sábado, 4 de novembro de 2017

At 1.1-11 Por que estais olhando para as alturas?



Uma visão do livro de Atos
Ray Stedman dá a uma série de sermões no livro de Atos o seguinte título: “Atos, uma história não concluída”. Ele afirma o seguinte: “Atos é o livro que revela o poder de Deus sobre a igreja, por esta razão quando a igreja se torna frágil, perdendo seu poder, e impotente no seu testemunho, ela precisa retornar em espírito, expectativa e conhecimento para os ensinamentos do livro de Atos. Neste livro, os princípios da transformação – “não eu, mas Jesus” – são dramaticamente revelados”.
Sem o livro de Atos jamais entenderíamos o restante da Bíblia. Nos evangelhos todos os registros giram em torno da Galileia e da Judeia, e quando abrimos a Carta aos Romanos, vemos um homem escrevendo a um grupo de cristãos para o centro do mundo daqueles dias, então, torna-se claro que alguma coisa aconteceu entre os evangelhos e a carta, e é exatamente isto que encontramos no livro de Atos.
Este livro foi escrito por Lucas, o médico amado, a Teófilo. Talvez um pseudônimo de alguém famoso que tinha interesse no Evangelho mas que não queria ser identificado, já que seu nome significa “amigo de Deus”. Lucas também foi o autor do Evangelho que leva seu nome e que também foi endereçado à mesma pessoa. Muitos preferem o título “Atos do Espírito Santo”, porque nele é registrado a maravilhosa obra que Deus estava acontecendo na igreja.
Este era o objetivo de Lucas:
Escrevi o primeiro livro, ó Teófilo, relatando todas as coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar até ao dia em que, depois de haver dado mandamentos por intermédio do Espírito Santos aos apóstolos que escolhera, foi elevado às alturas” (At 1.1,2).
Os Evangelhos relatam a obra de Deus ainda incompleta e o livro de Atos dá seguimento aos fatos no meio da igreja, agora sem a presença física de Cristo. Apesar da continuidade relatada, o livro de Atos encerra-se ainda de forma inconclusa, demonstrando que a obra continua.
A subida de Jesus ao céu, ou sua ascensão só é relatada no livro de Atos. Stedman afirma que o Evangelho  relata “o fim do começo”, e o livro de Atos mostra como o poder do Cristo ressurreto se revela sobre sua igreja a fim de cumprir o propósito de Deus designado para todos os povos,, cumprindo sua promessa dada: “Eis que estarei convosco até a consumação dos séculos” (Mt 28.20). Isto só é possível por meio da obra do Espírito Santo que capacita e energiza sua igreja à obra (At 1.8).
É isto que observamos no livro de Atos. O Espírito conduzindo sua igreja de forma direta, aos lugares certos, na hora certa, às pessoas certas. É Assim que o Espírito leva Filipe a acompanhar a carruagem do Eunuco da rainha da Candace que estava lendo o profeta Isaias (At 8). Da mesma forma, este mesmo Espírito leva o assustado Ananias a se encontrar com o temível Paulo e orar por ele em Damasco (At 9). No capítulo 13 ele designa Barnabé e Saulo para a obra missionária (At 13.2). Em At 16.6-7 os discípulos queriam ir para Bitínia, mas o Espírito os orientou em outra direção. A obra é de Deus, esta é sua divina estratégia.
Quando Pedro está pregando no dia do Pentecostes, sua mensagem foi interrompida no meio com a manifestação sobrenatural do derramamento do Espírito. Aquelas pessoas foram tocadas pelo Espírito de Deus e estavam indagando: “Que faremos irmãos?” (At 2.37). O Espírito Santo estava comunicando a vida de Cristo, levando-os ao arrependimento e à vida.
Um olhar em Atos 1.1-11
Este texto narra os 50 dias entre a ressurreição, ascensão de Cristo e o Pentecostes, vocábulo grego que significa “quinquagésimo”. O Pentecostes acontecia, portanto, 50 dias depois da celebração da páscoa, tanto para o povo hebraico (Peshah), cuja festa tem suas raízes na tradição agrícola, que coincide com o início da colheita do trigo, ou festa das primícias, quando o povo de Deus agradecia os frutos colhidos na primavera e cada família oferecia suas ofertas a Deus (Lv 23.33-44).
A festa da páscoa era uma festa fixa (14º dia do mês de Nissan), e o Pentecostes, 50 dias depois. Este texto fala das aparições de Cristo nestes dias e dá o pano de fundo para a compreensão do relato do livro de Atos dos Apóstolos.
O que Cristo fez nestes dias?
A.      Retornou ao Pai – Morte para Jesus nada mais era que uma transição de uma esfera para outra. Na cruz ele afirma ao ladrão arrependido: “Hoje mesmo estarás comigo no paraíso” (Lc 23.42-43). Após sua morte quando pagou o preço pelos nossos pecados, e a ressurreição, na qual demonstrou seu poder e glória, Jesus retornou para a glória celestial.

B.      Foi ao inferno – Esta é a afirmação mais controvertida e questionada. Ela aparece em 1 Pe 3.19: “Aos quais foi e pregou aos espíritos em prisão”. Esta é uma afirmação para a qual não há unanimidade, mas faz parte do Credo Apostólico:
“Creio em Deus Pai, Todo-poderoso, Criador do Céu e da terra.

Creio em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor, o qual foi concebido por obra do Espírito Santo; nasceu da virgem Maria; padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado; desceu ao Hades; ressurgiu dos mortos ao terceiro dia; subiu ao Céu; está sentado à direita de Deus Pai Todo-poderoso, donde há de vir para julgar os vivos e os mortos.

Creio no Espírito Santo; na Santa Igreja Universal; na comunhão dos santos; na remissão dos pecados; na ressurreição do corpo; na vida eterna. Amém”. 
A expressão, “desceu ao Hades”, é traduzido em alguns credos por “lugar dos mortos” e noutro “desceu ao inferno”.
A pergunta que surge: O que Jesus foi fazer no lugar dos mortos, no inferno. Qual era o objetivo dele ao pregar aos espíritos em prisão?
A visão reformada é que ele foi declarar sua vitória ao inferno, foi anunciar aos poderes infernais que sua obra havia sido concluída efetivamente. Talvez este texto tenha uma correlação com Ap 1.18 que diz: “Eu sou o primeiro e último, aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da morte e do inferno”. Pode ser que esta declaração tenha sido feita e proclamada no inferno. Certo cômico pregador nordestino assim se referiu a este texto: “Satanás é um bicho frouxo, não tem a chave nem de sua casa”.

C.      Fez Aparições ocasionais – Tanto os Evangelhos quanto o livro de Atos (e até mesmo a 1 Carta aos Coríntios), revelam inúmeras ocasiões, em que Jesus fez suas aparições depois da ressurreição.
                                                               i.      Maria Madalena – jo 20.1,2
                                                             ii.      Maria – Jo 20..11
                                                            iii.      A dez discípulos – Jo 20.19-23
                                                           iv.      A 10 Apóstolos, exceto Dídimo – Jo 20.26
                                                             v.      Aos apóstolos, incluindo Dídimo – 8 dias depois – Jo. 20.26
                                                           vi.      A 7 Discípulos – Jo 21.1,2
                                                          vii.      Aos 2 discípulos no caminho de Emaús- Lc 24
                                                        viii.      “A mais de 500 irmãos, de uma só vez, dos quais a maioria sobrevive até agora” -  1 Co 15.6
As aparições de Jesus foram:
Primeiro, por um curto espaço de tempo – “Apareceu durante quarenta dias” (At 1.3). Não foram aparições infindáveis e que continuaram acontecendo na história da igreja. Paulo afirma que Jesus lhe apareceu e se revelou no caminho de Damasco como que para um “nascido fora do tempo”. Não há muitos relatos sérios de Jesus aparecendo as pessoas desde a igreja primitiva até hoje. Isto é importante porque descarta a possibilidade de serem alucinações coletivas, se assim fosse, elas se repetiriam infinitamente na história. Não! As aparições se deram num período de 40 dias e cessaram!
Segundo, Jesus tinha um corpo glorificado – “E, comendo com eles, determinou-lhes que não se ausentassem de Jerusalém” (At 1.4). Jesus podia comer, seu corpo era transfigurado, glorificado, mas não era fantasmagórico. As pessoas podiam tocar nele (jo20.26-27), embora ele pudesse trasladar, isto é, atravessar paredes e portas. Foi assim que ele se revelou aos discípulos que estavam com as portas das casas trancadas em Jo 20.19. Ao mesmo tempo, podia comer com eles (Jo 21.13; At 1.4).
Terceiro, suas manifestações tinham aspecto didático. Dois temas estavam claros na sua mente: Falar do projeto de Deus para o estabelecimento do seu reino através da igreja e da capacitação espiritual que lhe seria dada através do Espírito Santo.
a.       O Projeto de Deus para a humanidade: O estabelecimento de seu reino – “Depois de ter padecido, se apresentou vivo”... “...e, falando das coisas concernentes ao reino de Deus” (At 1.3). O tema central de suas conversas era o reino de Deus. Isto é profundamente coerente com seu discurso, já que quando esteve andando com seus discípulos, este foi o assunto ao qual ele mais se referiu e ensinou. Na mente de Cristo, havia uma realidade que transcendia muito os poderes transitórios, e que estava no projeto de Deus para a raça humana.
A pergunta feita pelos discípulos revela o desvio hermenêutico fundamentado no pensamento judaico. “Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel?” Jesus precisava desfazer algumas falsas concepções sobre o reino de Deus que ainda estavam arraigadas no pensamento rabínico e judaico, carregado de um messianismo político. O Messias não viria para libertar Israel do poder opressivo de Roma, mas do poder devastador do pecado e da força do diabo.

Jesus afirma que o Pai tem uma agenda, com tempos e épocas reservadas para sua exclusiva autoridade, e que esta agenda não era da competência de ninguém aqui da terra. A história segue um plano divino, um propósito divino reservado pelo Pai.
b.      A capacitação do povo de Deus: O Poder do Espírito Santo. Na sequência do texto percebemos como Jesus faz uma quebra no tema proposto pelos curiosos e ansiosos discípulos, dando a direção que pedagogicamente lhe interessava: “Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas, tanto em Jerusalém, como em toda Judeia e Samaria, e até os confins da terra” (At 1.8).

A.    A obra do Espírito possui três dimensões apresentadas por Jesus:

                                                               i.      Marcada pelo empoderamento – “Recebereis poder ao descer sobre vós o Espírito Santo”. Este poder seria algo sobrenatural: “Ficai em Jerusalém até que do alto sejais revestidos de poder” (Lc 24.49). Não era poder humano, nem auto ajuda, nem marketing, nem política. Ele seria concedido pelo Espírito e viria do alto. A palavra “poder” no grego é “dinamis”, de onde surge a palavra dinamite em português. Algo transformador, impactante, poderoso e explosivo.

                                                             ii.      Capacitador – Jesus aponta para a missão de sua igreja. “Poder para serem testemunhas”. Não poder para exercerem domínio, mas para o martírio, que é a ideia que a palavra testemunha traz. Em grego Jesus emprega a palavra “martírio”. O testemunho seria feito através do suplício, da morte. Eles precisariam de poder para enfrentarem a oposição, perseguição e a morte, para viver e morrer pelo evangelho.
                                                            iii.      Alcance universal – “e sereis minhas testemunhas, tanto em Jerusalém, como em toda Judeia e Samaria, e até os confins da terra” (At 1.8). Jesus tinha uma visão clara do alcance do evangelho, vendo o fim desde o começo. A mensagem da cruz teria uma efeito multiplicador, como uma centelha, ou uma pedra lançada em um lago plácido, que causaria um “Ripley effect”, como uma onda, do centro para fora, começando em Jerusalém (onde estavam), alcançando a região imediata (Judeia, o estado), e a Galileia, seus vizinhos mais próximos, e até os confins da terra.
A didática de Jesus é clara: “tanto em Jerusalém, como em toda Judeia e Samaria, e até os confins da terra” (At 1.8).
A obra não deveria ser sucessiva: faça uma, se der tempo, faça a outra, mas simultânea. “tanto em...como em...até os confins”. A obra missionaria não pode aguardar processos ou plena realização numa região para se expandir, mas deve ocorrer ao mesmo tempo. Curiosamente, estas palavras foram suas últimas recomendações. A obra missionária ocupa um papel central na mensagem de Cristo. Antes de ascender aos céus, esta foi a última recomendação feita. Ele fala sobre o Espírito, a natureza e importância das missões, o martírio e o alcance do Evangelho, indo até os confins da terra.
Ditas estas palavras...
O vs 9 deixa claro que as recomendações finais e imprescindíveis foram satisfatoriamente entregues... “Ditas estas palavras, foi elevado Jesus às alturas, à vista deles, e uma nuvem o encobriu dos seus olhos” (At 1.9).
Provavelmente este fato tenha sido visto por aqueles 500 irmãos que Paulo faz menção em 1 Co 15.6, porque uma aparição para um grupo tão grande de pessoas precisava se dar num ambiente aberto.
O que acontece então?
Os discípulos ficam estáticos, sem ação, deslumbrados e parados. Os anjos, então intervém. Há momentos na vida da igreja que se as forças angelicais não se manifestarem o resultado é um desastre. “E, estando eles, com os olhos fitos no céu, enquanto Jesus subia, eis que dois varões vestidos de branco se puseram ao lado deles, e lhes disseram: Varões galileus, por que estais olhando para as alturas?” (At 1.10,11).
Em outras palavras: os anjos se movem para tirar os discípulos do encantamento que poderia se transformar em marasmo. A igreja corria o risco de ficar na surpresa e admiração, mas Deus os queria envolvidos na dinâmica da vida e na obra missionária que acabaram de receber. O mundo está aguardando, a igreja precisa se mobilizar. Há muito a ser feito!
Antes de irem embora, porém, os anjos ainda lhes trazem outra promessa: “Esse Jesus, que dentre vós foi assunto ao céu, virá do modo como o vistes subir” (At 1.11). Há muita coisa para acontecer, muitas surpresas ainda por vir, por hora, precisamos continuar testemunhando Jesus até que ele venha.
Jesus voltará nas nuvens da forma como subiu. Sua volta também será visível. No tempo e época que o Pai reservou para sua exclusiva autoridade, não sabemos quanto, e nem nos compete saber, Jesus virá!

O apóstolo Pedro, que estava com Jesus quando ele foi levado para o céu, testemunha ocular destes eventos afirma: “Visto que todas estas coisas hão de ser assim desfeitas, deveis ser tais como os que vivem em santo procedimento e piedade, esperando e apressando a vinda do dia de Deus, por causa do qual, os céus incendiados serão desfeitos, e os elementos abrasados se derretarão” (2 Pe 1.11,12).

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