Introdução:
Uma das parábolas mais
impressionantes, e muitas vezes esquecida, de Jesus encontra-se relatada apenas
em Marcos, e é chamada de A parábola da
semente (não confundir com a parábola do semeador): “Disse ainda: o reino de Deus é assim como se um homem lançasse a
semente à terra; depois, dormisse e se levantasse, de noite e de dia, e a
semente germinasse e crescesse, não sabendo ele como. A terra, por si mesma
frutifica” (Mc 4.26-27, 28a).
Jesus demonstra que a semente tem
poder em si mesma. Ela tem o germe da vida. Por isto, “a terra, por si mesma frutifica”. Outra verdade maravilhosa é que o
crescimento da semente é um mistério. “...
e a semente germinasse e crescesse, não sabendo ele como”. Não tente
entender a metodologia, nem os mecanismos. A obra de Deus é essencialmente algo
da exclusiva autoridade de Deus.
A forma como o avanço missionário
se dá é um mistério. Basta ler a história das missões que veremos as formas
mais improváveis da realização da missão. Creio que esta é uma forma de Deus
nos ensinar que ele é o autor das missões e que o seu poder é que realiza todas
estas coisas.
A maneira como as igrejas crescem
também é misteriosa. Deus usa situações improváveis, plantadores improváveis de
igreja e realiza a sua obra. Bem, isto não deveria nos causar surpresa, afinal,
Jesus foi categórico ao afirmar: “Eu
edificarei a minha igreja”, portanto a obra de edificação da igreja tem a
ver com sua promessa e seu empenho pessoal, para que as igrejas floresçam.
Assim tem sido, misteriosamente, em todos os lugares.
O texto de Atos 16 nos fala de
alguns princípios, criados pelo próprio Deus, para fazer sua obra acontecer.
O livro de Atos tem algumas
características importantes:
A. É um livro teocrático – O Deus
soberano controla todas as coisas. Alguém chegou a afirma que o melhor titulo
não deveria ser “Atos dos Apóstolos”, mas “Atos do Espírito Santo”. O Espírito
de Deus permeia e direciona cada ato dos seus servos, fechando e abrindo portas,
dando orientação e controlando os rumos da sua igreja. Deus soberano controla
todas as coisas: cosmos, igrejas, particularidades (pessoas).
B. É um livro profético – Deus
cumpre o que promete. Os acontecimentos na vida da igreja apostólica estão constantemente
sendo explicados à luz das promessas do Antigo Testamento. Deus está conduzindo
os eventos para que seus propósitos se cumpram.
C. É um livro Cristocêntrico – A
vida e a obra de Cristo, sua natureza, o que ele é, sua natureza redentiva, sua
divindade, são constantemente expostos nos sermões e mensagens deste livro.
Este livro nos convida a adorar a Cristo e a entender sua messianidade e
divindade.
D. É um livro missionário – O que
vemos em Atos é uma igreja sendo desafiada e impulsionada, pelo Espírito Santo,
a realizar a obra. Em todos os momentos percebemos que Deus, e não a igreja,
está levando sua igreja a cumprir a missão de pregar em Jerusalém, Judeia,
Samaria e até os confins da terra.
Apesar do mistério no processo de
plantação de igrejas, o texto de At 16 nos mostra como a igreja de Cristo é
implantada.
1. Deus inicia o processo – A igreja de Cristo estava em processo de expansão.
Esta era a hora certa de expandir. O pensamento de Paulo era claro: vamos
abraçar a Ásia! Temos experiência, recursos, pessoal treinado, equipe pronta.
Entretanto o Espírito de Deus não chancelou os projetos da igreja.
“E, percorrendo a região frígio-gálata, tendo sido impedidos pelo
Espírito Santo de pregar a palavra na Ásia” (At 16.6). Não é difícil pensar no diabo
impedindo a obra. O próprio Paulo afirma que queria visitar os irmãos de
Tessalônica “...não somente uma vez, mas
duas; contudo, Satanás nos barrou o caminho” (1 Ts 3.18). Aqui temos uma
difícil questão hermenêutica: Deus impede a missão da igreja na Ásia. Desde
quando o Espírito Santo “impede o avanço missionário?”
No versículo seguinte, mais uma
vez, “defrontando Mísia, tentavam ir para
Bitínia, mas o Espírito de Jesus não o permitiu” (At 16.7). O termo grego
poderia ser traduzido por “Deus proibiu”. Bitínia, era uma região próspera.
Aparentemente seria muito bom que o evangelho florescesse naquela região,
contudo, o Espírito disse não.
O primeiro axioma de missões é:
“A obra missionária nasce no coração de Deus”. Todas as vezes que olhamos para
Atos vemos exatamente isto. Então, porque o Espírito de Deus impediu e proibiu
os irmãos de seguirem seus projetos? Por uma razão simples: Deus é soberano,
ele tem propósitos em todas as coisas. Certamente não era a hora certa para a
execução destes projetos. Posteriormente veremos a igreja de Deus avançando
vitoriosa para alcançar a Ásia, mas agora não era a hora.
É assim que vejo Deus conduzindo
a história. Alguns anos atrás, queríamos plantar uma igreja na cidade de
Pirenópolis, importante eixo turístico de Goiás. Uma pessoa da igreja nos
procurou para informar que sua irmã estava vendendo um lote estratégico na
cidade e que ela queria comprar este lote para plantar uma futura igreja. Ela
não conseguiu levantar todo dinheiro, mas com metade resolvi desafiar o
conselho da igreja para adquirir aquela propriedade. E hoje, está igreja esta
sendo plantada naquela cidade. A liderança de nossa igreja estava bem aquém
deste projeto, mas o Senhor, dono da obra, levantou pessoas com sensibilidade
que contribuíram para que o projeto pudesse ser executado.
A importância de Trôade
A igreja foi obrigada a ficar em
Trôade, esperando o mover do Espírito. O que eles estavam esperando? A direção
do Espírito. Deus daria a visão.
Trôade, se torna o lugar e momento
de pausa e reflexão. A mente estava confusa e eles precisavam discernir a
vontade de Deus. Paulo fica em Trôade para pensar e orar. Trôade não era
estratégica, mas se torna importantíssima para a missão da igreja, porque nela
Deus dá a direção e a visão da obra missionária: “Passa à Macedônia e ajuda-nos” (At 16.9).
Muitas vezes Deus nos mantém em
Trôade, para que tenhamos tempo de discernir sua vontade e plano. Quando formos
obrigados a parar, precisamos refletir sobre o que Deus está querendo revelar. Naquela
cidade eles se mantiveram no caminho da espiritualidade. Não pregaram, mas foi
a cidade mais estratégica. Muitas vezes Deus nos deixa em Trôade para
aprofundamento, reflexão e discernimento.
Os apóstolos precisavam discernir
o próximo passo?
Da mesma forma, precisamos
considerar que é fácil se encantar com a Ásia e Bitínia, mas precisamos de
Trôade, onde encontramos tempo para orar, silenciar o coração, refletir mais.
Qual a direção que Deus está dando? Qual é o próximo passo?
2. Deus, e não nós, possui a correta estratégia. Ao lermos o texto observamos que
saem de Trôade, passam pela Samotrácia e Neápolis, mas não se detiveram em
nenhuma delas.
Este texto nos leva à pergunta:
Deus não tinha interesse nos habitantes destas duas cidades? Se tinha, porque
não manteve os discípulos ali? Esta tem sido uma questão interessante. Não
raras vezes vejo pessoas interessadas em plantar igreja, mas são muito pouco
estratégicos na sua abordagem.
Ao lermos com cuidado o texto,
observamos: “...e dali, a Filipos, cidade
da Macedônia, primeira do distrito e colônia. Nesta cidade permanecemos alguns
dias” (At 16.12).
Duas coisas podem ser observadas:
Primeira, o alvo de Deus era
Macedônia, portanto, não deveriam ter outro foco, quando Deus já havia dado a
direção.
Segunda, a importância da cidade.
Filipos era estratégica.
Algum tempo atrás, pensando na
plantação de futuras igrejas, pedi a um grupo de estudantes que fizesse um
trabalho demonstrando quais cidades do Estado de Goiás, tinham mais de 20 mil
habitantes, sem a presença de nossa denominação. Alguns questionaram: Por que
20 mil, e as demais cidades de 3, 5 e 7 mil habitantes, não precisam ser
alcançadas?
Minha resposta foi: por causa da
estratégia que estas cidades possuem. Teoricamente é mais fácil estabelecer uma
comunidade em lugares onde o campo tenha mais possibilidades de crescimento.
Além do mais, é isto que observamos no livro de Atos. Esta foi a estratégia de
Deus. Ele enviou seus discípulos para Filipos, a primeira e mais importante
cidade da região. Dali o evangelho atingiu rapidamente outras cidades e região.
Mas precisamos lembrar que nenhuma estratégia ou método será eficaz, se não
estiver direcionada pelo Espírito Santo.
3. Deus usa pessoas improváveis para estabelecer sua igreja. A experiência de Filipos é
interessante para demonstrar a forma misteriosa como Deus faz as coisas
acontecerem.
Lídia, a estrangeira
Paulo tem a visão de um jovem
macedônio, mas seu primeiro encontro foi com uma mulher estrangeira. Paulo não
encontra um varão, mas uma varoa. Ela não era de Filipos, mas de Tiatira. Lídia
se transformará numa pessoa chave para alcançar aquela cidade. Ela era
comerciante de púrpura. Foi a primeira pessoa a ser convertida na Europa. “O Senhor lhe abriu o coração para atender às
coisas que Paulo dizia” (At 16.14). Quando Paulo sai da cadeia, encontra
uma igreja na casa de Lídia (At 16.40).
A jovem adivinhadora
A segunda pessoa foi uma jovem
possessa, que adivinhava e impressionava as pessoas da região pela sua
clarividência. Havia todo um sistema de exploração destas coisas, mas aquela jovem
se tornou, por algum tempo, uma propagandista e marqueteira dos apóstolos,
porque “seguia a Paulo e a nós, dizendo:
Estes homens são servos do Deus Altíssimo e vos anunciam o caminho da salvação”
(At 16.17). Aparentemente ser referendado por aquela jovem poderia parecer
interessante, entretanto, depois de muitos dias, Paulo vai se tornando inquieto
com aquela situação, e já indignado, diz
ao espírito maligno: Em nome de Jesus Cristo, eu te mando: retira-te dela. E
ele, na mesma hora saiu.
Paulo se dirige ao demônio, e não
à jovem. Ela era dominada por aquela estranha força.
Depois de terem expulsado o
demônio são levados à cadeia. No processo da plantação de igrejas, você não
terá nenhum problema, enquanto não incomodar o diabo. Quando Jesus foi a
Gadara, ele expulsou o demônio daquele jovem que era severamente oprimido pelo
diabo. Mas quando ele os enviou para os porcos, houve prejuízo financeiro e
eles foram expulsos de Gadara. As pessoas não tem dificuldade em conviver com o
diabo, e não incomodam se ele está destruindo vidas. Mas quando você mexe no
chiqueiro deles, você está em problema.
O carcereiro desesperado
Pela sua profissão, este homem é
um daqueles que chegamos a duvidar se pode ser salvo. Ele era um militar linha
dura. Entretanto, após sua conversão, o vemos cuidando pessoalmente de Paulo e
Silas que foram espancados. O carcereiro deixa sua profissão e se torna
enfermeiro. Sua rudeza se transforma em ternura. Sua casa torna-se hospedagem
para aqueles homens.
Parece que as coisas não
encaixam. Estas três pessoas talvez não estivessem no nosso “target people”, ou “público alvo”.
Entretanto, Deus não age com base nas probabilidades, ele é Deus. Após a
ressurreição, para quem Jesus primeiramente se revela? Maria Madalena. Como
mulher, ela não poderia testemunhar num tribunal. Além do mais, seu currículo
não era dos melhores... entretanto, Jesus se revelou a ela, antes de se mostrar
aos seus discípulos. Após a ressurreição, alguns duvidam (Mt 28.17) mas Jesus
resolve usar pessoas dúbias. Maria Madalena: A mulher mais complicada, menos
inteligente, complexa. Certamente uma forma de evidenciar seus métodos, sua
própria força e poder? Nem sempre o que faz sentido para nos, faz sentido para
Deus.
É a lógica da graça.
O segredo não é se temos poder,
mas termos o Deus de todo poder ao nosso lado.
Aquelas pessoas, improváveis
membros de uma igreja cristã, são alcançadas pela graça do Evangelho.
Deus usa os fracos. John Knox
chega mesmo a indagar: Por que Deus escolhe os fracos?
Daquela cidade, muitas coisas
boas surgem. Epafrodito sai dali. Esta igreja se tornará a igreja mais
solidária à Paulo e se tornará a única igreja a sustentá-lo na obra missionária.
Conclusão:
Desta mensagem gostaria de tirar
quatro aplicações para nossa vida:
1. Uma igreja se estabelece por
causa de Deus. Ele é o autor da obra missionária. Ele inicia o processo.
2. Deus, e não nós, tem a estratégia
correta. Podemos ter planos, criar métodos, mas precisamos, acima de tudo
tentar entender para onde Deus deseja nos direcionar. Eles queriam ir para
Ásia, mas Deus lhes mandou para Europa.
3. Deus, e apenas Ele, sabe a hora
oportuna para alcançar uma região. A igreja de Cristo demorou muitos anos, mas
depois também teve oportunidade de ministrar a Ásia. Aquela não era a hora da
obra missionária avançar para o Oriente.
4. Deus usa pessoas improváveis para
estabelecer a sua igreja. Gente quebrada, confusa, desesperada, dominada pelas
trevas, pessoas desprezadas socialmente, para estabelecer sua obra e cumprir
seus propósitos.
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