Introdução:
Muitos tem tentando
entender e explicar o sentido da História humana. As motivações, as ambições,
as tramas, as forças ocultas e declaradas que agem e interagem neste drama
humano, e nesta trama quase infindável de traição, guerras, fome, forças
políticas, domínio econômico, controle cultural. Muitos estudiosos, sociólogos,
historiadores, tentam descobrir as forças e movimentos que existem neste
infinito jogo de poder, ambição , violências e mortes, contudo, “a História não é estática, nela se movem
forças distintas e antagônicas. Nela se agitam interesses múltiplos. Cabe ao
cristão, na sua contemporaneidade, interpretar o evento aparentemente
desproposital como oportunidade e ação de Deus”. [1]
Contexto:
O capítulo 5 demonstra
a ação do Cordeiro sobre o destino da humanidade. O Cordeiro de Deus abre o
livro selado, que contém o destino e desígnio de Deus para a História. Por ser
escrito por Deus, por dentro e por fora, nos mostra que a História não é fruto
do acaso, mas obra de Deus, e que não há mais espaço para que um fato novo,
inesperado, possa acontecer. O Livro está escrito “Por dentro e por fora”. Não
há espaços para “novos e inesperados rabiscos”, o livro está completo e selado.
O Livro revela que
existe um sentido secreto da História, um sentido que não está ao controle do
homem, que o homem não pode manipular. Este sentido só pode ser encontrado e
desvelado pelo Cordeiro de Deus que é o leão da Tribo de Judá. “O
homem não saberá nunca o segredo nem a significação da História da humanidade
sem a pessoa de Jesus, e nem o significado de sua existência fora do Cordeiro
de Deus. Viverá na noite, e avançará às apalpadelas sem saber de onde vem, para
onde vai, nem o que faz, nem se alguma coisa tem um valor ou um sentido, nem o
porquê do que ele faz”[1]
Otto Piper , historiador
cristão, nos desafia profundamente ao estudo da História. “O verdadeiro anseio de nossa época é entender e interpretar a
História. Os acontecimentos que, vistos à superfície, nos parecem tão ambíguos
e sem sentido, poderiam, talvez, revelar seu propósito e finalidade, se nos
déssemos ao cuidado de procurar discernir, sob à superfície, as forças reais
que operam nas profundezas da História. Seguirá a História algum plano?
Mover-se-á em direção definida? Haverá um fim para o qual estejam convergindo
os acontecimentos históricos?[1]
Parece-nos que é exatamente
isto que este texto propõe. Revelar os movimentos e forças que interagem na
História, e a dialética que ela traz no seu fluxo e refluxo. O que sela este
livro são os selos. 5:1 Há sete selos, mas apenas seis dão os componentes da
História; o sétimo desemboca nas trombetas. Os seis primeiros nos fornecem o
sentido e a matéria profunda da História; o sétimo, o segredo último. Ao
contemplarmos estes sete selos, estaremos percebendo, pela perspectiva de Deus,
e com os olhos que vão além da mera superfície, quais as forças reais que
operam nas profundezas da História e o desenrolar da História da humanidade,
pelos olhos e governo de Deus.
A História está nas
mãos de Deus, e só o Cordeiro pode desvelar seu sentido. “Se Deus é o protagonista principal da História, o sentido e o
significado profundo deverá ser buscado, sobretudo, em Deus mesmo”. [1] Cada selo, ao ser aberto, revela seu sentido. Os
primeiro quatro selos revelam o simbolismo dos cavalos e seus cavaleiros, cf.
Zc.1:8-11. Na Bíblia, os cavalos trazem o sentido de força, guerra e conquista[1]
Is. 30:16; 31:1; Jo 39:22-28; Ap. 9:7; 14:20; 18:13; 19:11
1.
Cavalo
Branco - Este cavalo branco dá lugar a diferentes
interpretações. Stierlin levanta a tese de que este cavalo significa a
guerra…Bortolini afirma que se trata da força da ganância. [1] Barclay, embora mantenha uma posição mais neutra, acha
difícil interpretar como sendo o Cristo, porque para ele este texto fala das
tragédias e ais que viriam sobre a terra, e este cavalo representa a guerra. Mas
o cavalo vermelho é a guerra. Ap. 6:3,4 (Isto descarta a possibilidade do
cavalo branco significar a mesma coisa que o cavalo vermelho). Branco é símbolo
de salvação/vida/pureza/santidade (símbolo celeste). Usa uma coroa que lhe “foi
dada” (não a conquistou, nem a dominou); o arco, é símbolo da aliança. O cavalo
branco 19:11 é a Palavra de Deus ( o verbo a vida). Ellul afirma que seria
difícil afirmar que este cavalo traga alguma idéia de tragédia:
i.
Enquanto os outros 3 cavaleiros provocam calamidades
(mortes, fomes, etc.) este texto não diz nada dos desastres da guerra;
ii.
Há no texto uma promessa: “partiu vitorioso”. A idéia de vencer em Apocalipse se refere a
Cristo e aos fiéis. Ele saiu vitorioso.
iii. O
branco é sempre o símbolo, (não da vitória militar), mas da salvação, da vida,
da pureza, da santidade. Indiscutivelmente, no livro de apocalipse,é sempre
símbolo celeste. Pense nos vestidos brancos, a nuvem branca, o trono branco, a
pedra branca, etc. Certamente não se trata de uma força antagônica a Deus e a
sua santidade.
iv. Usa
uma coroa, símbolo de vida e realeza, exatamente como o Filho do Homem, que na
cabeça uma coroa de ouro. (cap.14:14)
v.
Esta coroa lhe foi dada; logo ele não a conquistou,
tomou ou açambarcou (vemos aqui a impossibilidade da guerra);
vi. Tem
um arco que é, biblicamente, o símbolo da aliança, não da morte e da violência.
vii. Possui um
dualismo bem explícito: parte vitorioso (já é vencedor, a vitória já está
conquistada desde o começo, na eternidade), mas ao mesmo tempo para vencer (para realizar, concluir
esta vitória, torná-la evidente, manifesta para todos). A idéia do Cristo
vencedor perpassa este livro, do início até o fim. Veja 17:14 Não foi assim a encarnação e a morte de
Cristo?
viii. Finalmente,
podemos encontrar esta mesma descrição numa passagem paralela. Apoc. 19:11.
Como imaginar que no mesmo texto simbólico, o autor poderia descrever dois
cavalos brancos com seus cavaleiros, dando-lhes duas significações totalmente
diferentes? Esta passagem nos diz claramente que o cavaleiro é Cristo. Na sua
cabeça há muitos diademas 19:12; e vemos a descrição de um cavaleiro sentado
num cavalo branco, vestido com um manto “tinto de sangue, e o seu nome se chama
o Verbo de Deus”. 19:13 Temos que permitir que o próprio livro explique seu
simbolismo.
Torna-se evidente que
este cavaleiro é a Palavra de Deus. O cavaleiro branco, que é lançado no mundo,
o primeiro a agir e sair, é portador da vida e da aliança.
Esta seria a primeira
força a agir na História: A Palavra de Deus. Deus sempre falou, foi por meio
dsta palavra que as coisas começaram a surgir, por meio desta Palavra é que o
caos se fez ordem, Por meio desta palavra é que se estabelece os rumos da
História. Por meio desta palavra, Deus constitui reis e desfaz impérios. Esta é
a palavra que já “saiu vencendo” e “para vencer”. Ap. 6:2 Hendriksen sugere
que no cap. 5:5, aparece o Cordeiro como vencedor e pergunta: “Não é razoável pensar que o “vencedor” é a
mesma pessoa?”[1]
Ademais,
não se diz nada dos desastres da guerra, apenas que “saiu vitorioso e para
vencer”. Dualismo explícito. Já é
vencedor, a vitória está conquistada
desde o começo, na eternidade, mas sai para vencer: para realizar, concluir sua
vitória, torná-la evidente. Já e ainda não. O Cordeiro é vencedor desde a
eternidade, mas sua vitória é revelada no curso da história humana. Sua vitória
se deu na cruz, no meio da história de um povo, dentro de um contexto político
e geográfico, e dentro de uma cultura e tempo específico. A vitória da Cruz se
revela na história dos homens.
O cavalo branco, 19:11
é a Palavra de Deus, o verbo da vida. O primeiro cavalo é portador da vida e da
aliança, é a Palavra de Deus que age e continua a agir no curso da História. Depois
deste vem 3 outros, representando aspectos combinados, mas diferentes: potência
imaterial, abstrata, mas agindo num nível material e provocando catástrofes,
flagelos.
2. Cavalo Vermelho - sangue/fogo.
Depois do cavaleiro
branco, aparecem outros três cavalos que representam aspectos combinados, mas
ao mesmo tempo diferenciados. “Cada um é, ao mesmo tempo, uma potência
imaterial, abstrata, agindo, contudo, num nível material e provocando também
flagelos, catástrofes”[1]
O segundo selo revela que a História da humanidade é marcada pela violência e a
guerra. Existe uma potência espiritual escondida no coração da História marcada
pela espada. Este poder é simbolizado aqui pelo cavalo vermelho, um poder
secreto e imaterial que também age e determina a História.
As guerras, as
revoluções, os conflitos sangrentos sempre existiram e existirão na História
humana. Estas guerras mudam a geopolítica do mundo, fazem surgir e desaparecer
nações e povos. Escravizam, submetem povos inteiros a um absoluto e mortal
silêncio. Nos dias de João, a pax romana era uma paz de cemitério, quem se a
ela se opunha, corria o risco de perder a vida. Na etiologia das guerras, diz
Tiago, está a ganância. Tiago 4:1ss., quando surge um conflito armado, existem
razões humanas, econômicas, políticas e lutas pelo poder por detrás. As guerras
são originadas pela insaciabilidade humana de dominar e possuir. Pela ganância
dos poderosos.
Pelo contexto do
texto, podemos também ver que este cavalo vermelho, sai imediatamente após o
cavalo branco, que é a Palavra de Deus, dando-nos a impressão que, à palavra de
Deus, se segue a espada, a perseguição religiosa, a provação e fogo contra a
Palavra de Deus e àqueles que a seguem. Esta idéia parece se harmonizar com a
visão do quinto selo.
Este cavalo vermelho
possui duas características:
i.
Poder de tirar a vida
– Pode ser uma referência tanto a guerras civis, quanto a guerras
internacionais, revoluções, repressões, lutas internacionais, motivadas por
fatores pessoais, vaidade, e interesses econômicos. A guerra é uma potência
espiritual escondida no coração da História. Apocalipse não a descreve como um
poder impessoal, mas como uma realidade espiritual. Isto representa mais que
uma decisão humana e fatores políticos, mas como um poder secreto e imaterial, com uma profunda
atividade sobre a raça humana.
ii.
Recebeu a espada
- Símbolo de poder, autoridade. É o poder político que faz a guerra. Não se diz
quem concede tais poderes, mas as Escrituras nos mostra que Deus encontra-se
por detrás de todo movimento histórico, e ele dá permissão para tais poderes
agirem. O cavaleiro serve-se desta espada como quer, a mesma espada que é dada
para o justo exercício da justiça, serve para a opressão, exploração e guerra. Certamente
Deus se serve da guerra para julgar a humanidade cf. Hab. 1:6.
3.
Cavalo
negro – Este é o terceiro cavaleiro. Ele mede, pesa,
distribui e vende. A balança é o seu símbolo. É a pesagem, a venda, o uso do
dinheiro, subtendido. O dinheiro que se paga é o salário de um operário.”um denário”. Salário este capaz de, em
situações normais, satisfazer uma pequena família com suas necessidades
básicas. A medida do trigo, porém, é muito pequena,
serve apenas para suprir a necessidade de uma pessoa. Era portanto, incapaz de
suprir o mínimo necessário para a família. Ou seja, as pessoas trabalham um dia
inteiro para terem uma medida de trigo que dá para alimentar somente uma pessoa
o dia inteiro. Nestas condições o homem não pode sustentar sua família.
Curiosamente: vinho e óleo estão fora do seu poder “Não danifiques o azeite e o vinho”. É difícil explicar isto,
provavelmente significa que o poder do cavaleiro é limitado (não importa qual
seja o limite), não pode controlar tudo, dominar tudo. Este cavaleiro
representa a economia (especialmente valores relacionados a dinheiro). O fator
econômico, a vida, a organização econômica (liberal ou dirigida). Surge aqui
o flagelo econômico: escassez, pobreza, fome.
Este cavaleiro tem na
mão uma balança. Comer pão por peso indica uma condição de dureza econômica, de
acordo com Ez.4:10 Não designa uma situação de fome absoluta, mas de escassez,
de comida escassa, de racionamento de comida. A escassez é para a pessoa que
luta e não tem recursos e que come cada vez menos porque não tem poder
aquisitivo, nem o seu trabalho é suficiente para dar sustentar digninamente a
sua família e a si mesmo.
Este cavalo significa
o poder da economia. Poder este que tem uma dimensão espiritual já que a
História das nações é normalmente determinada pelo seu poder econômico. O
aspecto financeiro de um país ou de uma região é fator vital para a sua
sobrevivência. Normalmente as grandes calamidades, fome, enchentes, normalmente
agem contra aqueles que possuem o mínimo e que perdem este mínimo nas tragédias
da natureza.
4.
Cavalo
Amarelo - O quarto
cavalo é lívido, amarelado, clorótico, símbolo da morte e da peste. São
idênticos no pensamento da época. Representa potência ativa da morte e os meios
materiais de sua ação, as doenças, feras, calamidades e tragédias. O inferno
(hades) recolhe sua obra. “O inferno o
estava seguindo” O efeito da ação deste cavaleiro é devastadora. Pode
destruir ¼ da terra. Temos alguns exemplos claros na história humana do poder
que uma peste tem para dizimar povos. A peste bubônica, a febre amarela e vírus
fatais como aids, sem falar da árdua batalha que pesquisadores tem mantido
contra o câncer mostram-nos a violência deste cavalo. Felizmente seu poder
também é limitado, Deus limita as potências do caos e da destruição, como fez
em Gn. 1:2,3ss ao destruir o caos e o vazio. Não pode atingir além
da quarta parte da terra.
Estes flagelos não
atingem apenas “os maus”, mas alcança igualmente gente inocente e simples,
gente fiel e amada de Deus também é vitimada pelos seus feitos. Alcança a
todos, manifesta seus efeitos sobre todos. A potência destruidora continua, mas
a humanidade ainda sobrevive após o seu efeito devastador, porque O Senhor da
história tem as chaves da prisão do inferno e da morte. O poder final não é da
dor, do caos e do inferno e só podem agir quando existe uma permissão explícita
para que venham. 6:7
O que representam estes quatro cavaleiros?
Todos eles representam
potências, poderes, potestades, principados. São forças que agem e interagem no
desenrolar da História humana: A Palavra de Deus; (O cavalo branco); As
potências da guerra, os poderes políticos (cavalo vermelho); as potências
econômicas (O cavalo preto) e as forças
da destruição, tais como tragédias, calamidades e pestes, forças naturais, que
na verdade são também agentes sobrenaturais) (cavalo amarelo). As mesmas forças
que operam em todas épocas e em todos os regimes. Não dá para eliminar uma
coisa ou outra, Suprimir uma ou outra seria negar os mecanismos que movimentam
a própria História.
Esta é a proposta
básica deste texto, de acordo com Ellul. A trama da História é tecida com estas
4 forças em movimentos sempre renovados, sempre presentes, sempre em ação. A História
humana é feita pelo envolvimento e mutualidade destes quatro elementos ativos. Não
é uma combinação estável e constante. A História não é uma série de acasos,
probabilidades, atos fortuitos, acontecimentos inesperados e surpreendentes,
mas também não tem uma combinação racional, matemática e rigorosa de um certo
número de fatores determinados e coerentes. Não existe casualidade explícita de
sistema da História. Estes 4 cavalos percorrem a terra, aparecendo ora num
ponto, ora noutro. Não podemos captar uma lógica no seu galope e por isso
podemos ter a impressão de que se trata de um acaso. Mas não há acaso na
História, há forças que agem regidas por um propósito maior. O acaso é apenas
uma percepção pálida e distorcida que temos dos fatos. A combinação entre as 4
forças, com sua diversidade de ação, numa duração indeterminada, produz um
grande número de figuras que podemos ter a impressão de um acaso. Não existe,
contudo, casualidade rígida.
No meio da História
surgem estes cavaleiros, de forma não previsível, os cavalos surgem correndo, a
galope, surgindo e desaparecendo e passam transtornando nossas vidas e nossa
compreensão da sociedade e da História. São as forças sem as quais não haveria
História. E a História depende deles. Todos os acontecimentos e fatos podem ser
analisados em torno destes 4 cavalos e seus cavaleiros: A palavra de Deus, a
guerra e luta pelo poder, as transições econômicas marcadas sucessivamente pela
escassez e pela abundância, as enfermidades e pestes, que surgem do nada,
poderes incontroláveis, vírus desconhecidos e pavorosos: Aids, Émola, peste
amarela e peste negra são alguns exemplos. Estes cavaleiros são sempre os
mesmos, na sua correria desenfreada. O jogo de forças permanece o mesmo, com
roupagens atualizadas. Às vezes encontramos o cavalo vermelho em um lugar, ora
ele desaparece de uma região, depois afasta-se e surge em outro lugar.
Quando surgem as
guerras, sabemos que existem fatores humanos que desencadeiam tais ações, como
a ambição, o ódio, espírito de poder, prestígio, glória, cobiça, e não queremos
retirar do homem sua responsabilidade moral sobre a História humana. Mas este
texto também aponta para o fato de apesar de tudo ser do homem, o homem não
decide nunca. “Qual dentre os homens tem
poder sobre a morte?” Qual governo,
por mais poderoso que seja pode impedir o avanço do vento? Napoleão Bonaparte,
no auge de seu sucesso e de suas conquistas, viu o seu exército sendo dizimado,
quando marchava em direção a Rússia, não pelo exército inimigo, mas por uma
nevasca de proporções gigantescas. Alexandre o Grande, morreu de uma simples
febre, as 34 anos de idade, depois de conquistas épicas. Tudo é
responsabilidade do homem, mas tudo lhe escapa do seu domínio. Existem forças,
potências, energias, os poderosos cavaleiros se movimentam neste volver
histórico trazendo suas conquistas e fazendo suas vítimas. Tudo se passa como
se estivéssemos diante de uma determinação superior, de uma força irresistível.
Nenhum homem pode fazer mais nada quando estas forças, para além dele mesmo se
movimentam. Os homens são os agentes, mas muitas vezes apenas os instrumentos. Existem
forças que estão além deles mesmos.
Deus enviou juízo
sobre o povo de Israel e sobre muitas outras nações conforme nos revela o Velho
Testamento. Pestes, guerras e catástrofes são elementos muitas vezes associados
na Bíblia a julgamentos de Deus sobre uma nação. Por exemplo, Deus enviou
castigo sobre Joás por ter mandado matar o profeta Zacarias. E neste caso, o
castigo foi o exército da Síria, (a espada
: cavalo vermelho). Assim diz a Palavra: “Assim
executaram os siros, os juízos de Deus contra Joás” II Cr. 24:24. Esta
guerra, aparentemente tinha motivos meramente humanos, mas por detrás dela,
este cavalo vermelho sai para agir, quando o Cordeiro o libera para executar os
juízos de Deus e realizar os propósitos divinos.
Porém estas quatro
forças são em número limitado. Há quatro e somente quatro. Toda a História é
feita da mistura destes agentes, destas potências assustadores e fora de
controle dos homens. Ezequiel nos fala da espada, fome e peste como agentes de
Deus (6:11,39; 7:15-39); Zacarias diz que os cavalos são portadores da cólera
de Deus. 6:1. Também são estes três flagelos que Deus oferece a Davi, como
opção pelo seu pecado: 3 meses de espada (elementos ativos por intermédio dos
homens); 3 dias de peste ou 3 anos de
fome (que agem por si mesmos). Estes elementos são “forças da História”,
l e a expressão dos julgamentos de Deus, são castigos divinos do pecado do
homem. São homens que fazem a guerra, que oprimem, mas ao mesmo tempo é a
cólera de Deus que se exprime na História, fazendo-a assim, História de Deus.
Marx falava do agentes
de produção, dos seres humanos coisificados e manipulados e resolve anunciar aos homens que construam
sua própria História, e neste ponto, precisamos considerar o que Marx está
dizendo, mas ao mesmo tempo, este texto afirma que as relações de produção e as
forças de produção escapam na sua maioria ao controle dos homens. Há forças do
mal que são “desencadeadas”. Os julgamentos de Deus se inserem ao longo de toda
História, e não apenas no fim.
A novidade deste texto
de apocalipse é que a ação destes 4 cavaleiros é desencadeada pela abertura dos
4 primeiros selos, efetuada pelo Cordeiro. Quem abre os selos? O Cordeiro. Em
última instância, É Jesus Cristo o senhor desses desencadeamentos, e o agente
primeiro, a causa fundante dos movimentos da História. O Cordeiro que foi
morto, não o Cristo triunfante e juiz, justamente aquele que sofreu o peso do
galope dos cavalos, esmagados pela justiça dos homens e pela brutalidade e
violência dos maus. Este Cordeiro é o que controla os flagelos, os evoca, os
libera, o que os anuncia. O Cordeiro revela, torna manifesta a ação destas
forças a-históricas (ainda que profundamente históricas), e a-temporais (ainda
que profundamente envolvidas na historicidade humana). O Cordeiro abre os selos
que permite ler o interior do livro e ver as forças que movimentam a História. Revela
quais são as forças componentes da História e foi na sua própria morte que esta
revelação se efetuou.
Outro detalhe ainda
impressionante no texto, é que estas forças destruidoras não agem sozinhas. A
História não é feita apenas pelos três cavaleiros: preto, vermelho e amarelo. A
História é também palco da manifestação da Palavra de Deus. Existe antes de
tudo, a manifestação da Palavra viva de Deus. No curso, no coração, na essência
da História humana, no trama, no desenrolar desta História, existe a Palavra. A
palavra de Deus está no âmago dos acontecimentos e da História. Esta Palavra
representa tudo aquilo que contribui para a glória de Deus, todo amor que torna
Deus presente no meio dos homens, tudo o que mantém a vida contra a morte, que
torna Deus presente no meio dos homens. É no meio da guerra que a Palavra de
Deus se revela na ação dos seus agentes, que curam, que restauram as feridas,
homens que se dão no resgate daqueles que são vitimados pelas potências
econômicas na busca por mais poder e
riqueza; é no meio das tragédias humanas e da peste, que surgem pessoas
fundadas na Palavra de Deus e no Deus da Palavra, é no meio da fome que surgem
agentes de Deus, se levantam, revelando o amor de Deus aos necessitados. A
palavra de Deus é tudo aquilo que faz brilhar e dá alegria, tudo o que é
verdadeiro poder ( a coroa) contra a violência estabelecida (a espada); tudo o
que é abundância e pacto (o arco), contra o que é fome (a balança). Esta
palavra de Deus também se faz História com os outros. Por isso, se não há
progresso do reino de Deus como nós esperamos e desejamos, também não há
vitória completa do inferno, que se segue ao cavaleiro chamado Morte (6:8).
Por fim, não haverá
triunfo da morte, porque a esse cavaleiro branco está prometida a vitória
final, sendo ele a própria vitória. A vitória é do cavalo branco, que “saiu vencedor e para vencer”.
Há uma espécie de
dialética na Bíblia entre estas potências que se combinam. Se este cavaleiro
branco fôsse a morte, não haveria nada a se opor. Todos os cavaleiros estariam
na mesma linha, não haveria um movimento de ação oposta entre eles. Não seriam,
portanto, as forças da História. Para
que haja História é necessário que haja um processo dialético. A nossa
dialética passa-se entre a História e a supra História, entre as potências
históricas e a potência meta-histórica que se torna histórica.
O contraponto da
guerra, da fome e da peste é o cavalo branco. Enquanto a História não chega ao
seu desfecho, ainda não somos capazes de vislumbrar todo o seu domínio. Sua História só será plenamente
compreensível, sendo vista retrospectivamente, a partir do fim. É vendo o fim
da história que entendemos o momento histórico que vivemos. A história contém
um bloco com começo, meio e fim. Jesus é aquele que era, que é e que há de vir.
A Bíblia nos mostra a história não numa perspectiva cíclica, repleta de acasos,
mas num movimento ascensional, com princípio, meio e fim. A história tem
propósito, tem teleologia, possui significado e significante.
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