sábado, 5 de dezembro de 2015

2 Tm 3.1 Os últimos dias



As cartas enviadas a Timóteo são chamadas de “pastorais”, porque nelas, Paulo está instruindo o jovem pastor Timóteo quanto à fé cristã, doutrina e ministério.
Dois focos centrais podem ser encontrados nesta carta: A ênfase na doutrina e na consciência.

Doutrina e Consciência

Apesar da resistência de muitos hoje em dia quando se fala de doutrina, nestas cartas Paulo é enfático quanto a este assunto.

”...para admoestares a certas pessoas, a fim de que não ensinem outra doutrina” (1 Tm 1.3)
”...alimentado com as palavras da fé e da boa doutrina que tens seguido” (1 Tm 4.6)
Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina” (1 Tm 4.16)
Se alguém ensina outra doutrina e não concorda com as sãs palavras”... (1 Tm 6.3)
exorta com toda a longanimidade e doutrina” (2 Tm 4.2)
Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina” (2 Tm 4.3)

A verdade é que se há boa doutrina, existe também a má e perniciosa doutrina. Na carta a Tito ele fala da sã doutrina (Tt 2.1), e se existe doutrina que promove saúde, há doutrina que adoece. Sua primeira advertência a Timóteo se refere a “outras doutrinas” (1 Tm 1.3), isto é, elas não cabem nem são compatíveis com as Sagradas Escrituras.

A consciência ocupa também sua carta

...”coração puro, e de consciência boa, e de fé sem hipocrisia”... (1 Tm 1.5)
“... mantendo fé e boa consciência...” (1 Tm 1.19)
pela hipocrisia dos que falam mentiras e que tem cauterizada a própria consciência” (1 Tm 4.2)
Conserva-te a ti mesmo puro” (1 Tm 5.22)
sirvo com consciência pura” (2 Tm 1.3)

Todas estas exortações podem ser sintetizadas da seguinte forma: “Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Continua nestes deveres; porque fazendo assim, salvarás tanto a ti mesmo como aos teus ouvintes” (1 Tm 4.16).
A expressão “últimos dias” é enigmática na Bíblia. O apóstolo Pedro a usou no dia do Pentecostes, quando explicava aos aturdidos participantes os acontecimentos (At 2.17). Ele afirma que os eventos estavam relacionados às profecias de Joel sobre os “últimos dias”, e que, portanto, inicia um novo tempo que se estende até aos nossos dias. Desta forma, estamos vivendo estes dias, desde o derramamento do Espirito.
Por outro lado, estes últimos dias são escatológicos, isto é, se referem a um tempo futuro, quando se abrirão as cortinas dos dias finais, e muitos acreditam que estamos já vivendo estes dias do fim, e, de certa forma concordamos, já que não é muito difícil perceber isto. Basta ler atentamente o texto sobre o qual refletimos hoje para vermos como ele é contemporâneo.
Os “últimos dias” serão marcados por algumas características antropológicas significativas. Paulo diz que que estes dias serão “difíceis”, e fala de como o ser humano se comportaria neste tempo.
Paradoxalmente, observamos neste texto que a humanidade seria marcada por uma significativa perda da “humanidade”. Quase todas as descrições dos vs 2-4 estão relacionadas a uma perda sensível daquilo que deveria ser uma característica natural do ser humano. Deus fez o ser humano como alguém capaz de amar e se relacionar de forma saudável com outras pessoas, mas o texto demonstra que o homem vai paulatinamente, perdendo tais características que deveriam estar presentes no Imago Dei.
O quadro não é nada romântico. Paulo estabelece aqui 19 aspectos negativos que caracterizariam a raça humana nos “últimos dias”. Veja alguns destes exemplos:

Quanto aos afetos
Um quadro de profunda desestrutura deve marcar a humanidade. Não temos tempo para descrever todos, mas deixe-me acentuar alguns deles:

A. Egoístas – O ser humano marcado por uma desenfreada necessidade de que os outros satisfaçam suas necessidades pessoais.
Tim Keller no livro O Significado do Casamento afirma que esta é uma das causas básicas de fracasso no relacionamento conjugal. Por que dois jovens, bem intencionados e carentes afetivamente, narcisistas e egoístas por natureza, seriam felizes no casamento, já que todos os dois esperam que o outro faça aquilo que eles julgam serem merecedores. O egoísmo não nos deixa pensar em fazer o outro feliz, mas em encontrar alguém que os faça feliz. Este idealismo fantasioso demonstra-se insuficientemente capaz de promover um relacionamento saudável.

B. Avarentos – Esta é uma descrição que poucos de nós aceitamos sobre nós mesmos. Conversava recentemente com um casal que me afirmou que seu filho dificilmente casará, porque ele é sovina e não gosta de gastar dinheiro a não ser consigo mesmo, nas viagens e luxos que tem.

Achei interessante este raciocínio. Uma pessoa avarenta não tem, necessariamente, dificuldade de gastar dinheiro consigo mesma, para seus caprichos e desejos, mas jamais disponibilizará seus recursos para investir em sua igreja local, promover o reino de Deus e missões, ou investir em outra pessoa. Ela é prisioneira de seus próprios recursos. Por isto a Bíblia afirma que “a avareza é idolatria”.

C. Desafeiçoados - Outro termo interessante. Literalmente “sem afetos”. A perda da afetividade natural embrutece o ser humano. Em níveis mais críticos nos transforma em psicopatas e sociopatas, em níveis mais amenos, nos faz perder afeição por pessoas próximas, família e amigos.
Quando isto acontece, as relações tornam-se manipulativas e instrumentalizadas. Usamos as pessoas ao invés de amá-las. Nos relacionamos de forma meramente instrumental e funcional. As pessoas valem enquanto servem a determinadas finalidades, enquanto não exigem nenhum sacrifício de nossa parte.
A crueldade é derivada da falta de afetos. A pessoa cruel não se sensibiliza e por isto torna-se uma espécie de “autista extrovertido”. a dor e o sofrimento do outro não lhe toca, angustia ou o inquieta. Falta-lhe afetos.

Quanto à espiritualidade

A Bíblia faz questão de afirmar, que nos últimos tempos encontraremos uma dura realidade de pessoas distanciadas de Deus. Ao contrário do que dizem alguns, o ser humano vai se afastando paulatinamente de Deus. Eis algumas características deste aspecto.

i. Mais amigos dos prazeres que de Deus. Este é um perigo muito presente desta geração que busca o prazer e a adrenalina a qualquer preço. O entretenimento, a diversão, o lazer e o conforto tem assumido status de divindade na vida do homem moderno.
Algum tempo atrás tive uma conversa com uma pessoa que estava vivendo num estilo de vida de licenciosidade bem contrário ao Evangelho, apesar de ser frequentador assíduo da igreja. Ao ser confrontado com seu mal, ele afirmou sem reticência e de forma honesta: “Eu amo o pecado!”

Quando amamos o mundo, a Bíblia diz que o amor do Pai não está em nós. Aquela pessoa não queria arrependimento, não sentia necessidade de se humilhar. Havia apenas um desejo no seu coração, satisfazer seus desejos e impulsos, pouco interessado quanto ao plano de Deus para sua vida. Este é o trágico cenário de uma pessoa que caminha para a morte espiritual. Esta pessoa nunca assumiu compromisso com a fé cristã, pois ela ama o pecado. Santidade e comunhão com Deus não fazem parte do seu projeto de vida. É exatamente disto que a Palavra de Deus está falando. De pessoas que amam mais os prazeres que Deus.

Ministrando a um grupo de pastores, comentei que minha maior tentação era a do conforto. Este comentário provocativo me parece absolutamente verdadeiro. Somos uma geração em busca de “felicidade”, prazer imediato. Gostamos de coisas rápidas, de fast food, de micro ondas, de relacionamentos líquidos. Queremos máximo prazer, mínima dor. Desejamos ganhos sem sacrifícios. 

Alguém afirmou que mulheres modernas detestam baratas e gostam de carinho. Detestam roupas baratas, comidas baratas, viagens baratas e amam presentes carinhos, hotéis carinhos, carros carinhos. A verdade, porém, é que este é um retrato do mundo consumista de hoje, de uma sociedade centrada no prazer, que não quer pagar preço, não gosta de disciplina e sacrifício.

Nossa fé superficial revela como não queremos pagar preço de vida de oração, de jejum ou qualquer sacrifício relacionado às coisas de Deus. Por sermos mais amigos dos prazeres que de Deus, facilmente nos afastamos de sua comunhão. E i pior, nem sequer percebemos o que fizemos ou sentimos mal por isto.


ii.              Aparência de piedade mas sem o poder da cruz - O texto bíblico aprofunda a questão. Fala daqueles que tem aparência de piedade, de vida e de compromisso, mas nada mais é que aparência. “tem forma de piedade, negando-lhes, entretanto, o poder” (vs.5). Possuem um linguagem de crente, usam roupa de crente, tem comportamento similar ao de um crente, mas lhes falta algo profundo: O Poder.
A espiritualidade é apenas caricatural. Falta aquela vitalidade que emana da comunhão com Cristo, da graça que é derramada no coração pelo Espirito Santo. Religiosidade de forma. Tudo externo, tudo superficial.

Como precisamos estar alertas sobre o nosso coração.
Paulo fala que pessoas assim tendem a emitir comportamentos bizarros na sua vida de duplicidade. Vivem uma ética dominada por paixões carnais, vidas marcadas por atitudes “sorrateiras” (3.6). viver assim é um enorme risco espiritual, porque podemos chegar à trágica condição de “aprender sempre, sem jamais chegar ao conhecimento da verdade” (3.7).
Paulo cita um exemplo do Antigo Testamento. Dois homens cujos nomes não sao registrados nos textos de Moisés, mas que chegou até os dias de Paulo através da tradição oral e pelos rabinos. Janes e Jambres. Estes homens resistiram à autoridade de Moisés, mas acima de tudo, resistiram também à verdade.
Resistir à verdade é tolice, além de ser perigoso e ridículo. Este comportamento está sempre presente na inescrupulosa politica brasileira. São homens que, apesar dos fatos e provas, apesar de vídeos e gravações, insistem em afirmar sua inocência e negar o obvio. A verdade, porém, tem sempre  o poder da ironia. Mais cedo ou mais tarde se revela.
Paulo afirma em Rm 1.18 que “a ira de Deus se revela dos céus contra toda impiedade e perversão dos homens que detém a verdade pela injustiça”. Verdade é conceito, injustiça é prática. Eles tentam ocultar a verdade para que seus comportamentos escusos não sejam denunciados e por isto tentam “resistir à verdade”, ou “deter a verdade”. Resistir é confronto. Deter é manobra. Ambas são pífias porque a verdade não precisa se esforçar para se revelar, já a injustiça e a mentira precisam de conchavos, acordos, manobras, casuísmos – para, no final, serem desmascaradas.
O texto bíblico nos ensina que Janes e Jambres fizeram isto, a exemplo dos homens modernos, dos “últimos dias”, porque são “de todo corrompidos na mente, réprobos quanto à fé” (3.8).
Mente corrompida é como um software com vírus.
Ele deforma o programa, danifica o conteúdo, deleta a memória. Uma fé réproba é reprovada. Não passa pelo crivo mais simples da relação do homem com Deus. Por isto, tais homens, “não irão avante, porque a sua insensatez será a todos evidente, como também aconteceu com a daqueles” (3.9). Aqueles homens foram desmascarados, denunciados e julgados.
Assim também acontecerá à raça humana no juízo final. Diante de Deus serão manifestos todos pensamentos e motivos do coração.

Conclusão
Qual deve ser nossa resposta a tudo isto que vemos?
Paulo exorta Timóteo, este jovem líder cristão com uma clássica e repetitiva declaração: “Tu, porém”. (3.10,14; 4.5,15). É necessário dar uma resposta diferenciada a todo este caótico estado do ser humano no Século XXI.

1.     Tenha uma atitude diferente desta geração – “Tu, porém”. Precisamos ser cuidadosos para dar uma resposta contra cultural  e não reproduzir o estilo pecaminoso de vida. É fácil julgar outros, mas estamos realmente atentos à nossa própria condição? Estamos vigilantes quanto a estes e outros pecados? Não dá para se descuidar. Estas ameaças são reais e perigosas. Precisamos estar alertas quanto à nossa própria vida. Não estamos falando dos outros, mas de nós mesmos.

2.     Arrepende-te! Este “Tu, porém”, nos conclama à necessidade de termos um coração quebrantado. Confissão, quebrantamento e arrependimentos são desafios constantes para quem deseja viver uma vida de piedade e temor na presença de Deus. Não tenha dúvidas de voltar para Deus. Ao perceber que seu coração se desvia do propósito do Eterno, retorne com humildade, afinal “Deus resiste aos soberbos, contudo, aos humildes, concede sua graça” (1 Pe 5.5).

3.     Considere a graça de Deus. Nesta carta, já nos primeiros versos, Paulo fala da maravilhosa graça de Deus. “...que nos salvou e nos chamou com santa vocação. Não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos” (2 Tm 1.9).

Considere sua vocação.
Considere seu chamado.
Deus não nos chamou para uma vida sem afetividade, nem para uma vida de subterfúgios e aparência, portanto, devemos sempre nos apresentar diante dele como filhos da luz.
Ele não nos chamou “segundo as nossas obras”, isto significa que o Evangelho não trata, na sua essência, daquilo que sou chamado a fazer, mas daquilo que Deus é capaz de fazer em mim, através de mim e a despeito de mim.

Estamos nos “últimos dias” e por isto, devemos viver em santa piedade e temor, até a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo.

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