Introdução:
Este texto é um texto carregado
de esperança.
Fala de gente quebrada,
desajustada, sem direção, perdida em seus propósitos, e que é alcançada por
Deus. A Revista Superinteressante comentando a vida desta mulher afirma: “Ela
deu sorte de se encontrar com os espias”, mas poderíamos dizer de outra forma.
O plano sobrenatural de Deus encontra esta mulher desencontrada. Este texto nos
mostra que
ü Deus opera em ambientes
inesperados, um bordel;
ü Deus usa instrumentos incomuns,
uma prostituta;
ü Deus usa sinal surpreendente: Um
fio vermelho colocado numa muralha que vai trazer salvação a esta mulher e toda
sua família.
Hoje vamos estudar a vida de
Raabe. Este personagem bíblico enigmático, controvertido, encantador. Uma
mulher marginalizada socialmente, com uma vida muito além de suspeita, e que se
torna central neste episódio, e passa a ser citada na Bíblia de várias formas
elogiáveis.
A vida de Raabe nos ensina
algumas coisas fundamentais para a fé cristã:
1.
A graça de Deus não nos alcança
por causa do nosso currículo impecável.
Considerem o currículo de Raabe.
Ela não era uma pessoa de boa reputação, e humanamente falando, não tinha
qualificação para a salvação.
Quando Hb 11 cita Raabe na
galeria da fé, faz questão de se referir a ela como “a meretriz Raabe” (Hb 11.31), assim como Tiago fala da “Raabe, a meretriz” (Tg 2.25). é como se
a bíblia quisesse nos lembrar do seu currículo vergonhoso, ajudando-nos a
colocar os olhos na graça maravilhosa de Deus para seres humanos indignos, como
nós. Jesus afirma que “publicanos e meretrizes precederiam os fariseus no reino dos céus”.
Por que? O currículo moral
daqueles homens não era melhor que o dos publicanos, que eram traidores da
pátria e dos judeus? E das prostitutas que estavam na classe dos cidadãos mais
desprezados em Israel?
Os religiosos, moralistas,
legalistas, acreditam que para Deus alcançar alguém é necessário que esta
pessoa tenha algum currículo especial, que ela seja, pelo menos, um pouquinho
boa. Está presente na nossa mente, um ditado popular que muitos julgam ser um
versículo bíblico, mas não é: “faça da tua parte que da minha ajudarei”.
Não! Salvação é obra de Deus.
“Pela graça sois salvos, mediante a fé, e isto não vem de vós, é dom de Deus.
Não de obras para que ninguém se glorie” (Ef 2.8-9).
Sproul fez um comentário que me
encantou: “Estamos seguros, não porque seguramos firmemente nas mãos de Jesus,
mas porque ele nos segura firmemente”.
A mais básica e profunda distorção
do evangelho se encontra na salvação: somos salvos por causa do que fazemos ou
por aquilo que Cristo fez? Pelos nossos méritos ou pelos méritos de Cristo?
Pelo nosso currículo ou pelo sacrifício de Cristo? Paulo afirma: “De Cristo vos desligastes, vós que procurais
justificar-vos na lei; da graça decaístes” (Gl 5.4). Quando procuramos ser
justificados por Deus com base em nossas conquistas espirituais, perdemos a
referência da nossa salvação. Deixamos de crer que somos salvos pela graça e
passamos a crer na salvação pelas obras. Deixamos de crer no sacrifício de
Cristo e passamos a crer no nosso esforço pessoal; deixamos de crer na cruz, e
confiamos em nós mesmos para a nossa salvação. Fazendo assim, nos “desligamos
de Cristo” e “decaímos da graça”. Condições trágicas para nossa vida
espiritual.
Paulo afirma na carta aos
Romanos: “E se é pela graça, já não é
pelas obras; do contrário, a graça já não é graça”. (Rm 11.6). Fé e obras
são excludentes na salvação. Se você acredita que é salvo pelas suas obras,
você não será nunca capaz de entender a graça de Deus. Se você entende o que é
graça, você jamais ousará pensar que fez alguma coisa que lhe possa ser
atribuída por mérito pessoal ou espiritual. Por isto, a graça é de graça!
Apesar da redundância que esta afirmação possa parecer.
Dallas Willard definiu muito bem
esta questão da graça: “Graça não é ausência de esforço; é ausência de mérito”.
A graça de Deus é a coisa mais contracultural que existe. Somos uma cultura
baseada no mérito, no que somos capazes de fazer, nas nossas competências. Na
nossa performance intelectual, moral ou espiritual. A graça desestabiliza e
desequilibra. Deus nos trata com graça, e esta é a única forma de nos
relacionarmos com o Deus santo das Escrituras Sagradas.
2.
Precisamos discernir as condições
básicas da salvação
O texto nos revela o que
aconteceu com Raabe.
A. Raabe entendeu que o Deus de
Israel era maior que os deuses pagãos de Jericó
“Porque o Senhor, vosso Deus, é Deus em cima nos céus e embaixo na
terra” (Js 2.11). Esta é uma grande declaração de fé!
Como Raabe entendeu isto?
Se olharmos e, Js 2.10: “temos ouvido que o Senhor secou as águas do
mar Vermelho diante de vós”.
A Bíblia afirma que “A fé vem
pelo ouvir”. Somente encontramos fé para sermos salvos quando ouvimos, ou
entramos em contato, com a verdade de Jesus. Não há nenhuma outra coisa
que pode nos salvar. Nossas boas obras ou nossa obediência às leis de Deus
nunca serão perfeitas e nunca compensarão os pecados que cometemos. Também não
existe nenhum sacrifício ou qualquer pagamento que possamos oferecer. Mas,
Deus, em sua misericórdia, oferece perdão de todos os pecados a quem crê em
Jesus. A fé é essencial para a salvação. A fé nos faz aproximar de Deus,
convencendo-nos de nossos pecados, da necessidade de salvação e do sacrifício
de Jesus.
B. Raabe aceitou o sinal para sua
salvação.
“Disseram-lhe os homens: Desobrigados seremos deste teu juramento que
nos fizeste jurar, se, vindo nós à terra, não atares este cordão de fio de
escarlata à janela por onde nos fizeste descer; e se não recolherem em casa
contigo, teu pai, e tua mãe, e teus irmãos, e a toda a família de teu pai” (Js
2.17,18).
Raabe dependia de um sinal,
aparentemente frágil. Um fio vermelho na sua casa, um cordão, um lençol
vermelho, alguma coisa que fosse vermelha. Este é o sinal do sangue presente em
todas as Escrituras. Este sinal aponta para o sacrifício de Cristo, e seu
sangue derramado em favor dos pecadores. Sangue que nos livra da morte e da
condenação, nos tira das mãos do diabo, e nos traz salvação. Este fio de
escarlata aponta para o precioso sangue de Cristo.
Raabe poderia ter duvidado disto
e não levasse a sério o acordo.
Raabe poderia ter procrastinado,
e não atasse o fio vermelho.
Raabe poderia ter ficado
constrangido porque as pessoas poderiam ter perguntado e certamente o fizeram:
“Por que você tem este fio vermelho na sua casa?” ou, “porque você não tira
este fio, ele tira a estética da muralha”.
O que diz o texto: “E ela disse: Segundo as vossas palavras,
assim seja. Então, os despediu; e eles se foram; e ela atou o cordão de
escarlata à janela” (Js 2.21). Poderíamos até acrescentar: E ela, imediatamente, atou o cordão à
janela. Ato imediato. Nada de demora. Nada de hesitação. Sua vida estava em
jogo.
C. Raabe inseriu sua família no acordo.
Isto é muito importante.
Os espias disseram: “Desobrigados seremos deste teu juramento que
nos fizeste jurar, se, vindo nós à terra, não atares este cordão de fio de
escarlata à janela por onde nos fizeste descer; e se não recolherem em casa
contigo, teu pai, e tua mãe, e teus irmãos, e a toda a família de teu pai” (Js
2.17,18).
O pai, a mãe, os irmãos e toda a
família deveriam ser protegidos pelo sangue.
O mesmo símbolo também aparece em
Êxodo 12, na instituição da páscoa. “O
sangue vos será por sinal nas casas em que estiverdes; quando eu vir o sangue,
passarei por vós, e na haverá entre vós praga destruidora quando eu ferir a
terra do Egito... Porque o Senhor passará para ferir os egípcios; quando vir,
porém, o sangue na verga da porta e em ambas as ombreiras, passará o Senhor
aquela porta e não permitirá ao Destruidor que entre em vossas casas, para vos
ferir” (Ex 12.13,23).
Esta verdade é muito importante
para nossos lares. Todos precisam estar protegidos pelo sangue. Certifique-se
que sua família está coberta pelo sangue. Não há garantia para aqueles que
estiverem fora da cobertura. A família é protegida quando se encontra com a
marca do sangue em sua casa.
Este é o verdadeiro sentido do
Evangelho.
Nossa família precisa da
cobertura do Sangue do Cordeiro. Não podemos brincar com esta verdade.
3. A graça nos dá grande esperança
para nossa condição espiritual
Este texto é maravilhoso, também,
por nos dar esperança.
Deus nos encontra na nossa
condição moral de condenação e morte, e ele pode resgatar nossa história.
A vida de Raabe nos inspira
quanto à esta verdade.
Poucos personagens bíblicos
poderiam ser tão caricaturais quanto o estilo de vida pecaminoso de Raabe. Ela
era uma profissional do sexo. Por isto a Bíblia se refere a ela como “a prostituta
Raabe”. A Bíblia não nega sua condição. Ela não era “sugar baby”, como a moral moderna tenta desenhar o sofisticado
esquema de prostituição atual.
Raabe era desprezada socialmente.
Em geral as prostitutas morriam cedo por causa de doenças venéreas, não usavam
qualquer proteção, não tinham barreiras contra doenças sexualmente transmitidas
(DST). Mulheres assim era facilmente contaminadas e morriam.
Raabe era objeto de chacota
social e envergonhava sua família. Até hoje, mesmo numa sociedade moderna e tão
frouxa nos seus costumes, nenhuma família se sentiria orgulhosa em saber que
sua filha vive da venda do seu corpo. Era uma mulher que trazia desonra para o
nome da família. Era marginalizada e estereotipada muito mais que ainda o é
hodiernamente.
Apesar de todo este currículo,
Raabe se torna uma mulher singular na Bíblia:
1. Ela salva os espias – Jz 2.3,4
2. Ela é salva
3. Ela salva sua família – Jz
6.22-25
4. Ela salva Israel.
James Meeks falando sobre a vida
de Raabe faz a seguinte pergunta: Quem salvou quem? Os espias salvaram Raabe ou
Raabe salvou os espias? E ele afirma. Israel a salvou uma vez, mas ela salvou o
povo de Deus duas vezes:
Primeiro, protegendo os espias
Segundo, porque do seu ventre, do
seu sangue, do seu DNA, nasceria o Messias, salvador do mundo.
Não é isto impressionante? O que
Deus pode fazer com alguém quando esta pessoa é regenerada, resgatada?
Veja o que o texto nos diz em
Mateus 4
Salmon, da linhagem de Judá, se
casa com Raabe. Chegou ali, encontrou aquela mulher estrangeira, provavelmente
bonita, e resolve se casar com ela. Talvez um comentário furtivo aqui, outro
ali, mas Raabe agora faz parte da família de Deus.
Ela dá a luz a Boaz (que se casa
com Rute, a Moabita); que dá a luz a Obede, Jessé, e finalmente Davi. Ela foi
trisavó de Davi, o rei mais querido de Israel.
Mas o mais importante de tudo: Da
sua linhagem nasceria Jesus.
Quem poderia imaginar que a graça
de Deus pudesse levar esta mulher a uma honra tão imensa?
O que Deus pode fazer conosco,
pessoas travadas, tortas, desprezadas, que fizemos péssimas opções, vivemos num
estilo de pecado. O que Deus pode fazer conosco em situações semelhantes?
E ainda mais. Raabe figura num
lugar especial na Bíblia:
A. Ela é citada na genealogia de
Cristo – “Salmon gerou de Raabe a Baz; este, de Rute,
gerou a Obede; e Obede a Jessé; Jessé gerou ao rei Davi” (Mt 1.5,6). Que
surpresa! Será que ela um dia, na sua vida de pecado, longe de Deus, talvez
ansiando por uma resposta ao seu coração vazio, poderia imaginar que algo tão
surpreendente pudesse acontecer.
A genealogia de Cristo mostra
como Deus pode nos dar um futuro maravilhoso e surpreendente. De gente comum, de
gente perdida e desencontrada, Deus pode fazer de qualquer um, um filho do Rei.
A história de Raabe e seu parentesco com Jesus é não nega sua história de
muitas falhas e erros, mas de sua linhagem, Deus levantou o Rei dos Reis. E,
ele nos convida a fazer parte também da mesma linhagem. Pela graça de Deus, ele
pode mudar nossa biografia e marcar indelevelmente nossos filhos e netos. Ele
pode nos transformar para sua glória.
B. Ela é citada na galeria dos
heróis bíblicos –
“Pela fé, Raabe, a meretriz, não foi
destruída com os desobedientes, porque acolheu com paz os espias” (Hb
11.31). Onde aparece seu nome? No meio de gigantes da fé, ao lado de Abraão, de
Moisés, de Davi. Lá figura o nome de Raabe, a prostituta. O que Deus é capaz de
fazer da nossa vida quando sua graça nos alcança.
C. Ela é ainda citada por Tiago: “De igual modo, não foi também justificada por obras a meretriz Raabe, quando
acolheu os emissários e os fez partir por outro caminho?” (Tg 2.25).
Conclusão:
A
Maravilhosa Graça de Deus
Alguns anos atrás, numa igreja
na Inglaterra, o pastor notou um ex-assaltante se ajoelhando para receber a
ceia do Senhor ao lado de um juiz da Suprema Corte da Inglaterra. O juiz era o
mesmo que, anos antes, havia condenado o assaltante a sete anos na prisão.
Após o culto, enquanto o juiz e
o pastor caminhavam juntos, o juiz perguntou, “Você viu quem estava ajoelhado
ao meu lado durante a ceia?”
“Sim”, respondeu o pastor, “mas
eu não sabia que você havia notado”.
Os dois homens caminharam em
silêncio por alguns momentos. Daí o juiz disse, “Que milagre da graça!”
O pastor concordou. “Sim, que
milagre maravilhoso da graça”.
Daí o juiz perguntou, “Mas você
se refere a quem?”
O pastor respondeu “É claro, à
conversão do assaltante.”
O juiz falou “Mas eu não estava
pensando nele. Estava pensando em mim mesmo.”
“Como assim?” indagou o pastor.
O juiz respondeu, “O assaltante
sabia o quanto ele precisava de Cristo para salvá-lo dos seus pecados. Mas,
olhe para mim. Eu fui ensinado desde a infância a ser um cavalheiro, a cumprir
a minha palavra, fazer minha orações, ir à igreja. Eu passei por Oxford, recebi
meu diploma, fui advogado e eventualmente tornei-me juiz. Pastor, nada, a não
ser a graça de Deus, podia ter me levado a admitir que eu era um pecador igual
àquele assaltante. Levou muito mais graça para me perdoar por meu orgulho,
minha confiança em mim mesmo, para me levar a reconhecer que não sou melhor aos
olhos de Deus do que aquele assaltante que eu mandei à prisão.”
E que maravilha a graça é. Boas
pessoas só não entram no céu porque seu orgulho as impede de chegar ao
Salvador.
- Steven J. Cole, Not
the healthy but the sick WORLD (March 1, 1997).
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