Introdução:
O
que traduzimos por cobiçar [em hebraico, lo thahh.módh] da raiz do verbo “hamad”, que
significa uma manobra para se apoderar do que é dos outros.
De
todos os pecados, este é o mais subjetivo, por isto o que mais facilmente se
esconde, mas ao mesmo tempo, o que mais facilmente nos alcança quando olhamos
cuidadosamente para o nosso coração.
Paulo
afirma:
“Mas eu não teria conhecido o pecado, senão
por intermédio da lei; pois não teria eu conhecido a cobiça, se a lei não
dissera: Não cobiçarás. Mas o pecado, tomando ocasião pelo mandamento,
despertou em mim toda sorte de concupiscência; porque sem lei está morto o
pecado” (Rm 7.7-8).
Paulo
fora um religioso zeloso de suas responsabilidades, sempre olhou cuidadosamente
os mandamentos externos da lei cumprindo-os rigorosamente, mas um dia, ao olhar
para dentro de sua alma, percebeu como o seu coração era entregue à cobiça.
O
décimo mandamento penetra na área do pensamento, trata daquelas questões mais
interiores de nossa alma, toca nas intenções do coração. Lembra que o pecado
não se limita aos atos que praticamos, mas tangencia a vontade e desejos, pois
quem cobiça é o coração. Ou seja, não são os objetos cobiçados que contém
pecado, mas o coração do homem.
O
que Deus exige de seu povo é que retire de dentro de si este pensar ganancioso,
que deseja sempre se apossar. O vício da posse. Cobiça transforma o desejo de
se ter bens e lutar por consegui-los com meios lícitos em desejo desordenado
que degrada o ser humano.
O
décimo mandamento condena a avareza e o desejo de cometer uma
injustiça que provocaria dano ao próximo para obter os bens materiais que lhe
pertence. Não
consiste apenas no fato de se desejar ter o que os outros têm, mas em invejá-los
ao ponto de se ressentir por não ter o que eles têm.
O
texto fala de coisas que em geral fazem parte do desejo de conquista do homem daqueles
dias: Mulheres, servo, serva, boi e jumento.
Se
traduzíssemos esta linguagem para os dias de hoje, colocaríamos nesta lista,
pessoas, animais e coisas, mas certamente haveria uma grande diferença entre o
que será cobiçado naqueles dias e o é em nossos dias. Nossa lista provavelmente
seria muito mais ampla... incluiríamos viagens, hotéis de luxo, carros
luxuosos, status, posição, casas imensas, etc., Na verdade, cada pessoa possui
sua lista de bens e objetos a serem cobiçados. Para uma pessoa simples, a
cobiça pode ser o carro popular que o vizinho tem e não um carro de luxo.
Cobiça tem a ver com nosso imaginário, mais do que com o objeto em si.
Quais
são os objetos do nosso desejo no Século XXI? O que ainda cobiçamos e desejamos
nos apossar de forma indevida, regando nosso coração pecaminoso com desejo de
posse?
A
cobiça é má conselheira, ela age em duas direções:
A.
Pessoas – “Não cobiçarás a mulher do teu próximo” –
Alguém já afirmou que, para as mulheres só existem nove mandamentos, porque não
há recomendação para que a mulher não cobice o marido da outra. Este
raciocínio, obviamente é uma brincadeira.
Na
verdade, a Palavra nos exorta a não querermos ter aquilo que não nos pertence.
José
entendeu muito bem isto, quando a mulher de Potifar se ofereceu a ele. “Como, pois, cometeria eu tamanha maldade e
pecaria contra Deus?” (Gn 39.9). Possuir a mulher do outro, soava para José
como maldade contra seu patrão e atitude pecaminosa contra Deus. Se a mídia
entendesse isto hoje em dia, quando se despreza tanto o valor e a singularidade
do matrimônio, muita coisa mudaria em nossa sociedade, e muito sofrimento seria
poupado.
A
cobiça por pessoas, acaba com relacionamentos, enfraquece o matrimônio, traz
sofrimento a gerações inteiras, interfere no relacionamento do nosso próximo
com seus familiares. Devoramos o objeto de nossa cobiça e aquele que detém o
mesmo.
B. Coisas –
“Não cobiçarás a casa do teu próximo...
nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa
alguma que pertença ao teu próximo” (Ex 20.17). O texto cita casas, propriedades, servos (que
eram considerados posse de seus donos) e animais.
O que o décimo Mandamento requer de nós?
1.
Pleno contentamento com a nossa condição – Esta é a primeira atitude que o Catecismo Maior sugere
quando fala das exigências do décimo mandamento. Precisamos aprender a ter
contentamento, e isto vai da esposa (o)
que temos, até as nossas posses.
A
Bíblia nos encoraja a estarmos contentes com nossas coisas, e aprendermos a
glorificar a Deus por aquilo que temos e recebemos. Eis alguns exemplos
positivos e negativos da Bíblia.
Þ Jezabel criou uma junta de pessoas que falsamente
testemunhou contra Nabote, apenas por causa de sua cobiça. Ela não precisava de
mais nada, era rainha, mas a cobiça tomou conta de seu coração;
Þ Provérbios nos afirma: “Tal é a sorte de todo ganancioso; e este espírito de ganância tira a
vida de quem o possui” (Pv 1.19). A ganância é irmã da cobiça. O alerta que
a Bíblia nos faz é que a ganância vai tirar nossa vida, alegria, contentamento.
Þ Paulo faz uma severa admoestação contra a cobiça: “De fato, grande fonte de lucro é a piedade com
contentamento. Porque nada temos trazido para o mundo e nem coisa alguma
podemos levar dele. Tendo sustento e com quem nos vestir, estejamos contentes.
Ora, os que querem ficar ricos caem em tentação, e cilada, e em muitas
concupiscências insensatas e perniciosas, as quais afogam os homens na ruina e
perdição. Porque o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males; e alguns, nessa
cobiça, se desviaram da fé e a si mesmos se atormentaram com muitas dores”(1
Tm 6.6-9). O grande segredo de nossa vida é o contentamento. Aprendermos a
estar contente com o que temos recebido.
Þ João Batista exorta as pessoas aos coletores de
impostos a não cobrar nada além do estipulado, e aos soldados a não darem
denúncia falsa e a se contentarem com o
soldo (salário) recebido (Lc 3.12-14).
A
conformidade com os bens e as riquezas que Deus dá traz contentamento e satisfação
à alma, ao contrário da cobiça e da inveja que sempre gera inquietação. Por
isto a quebra deste mandamento gera também a inveja ou tristeza quando
se percebe o bem do próximo. Daí surge o ódio, a maledicência e a calúnia. É
necessário combater este pecado e isto se torna possível quando colocamos nossa
confiança e alegria na providência de Deus.
2.
Segunda Lição: Disposição caridosa da alma para com o
nosso próximo, de modo que todos os nossos desejos e afetos relativos a ele se
inclinem para todo o seu bem e promovam o mesmo – Esta é a segunda atitude sugerida pelo Catecismo
Maior.
Não
permitir que nossos desejos e afetos estejam ligados a coisas e que não consigamos
amar as pessoas. Quando vivemos cobiçando, nunca encontramos satisfação e nunca
nos satisfazemos. Pessoas cobiçosas são vazias, e morrem desejando, sem nunca
conseguir o que acha que pode conseguir.
Hans
Burke: “Quem não está satisfeito com o pouco, não estará satisfeito com o
muito. Mais da mesma coisa nos deixa no mesmo lugar”.
3.
Terceira Lição: Somos lembrados do perigo de
colocarmos nossa prioridade em coisas e pessoas, ao invés de Deus. O décimo mandamento faz um contraste claro com o
primeiro mandamento.
No
primeiro, Deus deve ser colocado como primazia de nossa alma, e no último,
somos mais uma vez lembrados de que Deus nos deu dinheiro para gastar, pessoas
para amar, e Deus para adorar. Muitas vezes adoramos as pessoas e consumimos
Deus. Invertemos as prioridades. A cobiça é responsável por estas questões.
A
cobiça aponta para os desejos e afetos desordenados para com coisas e pessoas. Ela
nos leva a ficarmos tristes pelo bem do nosso próximo e a fazermos comparações.
O coração se identifica com aquilo que ama, e, se ama sem medida os bens
materiais, se faz matéria – coisa – coloca a criatura em lugar do criador.
Rubem
Alves afirmou: “Aquilo
que está escrito no coração não necessita de agendas, porque a gente não
esquece. O que a memória ama fica eterno”.
A
Bíblia nos ensina que a cobiça está na origem de toda tentação. “Cada um é
tentado por sua própria cobiça”. Dietrich Bonhoeffer afirma: “Quando a cobiça
assume o controle, Deus se torna irreal para nós”.
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