uma igreja sensível à direção do Espírito. Missões nascem no coração de Deus. É Deus quem inicia o processo. Ele separa, capacita e impulsiona a obra missionária. Este é o primeiro axioma das missões: “Deus é o autor de missões”. O segundo segue na mesma direção: “Deus chega ao campo antes do missionário”.

Quarto, dá o melhor de si para o campo missionário – O Espírito Santo separou os líderes mais experimentados e frutíferos e não pessoas imaturas e desqualificadas. Muitas vezes  jovens bem intencionados, mas sem experiência pastoral e com pouco conhecimento bíblico e cultural, são enviados para campos transculturais. Alguns nunca tiveram coração missionário em sua própria igreja, nunca demonstraram maturidade cristã e o resultado é um desastre. São missionários aventureiros. As consequências já são bem conhecidas.

Quinto, Compromisso com os missionários. “Impondo sobre eles as mãos, os despediram” (At 13.3).

Missionários precisam estar debaixo da autoridade da igreja e submissa à esta liderança. Eles precisam de apoio, sustento e oração. Um missionário não se “auto designa”, mas ele é recomendado. Tem que estar debaixo da autoridade, não se trata de um ato individual e solitário que se lança num projeto sem reconhecimento e aprovação da liderança.
Este texto nos mostra o que acontece quando alguém se candidata sem chamado. Joao Marcos não foi chamado por Deus, mas foi inserido no projeto missionário, por causa de sua relação de parentesco com Barnabé (ele era sobrinho). O resultado não foi positivo. Logo na primeira dificuldade em Perge da Panfília, ele abandona os missionários, e Paulo fica muito irritado com sua atitude infantil (At 13.13), e sua relação com o grupo posteriormente se tornará pivô de um dos maiores conflitos de liderança relatados no Novo Testamento. Em Atos 15.36 lemos que Barnabé e Saulo enfrentaram graves problemas por causa de João Marcos: “Houve tal desavença entre eles que vieram a separar-se”. A linguagem bíblica é amena, mas indica que algo muito sério aconteceu. Barnabé e Saulo, dois homens de Deus não conseguiram mais trabalhar na mesma equipe.

Missionários precisam ser enviados pela igreja local.
É privilégio e responsabilidade da igreja. Em Fp 4.15 Paulo se refere carinhosamente ao cuidado que recebeu da Igreja de Filipos. Ele fala que aquela igreja se “associou” ao seu ministério. Obreiros precisam de associação.

Quando concluíram sua viagem missionaria, Paulo e barnabé retornaram a Antioquia, onde estava a base de sua missão, para dar testemunho e relatório das atividades (At 15.25), e como era de se esperar, dali saíram duas equipes missionarias. Barnabé, levando a João Marcos e Paulo, tendo como companheiro a Silas. É digno de nota que todas as três viagens missionarias registradas em Atos, tiveram a igreja de Antioquia com base (At 13.1; 15.36; 18.22). 

Édson Queiroz, no seu conhecido livro, Igreja Local e Missões, faz as seguintes observações sobre o papel da igreja com missões.

A.   A Igreja reconhece o chamado – A Igreja vê o fruto e identifica o dom, porque está convivendo e trabalhando com a pessoa. É muito difícil quando pessoas se candidatam a um projeto missionário sem darem testemunho de vida cristã na sua igreja local.

B.    A Igreja treina o candidato – Esta tese é defendida por Queiroz, embora muitas prefiram delegar tal tarefa a institutos, seminários e agências missionárias.

C.    A igreja envia o missionário – Este envio pode ser feito de forma direta ou em parceria com agências missionárias.

D.   A igreja cuida do missionário – Qualquer problema no campo deve ser da responsabilidade da igreja. Neste sentido, estar associado a uma agência missionária facilita muito porque eles sabem como lidar melhor com a imprevisibilidade.
Quando a igreja não tem envolvimento e vinculo com o missionário, ela não sabe como orar e contribuir, e não raramente se sente desestimulada a investir na obra missionária.

Conclusão:

Um olhar para o mundo tira a igreja da zona do conforto.
Mas, honestamente, qual igreja deseja pagar este preço?
Certa vez estava com um presbítero visitando uma igreja toda muito bem estruturada, bancos confortáveis e ar condicionado, e nossa igreja, naquela época, não tinha ar condicionado. Em épocas de calor, com todos seus assentos ocupados, era fácil fazer sauna.
Então, aquele presbítero brincou: “É pastor, esta igreja está bem na nossa frente!”. Embora eu respeite muito aquela igreja, eu sabia que eles não tinham nenhuma congregação, enquanto estávamos plantando três igrejas com salario integral de dois obreiros. Então lhe disse: “Não é muito difícil, basta interrompermos um dos projetos missionários, que no final do ano teremos dinheiro para o ar-condicionado. Muito querido, como sempre foi, ele me respondeu: “Não precisava apelar, né pastor?”
Na verdade,  ser uma igreja missionária não significa que não poderemos melhorar nossas estruturas físicas, o templo e o Departamento Infantil. Mas no mínimo, precisamos entender que, ter os olhos postos no mundo implicará em uma compreensão maior acerca da missão e do chamado da igreja local. Na verdade, a piedade, as orações, serão suficientes para ouvirmos a voz do Espírito e discernirmos sua voz dizendo: “Ide por todo mundo, e pregai o Evangelho a toda criatura”.

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