Introdução:
Este texto resgata
novamente a identidade e a autoridade de Jesus, tema este exaustivamente
exposto no capítulo primeiro. É significativo que mais uma vez haja a
necessidade de se afirmar a identidade de Jesus, justamente num texto que vai
tratar de um assunto palpitante como o do misticismo, que estava fortemente
enraizado na dinâmica da Igreja de Tiatira. Provavelmente, isto se dá porque o
místico tende a suprimir todo elemento concreto e teórico de suas convicções
para que as experiências possam fluir sem embaraço ou crise. Mas é exatamente
aí que o misticismo se torna uma ameaça. O místico cristão tem que estar
fundamentado na verdade do Evangelho, e não apenas no subjetivismo de sua
experiência. Por isto Paulo afirma aos Gálatas que “ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá
além do que vos temos pregado, seja anátema”. Gl 1.8
Por esta razão,
possivelmente, este texto nos fale sobre a personalidade de Jesus. Ele é
descrito como :
§
Filho de Deus –( 2.18) - Refere-se à relação de Jesus
e Deus, Seu papel na Trindade. Calvino afirma: “Dois títulos são atribuídos a
Jesus nas Escrituras: Filho de Deus e Filho do Homem. Quanto ao segundo, sem
dúvida é chamado assim por causa de sua divindade e essência eterna”. [1]
§
Olhos como chamas de fogo (olhar penetrante). Sua
percepção profunda de todas as coisas, juízo. "Eu sou aquele que sonda mente e corações”(2.23). Revela a
capacidade de julgamento e análise de Jesus, de quem nada pode ser oculto e que
vê todas as coisas além das representações e máscaras.
§
Bronze polido (metal mais forte). Demonstra sua
estabilidade e firmeza. Os pés do rei Nabucodonozor eram de ferro e barro. Os
pés de Jesus são de bronze polido, não é algo frágil, revela sua solidez.
Depois de relatar a
personalidade de Cristo, outro aspecto que se destaca neste texto são os Elogios à Igreja. Uma das primeiras
observações feitas é que esta igreja não apenas perseverou nas boas obras, mas
estas obras eram mais numerosas que
as primeiras (2.19).
·
A importância de perseverar nas
obras – (1 Co15.58). Quantas vezes desistimos porque
achamos que nosso trabalho, o que fazemos para Deus não tem valor, não há
nenhum reconhecimento e perde-se no vazio.
·
A importância de perseverar no
amor –Diante de tantas traições e desenganos tendemos
impermeabilizarmos nosso coração e a esvaziarmos nossa alma de afetos e doação
de nós mesmos.
·
A importância de perseverar no serviço
– Serviço e obra são termos que se confundem, mas o Senhor diz que conhece as
obras e o serviço daquela comunidade.
·
A importância de perseverar na fé
- Jesus afirma conhecer também a fé
daquela igreja. Jesus tem parâmetros para avaliar nossa espiritualidade.
O
grande problema da Igreja de Tiatira: Misticismo vazio.
Apesar de todo este
elogio feito pelo Senhor da Igreja, algumas coisas não caminhavam bem na vida
daquela comunidade. Um dos problemas mais gritantes ali é o do misticismo mal
orientado. Esta igreja estava sofrendo com a intromissão de uma mulher que se
auto declarava profetisa, O nome dessa mulher é simbólico, uma referência a
Jezabel do VT que levou Israel a seguir a baal, e era perversa nos seus atos. E
um grupo ali que se orgulhava de ter altas experiências transcendentais, a
ponto de conhecer, como eles mesmos diziam, “As
coisas profundas de satanás”.
Aqui vemos o
misticismo pagão em nome de Deus, manifestando-se dentro da Igreja. Esta mulher
juntou duas fórmulas fatais: Misticismo e ausência de ética. Ela se auto
proclama profetisa e seduz os homens da igreja a praticarem prostituição (2.20).
O problema grave aqui é o do misticismo sem ética.
Jezabel é uma mulher
demoníaca. Com fundamentos místicos, tornou-se líder na sua igreja. Dava aula
de Escola Dominical, pregava nos cultos à noite, fazia discipulado, orava com
as pessoas e nas horas de folga, seduzia os homens da igreja, levando-os para
cama, e afirmava que não havia qualquer problema em participar das coisas
sacrificadas aos ídolos. Ela era o protótipo de uma pentecostal liberal.
Experiências sobrenaturais e místicas abundantes e imoralidade sexual
ilimitada. Agia de forma mundana e satânica e justificava sua atitude com uma
pseudo-espiritualidade auto intitulando-se profetisa. Apesar de Deus ter lhe
dado tempo para mudança, ela não queria mudar sua conduta.
O dilema prático:
Por causa dos exageros
e abusos atuais no universo carismático, muitas igrejas históricas têm sido
privadas da graça, da benção e do encanto da experiência sobrenatural e
carismática. Passamos a ter medo e noutros casos até repulsa por experiências
sobrenaturais. O exagero, o desequilíbrio tem gerado reações de resistência de
parte da igreja. Gente assim começa a ter crise de fé. Uma das coisas que tenho
procurado lembrar a mim mesmo é que “o falso não anula o verdadeiro”. O fato de
existir tantas pseudo manifestações místicas isto não deve retirar de nós a
alegria que um derramamento especial do espírito pode trazer sobre as nossas
vidas, a experiência do fogo que o Espírito derrama em nós e a expectativa de
coisas sobrenaturais em nosso meio. O Livro de Atos registra que “Em cada alma havia temor”. Atos 2.43 .
V. A solução: “Conservai o que tendes”. (Ap
2.25)
Podemos perder a
essência do Evangelho, aquilo que de forma simples nos foi dado neste frenesi e
fascínio pelo mágico. Não precisamos de mágica, precisamos de milagres.
Os gnósticos, sempre
esbarraram na tentação de acrescentar algo à cruz. Acreditavam que eram
necessários alguns rituais, que só aqueles que eram super-espirituais, ou possuidores
de novos conhecimentos.
Na carta aos Gálatas acrescentaram
um elemento litúrgico e doutrinário à obra de Cristo na cruz: A circuncisão! “De Cristo vos desligastes, vós que
procurais justificar-vos na lei, da graça caístes” (Gl.5.4).
Esta carta é muito
atual, principalmente em relação aos nossos dias. Milhares de pessoas tem se
interessado pelo misticismo, experiências transcendentais, contatos extra
sensoriais e extra-terrestres. Tornou-se moderno falar em fluídos mentais e
neuroteologia, os livros que mais vendem são aqueles que relatam as
experiências mais sensacionalistas. A Igreja de Cristo também tem sido varrida
por uma forte atração especulativa e mística. Embora isto pareça bíblico e seja
atraente, precisamos ser cautelosos para não criarmos um cristianismo baseado
na “new age”.
A Bíblia diz que
quando a pessoa aceita a Jesus, ela é “nascida de novo” (Jo 3:3) “as coisas antigas se passaram, eis que se
fizeram novas”. (2 Co 5.17).
A obra de Cristo foi
completa na cruz. De uma vez por todas, quando passamos pela cruz somos
regenerados. O Espírito Santo atuando por meio da Palavra de Deus nos
restaurou. A palavra “regeneração” tem na sua raiz terminológica a idéia de que
algo geneticamente foi mudado em
nós. Deus literalmente provoca em nós uma alteração em nosso
“gen”. A cruz ‘é o lugar onde despojamos o nosso velho homem. Novas realidades
espirituais começam a surgir. O ponto de partida é a cruz. A santificação é
processual, mas o rompimento definitivo da obra maligna em nós se dá ali,
naquele ato único e pleno de Deus. Nós morremos com Cristo. Não é necessário
conhecer as “obras profundas de satanás”, antes o amor de Cristo na cruz, a
suficiência da cruz e o que ele fez por nós ao derramar o seu sangue, para que
a verdadeira libertação ocorre em nossas vidas.
Schaeffer, porém nos
adverte sobre o perigo do misticismo do homem moderno. Tillich e Barth, tem
dificuldade de achar “um campo de conhecimento unificado” e a conseqüência
deste misticismo moderno cristão é o desespero, pois o cristianismo não está
sustentando mais sua fé em bases concretas, mas na subjetividade da experiência
existencial ou emocional. Desta forma a fé perde sua base histórica e torna-se
“um salto no escuro”, sem nenhum elemento factual. Contudo, aponta ainda
Schaeffer, a fé cristã é baseada, não numa experiência mística ou existencial,
mas no seu conteúdo, por isto recomenda que toda a posição do cristianismo
histórico deve ser claramente mantida[2].
vi. Promessas
e advertências:
i. Só vence quem
perseverar até o fim: Todas as cartas enfatizam isto. “O vencedor é aquele
que chegar firme até o fim”. (Ap 2.26 e Gl 6.9).
ii. A promessa da autoridade
dos cristãos sobre as nações: Esta promessa aparece
muitas vezes na Bíblia. Deus tem chamado a sua igreja para reinar. “De um modo
que a Bíblia não esclarece, os seguidores do Messias deverão participar de seu
triunfo sobre as nações hostis”.[3]
Esta é uma promessa
escatológica. Deus chamou a igreja para reinar, para exercer “autoridade
sobre as nações”. Um dia, todas as nações estarão debaixo do governo de Jesus,
todo joelho se dobrará e toda língua confessará que Jesus é o Senhor! Neste
dia, a igreja terá uma função de governo. O lugar de Jesus é o trono, e a
igreja governará junto com Jesus.
Às vezes nos
desanimamos, nos sentimos desencorajados e nos esquecemos das promessas que
Deus tem nos dado. Nestas horas, as promessas de Jesus nos trazem alento e
renovam nossas almas.
Conclusão:
Este texto afirma: “Ao vencedor, que guardar até o fim as
minhas obras” (Ap 2.26). Existe sempre a promessa maravilhosa para aqueles
que amam o Senhor e o glorifica.
Que Deus nos ajude!!!
[1] . Calvino, Juan – Institución de la religión cristiana, Fundación
editorial de Literatura reformada – Rijswijk, Países Bajos. 1968. Vol.
I, Libro II, Capítulo XIV & 6, pg. 361
[2] .
Shaeffer, Francis A. – O Deus que intervém – Jaú, Editora Refúgio, 1981.
Recomendamos a leitura dos capítulo 1 e 2 da parte I, e o cap. 5 da parte II.
[3] .Ladd,
George - Apocalipse . São Paulo, ed. Mundo cristão, 1980, pg. 43
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