Introdução:
Este
mandamento tem a ver com o uso da língua.
Falso
testemunho está diretamente relacionado ao mau uso da língua contra o outro,
para acusá-lo sem motivos ou para proteger o ímpio quando ele deveria ser
julgado. Num sistema onde a verdade é tão sacrificada para auto proteção e no
qual a moral tem sido tão banalizada, este texto tem um enorme significado para
a ética de nossos dias.
Para
o povo judeu, isto também era extremamente importante, já que na terra do Egito
não existiam normas de justiça aceitáveis: o dinheiro comprava qualquer
testemunho, subornava os sistemas jurídicos, corrompia os juizes, pagava
qualquer palavra, e desta forma a vida humana foi sistematicamente depreciada.
A
“verdade lucrativa” não instaura um reino de justiça e igualdade. Uma sociedade
onde a lei pune o inocente e o pobre, e em nome de uma moral podre, defende os
ricos e poderosos, certamente é uma comunidade que abre espaço para toda sorte
de corrupção.
Para
defender o direito do acusado, a tradição do povo instruía a corte a não
condenar ninguém a morte pelo testemunho de uma só pessoa:
“Uma só testemunha não se levantará contra
alguém por qualquer iniquidade ou por qualquer pecado, seja qual for que cometer;
pelo depoimento de duas ou três testemunhas se estabelecerá o fato” (Dt
19.15).
“Uma só testemunha não deporá contra
alguém para que morra (Nm 35.30).
O
falso testemunho é a violação de um direito, pois condena um inocente. A
testemunha é mais importante que o juiz. No sistema judaico, a testemunha era a
primeira a atirar a pedra no caso de condenação à morte por apedrejamento.
Caluniar
e mentir sobre o outro, sobre sua vida, seu procedimento, é o mesmo que montar um
tribunal com falsidade para condenar outros à morte. Quantas pessoas na
história foram vítimas das falsas acusações e do perjúrio?
O
problema dos sistemas judiciais é grave, quando se trata de um sistema público
baseado numa ideologia. O livro, “Brasil, Nunca mais!”, relata as torturas
praticadas pelo governo da ditadura militar na década de 60, e mostra como o
sistema de denúncia, para atender a determinados propósitos pode ser tão cruel.
Outro livro assustador foi escrito por Alexander Soljenitzein: “Arquipélago Gulag” que narra as
torturas praticadas pelo sistema militar na extinta União Soviética.
Estes
dois livros são sinistros. Um detalhe nos chama a atenção. Em geral, a fonte de
toda tortura praticada por estes sistemas de opressão era a acusação mentirosa que
se fazia contra as pessoas, muitas delas, pequenos comerciantes, religiosos, trabalhadores
braçais e operários.
O
tribunal de Jesus foi baseado não somente numa lei opressora, mas num juízo
forjado, testemunha falsa e suborno de 30 moedas, e tais pessoas ainda consideravam
isto como “culto a Deus” (Jo 16.2).
A
desgraça do falso testemunho é que por ele, vidas são destruídas, inocentes são
punidos, culpados absolvidos.
Quais são os motivos dos falsos
testemunhos?
- Ganância – Jezabel, rainha de Israel nos dias do profeta
Elias, mandou testemunhar contra Nabote numa corte, porque seu marido estava
interessada no pedaço de terra que ele possuía e era anexo ao palácio.
Para isto contratou falsas testemunhas para apedrejar este inocente homem.
Deus julgou de forma severa seu comportamento.
- Amargura
ou ira – Pessoas feridas guardam
ressentimentos, e quando podem se vingar, usam traiçoeiramente o nome do
outro para denunciar, acusar, delatar. O potencial da malignidade em dizer
mentiras sobre outros, para defesa pessoal costuma ser inimaginável.
- Razões
egoístas – Visando lucro, proteção pessoal ou medo do julgamento. Quando
isto acontece, a mentira, acusação e traição se manifestam. É fácil transformar
até mesmo Deus em aliado de perversos motivos. Ananias mente para ter
lucro financeiro ou parecer bom à comunidade.
- Para
proteger pessoas que amamos –
Caso dos pais de Alexandre Nardoni que matou sua filha Isabela, de 5 anos,
jogando-a a da janela. Os pais queriam proteger o filho que matou a neta e
tentaram criar álibis para que ele escapasse das graves acusações contra
ele. Felizmente a verdade prevaleceu neste horrendo caso. Safira também
mentiu para proteger seu marido, Ananias. Muitos pais protegem seus filhos
de mentiras, de envolvimento com drogas, pequenos crimes, apenas para
justificá-los e para que não sejam punidos.
Todas
estas coisas se encaixam dentro do falso testemunho.
Mentir
para acusar falsamente, se defender, defender outros que amamos. Dar falso
testemunho por amargura e razões egoístas. A quebra do nono mandamento é mais
comum que imaginamos.
Como devemos agir diante de situações
semelhantes:
Seja qual for a implicação para sua
vida: perdas, juízo, perda da reputação pública, diga a verdade, e apenas a verdade, nada mais que a
verdade.
Talvez
isto traga sérias perdas, mas sua consciência e alma estarão livres diante de
Deus. Não minta contra ninguém. Recuse o dolo. Os fortes e poderosos,
tradicionalmente manipulam informações e formam a opinião publica para tirar
proveito econômico ou político.
Tive
o privilégio de ser pastor auxiliar do Rev Adail Sandoval em Brasília. No
início do seu ministério, na pequena cidade de Nanuque-MG, a repressão política
estava na sua fase mais aguda, e este pastor foi denunciado falsamente por um
presbítero de sua igreja porque criou uma associação de lavadeiras para ajudar
as mulheres que viviam lavando roupas nos rios que margeavam a cidade, em
condições deploráveis. Quando ele ajudou a criar uma associação para este fim,
isto soou como uma ação comunista, e por esta razão ele quase foi preso.
Felizmente, um piedoso diácono daquela igreja, tomou conhecimento de sua
iminente prisão, protegeu-o, levando-o escondido para uma fazenda, e de lá
enviando-o para outra cidade.
Outro
exemplo na história recente do Brasil se deu com a morte do pastor
presbiteriano, James Wright, deputado estadual, envolvido com direitos humanos no
Brasil, que foi exterminado e nunca mais encontrado.
O
Nono Mandamento vem nos lembrar: Não dirás
falso testemunho. iNão diga não quando for sim, nem sim quando for não. Não
comprometa quem quer que seja com tuas palavras.
O Catecismo Maior ao explicar este mandamento afirma que eles existem
para conservar e promover a verdade entre os homens e a boa reputação do
próximo, assim como a nossa; por isto devemos falar a verdade, somente a
verdade, em questões de julgamento e justiça e em todas as demais coisas,
quaisquer que sejam; devemos considerar caridosamente os nossos semelhantes;
defender sua inocência.
Afirma ainda que os
pecados proibidos no nono mandamento são:
- Tudo quanto prejudica a verdade e a boa reputação
de nosso próximo, bem assim a nossa, especialmente em julgamento público,
o testemunho falso.
- Subornar testemunhas falsas, aparecer e pleitear
cientemente a favor de uma causa má
- Resistir e calcar à força a verdade, dar sentença
injusta, chamar o mau, bom e o bom, mau.
- Recompensar os maus segundo a obra dos justos e
os justos segundo a obra dos maus.
- Falsificar firmas, suprimir a verdade e silenciar
indevidamente em uma causa justa.
- Manter-nos tranqüilos quando a iniqüidade reclama
a repreensão de nossa parte, ou denunciar outrem indevidamente.
- Falar a verdade inoportunamente, ou com malícia,
para um fim errôneo; pervertê-la em sentido falso, ou proferi-la duvidosa
e equivocadamente, para prejuízo da verdade ou da justiça.
- Falar inverdades, mentir, caluniar, maldizer,
depreciar, tagarelar, cochichar, escarnecer, vilipendiar, censurar temerária
e asperamente ou com parcialidade, interpretar de maneira má as intenções,
palavras e atos de outrem.
- Descobrir desnecessariamente as fraquezas de
outrem e levantar boatos falsos;
Conclusão:
Desta
forma dá para perceber que o leque de contato do nono mandamento é bem mais
forte que imaginamos.
Por
esta razão, o nono mandamento é mais atual que nunca. Por isto, “Não dirá falso testemunho”.
Samuel
Vieira
Anápolis,
Agosto 2008
Refeito
Novembro 2019
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