terça-feira, 7 de novembro de 2017

At 1.12-26 Na expectativa do pentecostes




Pentecostes é  uma das três grandes festas anuais instituídas pela  Lei Mosaica: Páscoa Pentecostes e Tabernáculo. Pentecostes foi um nome posteriormente dado a festa das semanas  ou  das  colheitas  (Ex 23.16; 34.22; Nm.28.26). Tem este nome porque era celebrada 50  dias  depois  da  Páscoa (At 2.1). Nesta festa era exigido a presença de todos os homens e só estavam isentos da presença os que fossem incapacitados por doença ou enfermidade (Ex 23.17; Dt16.16).

Este texto mostra a igreja vivendo entre dois grandes eventos da redenção: Ressurreição e Pentecoste.

Ressurreição

Cerca de 50 dias atrás, os discípulos se surpreenderam ao ouvir, primeiramente das mulheres, que Jesus havia ressuscitado. A Bíblia afirma que esta informação era tão inesperada, que a reação imediata era de que se tratava de um delírio feminino (Lc 24.11). Aos poucos, porém, eles também tiveram experiências com Jesus, participaram deste evento e se tornaram testemunhas oculares. Apesar deste fato tremendo, os discípulos não conseguem avançar.
Stanley Jones afirma no livro “O Cristo de todos os caminhos”, que a igreja vivia entre a ressurreição (um fato histórico), mas sem o pentecostes (o poder necessário), e por isto continuava de portas trancadas. O conhecimento da ressurreição, por maior que tenha sido, não lhes dava a ousadia e intrepidez enfrentarem os desafios, e assim Jesus os encontrou: “Ao cair da tarde daquele dia, o primeiro dia da semana, trancadas as portas da casa onde estavam os discípulos, com medo dos judeus, veio Jesus, pôs-se no meio deles e disse-lhes: Paz seja convosco!” (Jo 20.19). Apesar da ressurreição, a igreja estava encurralada e ensimesmada, entre quatro paredes e com “as portas trancadas”, dominada pelo “medos dos judeus”. É uma igreja que teme ser destruída e se esconde para se proteger.
“Nem a fantástica notícia da ressurreição os arranca da  morbidez  da  paralisia  de  análise" (Stanley Jones). A Igreja continua ensimesmada, sem projetos  para  fora, apenas defendendo o grupo. Uma igreja que teme ser destruída e se protege. O medo a faz ser assim. Medo de que seus pressupostos não sejam suficientemente fortes para sustentar-se diante  das evidências. Ao mesmo tempo revela-se incrédula. Esta atitude é evidente em Tomé que não  consegue  crer  a  despeito  do testemunho dos outros apóstolos, assume atitude crítica. Dois discípulos estão no caminho de Emaús retornando para suas casas, apesar de ouvirem a notícia de que Cristo ressuscitara. Eles nem sequer se dao ao cuidado de averiguar a veracidade dos fatos, porque isto lhes parece tão absurdo que não dava para crer. No encontro de Jesus com seus discípulos, ele lhes censura a incredulidade (Mc 11.14). 

A igreja estava vivendo entre a ressurreição e o pentecoste.

Pentecoste

Torna-se evidente que o conhecimento doutrinário não foi suficiente para levar a igreja à realizar a obra, e Jesus sabia disto. Por isto “Determinou-lhes que não se ausentassem de Jerusalém, mas que esperassem a promessa do Pai, a qual, disse ele, de mim ouvistes” (At 1.4). Para realizar a missão eles precisavam de poder. Missão é algo subsequente à experiência do Espírito. Lucas registra que as provas de sua ressurreição eram "incontestáveis" (At 1.3), mas apesar de toda esta experiência e das múltiplas aparições de Jesus por quarenta dias eles precisavam de algo imprescindível: O derramamento do Espírito.  

Este texto nos mostra a igreja vivendo então, na expectativa de algo, há uma promessa, mas ao lermos atentamente, verificamos que quatro elementos estão presentes na vida da igreja, antes do derramamento do Espírito acontecer. Se quisermos este poder de Deus, estas coisas precisam estar presentes em nossas vidas.
É muito comum vermos pessoas falando de avivamentos. Estudiosos atentos afirmam que o Brasil nunca passou por um avivamento, porque historicamente os avivamentos tem as seguintes características:

Primeiro, são caracterizados por arrependimento, desejo de santidade, e retorno às Escrituras Sagradas.
A Bíblia e as doutrinas fundamentais, como justificação pela graça são resgatadas. As pessoas sentem tristeza pelo pecado e são atraídas pelas coisas de Deus. A Bíblia passa a ser estudada com seriedade profunda, e as pessoas sentem seu pecado e buscam santidade.
Quando Jonathan Edwards, pregou seu famoso sermão: “pecadores nas mãos de um Deus irado”, conta-se que as pessoas abraçavam os pilares do templo com medo de morrerem e irem para o inferno. A frieza e o compromisso daqueles dias foram substituídos por vida intensa de oração e alegria de Deus.
As igrejas são renovadas. Novo desejo pela oração, pela leitura da Palavra, por uma vida santa.

Segundo, são movimentos duradouros
Alguns movimentos da história duraram séculos. Para se ter uma ideia, afirma-se que só nove avivamentos históricos se deram. Considere, por exemplo, o avivamento no país de Gales. Um grupo de irmãos se reuniu para orar, e os familiares começaram a ficar preocupados porque os jovens não voltaram para suas casas. Eles chegaram lá e viram um grupo clamando fervorosamente pela obra de Deus em suas vidas. Aquelas pessoas foram igualmente contagiadas pelo fervor presente na reunião e enquanto uns saiam, outros foram chegando. Esta reunião de oração durou, ininterruptamente por décadas.
O avivamento que soprou na Coréia do Sul, durou cerca de 100 anos.
O avivamento da Azuza Street, impactou o mundo inteiro.
O primeiro avivamento da América, com Jonathan Edwards no Século XVII, gerou uma quantidade imensa de missionários no mundo inteiro.
Avivamento não é uma experiência pentecostal que acontece num grupo de pessoas e fica por isto mesmo. São movimentos duradouros e longos.

Terceiro, tem grande impacto social
Quando aconteceu o movimento wesleyano na Inglaterra, no meio de uma igreja fria, institucional e formal, a Inglaterra estava a ponto de falência moral e espiritual. John Stott afirma que se não houvesse avivamento, teria acontecido uma guerra civil tão sangrenta quanto a Revolução Francesa. Londres estava marcada pela decadência moral, bares e prostíbulos, e os índices da violência aumentavam significativamente. Foi então que Deus despertou John Wesley e Carlos Wesley, e um pequeno grupo de irmãos, que ficaram posteriormente conhecidos como Metodistas. Por que metodistas? Se quisessem ser membros de sua igreja, precisavam assinar termos de compromisso e envolvimento, que incluíam, entre outros, acordar 4 hs da manhã para orar.
A Inglaterra foi transformada pela vida destes homens de oração.
No Brasil, infelizmente, nunca aconteceu um avivamento que mudasse historicamente o rumo de uma sociedade. Apesar do aumento de igrejas, ainda não vimos o que o poder do Evangelho de forma transformadora. Nossa nação está podre, sua liderança política corrupta, a sensualidade e a imoralidade presentes, e os índices de violência aumentando cada vez mais, as famílias se esfacelando, mesmo os cristãos com uma vida de frieza e apatia espirituais.
Oh! Como estamos necessitados de um mover do Espírito. Como minha vida precisa disto, como minha família precisa disto, como a igreja precisa disto, como o país precisa disto!

A Igreja primitiva estava ali, entre a ressurreição e o pentecostes. A obra não se realizaria sem este fogo do Espírito.
Ao estudarmos atentamente este primeiro capítulo, observamos que quatro ingredientes antecederam o derramamento. Estes mesmos elementos precisam estar presentes no meio do povo de Deus se desejamos derramamento do Espírito.

1.     Expectativa  do  novo - E comendo com eles, determinou-lhes que não se ausentassem de Jerusalém, mas que esperassem a promessa do Pai, a qual, disse ele, de mim ouvistes” (At 1.4).

Eles estavam encharcados por um sentimento de que algo novo aconteceria entre eles. Jesus didática e intencionalmente criou esta expectativa em seus corações. "Eis que envio sobre vós a promessa de meu Pai; permanecei na cidade, até que, do alto, sejais revestidos de poder" (Lc.24.49).

Só acontece pentecoste para quem espera pentecoste.
Quem não espera nada  de Deus não recebe nada.

Deus atende  expectativas de corações sedentos e sinceros "Buscar-me-eis e me achareis, quando me buscardes de todo coração” (Jr 29.13). “Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareisbatei e abrir-se-vos-á. Pois todo o que pede, recebe; e quem busca, acha; e ao que bate, abrir-se-lhe-á” (Mt 7.7-12).
O cristão atento é aquele que já experimentou a graça da salvação, mas aguarda a promessa do que virá. Encontra-se na ponta dos pés aguardando o que Deus fará. Onde houver  expectativa    abertura para a ação do Espírito de Deus. Portanto, ore com expectativa, leia a Bíblia com expectativa, abra seu coração com expectativa, venha à Igreja com expectativa.
Acredito que a conhecida frase do evangelista D.L. Moody aponta nesta direção. “Faça grandes coisas para Deus e espere grandes coisas de Deus”. Deus nos dará na medida da expectativa. Atribui-se a John Haggai a frase: “Sonhe com coisas tão grandes para Deus, que se ele não fizer, o resultado será o fracasso”. A mulher hemorrágica dizia: “se eu apenas lhe tocar as vestes, então serei curada”(Mc 5.28), e ela voltou curada, ao passo que centenas de outras pessoas, igualmente necessitadas, voltaram para suas casas, sem experimentarem o poder restaurador e renovador de Jesus.
Os discípulos não sabem o que virá, alguns estavam até com erradas expectativas, mas eles aguardam. E a promessa se revela: “Ao cumprir-se o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar, de repente veio do céu um som, como de um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam assentados” (At 2.1,2).

2.     Intensa vida de oração – “Quando ali entraram, subiram para o cenáculo... todos estes perseveravam unanimes em oração, com as mulheres, com Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos dele (At 1.12,13).

É importante notar que até mesmo a mãe de Jesus e seus irmãos estão nesta reunião de oração. Porque é importante o registro deles nesta reunião? Os irmãos de Jesus, em determinado momento de seu ministério, acharam que ele estava tendo estava com um surto psicótico pela coisas que dizia e fazia e foram atrás dele para trazerem de volta para casa (Mt 12.48), mas agora, todos eles, inclusive Maria, encontram-se, reconhecendo quem ele era, e participando desta abençoada reunião de oração.
Somente a oração pode dar a exata dimensão de quem somos no reino e propiciar o ambiente para que sejamos revisitados pelo pentecostes. É assim, de joelhos, que encontramos a igreja neste momento. Eles voltaram do Monte das Oliveiras depois de verem Jesus sendo elevado para os céus, e voltaram diretamente para o cenáculo, para orar (At 1.13).
A igreja estava orando antes do pentecostes acontecer, mas o que surpreende aqui é que a liderança ora. Todos os onze apóstolos estão ali e são citados nominalmente. Só quem não aparece nesta reunião de oração é Judas Iscariotes, por razões óbvias, mas porque também já havia morrido. Estão frisando isto, porque é muito fácil líderes de igreja e pastores se esquecerem da importância da oração comunitária. É conhecido o fato de que presbíteros e diáconos raramente participam de reuniões de oração.
Pentecoste se dá na vida da igreja que ora.
Em At 2.1 novamente vemos a igreja reunida e orando, se aproximando de Deus sincera e devocionalmente, abrindo-se para a possibilidade de uma ação sobrenatural em suas vidas.

3.     Atenta leitura das Escrituras – Irmãos, convinha que se cumprisse a Escritura que o Espírito Santo profetizou anteriormente pela boca de Davi, acerca de Judas, que foi o guia daqueles que prenderam Jesus”(At 1.15). “Porque está escrito no Livro dos Salmos” (At 1.20).

Como eles tomam conhecimento destas verdades relatados no Antigo Testamento? Porque estavam lendo cuidadosamente a Bíblia.
Aquela comunidade tinha de fato a Bíblia como referência de suas vidas. É importante lembrar que não era tão fácil ter acesso ao Antigo Testamento, poucas pessoas tinham direito para comprar um pergaminho com os textos sagrados, era preciso ir para a sinagoga e ler a Torah e os Nabiins (Lei e os profetas) que ficavam guardados e sobre a proteção de algum líder espiritual, mas apesar da dificuldade de acesso aos textos sagrados, eles estavam refletindo sobre seu conteúdo e verdade, e desta forma encontram referencias proféticas sobre aquilo que está acontecendo entre eles.
É assim que devemos ler a Bíblia, procurando respostas para enfrentar as batalhas das crises que estamos vivendo, dos momentos históricos nos quais estamos envolvidos.
Esta é a leitura de quem procura ouvir a  voz de Deus.
Quanto tempo faz que você não lê a Bíblia devocionalmente, não para preparar estudos bíblicos e sermões, nem por curiosidade teológica, mas para ouvir a voz de Deus?
Juan Carlos Ortiz, conhecido pregador argentino afirma que precisamos ler os textos não sublinhados da Bíblia para não criarmos o “evangelho dos Santos  evangélicos”. Um conhecido meu, certa vez sugeriu ao ver minha bíblia toda marcada, que eu comprasse uma bíblia nova, para fazer novas marcações e encontrar novas realidades e promessas de Deus. Talvez ele tivesse razão.
Mas o que vemos na igreja de Atos, é este cuidado em ler a Bíblia, em saber a vontade e o plano de Deus para suas vidas, em querer se orientar não pelas circunstâncias e sentimentos do coração, mas pelas verdades eternas reveladas nas Escrituras.

4.     Vida intensa de comunhãoAo cumprir-se o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar”(At.2.1)

Observem como este texto enfatiza a vida de comunidade.
São várias afirmações sobre o mesmo tema, todos revelando como valorizavam a  vida comunitária:
“Estavam todos”
“reunidos”
“No mesmo lugar”.
Todas estas três frases falam da mesma coisa: vida de comunhão:
Não faltava ninguém...
            Não estavam dispersos...
                        Não estavam em outro aprisco...

Nos grandes avivamentos históricos, um fato sempre presente e comum, era a busca comunitária.
Se quisermos experimentar renovação em nossas vidas e em nossa igreja precisamos aprender a orar juntos.
Infelizmente as reuniões de oração são geralmente as mais desprezadas e esquecidas. Parece que ninguém gosta de orar, ou consideram a oração comunitária de pouca importância, mas o que vemos nesta igreja é que toda igreja estava em oração, e a liderança também estava presente.

Conclusão

Uma das coisas que observo na vida de Hananias, Mizael e Azarias, quando desafiam o império babilônico, é que estes jovens estavam dispostos a pagar o preço de uma vida de compromisso com Deus. Eles se sacrificaram por isto. Eles se deram incondicionalmente a Deus.
Muitos gostariam de passar pela experiência de andar com o quarto homem da fornalha, mas quantos estão dispostos a enfrentar sistemas, oposição, ameaças, por causa de Deus?
Muitos falam que desejam avivamento, ou mesmo, reavivamento, mas quantos, na verdade estão dispostos a pagar o custo de uma vida de busca, de oração, de leitura atenta da palavra, de vida comunitária, para experimentar o derramamento do Espírito em suas vidas?
É certo que havia a promessa clara de Jesus para os seus discípulos, mas é perceptível também que o derramamento do Espírito, não aconteceu no vácuo, mas em vidas desejosas de Deus, atentas às coisas de Deus, disponíveis para Deus.
Certa vez o grande evangelista Moody afirmou: “O mundo está por ver o que Deus é capaz de fazer por uma vida inteiramente consagrada a Deus”.
Que Deus nos dê graça e disposição para uma vida de reverência e piedade. Só assim experimentaremos a promessa dada por Jesus aos seus discípulos: “Porque João, na verdade, batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo não muito depois destes dias”(At 1.5).

Rev. Samuel Vieira
Christ The King Presbyterian Church
Cambridge - Ma, 15.05.96

Refeito, Novembro 2017

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