Introdução
“Em menos de 300 anos o cristianismo, praticamente, conquistou o Mediterrâneo e a totalidade do Império Romano. Um movimento que começou dentro do judaísmo com doze homens em treinamento intensivo aos pés de um Mestre e ainda quase uma centena de outros seguidores e discípulos com níveis diferentes de comprometimento. Nesse período de vertiginoso crescimento é de se esperar que tempos de paz, muito incentivo e apoio cultural e político, bem como a influência de pessoas poderosas, contribuíssem diretamente para tal sucesso. Também poderíamos esperar que a todo o tempo, os membros desse movimento contassem com a liderança sempre proficiente de líderes bem formados e profissionais. Mas, nada disso aconteceu, pelo menos não o tempo todo e em todos os lugares.
Na verdade, tudo corroborou, debaixo da providência divina, para que o
Evangelho se movimentasse em todas as direções, o tempo todo, em todas as
camadas sociais. Deus serviu-se de perseguições religiosas, perseguições e
intolerâncias culturais e políticas, guerras, epidemias, tráfico de escravos e
muitas outras situações para colocar em ação o seu plano de estabelecer Cristo
como Rei e Senhor de muitíssimas vidas. O mais impressionante é que nem sempre
o Evangelho chegou com um missionário especialmente para isso comissionado. E
isso, ainda nos tempos apostólicos. Na esmagadora maioria das vezes o Evangelho
foi levado no meio dos poucos pertences de uma fuga às pressas em tempos de
perseguição. Outras vezes foi recebido entre os espólios de uma guerra e foi
introduzido quase imperceptivelmente pelos expatriados, exilados e escravizados
onde quer que seus novos ‘senhores’ os haviam enviados.
O impacto do Evangelho nesse período até Constantino (313) e também depois dele
até quase o século V teve como principais obreiros, os seguintes personagens:
soldados, mercadores, empregados domésticos, servidores públicos, artesãos,
mascates, donas de casa e escravos. Os principais púlpitos eram os mercados, as
esquinas, as casas públicas de banho, os escuros, úmidos e insalubres aposentos
dos empregados e escravos e as masmorras. A estratégia era uma só, não perder
tempo e nem oportunidade para falar de Jesus Cristo e de viver uma nova ética
em meio ao seu contexto vital.”
Fonte: https://www.ultimato.com.br/conteudo/o-poder-do-testemunho
Este texto bíblico que lemos, narra a impressionante história de uma menina sem nome. Nenhum de nós sabe coisa alguma sobre ela, a não ser aquilo que o texto sagrado nos relata.
O que sabemos desta menina? Qual era o seu perfil?
Cinco realidades podem ser mencionadas:
1. Era escrava, sem dignidade e sem nome. Ela é uma menina, não sabe sequer o que está acontecendo no mundo político repleto de interesses dos poderosos e generais arrogantes. Foi violentamente levada por homens estranhos para um país de uma língua diferente e agora tem que conviver num palácio com cheiros e pessoas que ela não conhece, tentando se adaptar. Ela havia sido levada cativa para ser escrava na casa de Naamã, comandante do exército da Síria.
2. Era exilada, numa terra estranha, com deuses e cultos diferentes, com histórias, sem sua religião, sem suas tradições e cultura, sentindo enorme saudade de casa e dos pais, que provavelmente foram exterminados na crueldade da guerra. É difícil entender este jogo de poder de pessoas que, por caprichos ou necessidade de ampliar seus territórios, simplesmente ignoram as relações de afeto e humanidade.
3. Vive no meio de um povo de língua estrangeira. Para ela, menina, tudo era estranho e incompreensível. Precisava aprender as coisas básicas de uma nova cultura, entender a língua de seus opressores. “O poder tem a sua lógica. Nela, sempre se quer ganhar, conquistar e acumular mais” (Waldir Steuernagel).
4. Perdeu suas relações de afetos. Sua infância fora cortada ao meio. Distante das pessoas que amava, de seus pais, do abraço da mãe, da segurança do pai que morrera na guerra, distanciada de suas amigas da aldeia onde vivia. Uma das coisas que me fez retornar dos EUA, foi a perda de minha história e vínculos pessoais. Estava cada vez mais distante de familiares e amigos que passaram pela minha história.
5. Esta menina sofreu todos os tipos de abusos psicológicos. Sabe o que é ser uma garota de 8 anos de idade, sem ter mãe para abraçar, casa para voltar, seus irmãozinhos para brincar? Esta menina foi roubada de sua identidade e individualidade, privada da infância e adolescência. Ela era apenas uma “menina sem nome”.
Waldir Steuernagel faz a seguinte análise:
“A menina aprendeu o que era saudade da pior forma possível, aprendeu chorando às escondidas nas longas noites insones, aprendeu em meio a uma situação que exigia dela um sorriso disfarçado de “tudo bem” quando estava paralisada pelo medo. Aprendeu tendo de se movimentar uma enorme mansão, em meio a pratos finos que precisavam ser bem servidos, usando roupas estranhas e manuseando estranhos produtos de beleza. A coisa era, na verdade, bem mais complicada, pois ela não passava de um joguete insignificante naquela mansão com tantas outras meninas. Ela era, simplesmente, uma menina sem nome.”
(Ultimato, Marco/abril 2016, artigo Uma menina sem nome, pg 32).
Este texto impõe questões espirituais e existenciais básicas:
- Como ainda continuar crendo em Deus diante de tanta atrocidade?
- Como desenvolver uma consciência missionária, se o Deus da minha referência não foi capaz de me livrar do jogo de interesse econômico e militar?
- Como ser relevante quando já se perdeu todo valor pessoal?
- O que fazer da vida se o que resta é o caos e a humilhação?
- Como ser relevante quando já se perdeu todo valor pessoal?
A resposta pode ser uma só. De fato, ela perdeu quase tudo, mas não o que era essencial: o senso da presença do Deus vivo! O ponto nevrálgico de sua existência foi mantido. Ela não perdeu o senso real de um Deus real. Ela tinha consciência do poder do Deus de seus pais, o Deus da aliança com seu povo, e por isto teve coragem para testemunhar. Ela manteve, o que a espiritualidade clássica ensina: “A identidade tem que ser central na história.” Os problemas externos podem ser gigantescos, mas quando se tem identidade em Deus, consciência de um Deus soberano e amoroso, tudo o que acontecer será interpretado na ótica deste amor. A Bíblia afirma: “Somos mais que vitoriosos por meio daquele que nos amou.”
Chama-nos ainda a atenção, a declaração feito pelo próprio Senhor Jesus, quando falava do ministério aos gentios, àqueles que não eram judeus referindo-se a este texto: “Havia também muitos leprosos em Israel nos dias do profeta Eliseu, e nenhum deles foi purificado, senão Naamã, o siro.” (Lc 4.27) Isto demonstra que a fé daquela criança, que desafia o comandante Naamã, não estava baseada em experiências ou curas que presenciara, mas no caráter do Deus em quem cria. O conhecimento de Deus, marcado por uma fé profunda e convicções claras, certamente lhe havia sido transmitidas por seus pais, e é isto que sustenta esta menina e fortalece sua fé e a capacita a dar testemunho da verdade e de Deus.
Este texto nos mostra o poder da convicção na vida dos adoradores.
- Pessoas com claras convicções testemunham e verbalizam sua fé. “Disse ela à sua senhora: Tomara o meu senhor estivesse diante do profeta que está em Samaria; ele o restauraria da sua lepra.” (2 Rs 5.3)
Ao falar do Deus que ela conhecia, aquela criança criou expectativa no coração de seu patrão. Ela afirma que a situação de saúde dele seria diferente se ele estivesse diante do profeta e do Deus de Israel.
Nos dias 18-19 de Junho-2016, estive falando no congresso da Apecom em Águas de Lindoia, e um dos conferencistas foi o Pr. Jeremias Pereira. Ele afirmou de forma contundente que uma das grandes armadilhas do diabo é nos fazer pensar que “nossa igreja não está preparada para evangelizar”. Analisando o Novo Testamento ele afirma que o novo convertido, tão logo se convertia nos Evangelhos já saia pregando. Assim foi com o endemoninhado Gadareno, que sem discipulado algum é enviado por Jesus à sua família e ao seu povo para contar tudo aquilo que Deus lhe havia feito. Jesus o transforma num evangelista poderoso, e esta foi, sem dúvida alguma, a primeira ação missionaria transcultural registrada nas Escrituras Sagradas.
“Jesus, porém, não lho permitiu, mas ordenou-lhe: Vai para tua casa, para os teus. Anuncia-lhes tudo o que o Senhor te fez e como teve compaixão de ti. Então, ele foi e começou a proclamar em Decápolis tudo o que Jesus lhe fizera; e todos se admiravam.” (Mc 5.19-20)
Quem conhece a Jesus deve compartilhar sua experiência com outras pessoas.
Veja quantas pessoas na Bíblia eram novas na fé e saíram a compartilhar sua fé.
O alto oficial da rainha de Candace, que se encontrou com Filipe no caminho do deserto, entre Jerusalém e Gaza, superintendente de todo o tesouro da rainha dos Etíopes, ouviu a explicação de Filipe, se converteu a Jesus, e saiu jubiloso depois de ter sido batizado, de volta à sua terra. A tradição afirma que uma das primeiras missões transculturais, teria sido a Etiópia, por causa do testemunho de fé deste homem.
Saulo, tinha acabado de se render a Jesus no caminho para Damasco, recém convertido, e a Bíblia afirma: “E logo, pregava nas sinagogas a Jesus, afirmando que eeste é o Filho de Deus.” (At 9.21)
A convicção pessoal desta menina, ao verbalizar sua fé, traz esperança, alento, anseio pelo conhecimento do Deus verdadeiro. Naamã era adorador de Rimon, o falso deus cultuado na Síria. Aquele falso deus, assim como os falsos deuses antigos e modernos, são incapazes de resolver os dilemas da nossa vida.
- Pessoas com clara convicção são eficientes em contrastar o vazio dos falsos deuses com o Deus de verdadeiro (2 Rs 5.4)
É interessante observar que quando ela fala do Deus de Israel, este homem que é idólatra e pagão, não hesita em sair em busca da resposta ao seu problema, indo em busca do Deus verdadeiro. “Então, foi Naamã e disse ao seu senhor: Assim e assim falou a jovem que é da terra de Israel.” (2 Rs 5.4)
Muitas pessoas vivem no paganismo, fazendo oferendas e preces a falsos deuses, mas os deuses falsos geram frustração e vazio na alma, porque não trazem resposta, são impotentes. “Têm boca e não falam; têm olhos e não veem; têm ouvidos e não ouvem; têm nariz e não cheiram. Suas mãos não apalpam; seus pés não andam; som nenhum lhes sai da garganta.” (Sl 115.5-7) Muitos estão buscando respostas espirituais, mas não sabem onde encontrá-las, e quando ouvem falar do verdadeiro Deus não hesitam em mudar a trajetória de vida.
Naamã se desloca da Síria para Israel, com uma expressiva comitiva. Era viagem de cerca de 10 dias, a cavalo, mas quando ouve falar de um Deus real, nada lhe pareceu caro, nem distante. Era necessário sair para se encontrar com seu Deus.
Ronaldo Lidório, pastor presbiteriano, foi para Ghana, África, em 1993, para evangelizar os konkombas, povo que até sacrificava os filhos aos demônios. Com dificuldade de pronunciar o nome de Ronaldo, chamaram-no “Uwumbor-bi”, literalmente “o homem que diz que existe um Deus”. Um dia, uma mulher de outra aldeia veio procurá-lo:
-“O senhor é o homem que diz que existe um Deus?”
-“Sim, sou eu.”
-“Será que o seu Deus pode me ajudar? Já procurei todos os deuses que conheço, e eles nada puderam fazer por mim. Minha filha está morrendo. Se o seu Deus pode alguma coisa, peça para ele curá-la.”
O missionário “tomou a criança em seus braços, desenrolou-a dos lençóis e viu o corpinho frágil coberto de chagas. A pele estava necrosada. A criança agonizava. Então orou a Deus: “Senhor, este povo não sabe que tu és o único Deus vivo e verdadeiro. Não sabe que Jesus, teu Filho, venceu a morte e tem todo poder e autoridade no céu e na terra. Ó Deus, cura esta criança para testemunho do teu poder e para a manifestação da tua própria glória.”
Chegando em casa, a mulher viu que sua filha estava curada. Nem sinal da doença. Pele nova em folha. Não havia sequer marca das feridas. Diante deste milagre, a mulher saiu aldeia afora gritando – isso mesmo, gritando – que havia encontrado o Deus verdadeiro. “A partir daí, muitos feiticeiros se converteram (…). Em menos de cinco anos, o Rev. Ronaldo plantou onze igrejas entre os Konkombas, com mais de três mil membros, criou uma escola de alfabetização e uma clínica, traduzindo ainda vários livros do Novo Testamento para a língua Konkomba”.
Naamã precisa se encontrar com este Deus. Nós também precisamos saber que de fato existe um Deus, que ouve as nossas orações, conhece nossas lágrimas, visita a nossa incredulidade, e que pode fazer milagres.
- Pessoas com clara convicção, podem ser privadas da liberdade de ação, mas não perdem as convicções interiores
É isto que este texto nos ensina e é assim que esta menina sem nome se comporta. Ela perdeu sua infância e liberdade, mas não a certeza de sua fé. Este é o poder da convicção. Nada pode nos afastar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, diz o apóstolo Paulo. Nem fome, nem nudez, nem perigo nem espada, nem coisas do presente ou do porvir.
José foi vendido como escravo, e na casa de Potifar é capaz de testemunhar e manter sua integridade. “Como seria capaz de cometer semelhante mal contra meu senhor e contra o meu Deus”. Estamos precisando de pessoas cheias de convicção, que sejam sustentadas por verdades profundas da fé. Lamentavelmente, quando qualquer coisa acontece de errado, ao invés de testemunharmos, blasfemamos e falamos contra Deus.
- Pessoas com convicção, se esquecem quem são e falam de quem Deus é
Muitas vezes ficamos inibidos por causa da situação humilde que temos e estamos diante de pessoas poderosas. No entanto, esta garota não se inibiu na condição de escrava. Ela estava presa, mas seu coração estava livre. Devemos parar de olhar para nossa condição humana e olhar a natureza do Deus a quem servimos.
“Assim como os outros, ela estava vivendo o silêncio que reinava na mansão. Percebera que a patroa passava muito tempo em seus aposentos e com os olhos inchados e o palácio inteiro estava tomado por um murmúrio indisfarçável: “o comandante está com lepra!”. E todos procuravam afastar-se dele e de qualquer coisa que o tocasse.” (Waldir Steuernagel)
Esta menina não reclama da sua história, mas foca sua atenção no Deus que controla sua história. Ela sabe que Deus é Deus, e que ele sim, tem todo poder e toda glória.
Aplicações
Para concluir, algumas coisas brotam no meu coração quando reflito sobre esta menina.
- Nossa identidade como filhos de Deus - Não percamos a identidade. O que fazemos e o que somos. Por que estamos vivendo nesta cidade e não em outra? Nesta empresa? Morando nesta casa? Somos designados para sermos benção como intercessores, proclamadores da graça e amor de Deus. Deus nos move para ser sal e luz de acordo com seus planos. Já tentou entender sua missão, sua vocação, no seu trabalho e profissão? Esta menina está ali por um propósito de Deus, a situação não é boa, mas ela não deixa de ser benção.
Já imaginou a benção que você pode ser no seu local de trabalho, orando, abençoando e testemunhando?
Veja o exemplo de José. Na casa de um pagão, homem rico e importante, qual foi a percepção de Potifar em relação José? “Deus era com ele”. José possui algo que o distingue dos demais, ele transmitia graça por onde passa. Não podemos perder o conceito de missão. Estamos nas mãos de Deus para executar seu plano, e seja onde quer que ele nos coloque ou tire, estamos nas suas mãos, para executar seu plano. Não estamos à mercê de homens, nem somos vítimas das variações fatalista da história, mas de um Deus soberano, poderoso e bom.
- Nossa necessidade de testemunhar com sabedoria - Crises podem ser movimentos de Deus…esteja atento às crises…
Naamã: homem rico e poderoso, mas condenado e estigmatizado, família deprimida. “O poder tem a sua lógica. Nela, sempre se quer ganhar, conquistar e acumular mais. Porém, a realidade da vida insiste em atrapalhar essa lógica que acaba pregando peças às quais nos achávamos imunes. Certo dia, o comandante notou manchas em suas mãos...O médico deu o terrível diagnostico: lepra. O mundo do comandante ruiu... para essa lógica ele não estava preparado. Com essa lógica ele não sabia lidar. O comandante estava desarmado” (Waldir Steuernagel).
A Bíblia nos exorta a aproveitarmos as oportunidades. Apontar para o Deus que pode solucionar a crise.
- Precisamos ter fortes convicções de fé - Esta menina faz algo arrojado, desafiador… Ela tem convicções claras e profundas do Deus que ela crê… Temos tido muitos poucos testemunhos ousados, porque poucos crêem ousadamente. Nosso testemunho traz renovação de vidas. Testemunhar a Deus é anunciar novas possibilidades de vida; trazer alegria nos lares e para a vida de seres humanos. Você já imaginou o impacto destes fatos sobre a vida daquela casa? Sair do estigma de uma enfermidade tão carregada de sombras?
- Nosso testemunho gera conversões-
Depois de ter experiência com o Deus de Israel, Naamã declara publicamente: “Agora reconheço” - isto é confissão de fé… Ele afirma que não pode mais adorar ao Deus pagão, a Rimon (2 Rs 5.18), depois de ter conhecido o Deus verdadeiro.
Nosso testemunho engrandece o nome de Deus, gera conversões dos deuses falsos para o Deus verdadeiro. O rei vai saber…seus soldados souberam…Deuses falsos foram destronados. Não dá mais para seguir entidades. Muitas pessoas adoram deuses falsos porque não conhecerem o Deus verdadeiro.
Conclusão
O que queremos? Na verdade, precisamos refletir o que estamos querendo testemunhar. Estamos falando de um Deus que desceu de sua glória e visitou a humanidade. Nosso testemunho é sobre Jesus, não é sobre o que fazemos, mas sobre o que ele pode fazer. Nosso testemunho sempre será sobre o poder de Deus e sua graça em nos acolher e nos salvar.
Nosso testemunho é sobre um Deus que pode fazer milagres, que é capaz de mudar a nossa história, que pode trazer cura, esperança, salvação. Somos apenas testemunhas, de um amor imenso: o amor de Deus pela humanidade.
Maravilha de texto Pastor Samuel. Glorias a Deus por sua vida.
ResponderExcluir